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‘O Universo no olhar’ e o dualismo da existência humana

Cada pessoa no planeta tem um único par de olhos. Todos, seu próprio universo. ”

O universo no olhar’ (2014), filme dirigido por Mike Cahill, aborda de forma fantasiosa e dramática a dicotomia (contrárias e/ou complementares) entre ciência versus espiritualidade. O personagem principal Dr. Ian Gray, interpretado por Michael Pitt, é um biólogo molecular que pesquisa sobre a evolução dos olhos humanos junto com sua assistente Karen (Brit Marling), já que os olhos são um recurso usado por religiosos para desacreditar na evolução, pois são únicos em cada indivíduo como impressões digitais. Assim, Ian tem o objetivo de refutar crenças religiosas, acreditando no avanço da natureza em detrimento da existência de um criador superior.

Aparentemente, o clichê que os opostos se atraem não falha. Durante esses estudos, o cientista que acredita somente em dados conhece Sofi em uma festa de Halloween, personagem de Astrid Berges-Frisbey, uma jovem enérgica, apaixonada e poética, sendo totalmente o oposto dele. Ela crê em vidas passadas e conexões de almas, baseando sua vida de acordo com a mitologia e posição das estrelas.

Fonte: encurtador.com.br/dfvJW

Esse relacionamento intenso mostra de forma sutil e um tanto superficial devido a profundidade do tema, a necessidade de buscar um “porquê”, encontrar sentido e explicações para a vida humana, usando os caminhos da razão ou espiritualidade. A partir do Iluminismo, a ciência procura explicar os fenômenos de modo racional por observação e reprodução, enquanto a espiritualidade justifica o mundo como projeto de um plano superior a si mesmo e ao que os olhos podem ver.

Buscamos há décadas compreender o mundo, à procura das respostas para as perguntas “como surgimos?” e “para onde vamos? ”; Ian Gray decide seguir a razão para explicar a realidade. Seu paradoxo surge 8 anos após vivenciar um amor de verão com Sofi, depois de uma série de coincidências (que podem ser vistas como sorte) para chegar a descoberta que podem existir olhos iguais. Isso deixa o especialista perplexo diante da possibilidade de sua única prova a favor da supremacia científica diante de qualquer outra hipótese, falhar.

Fonte: encurtador.com.br/szJZ7

A partir de pesquisas de outra cientista, ele continua a investigar se padrões de íris idênticos estão associados a conexões mnemônicas. Pois se os olhos e cérebro estão conectados, e essa estrutura celular do olho é repetida de pessoa para outra pessoa, talvez haja uma ligação neuronal, e mais a fundo talvez existisse uma ligação transcendental entre esses indivíduos, como um compartilhar de janelas da alma.

Sendo visto impossível pela visão do Dr. Gray tamanha similaridade em algo tão vasto, e seguindo o princípio da causa e efeito: para todo efeito há uma causa, quando não conhecemos uma causa especifica chamamos de “destino”, mas ele se nega a deixar seus anos de estudos serem justificados por algo tão ingênuo, assim vai à Índia afim de encontrar os olhos parecidos àqueles que mudaram seu mundo, os olhos de Sofi.

Fonte: encurtador.com.br/hiCQ1

Chegando ao grande momento de reflexão que o filme traz: “O que ele faria se algo espiritual refutasse suas crenças científicas?”. Logo, o personagem principal passa por questionamentos e conclusões individuais sobre esse tema que acreditava possuir completa certeza. Situação exemplificada na frase de Fritz Perls: “A verdade só pode ser tolerada se descoberta por conta própria. ”

Juntamente com a ideia de Immanuel Kant que não considerava possível saber como são as coisas “em si mesmas”, porque interpretamos o mundo de acordo com nossas “lentes pessoais”, que são formadas por nossas experiências e percepções (história de vida, tragédias, anseios, crenças), assim, a verdade é relativa e individual. Ou seja, só podemos nos tornar pensantes autônomos se tivermos responsabilidade por nossas próprias crenças, nos libertando das sombras projetadas nas paredes de nossas cavernas particulares.

Fonte: encurtador.com.br/ftGH1

De certa forma, grande parte de nós tende a achar a ideia de ciência e espiritualidade incompatíveis, sempre tentando fazer com que uma se sobressaia. O ateísmo não te deixa inteligente, assim como a religião não te torna moralmente superior! Mas que inclusive podem ser complementares já que diante da morte, a razão revela nossa mortalidade e pequenez humana perante esse universo, enquanto a espiritualidade costuma transcender a natureza física, em vida e após, nos elevando a um plano sobrenatural, suprindo a vontade da infinitude.

O filme traz algumas reviravoltas, ora clichê, ora empolgante. Apresenta de forma encantadora um breve romance e um conflito que nos persegue a décadas, talvez de forma mais passiva do que profunda, mas que incentiva o telespectador a se envolver emocionalmente com sua própria visão. O mais incrível é que O Universo no olhar não determina qual lado está certo, mas deixa para o público o poder de escolher um, ou principalmente, a possibilidade de alternar entre os dois.

FICHA TÉCNICA DO FILME:

O UNIVERSO NO OLHAR

Titulo Original: I Origins
Direção: Mike Cahill
Elenco: Michael Pitt,Brit Marling,Astrid Bergès-Frisbey
Ano: 2014
País: Estados Unidos
Gênero: Drama,Ficção científica

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