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Redes sociais e dopamina: por que rolamos sem parar?

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É só pegar o celular e abrir o feed: em poucos segundos, a gente já está preso. Rolamos, rolamos e, quando percebemos, meia hora se passou em um piscar de olhos. Isso não acontece por acaso. As redes sociais foram construídas para explorar um ponto frágil do nosso cérebro: o sistema de recompensa da dopamina.

Em Irresistível: por que você é viciado em tecnologia (2017), Adam Alter explica como o recurso do scroll infinito — aquele que nunca acaba — sequestra nossa atenção. Diferente de um livro ou de uma série, não existe “última página” ou “último episódio”. Sempre pode haver algo novo logo abaixo da tela. Essa incerteza é o que nos prende. Como diz Alter, “as recompensas incertas são muito mais viciantes do que as previsíveis” (p. 87). É o mesmo mecanismo que mantém pessoas grudadas em caça-níqueis: talvez a próxima puxada seja a vencedora.

E qual o problema disso? O problema é que esse prazer rápido e constante vai desgastando nossa atenção. Ficar rolando o feed por horas nos deixa ansiosos, impacientes e incapazes de sustentar o foco em tarefas que realmente importam. Como o próprio Alter aponta, “a busca incessante por pequenas doses de prazer digital mina a habilidade de sentir satisfação em experiências cotidianas mais simples” (p. 142). Ou seja: estamos treinando nosso cérebro para só se interessar por estímulos rápidos e rasos.

É aí que entra a parte mais incômoda: não somos apenas usuários, somos o produto. Plataformas como Instagram, TikTok e X (antigo Twitter) dependem que passemos cada vez mais tempo conectados, porque nossa atenção é o que gera lucro. Quanto mais rolamos, mais anúncios vemos, mais dados entregamos. O scroll infinito não é um recurso inocente de design: é uma armadilha planejada.

A questão, então, não é só individual, mas social. Quantas horas por semana se perdem em feeds intermináveis? Quantos livros, conversas, trabalhos ou momentos de descanso deixam de existir porque estamos caçando migalhas de dopamina? Alter mostra que não se trata de fraqueza pessoal, mas de um sistema desenhado para viciar.

A boa notícia é que dá para resistir, mas exige consciência. Desligar notificações, estabelecer limites de uso ou até tirar pausas digitais pode parecer pequeno, mas são atos de rebeldia num ambiente construído para nos capturar. E talvez esse seja o verdadeiro desafio do nosso tempo: reaprender a cuidar da atenção como quem cuida da própria saúde.

Referência
ALTER, Adam. Irresistível: por que você é viciado em tecnologia. São Paulo: Companhia das Letras, 2017.

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