“É só comer menos.”
Essa é a frase que quem vive fora do padrão ideal de corpo está acostumado a ouvir. Mas será mesmo só isso?
Quer dizer que você quer que eu simplesmente abra mão da única coisa que, neste momento, ainda me faz sentir bem?
O que muitos não enxergam é que há um universo inteiro por trás de um ato aparentemente banal. Tudo começa de forma sutil — com a ansiedade, essa força invisível que invade, ocupa, domina. Ela toma os seus pensamentos como reféns. Você já não é mais você. Surge um vazio urgente, uma vontade de silenciar tudo dentro. E a comida… a comida se torna a resposta perfeita.
Por que o que mais, além dela, é tão rápido em aliviar, em preencher, em anestesiar?
Poucos realmente entendem como a compulsão alimentar funciona. Ela é discreta, sorrateira, se esconde no cotidiano. Começa cedo, com um pensamento inocente sobre sua comida favorita — talvez seja só um desejo, um mimo depois de um dia difícil. Mas, sem aviso, esse pensamento se transforma em necessidade.
Sua mente começa a girar em torno de um único objetivo: comer. Não importa quantos motivos existam para evitar, você vai encontrar um para ceder. E quando finalmente dá a primeira colherada, é como se o mundo parasse por alguns segundos — fogos de artifício, glitter, alívio.
É nesse instante que você entende: sentir fome é completamente diferente de sentir vontade de comer.
A comida, para mim, é como uma droga. Tem o mesmo efeito de uma substância intensa, viciante — ligada ao alívio imediato, à sensação de ser imbatível, de estar no controle.
Depois de devorar metade do prato, tudo parece mais leve. Os problemas se apagam, a ansiedade silencia, e os pensamentos… simplesmente desaparecem.
Pela primeira vez no dia, talvez na semana, eu respiro. Não porque estou curada — mas porque, por um instante, doeu menos.
Tudo isso é exaustivo.
É um ciclo cansativo, desgastante, frustrante — sempre cercado de culpa, recheado de remorso.
Eu me sinto pequena. Incapaz. Fraca.
Tudo porque, mais uma vez, não consegui dizer não àquela voz que insiste em gritar dentro da minha cabeça:
“Come só mais um pouco… não tem problema repetir o prato.”
É devastador perceber que essa voz é minha.
Fui eu quem a criou.
Fui eu quem a alimentou, dia após dia, até que ela crescesse mais do que meu autocontrole.
Mais do que minha vontade de parar.
Mais do que eu mesma.
É triste…
Triste não ser mais forte do que aquilo que nasceu de mim.
No cansaço absoluto, tudo o que resta é o silêncio. E os olhares de julgamento dos que estão por perto. Quando o prato está vazio e a mente finalmente desacelera, o que sobra é só o eco daquilo que já se foi.
Talvez eu realmente não seja mais forte do que a voz que criei porque, no fundo, eu nunca tenha sido. E, para ser honesta, não sei se algum dia serei. Eu tento. Todos os dias. Há 22 anos. E, até agora, falhei em todos os momentos.
A verdade é que ainda não consegui ser mais forte. Não existe redenção nesse momento. Só o corpo pesado, a cabeça cheia. E a vergonha — silenciosa, mas constante — por mais uma vez ter perdido para mim mesma. E, pior ainda, na frente de quem eu amo.
Não existe beleza aqui. Só o fato de que continuo fazendo exatamente aquilo que ontem prometi que não faria mais.