Como a cirurgia bariátrica mudou minha vida?

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Mestre em computação e mãe, professora do CEULP/ULBRA partilha sua vivência pré e pós-cirurgia.

Madianita Bogo Marioti, 47 anos, graduada em Tecnologia em Processamento de Dados, especialista em Informática para Aplicações Empresariais e mestre em Ciências da Computação, partilhou com as acadêmicas de Psicologia sobre sua decisão pela cirurgia, as mudanças que essa escolheu gerou e conselhos para os que pretendem encarar esse processo.

Fonte: Arquivo Pessoal

En(cena) – A obesidade vem crescendo de forma alarmante no Brasil e em todo o mundo. A cirurgia bariátrica é utilizada para o emagrecimento, o resgate da saúde e melhoria da qualidade de vida, no entanto, é um procedimento que apresenta riscos de complicações pós-operatórias nos aspectos biopsicossociais. Quando que você realizou a cirurgia? Foi um desejo seu ou uma indicação médica inicialmente?

Madianita – Eu fiz a cirurgia em 14 de janeiro de 2016, e alguns médicos já tinham sugerido que eu fizesse, principalmente o Endocrinologista. Mas eu decidi mesmo por uma questão de mobilidade porque eu sempre gostei muito de trilha, de andar em mato, cachoeira, e uma vez subindo na trilha da Cachoeira do Roncador, quando cheguei no último andar da escada eu achei que estava morrendo, eu realmente achei que estava tendo um infarto, meu peito ardeu demais. Nesse momento eu cheguei a conclusão de que eu precisava fazer algo, porque eu já tinha tentado várias dietas, mas aí eu emagrecia 2 kg e engordava 4 kg, se eu emagrecia 5 kg depois engordava 10 kg. Então foi uma decisão mais por saúde mesmo, para me sentir bem, mesmo com as indicações médicas anteriores, a decisão final foi minha.

En(cena) – As pesquisas e vivências individuais destacam a importância da preparação pré operatória na cirurgia bariátrica, por equipe multidisciplinar, bem como delimitam esta equipe com os mais variados profissionais. Como foi a atuação da equipe e a sua relação com esses profissionais?

Madianita – Eu fiz tudo certinho igual o médico mandou, fiz acompanhamento com fisioterapeuta, nutricionista, fiz todas as sessões do psicólogo. E esses acompanhamentos foram fundamentais, fez com que tudo fosse tranquilo, eu tive um pós-operatório muito tranquilo, eu não sofri como eu vi que muita gente sofre. Então a minha relação com essa preparação foi uma questão de segurança pessoal mesmo, eu não queria fazer a cirurgia sem ter certeza que eu estava preparada para aquilo. Eu vejo muita gente “pirando”, já tive relatos de um grupo que eu estou de gente que sofreu muito na fase “da líquida”, que se trancava no quarto chorando, e é comum eles falarem que foram no psicólogo somente uma sessão, receberam o laudo e foram embora. Então eu creio que fazer essa preparação, entender o que te espera, entender que esse pós-operatório é passageiro, que as coisas que “a gente sofre” são passageiras, é importante, e sozinho, só com leitura, é muito difícil conseguir isso.

Fonte: encurtador.com.br/elty0

En(cena) – Sabendo da importância do acompanhamento psicológico durante todo o processo de preparação e recuperação do paciente, como foi sua experiência com o profissional da Psicologia que estava inserido na equipe multidisciplinar?

Madianita – A minha relação com a psicóloga eu creio que foi de sucesso, eu me senti a vontade de conversar tudo com ela, de falar tudo com ela. Ela me deu apoio de certa forma nos momentos que dá uma certa insegurança e incerteza. Eu creio que ela foi importante tanto no pré, como no pós-operatório. E eu emagreci mais de cinquenta quilos, depois da cirurgia eu engravidei, tive meu filho, veio a pandemia e eu sou uma pessoa ansiosa, acabei me descuidando, e engordei vinte quilos. Não me arrependo de ter feito a cirurgia, não perdi a cirurgia porque eu ainda continuo mais de trinta quilos a menos do que eu tinha antes da cirurgia. Então assim, eu percebi que esse engordar aconteceu depois que eu parei o meu tratamento com a psicóloga. Hoje eu estou tentando me coordenar pra ver se eu consigo voltar ao tratamento, porque eu acho que ele foi fundamental, ela foi muito fundamental, tanto pra eu me sentir preparada pra fazer a cirurgia, no pós-operatório, como pra eu ter me mantido muito bem por muito tempo. Eu me mantive bem magra por um bom tempo. Só que aí logo eu engravidei (um ano e pouco depois da cirurgia), me mantive magra a gravidez inteira, mas estava fazendo o apoio psicológico durante a gravidez inteira. Eu comecei a engordar meu filho já estava com quase um ano, depois de quatro a cinco meses que eu tinha parado de amamentar que eu comecei a engordar, e eu atribuo muito esse meu descontrole à falta de acompanhamento psicológico. É importante que fique claro para quem vai fazer a cirurgia quanto é imprescindível fazer o tratamento psicológico depois, e quem chega a engordar o que eu engordei por ansiedade, a cirurgia não opera a cabeça, ela opera o estômago para ajudar a emagrecer aquilo que é difícil sozinho. Mas para manter, tem que ser um acompanhamento psicológico pro resto da vida, e faz diferença.

En(cena) Levando em conta toda a pressão estética presente em nossa sociedade, juntamente com seus padrões, é possível dizer que você sofre as consequências disso? Se sim, quais?

Madianita – Ser muito gorda no nível que eu estava, atrapalhava independente de padrões sociais/estéticos. Não era uma coisa que moldava a minha vida. Eu e meu marido sempre tivemos uma relação de muito amor, de muito carinho, mesmo quando eu estava muito gorda ele nunca demonstrou sentir vergonha ou não sentir desejo por mim, então eu não tinha grandes problemas em relação a convivência pessoal, por exemplo, eu usava maiô jogando vôlei com meus alunos. Então essa parte estética, de não viver por ser gorda, que eu vejo que muita gente tem, eu não tinha. Mas é lógico que eu tive meus momentos, que eu queria estar mais magra, principalmente quando eu ia comprar uma roupa. Eu brinco que a gente só achava capinha de bujão de gás colorida. Eu gosto de roupa preta, eu gosto muito de cores, mas eu não gosto muito de estampas, e eu falava que gordo só acha estampa. Então assim, tinha essa pressão estética um pouco, mas eu creio que em relação a isso eu era até bem tranquila. Era mais em momentos esporádicos que eu sentia essa pressão. Em relação ao pós-cirúrgico, apesar de ter engordado um pouco, eu não me sinto tão pressionada com essa questão estética, nesse ponto eu sou bem “cabeça de gelo”. Aí você me pergunta “mas se você é tão cabeça de gelo porque fez a bariátrica?” Porque realmente eu já estava num nível que eu tinha medo de morrer a qualquer momento, de infarto, eu tinha problema de subir escadas. Coisas que eu gostava de fazer no dia a dia estavam ficando difíceis pra mim. Então esse foi o meu grande motivador. Por mais que emagrecer, tenha me proporcionado poder escolher roupa e não a roupa me escolher, e eu ter ficado vaidosa, isso aí acabou alterando outros fatores. Então eu analiso que meu grande motivador foi o viver melhor, e não a pressão estética.

Fonte: encurtador.com.br/pCHX4

En(cena) – Avaliando o contexto cirúrgico pelo qual você passou, como pode ser descrita a influência desse processo na sua vida tanto antes quanto agora no pós, houve muitas mudanças? Quais foram elas?

Madianita – No pré-operatório, em termos da cirurgia em si, o medo de morrer, o medo de não dar certo eu nunca tive. Eu sou aquele tipo de pessoa que eu acho se dá certo pra noventa e oito por cento em termos de perigo de risco cirúrgico porque que vai dar errado comigo? Então não me afetou tanto essa questão. Eu estava bem tranquila até porque como eu falei na primeira resposta, eu fiz todo o procedimento certinho, eu procurei todos os profissionais, eu não pulei nenhuma etapa, eu fiz todos os exames, eu tinha muito medo do pós-cirúrgico. Meu problema no pré era o medo do pós. As pessoas falavam que passava mal naqueles quinze dias de dieta líquida, sofriam muito e choravam. Eu li histórias de pessoas que comeram sólidos e quase morreram ou morreram. Então o que me preocupava era o pós. Tirando isso, foi tudo muito tranquilo até porque o pré-operatório é muito corrido, a gente tem que fazer muita coisa, não dá muito tempo de “pirar” não. A mudança depois do pós-cirúrgico foi principalmente o me sentir bem. Eu tinha enxaquecas terríveis e isso diminuiu drasticamente, minhas TPMs, eu ainda tenho TPM, mas elas eram piores, eu pude voltar a fazer as coisas que eu gostava, melhorei a locomoção. Então assim, em termos de saúde, de me sentir bem, minha vida deu uma volta de cento e oitenta graus. Mudou a relação com o meu corpo, o próprio desejo sexual mudou um pouco, a minha vaidade. Então teve muita coisa boa, por mais que eu não tenha feito com motivação estética, eu estaria mentindo se falasse que isso não afetou positivamente minha vida. No pós-cirúrgico, eu engravidei, coisa que eu teria muita dificuldade por conta do ovário policístico, então mudou muita coisa na minha vida, positivamente, creio eu por causa da cirurgia.

En(cena) – Como você percebe suas relações interpessoais antes e após a bariátrica?

Madianita – Ser gorda não me afetava em termos de convivência social, não me afetava em relação a ter vergonha. Eu sempre conversei com todo mundo. Onde eu andava, eu conversava com todo mundo, fazia amizade com todo mundo. Eu dava aula tranquila, eu ia pra praia, colocava maiô, me divertia. Então quanto a relacionamentos interpessoais acho que não mudou muito minha vida, pelo fato de eu ter emagrecido com a bariátrica. Por mais que eu me sinta um pouco mais segura, me sinto mais bonita quando eu me arrumo. Quando eu ia para as formaturas e tinha que fazer um discurso, eu me senti melhor subindo no palco estando mais magra, podendo estar com uma roupa mais alinhada. Fora isso, eu continuo muito eu e muito do mesmo jeito que eu sempre fui.

En(cena) – O que você diria para as pessoas que pretendem passar por esse processo?

Madianita – Bom, para as pessoas que pretendem passar por esse processo, a primeira coisa que eu digo é, caso não exista nenhum impeditivo real, faça. Porque em termos de saúde de se sentir bem, melhorou da água pro vinho, como melhora também a aparência. Mais uma coisa que eu digo, faça tudo que o médico manda no pré-operatório, faça todas as terapias possíveis, não aceite se algum profissional falar que te dá o laudo antes do tempo, e algumas pessoas ficam felizes com isso. Então, é importante essa fase de amadurecimento da cirurgia, e depois da cirurgia continuar com o acompanhamento nutricional e psicológico. Enquanto eu estava indo na psicóloga direitinho eu me mantive magra, até mais do que eu queria. E quem chega a engordar a ponto de fazer uma bariátrica, normalmente são pessoas ansiosas, que descontam suas frustrações na comida e isso não vai mudar. Então assim, eu não me arrependo, não acho que eu perdi mesmo engordando os vinte quilos, mas eu engordei exatamente porque eu descuidei e deixei de ir nos profissionais que me acompanhavam. Hoje em dia eu voltei pra nutricionista, já eliminei três quilos, agora eu quero voltar para o psicólogo, porque é o único tratamento que consegue auxiliar na questão da ansiedade, pelo menos para mim.

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Valdenir dos Santos Dias fala de experiência como usuário do CAPS AD III

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No dia 18 de maio ocorreu no Parque Cesamar, em Palmas/TO a comemoração pelo Dia Nacional da Luta Antimanicomial. O evento contou com piquenique, rodas de conversa, sarau musical, testagem rápida e aconselhamento e estava na programação entre outros eventos que ocorreram durante o mês de maio em celebração a data. Essa programação foi elaborada por um coletivo de usuários, trabalhadores e gestores de Palmas.

Entre eles está Valdenir dos Santos Dias, que foi usuário do CAPS AD III por seis anos e hoje participa do serviço compartilhando sua experiência com os usuários, dando depoimentos e também orientação para eles acerca do serviço oferecido. O (En)Cena entrevistou Valdenir, que fala de sua experiência e sua mudança de vida.

 (En)Cena: Por quanto tempo você usou o serviço e como ele te ajudou?

Valdenir: Usei o CAPS AD III durante seis anos e medicação, rodas, grupos de apoio. Hoje eu uso o CAPS para levar uma palavra e incentivar o pessoal de que existe sim a cura para cada um. Quando a gente fala em cura se torna para muitos dos profissionais da saúde, principalmente os médicos, algo muito pesado a gente falar cura da dependência química, mas eu falo cura porque hoje eu não estou em cima do muro, não tomo mais nenhum tipo de medicação. Eu tomava nove tipos de medicação pesada. Tinha muitas que eram piores que droga, porque eu tomava e não podia sair de tão dopado que eu ficava. Então hoje eu falo assim porque depois de vinte anos de dependência você passar um dia sem o uso da droga, um ano, você pode passar o resto da vida. Então isso para mim é cura. O CAPS me ajudou tendo as portas abertas. Os psicólogos, os médicos me deram uma injeção de esperança, de mudança de vida. E eu peguei aquilo. Se existe realmente um controle como eles falavam, fazer a redução de danos, algo que te ajude a voltar para a sociedade, porque uma pessoa que vivia nas drogas, passou por psiquiatria, era tratado como uma pessoa louca por muitos, para essa pessoa voltar ao seu convívio natural e família acreditar que houve uma mudança, é complicado. Então o CAPS realmente foi uma porta aberta, o incentivo que eles me deram é muito válido, muito rico e eu agradeço a todos. Estou aí para ajudar, mas você tem que fazer por você, não adianta você querer se esconder achando que aquilo vai fazer com que você venha a se sentir bem. Hoje eu vou no CAPS para orientar as pessoas, não que eu me sinta melhor que ninguém, mas hoje eu me sinto uma pessoa bem.

(En)Cena: Qual o significado que esse evento tem para você?

Valdenir: Quando fala em dependência química eu gosto de participar porque tem muita gente que perdeu esperança, muitas famílias que perderam esperança nos filhos, no marido. A minha mulher esperou durante vinte anos e tem muita gente que perguntou como ela aguentou. Eu digo para perguntar para ela. Mas o que eu dei para a minha mulher de loucura, de perca, hoje eu dou de vida. Hoje eu tento abraçar ela da melhor forma, não fisicamente, mas da melhor forma que eu posso e dar o carinho, a atenção que eu não dei esse tempo todo. Uma pessoa que me ajudou o tempo todo. Eu me emociono porque ela realmente me ajudou. Ela nunca falou não adianta mais para ti. Ela sempre me deu uma palavra de apoio. E graças a Deus me sinto uma pessoa bem hoje. Tenho sentimentos no meu coração. Isso aqui é vida, resumindo. Talvez você não veja assim, mas eu vejo, isso aqui é vida, uma palavra de esperança para quem está realmente buscando. Tem muitos que querem ficar nessa vida, da dependência. Mas tem muita gente que está cansada de sofrer. Desce numa ponte dessa aí que você vai ver. Tem pessoas lá que estão desesperadas, estão gritando pedindo socorro e a voz não sai mais. Só no olhar você vê que a pessoa está buscando ajuda e não sabe onde. Então isso aqui é uma família. Um depoimento, uma palavra, ela vem mudar realmente o conceito da dependência química.

(En)Cena: O que o serviço de saúde mental representa para você?

Valdenir: O serviço de saúde mental está aí para tentar ajudar quem realmente quer. E é o que eu falei, o trabalho vem para trazer uma esperança de mudança de caráter, de vida. E tem muita coisa, talvez no momento assim a gente não saiba expressar. Mas esse trabalho é uma esperança de mudança de vida. Acabou o hospital psiquiátrico onde o pessoal recebia choque, ninguém tinha uma conversa que nem tem agora. Então eu acho que a saúde mental vem trazer uma mudança de pensamento para cada um, para as pessoas entenderem que o dependente é uma pessoa como qualquer outra, que tem solução para ele. Para mim deu certo esse trabalho da saúde mental e creio que dá para muita gente. O serviço está aí de portas abertas.

(En)Cena: O que os profissionais envolvidos nesses dispositivos significam para você?

Valdenir: Quando fala de funcionários a gente sabe que cada um corre atrás do que quer. Então as pessoas que estão trabalhando com a saúde mental, tem muita gente que realmente vestiram a camisa, muita gente que pensa no financeiro, mas muitos buscam realmente ajudar as pessoas, trabalha realmente com essa intenção. Muita gente que eu conheci, como a doutora Camila, a Natasha, que eu conheci o trabalho e realmente me ajudaram muito. Sei que a doutora Camila é alguém que realmente veste a camisa. Quando ela saiu do CAPS AD III ela fez muita falta. Hoje acho que ela está fazendo um trabalho no CAPS II, mas ela é uma pessoa que realmente abraça, ela dá esperança para a pessoa e todas as vezes que eu chegava no CAPS, as vezes de madrugada, batia lá desesperado e o pessoal atendia, eu entrava, alguém me dava medicação. Ela me ajudou muito e ajuda muita gente. Então a doutora Camila é uma pessoa que merece parabéns. Talvez ela não saiba como estou, nunca mais me viu, mas sempre estou orando por ela e por muitos profissionais que realmente vestem a camisa e ajudam as pessoas. Eu falo do CAPS de coração aberto e também não posso deixar de falar de Deus. Foi ele que me deu forças para trilhar esse caminho. O CAPS me ajudou, me incentivou nessa caminhada, mas Deus foi o protagonista que me deu esperança de mudança.

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