Bonecos de pessoas são uma espécie de imitação fajuta. São as pessoas, ou alguma parte delas, representadas em madeira, barro, tecido, metal… Matérias inanimadas que precariamente tentam representar o humano e sua potência de vida. De início, tal tarefa, por árdua demais, está fadada ao fracasso. Afinal, é tarefa divina dar alma ao inanimado. Mas se bonecos fossem apenas isso, eles seriam só insuficiência, erro e impotência. Neste caso, como se explicaria o sucesso que os bonecos fazem?
Dos mamulengos atrevidos e desbocados das feiras nordestinas aos bonecos mudos e gigantes do carnaval de Olinda, dos seculares e universalmente conhecidos títeres ao curioso Falcon, sonho de consumo da meninada na década de 1980, os bonecos se impõem por sua popularidade… Mas por quê?
Não se trata aqui, claro está, de se fazer um ensaio antropológico sobre os usos e costumes relacionados a bonecos, ao longo da história do homem. Eis a vantagem de se escrever despretensiosamente, quase como quem brinca: não se ter compromisso com as verdades históricas, poder-se valorizar outras verdades (estéticas, por exemplo) e até mentir-se, se isso apetece.
Os humanos são um macaqueamento de Deus, imagem e semelhança de seu criador, exatamente como os bonecos. Imagem distorcida, semelhança enganosa, faltante… Mas, é por essa semelhança àquele que nos criou, que nos permitimos – vez e outra – para o bem e para o mal – brincarmos de Deus. Isso explica a popularidade dos bonecos.
É isso que fazemos com eles, eles nos permitem sentir ainda que imperfeitamente – o sentido de Deus: sopramos vida em seu barro, damos-lhes alma e história. Algumas vezes, também como Deus, os matamos. Eis o FIM…
Mardônio Parente