Arlequina: sua evolução nas telas como representatividade feminina

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A crescente representatividade feminina num universo majoritariamente masculino

A Arlequina (Harleen Quinzel) é uma personagem do universo das histórias em quadrinhos da DC Comics, editora norte-americana subsidiária da companhia Warner Bros. Criada por Paul Dini e Bruce Timm, fez sua primeira aparição na série animada de televisão “Batman: A Série Animada”, em setembro de 1992.  Tamanha foi sua popularidade que foi posteriormente introduzida também nos quadrinhos. Ainda assim, até recentemente, a sua existência era reduzida a de uma subordinada ao infame vilão Coringa. Devido a essa estrutura simbólica estar tão implantada culturalmente, por muito tempo não houve uma ampla contestação sobre essa disposição dos personagens.

Sua identidade civil, em sua primeira aparição, era Harleen Quinzel, doutora e psiquiatra do que trabalhava no Asilo Elizabeth Arkham para os criminalmente insanos. Onde conheceu e se apaixonou pelo Coringa, ajudando-o a fugir e, sendo sequestrada pelo vilão. Foi, então, jogada por ele em um poço de produtos químicos, tornando-se finalmente na anti-heroína que hoje é tão famosa nos cinemas (Margot Robbie). Apenas com o sucesso de bilheteria de Esquadrão Suicida (2016), produzido depois de mais de 20 anos de sua estreia como personagem, que o público se abriu para a possibilidade de que talvez a Arlequina fosse mais do que um simples par romântico do antagonista do Batman.

                                    Fonte: WARNER BROS. PICTURES/DC COMICS

A marcante caracterização de Margot Robbie, que reverberou pelas redes sociais no ano de 2016.

Assim como afirma Colling (2004, p. 13), “os historiadores ocultaram-nas como sujeitos, tornaram-nas invisíveis. Responsáveis pelas construções conceituais, hierarquizaram a história, com os dois sexos assumindo valores diferentes; o masculino aparecendo sempre como superior ao feminino”. A demanda de uma representatividade feminina começa quando transformações políticas e sociais passam a acontecer de forma mais intensa. Concomitantemente, em suas aparições, até então, a personagem além de apresentada somente como uma coadjuvante, assim como a grande maioria das personagens femininas no universo dos quadrinhos, foi hiper sexualizada e objetificada sob o olhar de homens para homens sobre o feminino.

Houve um retorno negativo com a forma que o sexo feminino foi representado, fazendo com que houvesse reverberação do assunto em Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação Revista Iniciacom – Vol. 10, N. 3 (2021) grande escala, que tempo depois foi levantada mais uma vez com o lançamento do filme Aves de Rapina.

Assim, diante de altas críticas e com uma demanda de público feminino crescente, surgiu o longa-metragem Aves de Rapina: Arlequina e sua Emancipação Fantabulosa. Conta com uma direção (Cathy Yan), produção (a própria Margot Robbie) e elenco majoritariamente feminino. O filme traz histórias de personagens que, a partir de diferentes contextos, procuram se libertar das amarras do limitante patriarcado. Desta forma, o título do longa se faz justo: um movimento emancipatório.

                                                                                         Fonte: PINTEREST

E em foco temos Quinn, que inúmeras vezes se entrega por completo ao Coringa e se decepciona, sendo usada por ele por vezes como um troféu bonito e outras como um peão nos embates contra os heróis, finalmente colocam um ponto final definitivo em seu relacionamento abusivo. Harley se encontra sozinha e luta para conquistar seu próprio espaço no cenário de Gotham. Só então, a personagem não foi sexualizada em suas atitudes e figurinos.

De acordo com crítica feita para o site de cultura pop Omelete, Sabbaga (2020, n.p) afirma:“Ao trazer uma mulher ao comando na nova produção, a Warner fez um movimento claro de mudar a representação de Arlequina nas telas […] a DC tomou nas mãos a responsabilidade de ajustar Harley aos moldes das discussões atuais”. Por meio do olhar da diretora, Cathy Yan, notamos um distinto enfoque, a câmera “trabalha em prol da história do filme e dos personagens, não da sexualização” (FRANÇA, 2020, n.p).

Vale observar, então, que cada alteração em toda a construção e apresentação da personagem, Arlequina, observadas através dos longas acima, se fazem análogos à teoria social e a estrutura simbólica naturalizada culturalmente. Frequentemente, tais mudanças se fazem presentes em consonância com às lutas sociais vigentes. De tal forma que comportamentos sociais se alteram, implicando também em mudanças na forma como produtos midiáticos se apresentam.

Referências

NOBRE, Andrea. Os efeitos psicológicos da covid-19. Palmas-TO: Editora X, 2022.

ROCHA, Guilherme. Protagonismo Feminino: uma análise da Representação da personagem Arlequina no Cinema. Disponível em <: https://revistas.intercom.org.br/index.php/iniciacom/article/view/4052 >.Acessado em 30 agost. 2023.

Kuviatkoski, Caroline; Ribeiro, Regina. A representação da bissexualidade na série animada Harley Quinn: Uma análise da personagem Arlequina. Disponível em<:http://177.101.17.52/jornalismo/ocs/index.php/7coloquiomulheresociedade/7coloquiomulheresociedade/paper/viewFile/330/95 >. Acessado em 30 agost. 2023.

VIEIRA, Ana C. Entre caos e emancipação: o romance de Harley Quinn e Poison Ivy. Disponível em <: https://valkirias.com.br/harley-quinn-e-poison-ivy/ >. Acessado em 30 agost. 2023

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Saúde mental dos cuidadores de autistas

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É frequente que os pais e cuidadores de crianças com TEA passem a vivenciar emoções de solidão e autorrecriminação.De acordo com a estimativa dada pelo IBGE, no Brasil existem cerca de 2 milhões de autistas(2023)

Nas famílias que têm crianças diagnosticadas com Transtorno do Espectro Autista (TEA), é comum que os pais e cuidadores comecem a experimentar sentimentos de isolamento e culpa. Esses sentimentos surgem devido à pressão associada ao diagnóstico e à autocobrança de tentar acompanhar e aliviar os sintomas do TEA. Outra característica frequentemente observada é o isolamento social, que se torna necessário para garantir os cuidados adequados à criança, intensificando a sensação de impotência e, consequentemente, a culpa.

De acordo com Cadman et al. (2012), após a detecção inicial de sinais e sintomas ou comportamentos atípicos, os familiares e cuidadores de crianças com TEA tendem a experimentar níveis elevados de estresse em comparação com as famílias de crianças com desenvolvimento típico, o que, por sua vez, afeta a qualidade de vida familiar.

Além das emoções e desafios mencionados, a falta de informação também desempenha um papel significativo. Muitas vezes, a falta de conhecimento leva a buscas desesperadas, levando os cuidadores a submeterem as crianças a tratamentos não regulamentados e/ou exaustivos na esperança de reduzir os sinais e sintomas. A ignorância também pode resultar na recusa dos responsáveis em seguir o tratamento recomendado, criando assim um ciclo de impactos negativos na saúde e bem-estar da criança e da família.

É notável que houve avanços significativos na identificação precoce e no diagnóstico do TEA no Brasil. No entanto, ainda se observa uma lacuna considerável em relação ao apoio oferecido às famílias após o diagnóstico. Como mencionado anteriormente, as crianças com TEA exigem mais atenção e cuidados de seus responsáveis devido às suas dificuldades em realizar tarefas comuns para suas idades e estágios típicos de desenvolvimento. Isso resulta em um alto nível de dependência por parte dessas crianças.

                                                                                                           Fonte: seguireaba

Ainda se observa uma lacuna considerável em relação ao apoio oferecido às famílias após o diagnóstico.

Conforme destacado por Ebert, Lorenzini e Franco da Silva (2015) e Bosa (2006), o diagnóstico de TEA muitas vezes representa uma reviravolta na vida da família, exigindo uma reorganização para atender às necessidades específicas do filho. Muitas vezes, os planos e expectativas anteriormente estabelecidos pelos pais são deixados de lado.

De acordo com os autores Bronfenbrenner e Morris (2006), os pais se tornam uma parte crucial de uma equipe multifacetada, desempenhando papéis de cuidadores, modelos, disciplinadores e promotores da socialização de seus filhos. Eles ocupam uma posição central na estimulação do desenvolvimento dos filhos. Portanto, não é surpreendente que o diagnóstico de TEA seja reconhecido como uma fonte de estresse para os pais, que geralmente experimentam níveis mais elevados de estresse em comparação com pais de crianças com desenvolvimento típico e atípico de acordo com as pesquisas de Cadman, Hayes e Watson (2012).

Além disso, Sá e Rabinovich (2006) ressaltam a importância do apoio às famílias após o diagnóstico para facilitar os estágios previsíveis de luto. Inicialmente, ocorre o choque, acompanhado de choro, sentimentos de desamparo e desejo de escapar da realidade. Em seguida, vem a fase de negação e questionamento sobre o diagnóstico. Posteriormente, surgem sentimentos de tristeza e raiva, seguidos pela aceitação da condição e, por fim, pela reorganização da família, que implica na reintegração e reconhecimento da situação do filho.

Jerusalinsky (2007) também aborda esse aspecto do luto após o diagnóstico, que ocorre devido à quebra das expectativas de ter uma criança típica, muitas vezes concebida antes mesmo do nascimento – uma criança completamente saudável, sem deficiências ou necessidades especiais. Isso pode causar sentimentos de fracasso e culpa nos pais.

Pesquisas de Gomes (2015) destacam, ainda, uma diferença de gênero nesse contexto, com as mães apresentando níveis mais elevados de estresse em comparação com os pais de crianças com TEA. Schmidt e Bosa (2007) também revelaram que o alto nível de estresse está relacionado com a demanda intensiva de cuidados à criança, isolamento social e falta de apoio. Essas autoras identificaram que as tarefas cotidianas, como vestir-se, higiene pessoal, sair de casa e as barreiras de comunicação da criança, estão entre os fatores que contribuem para a sobrecarga materna.

                                                                                                         Fonte: gettyimages

Pesquisas apontam níveis mais elevados de estresse em mães em comparação com os pais de crianças com TEA. 

Em um estudo epidemiológico, Lecrubier et al. (2002) encontraram taxas elevadas de depressão (68%) e ansiedade generalizada (28%) em cuidadores de crianças com autismo na Europa Ocidental e em países em desenvolvimento. Essas taxas estavam relacionadas a desafios sociais significativos e eventos estressantes. Resultados semelhantes foram observados em Taiwan por Shu, Lung e Chan (2000), com uma prevalência de 33% de transtornos psiquiátricos entre as mães de crianças com TEA. Os autores consideram a condição autista da criança como uma fonte de sobrecarga emocional, física e financeira para as mães e para a família.

Essas situações frequentemente deixam as mães em uma posição de vulnerabilidade, em que são responsáveis por dedicar-se integralmente às crianças, além de cuidar da casa e da família. O tempo que sobra para o autocuidado, interações sociais e carreira pessoal é escasso. Além disso, essas mães vivem em constante preocupação sobre o futuro de seus filhos quando não puderem mais desempenhar o papel de cuidadoras. Conforme afirmado por Nunes e Santos (2010), até mesmo o tempo em que as crianças estão na escola ou em clínicas especializadas é frequentemente dedicado às tarefas domésticas, o que resulta em isolamento social e limitações significativas em suas vidas.

Referências

EBERT, M., LORENZINI, E. F. Mothers os children with autistic disorder: perceptions and trajectories. (2015)

BACKES, Bárbara; Identificação dos primeiros sintomas do autismo pelos Pais. Disponívell em <https://www.scielo.br/j/ptp/a/9VsxVL3jPDRyZPNmTywqF5F/?format=pdf&lang=pt>. Acesso em: 16 de maio de 23.

MINETTO, M. de F., CREPALDI, M. A., BIGRAS, M., & MOREIRA, L. C.. (2012). Práticas educativas e estresse parental de pais de crianças pequenas com desenvolvimento típico e atípico. Educar Em Revista, Disponível em <: https://doi.org/10.1590/S0104-40602012000100009 >. Acessado em 12 set. 2023.

OLIVEIRA, Isaura Gisele de; POLETTO, Michele. Vivências emocionais de mães e pais de filhos com deficiência. Rev. SPAGESP,  Ribeirão Preto ,  v. 16, n. 2, p. 102-119,   2015 .   Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1677-29702015000200009&lng=pt&nrm=iso>. acessos em  13  set.  2023.

SILVA, D. F. D.; ALVES, C. F.. Aceitação Familiar da Criança com Deficiência: Revisão Sistemática da Literatura. Disponível em <: https://doi.org/10.1590/1982-3703003209337>. Acesso em 13 set. 2023

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