Graduada em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (2002), especialista em Gerontologia (2004) e mestre em Ciências da Saúde pela UNB. Atualmente, com atuação em Psicologia Clínica (infantil e adulto) e organizacional na cidade de Palmas e como docente do curso de Psicologia do CEULP ULBRA e também como supervisora de atendimentos clínicos no serviço de Psicologia Clínica da mesma universidade
A Partida: ressignificação da vida através do trabalho
Este filme é de nacionalidade japonesa, com direção de Yojiro Takita. Gênero: Drama. Elenco: Masahiro Motoki, Tsutomu Yamazaki, Kazuko Yoshiyuki, Kimiko Yo, e outros. Daigo Kobayashi (Masahiro Motoki) é o protagonista, esse personagem tocava violoncelo, e diante das mudanças financeiras, a orquestra que trabalhava encerrou suas atividades, nesse ínterim necessitou se desfazer de seu instrumento, deparando-se com desemprego. Concomitantemente, mudou de cidade com sua esposa em busca de novas oportunidades, surgindo assim um novo emprego e, sem saber na íntegra como seria este trabalho, aceitou-o. Precisava estar empregado, ter dinheiro para sobreviver e tocar a vida. “Entre outros aspectos ligados à dimensão individual, surge o financeiro: o trabalho como elemento fundamental para garantir a sobrevivência.” (OLIVEIRA et al, p. 11).
No primeiro dia deparou-se com uma empresa funerária, o qual sua função era auxiliar de agente funerário. Experimentou um misto de sensações diante do contexto o qual estava, mas o momento em que Daigo se encontrava, não poderia se dar ao luxo de desistir de estar empregado, sua real situação não permitia. Porém, sua esposa não sabia de que se tratava seu novo trabalho, optou por esconder, pois precisava do emprego. “[…] o emprego é uma forma especifica de trabalho econômico (que pressupõe a remuneração), regulado por um acordo contratual (de caráter jurídico)” (BORGES; YAMAMOTO, p. 27).
Passou a enfrentar preconceitos, sua esposa o abandonou, encontrou-se sozinho e procurando forças para seguir em frente. Diante dos desafios e superações, Daigo traçou um novo começo, com significações, transformando todo seu contexto. Inicialmente era pela sua sobrevivência, precisava se manter, mas o sentido que este trabalho lhe proporcionou mudou toda sua história. “Identificado o significado do trabalho, é necessário saber o que motiva, incita o homem a realizá-la, ou seja, o sentido que ele dá ao seu trabalho.” (OLIVEIRA et al, p.6).
A cada tarefa realizada suas habilidades iam sendo aprimoradas, com a delicadeza de um músico, suas mãos pareciam dançar no corpo e nas vestes, com muita amabilidade, mudava o que estava sem vida, dando aos entes queridos o reconhecimento da pessoa que seu morto era quando estava entre eles, trazendo conforto aos familiares em seu último adeus. Para Daigo esse era o motivo que o impulsionava a seguir em frente, através dessas transformações o mesmo percebeu que sua vida mudou, ressignificando-a. Seu novo emprego possibilitou encontrar-se consigo mesmo, enfrentar seus medos e reencontrar o pai, mesmo sendo para se despedir.
Gostar do que faz torna o trabalho prazeroso, mesmo sendo um emprego considerado um dos piores como era o de Daigo, sentia prazer em fazê-lo, enfrentou os obstáculo e conquistou seu espaço e respeito. Considerado o pior emprego, mas era o que mais fazia sentido, estava em jogo sentimento de perda, luto… Com tudo isso, percebeu nessa atividade a real importância de estar vivo e fazer o que realmente te faz bem, sem se importar com as dificuldades. O mesmo percebeu que era importante na tarefa que realizava, e isso fazia sentir-se bem. Executar um trabalho que goste, sinta prazer em sua execução, também é algo importante para que este faça sentido. Entretanto, se a pessoa realiza um trabalho que não é prazeroso, que ela não goste, não é possível encontrar sentido.” (OLIVEIRA et al, p. 10).
Cada ser humano pensa e age de forma diferenciada, o mesmo se aplica a concepção de trabalho para cada pessoa, ou seja, significação individual não o torna universal. A importância dada reflete na sua história de vida com o momento atual de cada sujeito. Compreendemos que cada indivíduo tem seu próprio conceito de trabalho, o que si estabelece uma variedade de conceitos e/ou significados, mas estes não são independentes do contexto histórico.” (BORGES; YAMAMOTO, p. 27).
Para Daigo não foi diferente, o sentido atribuído foi através de sua representação, despertou no mesmo algo que faltava, existia uma lacuna, e diante do inesperado, de musicista a agente funerário, ou seja, de um extremo ao outro, em caminho opostos encontrou a esperança, o saber fazer. Preencheu o vazio que faltava, encontrou a realização pessoal no trabalho que exercia. Mesmo ter se encontrado nesta profissão, pois houve identificação, tinha um pesar, existia sofrimento por parte dos familiares, e do próprio Daigo, era um momento intenso, cheio de angústias, e isso pairava no ar, era sentido por todos que estavam presentes.
Mas aquele trabalho era necessário e deveria ser feito com propriedade, mesmo sendo árdua a tarefa, mas Daigo fazia com destreza, pois era necessário e precisava dar o seu melhor. “[…]o trabalho humano, esta atividade determinada e transformadora tantas vezes penosa e contudo necessária.” (ALBORNOZ, p. 7).O filme também faz refletir sobre o trabalho nesse mundo totalmente capitalista, onde muitos irão ter sucesso e outros irão experimentar sofrimento por diversos motivos, pois a maneira acelerada do processo de globalização os torna alienados.
Este filme demonstra que a realidade do mercado de trabalho nos impulsiona a procurar alternativas para sobrevivência, nas mais diversas formas de trabalho, mas o que cada um procura além da sobrevivência? O filme nos mostra que o ‘sentido’ é chave da não alienação, da realização, e do encontro consigo mesmo. O trabalho por sua vez é demonstração de homem e individualidade, em sua criação o homem se transforma, se apropria, e torna realizador de sua atividade, dando a entender que ambos não se separam, é pela atividade que exerço que demonstro quem sou, e isso é uma forma de preencher a vida, de torná-la possível em um ambiente tão competitivo e alienador. Para tanto, este filme foi recheado de muita emoção, e aprendizado.
REFERÊNCIAS:
ALBONOZ, Suzana. O que é trabalho. São Paulo: Brasiliense, 6º ED. 2004, p.7.
BORGES, Lívia de Oliveira; YAMAMOTO, Oswaldo H. MUNDO DO TRABALHO: CONSTRUÇÃO HISTÓRICA E DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS, p.27.
OLIVEIRA, Sidinei Rocha, et al. Buscando o Sentido do Trabalho, p. 11,6,10.
Atualmente, a separação entre o ser adulto e o ser criança parece tão normal para todos nós, mas nem sempre foi assim. As transformações da sociedade, cultura e economia foram fundamentais para esta divisão. Segundo Ariès (1981), o sentimento de infância que se aproxima mais da modernidade se deu a partir do século XVIII, onde houve uma segmentação do mundo adulto com o da criança. Até então, na família medieval, a infância não tinha um foco significativo. As crianças eram consideradas como miniadultos, o que é possível ver na forma de representá-las nas artes da época. Na sociedade medieval, o público e o privado fundiam-se nas relações familiares, no trabalho, nas relações sociais. As brincadeiras não eram distintas, mas comum aos dois mundos. Não havia espaços destinados às crianças, assim, logo que desmamadas, eram inseridas nos afazeres do dia a dia dos adultos, ou seja, não havia clareza quanto aos espaços e papeis de cada um.
Partimos de um mundo de representações onde a infância é desconhecida: os historiadores da literatura (Mgr. Calvé) fizeram a mesma observação a propósito da epopeia, em que crianças-prodígio se conduziam com bravura e a força física dos guerreiros adultos. Isso sem dúvida significa que os homens dos séculos X-XI não se detinham diante da imagem da infância, que esta não tinha interesse, nem mesmo realidade (Ariès, 1981, p.52).
Já na família nuclear, a preocupação com a criança era mais de cunho econômico. Mesmo com o surgimento do “sentimento de infância”, este era direcionado para a qualidade de mão de obra que emergiria desta família.
Paralelamente, a criança adquire um novo valor e importância; percebe-se que ela é, potencialmente, riqueza econômica – o trabalhador do futuro. A partir daí, surge a necessidade de cuidar mais dessa criança e principalmente, de educá-la. Assim, precisa ser alvo de todo cuidado e atenção na medida em que ela é vista como tesouro das nações em formação. (Aguiar, 2005,p.27).
Neste momento, com aquisição deste novo olhar, agora seria possível ver a diferença entre ser adulto e o ser criança. E esta pode ser vista mais frágil, dependente e inocente e com uma afetividade peculiar, típico da infância. Com isso, surge a educação formal, o sentimento materno, maiores cuidados com a higiene e a separação dos espaços, que antes eram comuns aos dois universos. Nascem então, a Pediatria, a Pedagogia e a Psicologia, ciências que auxiliariam no zelo deste ser, agora em foco.
Em 1990, no Brasil, se consolida os direitos das crianças através da criação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), concedendo direitos a estas à educação, segurança, lazer e saúde.
A Diversidade de Olhares Sob o Ato do Brincar
Quando se pensa em crianças, logo vem à lembrança momentos da infância e, consequentemente, a diversidade de brincadeiras que circundam tal mundo. Porém, o brincar nem sempre foi visto como algo pedagógico e muito menos terapêutico. O olhar para as atividades infantis foi encarado com maior relevância, ou seja, como algo benéfico a partir de uma experiência de Freud ao observar uma criança.
Freud, em busca da etiologia para as neuroses, descobre que a origem dos adoecimentos psíquicos era gerada na infância. Segundo Aguiar (2005), Freud evidencia a importância da infância para a construção da personalidade e identificação das patologias. Foi com o caso Hans, onde ele aconselhava um pai em relação aos cuidados com o filho, que Freud pode observar a influência do adulto no comportamento da criança. Mesmo sabendo da influência de seu discurso no agir desta, esse pai não mudou completamente suas atitudes, porém esta observação possibilitou Freud a visualizar que havia benefício terapêutico em tal prática, como pode ser constatado na visão de Aguiar
descobrir que elas eram afetadas pelo que os adultos diziam ou faziam não fez que estes mudassem totalmente seu comportamento com relação à criança, porém legitimou a possibilidade de determinado adulto, o psicoterapeuta, agir e falar de modo específico com ela afim de que isso trouxesse algum benefício terapêutico. A forma que esse agir e falar adquiriu ao longo do desenvolvimento da psicoterapia infantil é congruente com as perspectivas de ser humano e de funcionamento não saudável, próprias de cada abordagem (AGUIAR, 2005, p.29 ).
Em outra observação de Freud, em uma brincadeira de carretel com uma criança, ele viu, segundo Luciana Aguiar (2005), o brincar como representação e elaboração de frustrações e conflitos. Para Anna Freud (1971) apud Aguiar (2005) o ato de brincar tinha como função apenas a criação de um forte vínculo entre a criança e o psicoterapeuta, ou seja, era apenas estabelecer o rapport- que significa relação de harmonia em um processo comunicativo, no qual a pessoa fica mais receptiva à interação.
Melanie Klein (1981) foi a primeira a sistematizar o trabalho clínico com criança e viu no brincar uma linguagem não verbal que possibilitaria esta a se expressar desde muito pequena. Ao utilizar o brincar como um substituto da verbalização, visto que as crianças podiam se beneficiar da interpretação, percebeu que não era possível conduzir a sessão terapêutica como a de um adulto deitando-as no divã e conduzindo-as à associação livre , Klein concluiu que a linguagem predominante da criança é a linguagem do brinquedo e era sobre essa perspectiva que a interpretação deveria acontecer (AGUIAR, 2005).
Partindo dos pressupostos da psicanálise infantil kleiniana, Donald Winnicott estudando tal relação terapêutica desenvolveu a importante teoria do brincar, expandindo a compreensão da função do brinquedo no desenvolvimento infantil e introduziu a noção de espaço transicional, termo essencial para a compreensão do processo de diferenciação da criança com o adulto bem como dos recursos que ela utiliza para tal, ele distingue o espaço terapêutico como sendo unicamente do brincar e sugere que o terapeuta deve ir ao encontro do brincar da criança, tornando-se ativo e engajado não só na análise, mas também na relação paciente-analista, valorizando o contato entre ambos. (AGUIAR, 2005).
[…] Winnicott propõe uma vivência da experiência clínica ao lado da criança e critica os terapeutas que nunca sentaram no chão para acompanhá-la no atendimento, por exemplo, (OUTEIRAL, 2010; NEWMAN, 2003a). Para ele, o brincar possibilita a construção e vivência do espaço transicional, ou seja, intersubjetivo. Além de ser um meio de comunicação, tal gesto estaria inserido no contexto psicoterapêutico, pois auxilia a constituição e fortalecimento do self, caracterizando o viver criativo (LEHMAN, 2012; FRANCHIN et al, 2006). (CARNEIRO, SILVA, 2013, p.343)
Já Para Virginia Axline (1972), a ludoterapia pode ser guiada de forma diretiva, ou seja, pelo psicoterapeuta, e não diretiva. No caso, não diretivo a terapia é conduzida pela criança, por meio do brincar, oportunizando a esta a expressão de seus sentimentos e suas angústias. A autora define ainda que o jogo é o ambiente espontâneo de auto expressão da criança, onde se torna possível que esta cresça em melhores condições, pois nesse ambiente ela tem a possibilidade de manifestar seus sentimentos mais comuns, frustração, insegurança, agressividade, medo entre outros, e o fato de ela poder se expressar proporciona a tomada de consciência, o esclarecimento e enfrentamento da situação conflitiva.
Demonstrando a importância do brincar para elaboração dos conflitos e promoção de saúde, (SOUZA, MITRE, 2009, p.4, apud CARNEIRO, SILVA, 2013, p.345), relata a experiência hospitalar com crianças
certa tarde, atendemos outro menino de 5 anos. Ele estava restrito ao leito por conta de um acesso profundo na virilha. Tendo que usar luvas de gaze para impedir que tirasse o acesso, estava, portanto, com a movimentação ainda mais limitada. Além disso, estava em dieta zero há cerca de dois dias. Quando nos aproximamos dele, começou a chorar sinalizando que estava com fome, e que não queria brincar com nenhum dos brinquedos que tínhamos levado. Propusemos, então, brincar de comidinha de faz-de-conta. Ele aceitou. Preparávamos a comida, perguntávamos se ele gostava, se ele queria provar, e a levávamos até a sua boca. Depois de um tempo, ele sinalizou que já tinha comido muito e queria dormir. Com a brincadeira ele conseguiu expressar sua necessidade, elaborar de alguma forma aquela situação desprazerosa e relaxar.
Segundo Luciana Aguiar (2005), a inserção do psicoterapeuta no espaço lúdico da criança é de fundamental importância para a realização das possíveis intervenções. Muitas vezes, ele precisará mediar algo durante a brincadeira, utilizando a linguagem lúdica da criança. Isso nos remete a outro ponto importante: a disponibilidade para brincar. Embora algumas crianças prefiram não envolvê-lo em suas brincadeiras, fazendo com que ele seja um mero observador, verificou-se que a maior parte delas precisa da interação do psicoterapeuta.
brincar com a criança não é tornar-se criança no espaço terapêutico. Brincar com a criança não é reagir como se fosse uma criança. Brincar com a criança é poder compartilhar da importância e da magia daquela linguagem sem perder de vista a tarefa terapêutica. ( AGUIAR, 2005, p.198.)
Melanie Klein (1964) apresenta o brincar como a personificação da criança não apenas de seu ego, mas também de conteúdos do Id e do Superego, distribuídos pelos diversos personagens pertencentes ao enredo de uma brincadeira. Esta personificação pode ocorrer de diversas maneiras com o uso de objetos inanimados como carrinhos, animais e bonecos entre outros, oportunizando assim a expressão dos conflitos e fantasias do mundo infantil.
É possível constatar que o ato de brincar acompanha o ser humano em todas as fases do seu desenvolvimento, inclusive na fase adulta, onde se abandona os brinquedos infantis e projetam-se as suas angústias e anseios por meio das artes visuais, do cinema, da literatura. Segundo o escritor Nelson Rodrigues (1986), se não fosse o seu oficio de escrever, teria enlouquecido, pois com sua obra exorcizava seus demônios, seus fantasmas, já que sua vida foi uma sucessão de tragédias.
Conclui-se, então, que o ato de brincar como benefício terapêutico é fundamental em todas as etapas da evolução humana. Para Oklander (s\a) apud Goiânia-itgt, (2012), o organismo se desenvolve através de um processo de auto regulação organísmica, ou seja, ele fará o que tiver que fazer para alcançar a tão desejada homeostase – que é o processo pelo qual o organismo satisfaz as suas necessidades e interage com o seu meio buscando o equilíbrio, a fim de adquirir saúde física, mental e espiritual. E o brincar como recurso terapêutico se torna uma via eficaz para esta estabilidade.
REFERÊNCIAS
AGUIAR, L. Gestalt-terapia com crianças: teoria e prática. Livro Pleno. Campinas, 2005.
ARIÈS, P. História Social da Criança e da família. LTC-Livros Técnicos e Científicos Editora S.A. Rio de Janeiro-RJ, 1981.
CARNEIRO, P. V. M. S; SILVA, M. P. Quando brincar é viver criativamente: o encontro da abordagem gestáltica com a winnicottiana. Rev. IGT na Rede, v. 10, nº 19, 2013, p. 335 – 350. Disponível em:< http://www.igt.psc.br/ojs > ISSN: 1807-2526. Acesso em: 27 abr de 2016.
GOIÂNIA-ITGT, Instituto de Treinamento e Pesquisa em Gestalt Terapia de. GESTALT-TERAPIA COM CRIANÇAS: Violet Oaklander, Ph. D. – Fita 01. 2012. Disponível em: <http://itgt.com.br/wp-content/uploads/2012/08/Gestalt-terapia-com-crianças-Violet-Fita-1.pdf>. Acesso em: 12 maio 2016.
MONTEIRO, N. M. O (Ser) Terapeuta Humanista-Existencial e sua Postura na Psicoterapia Infantil. S/A.
PINTO, E. R. Conceitos fundamentais dos métodos projetivos. Ágora (Rio J.) [online]. 2014, vol.17, n.1, pp.135-153. ISSN 1516-1498. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-14982014000100009.
A Gestalt-terapia é um modo de exercer psicoterapia através de uma maneira cientifica dinâmica e artística. Idealizada nos anos 50 por Fritz S. Perls. Busca dar ao individuo meios precisos para seu desenvolvimento e compreender a forma como o homem inter-relaciona-se com o mundo.
Nessa vertente, Perls considera que a Gestalt-terapia é uma abordagem psicoterápica que procura ver o homem como um todo. Fazendo com que o individuo empregue suas emoções, sentimentos e sensações, além das funções cognitivas (PERLS, 1997).
De acordo com Loffredo (1994, p.74)
Nesta filosofia está a concepção de homem, das relações humanas e , dela oriunda, da relação terapeuta é cliente que fundamentam a Gestalt-terapia, proporcionando uma estrutura de conjunto, formando um Gestalt, pois um leque só é montado através do ponto comum que une os segmentos.
E continua,
A Gestalt-Terapia é uma modalidade de psicoterapia existencial, enquanto uma forma característica de reflexão sobre a existência humana. Tem em comum, com as outras da mesma linhagem, a concepção do homem com o ser-no-mundo, como ser-em-relação, numa dialética na qual cria e é criado nesta relação, num vir-a-ser, que nunca se completa, um movimento continuo alimentado por um conjunto de potencialidades, sempre em aberto, que caracteriza o eterno projeto que é o existir humano (1994, p.74).
Portanto, essa abordagem se apresenta como uma maneira de vivenciar o aqui- e-agora e Perls considera necessário focalizar no que está perto, no presente. O que vivenciam no presente serão visíveis elementos do que possa lidar com o novo. Para a Gestalt terapia, o individuo está em processo de desenvolvimento e crescimento do potencial humano, que só será ampliado através da integração. É vista como a terapia do contato, onde considera que o individuo se encontra em iteração o tempo todo com o meio que está inserido. Havendo êxito da forma de viver, evitando adoecimento existencial. É importante enfatizar que só ocorrera mudanças, quando o indivíduo se torna consciente das suas escolhas, para possíveis mudanças , alcançando seu equilíbrio, e tornando suas escolhas reais e necessárias a partir do contato.
Gestalt-Terapia, embora formalmente apresentada como um tipo de psicoterapia, é baseada em princípios que são considerados como uma forma saudável de vida. Em outras palavras, é primeiro uma filosofia de vida, uma forma de ser, e com base nisto, há maneiras de aplicar este conhecimento de forma que outras pessoas possam beneficiar-se dele. Gestalt-Terapia é a organização prática da filosofia da Gestalt. Felizmente o gestalt-terapeuta é antes identificado por quem ele é como pessoa, do que pelo que é ou faz. (Perls, op.cit, p. 14).
As abordagens da psicologia veem os sonhos de maneiras diferentes, cada uma interpreta e utiliza de forma diversa na psicoterapia. As principais abordagens que teorizam sobre eles são a psicanálise, a psicologia analítica, a gestalt, o behaviorismo e a cognitiva.
De acordo com Zimermam (2008), Freud foi o primeiro cientista a dar dimensão científica ao entendimento dos sonhos. Aires (2011) afirma que a psicanálise vê o sonho como um texto a ser decifrado e utiliza-se da ideia de que esses conteúdos envolvem signos e significações complexas que podem ser reveladas com a técnica analítica. Para Freud (1900), os sonhos possuem um sentido e são realizações de desejos, além de ser uma forma de acesso ao inconsciente.
Na psicanálise contemporânea, se considera que os sonhos podem significar uma realização de desejo, todavia, isso não é o principal, pois para os analistas o surgimento de sonhos no paciente em períodos do processo analítico, mostra que a “mente do paciente está, trabalhando”. O analista também preocupa-se em conhecer o que determina um sonho específico, as conexões entre os sonhos sonhados em uma mesma noite, em busca de significações das angústias (ZIMERMAN, 2008). A interpretação permite encontrar o sentido de um sonho percorrendo o caminho que leva do conteúdo manifesto aos pensamentos latentes, pois, o que se interpreta é o relato do sonho. (GARCIA-ROZA, 2009).
Na psicologia analítica de Jung (1997, p. 26) “os sonhos são o mais fecundo e acessível campo de exploração para quem deseje investigar a faculdade de simbolização do homem”. Ele afirma que o sonho possui uma função complementar na constituição psíquica, trata-se de tentar restabelecer a balança psicológica, produzindo um material que reconstitui o equilíbrio psíquico. Ele também acredita que o inconsciente transmite informações através dos sonhos e que para interpretar os sonhos é necessário uma aproximação dele na esfera das mitologias e nas fábulas das florestas primitivas, pois os símbolos oníricos são os mensageiros da parte instintiva da mente humana para a parte racional. O autor ressalta que os símbolos oníricos não podem ser separados da pessoa que sonhou e da mesma forma não existem interpretações definidas para os sonhos, mas é importante saber de algumas generalizações que ajudem a esclarecer alguns materiais dos sonhos. As figuras dos sonhos personificam algum aspecto da nossa personalidade, chamadas por de sombra, anima, animus e Self. um sonho revela o inconsciente sob a forma de imagem, metáfora e símbolo (VON FRANZ, 1988).
Sobre a atuação na clínica Jung (1997) afirma que é muito importante saber se as personalidades do paciente e terapeuta são harmônicas, divergentes ou complementares, pois a análise dos sonhos leva a um confronto entre os dois. Também acredita que assim como os pensamentos conscientes se ocupam do futuro e de suas possibilidades, isso também ocorre com o inconsciente e os sonhos. Isto é possível pois o inconsciente toma suas vontades instintivamente através de formas de pensamento correspondentes, os arquétipos.
De acordo com Von Franz (1997) Jung descobriu que os sonhos dizem respeito à vida de quem sonha e também são parte de fatores psicológicos. Além disso parecem obedecer a uma determinada configuração ou esquema, o processo de individuação. Pois ao se estudar os sonhos e sua sequência, pode-se verificar que alguns conteúdos emergem, desaparecem e retornam. Sonhos que repetem figuras, paisagens ou situações, ao serem analisados, observa-se que sofrem mudanças lentas, porém perceptíveis, que podem acelerar se a atitude consciente do sonhador for influenciada pela interpretação dos sonhos e dos conteúdos simbólicos, ou seja, uma ação de tendência reguladora que gera um processo lento e imperceptível de crescimento psíquico.
Dentro da psicologia comportamental não há muitos estudos sobre os sonhos, porém Skinner levantou algumas questões sobre os sonhos quando escreveu sobre Comportamento Encoberto e Comportamento Verbal. Os comportamentos encobertos, como o sonhar, o pensar, sentir, não são considerados como eventos mentais ou cognitivos, pois uma das principais tarefas do terapeuta comportamental é levar os clientes a perceberem como seus comportamentos encobertos são um dos elos da contingência tríplice a ser analisada, e como eles se relacionam a outros eventos do mundo interno e externo, possibilitando a modificação de seu comportamento (BACHTOLD, 1999).
Para isso é importante o relato verbal, que, por ser influenciado por questões sociais, acaba evidenciando aspectos públicos e não somente privados do indivíduo. Dessa forma, os terapeutas usam estes relatos para uma intervenção que faz uso da interpretação com objetivo de identificar as variáveis sociais dos relatos e conduta que controlam, uma análise do episódio verbal através de perguntas. Ou seja, sonhar é comporta-se, e seu relato, sob estímulos verbais e ambientais, será utilizado para melhorar o autoconhecimento do cliente, numa interação terapeuta-cliente, uma vez que é um importante fornecedor de dados sobre a história do sujeito e permite a este se conscientizar de seu comportamento e do que o controla (BACHTOLD, 1999).
O modelo cognitivo concebe o sonho como dramatização das crenças do individuo sobre si, sobre o mundo e sobre o futuro, o qual está sujeito às mesmas distorções de quando acordado. Ele está relacionado a sua personalidade, as preocupações conscientes são manifestas no sonho e é uma história que pode ser relatada, ou registrada, e discutida com objetivos. Os sonhos podem também ser utilizados com o propósito de confirmação ou refutação de hipóteses diagnósticas, pois seus temas estão correlacionados com categorias diagnósticas, como por exemplo, depressivos relatam sonhos de derrota e coerção. Ademais a maneira como o cliente lembra detalhes e interpreta as memórias do sonho será peculiar e característico de sua personalidade. O trabalho terapêutico com eles pode ser escolhido como estratégia em momentos em que a terapia parece estar estática, ou quando emoções fortes são vivenciadas neles. Serão explorados na interpretação aspectos como: quando ocorreu o sonho, qual era a cena, o que pensou, o que sentiu e o que fez e os personagens envolvidos também serão explorados caracterizando o acesso, experienciação, modificação e ação sobre os sonhos, através de perguntas (SHINOHARA, 2006).
Sob a visão fenomenológica existencial sartriana o sonho não é percebido como um objeto real, mas como irreal e produto da consciência imaginante, criado pela atitude de negação do mundo, produzindo um mundo análogo ao real como enredo, com espacialidade e temporalidade que lhe são próprias. Assim, o terapeuta pode fazer com que o sonhador se aproxime das experiências que são manifestadas no contato com o material onírico, pois a análise do próprio relato é uma maneira de observar elementos importantes sobre a vida do sonhador. A função do analista é auxiliar o paciente a regredir em sua história pessoal até chegar ao sentido do seu projeto inicial. Nesta perspectiva, deixar que o sonho se revele tal como é, trazê-lo para o mundo real, permite a descoberta de outros significados presentes na existência do sujeito (MILHORIM, CASARINI, SCORSOLINI-COMIN, 2013).
De acordo com os autores acima, sob uma ótica Heideggeriana o sonhar é dependente da história de vida do sonhador, é visto também como “uma experiência que depende da continuidade histórica da vida humana, se constituindo como um acontecimento pertencente à própria experiência” (p. 89). O significado e interpretação do sonho estão relacionados ao conteúdo manifesto e o modo como o sonhador se relaciona com isso demonstrará toda a condição existencial deste, sendo necessário para isso, investigar sua vida interior e exterior.
De acordo com Santana (2005), outra teoria que pode auxiliar na interpretação dos sonhos, porém não trata sobre o tema é a Teoria da Subjetividade de González Rey, em que o sonho pode ser visto como expressão da emoção e da produção de sentidos constituídos pela nossa personalidade, que é um sistema dinâmico, em permanente construção relacionada aos contextos sociais e culturais. Dessa forma,
a) o sonho é uma expressão da emoção, b) os sonhos são produzidos a partir dos nossos sentidos, c) a única pessoa capaz de perceber e que pode significar os elementos, e o significado ao sonho é o próprio sonhador; d) o mesmo sonho e o mesmo símbolo sempre terão, em pessoas diferentes, sentidos e significados diferentes; e) as interpretações dos sonhos estão sempre em seguidas transformações e construções, nunca tendo uma compreensão definitiva; e f) cada compreensão do sonho só terá aquele significado para o sonhador naquele momento e configuração de sentido e cultural (SANTANA, 2005, p. 14).
Dessa forma, existem várias formas de interpretar os sonhos de acordo com a abordagem utilizada, mas todas possuem o objetivo de melhor compreender o sujeito de forma que é mais uma técnica utilizada em psicoterapia na busca do conhecimento do sujeito.
No trabalho com os sonhos a pessoa é instruída a recontar o sonho como se ele estivesse acontecendo no presente, ou seja, aqui e agora, este simples artifício de linguagem utilizado pela gestalt terapia coloca a pessoa em contato com o seus conteúdos de uma forma mais energizada para o desenvolvimento do processo. O trabalho com os sonhos consiste r em perceber, com os sentidos, as emoções, o impacto subjetivo das imagens eventualmente encenadas, permitindo experienciar o sonho no aqui e agora (SANTANA, 2014).
Por tratar-se de algo no qual é a criação mais espontânea da pessoa, pois surge sem intenção ou ao menos desejo, ele simplesmente permeia nossos pensamentos, sendo composto pelo sonhador de parte em partes vivencia, experiência, uma junção da memória e realidade, Deve ser entendido como temático em vez de simbólico. A compreensão do conteúdo e dos temas dos sonhos oferece oportunidade para o cliente entender suas cognições e questionar os pensamentos, podendo ter, como resultado, uma mudança afetiva (FILHO, 2002).
Perls (1974, apud FILHO 2002, p. 35) qualifica a gestalt terapia como uma abordagem existencial, dado que não se limita a lidar com sintomas e estruturas de caráter; ocupa-se, em lugar disto, com a existência total da pessoa cujos fenômenos são claramente indícios em sonhos.
A concentração visa o reconhecimento com as possibilidades de identificação com os componentes do sonho onde a pessoa amplia sua percepção a respeito de seu senso de diversidade e descobre algo sobre si mesma.
Os sonhos abraçam muito de nossa existência portanto PERLS desenvolveu algumas formas de trabalho com as mesma,estas permitem a ampliação do senso de diversidade ,ampliando a experiência do eu .a escolha da forma de trabalho depende só do eu . A escolha da forma de trabalho depende do cliente ele deve ser ativo nesse processo especifico e da habilidade de psicoterapeuta.Só se pode trabalhar o que já foi disponibilizado pelo cliente, quando o cliente já desenvolveu awareness (conscientização) de suas coisas no setting terapêutico e sempre a nível sensorial ou de percepção e nunca de ação. Assim, de acordo com Santana (2014, p. 97), sobre a Gestalt Terapia e os sonhos,
são formas de experimentos básicos em GT encenação, dramatização, trabalhos para casa ou outras atividades que promovam a autoconsciência do indivíduo. Na utilização do sonho como experimento, o cliente/paciente poderá falar sobre este, identificando elementos em termos de importância e, isso permitirá que a pessoa assuma a responsabilidade (tomada de responsabilidade individual pela sua própria vida, em vez de culpar os outros) pelos sonhos, aumentando a consciência de seus pensamentos e emoções. O sonho pode ser usado como experimento em GT, a partir do recurso de psicodrama ou monodrama.
A forma de trabalho proposta por PERLS (1997) e a partir da sua visão do sonho como projeção, pontuando que todos os componentes do sonho são representações do sonhador e assim aquele que sonha e auxiliado a representar as partes de seu sonhos de forma ativa no presente, este ponto de partida possibilita na experiência sempre nova e interessante para o psicoterapeuta e cliente.
REFERÊNCIAS
BACHTOLD, L. Os sonhos na Terapia Comportamental. Interação, v. 3, p. 21 a 34, Curitiba, 1999. Disponível em: <http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs/index.php/psicologia/article/viewFile/7658/5461>. Acesso em: 13 abril 2016.
FILHO, A. P. Gestalt e Sonhos. São Paulo: Summus, 2002.
GARCIA-ROZA, L. A. Freud e o inconsciente. 24.ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2009.
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O Aconselhamento Psicológico segundo Yolanda Forghieri e a Abordagem Centrada na Pessoa
Para se entender o atual panorama do Aconselhamento Psicológico, é necessário buscar informações acerca dessa prática terapêutica a épocas primitivas e a forma de terapia que se utilizava, haja vista que o aconselhamento remete a tempos remotos, quando ainda nem se sabia o que seria o termo “aconselhar”. Além disso, é sempre interessante buscar a compreensão de um processo vigente e em constante desenvolvimento.
Levando ao plano da questão de saúde-doença, podemos observar, as “terapias” vigentes a épocas primitivas. Na pré-história, as doenças se remetiam a espíritos do mal e eram tratadas com trepanação ou rituais de feitiçaria. No Antigo Egito, a crença era de que as doenças eram causadas por demônios e punições de deuses, tendo como tratamento, a magia e algumas formas primitivas de cirurgia e higiene. Na China Antiga, acreditava-se que as doenças eram causadas em detrimento do desequilíbrio de forças da natureza e o tratamento consistia em ervas medicinais e acupuntura. Hoje, conhecemos esse tratamento como medicina chinesa tradicional (STRAUB, 2014).
Já na civilização grega, doença e terapia passam para o plano natural e científico. Vale ressaltar, nesse período, as significativas contribuições de alguns filósofos: Sócrates, Platão e Aristóteles. Hipócrates foi responsável por iniciar esse enfoque do ponto de vista racional, porém, há um retrocesso nessa visão, “assim, o tratamento das doenças mentais passou a ser sinônimo de exorcismo, representando uma união da demonologia primitiva e da mitologia cristã” (FORGHIERI, 2007, p.12).
O ar contaminado e os humores do corpo eram as causas das doenças, na Roma Antiga. O tratamento utilizado era a flebotomia, banhos e enemas. Na Idade Média, a doença era vista como punição divina, devido aos pecados do indivíduo, e curada através de milagres, santos e também, a partir flebotomia. Já na Renascença, surge com Descartes a divisão entre mente e corpo (dualismo cartesiano ou dualismo mente-corpo), onde a causa da doença devia-se a uma condição física do corpo, sendo este último, separado da mente. Ou seja, mente e corpo funcionam separadamente, sem interação. Nesse período, utilizaram-se as primeiras técnicas cirúrgicas como tratamento das doenças. Na década de 1920, as causas das doenças tinham influência da mente e suas emoções (medicina psicossomática), sendo tratadas através da psicanálise (STRAUB, 2014).
São diversas as terapias praticadas antigamente que podem ser consideradas como matrizes do Aconselhamento Psicológico, que surgiu como “uma ajuda terapêutica destinada a aliviar os sofrimentos existenciais dos seres humanos, com procedimentos variados, sem o estabelecimento de teorias ou regras rígidas” (FORGHIERI, 2007, p. 38). Sendo assim, mesmo que de forma indireta ou não, podemos perceber as contribuições de períodos primitivos da história para a origem do Aconselhamento Terapêutico.
Além disso, a partir do século XX, pode-se constatar que a origem do Aconselhamento Psicológico também está relacionada à orientação profissional e vocacional, haja vista o estabelecimento de uma relação terapêutica entre o profissional que auxilia na tomada de decisão e o indivíduo.
Forghieri (2007) diz que, devido às Grandes Guerras e as consequências trágicas de tais acontecimentos, um elevado número de pessoas necessitou de atendimentos psicológicos. Logo, apesar de apenas psiquiatras e médicos terem a autorização da prática psicoterápica, outros profissionais, tais como da área da enfermagem, assistência social e orientação educacional, também puderam exercer um papel de aconselhadores terapêuticos, a fim de dirimir a demanda. Foi com a publicação da obra de Carl Rogers, em 1942 nos Estados Unidos sobre Aconselhamento Psicológico (Cousenling Psychology) que foi reconhecida essa prática na comunidade científica da Psicologia. Porém, somente a partir da década de 1950, a APA (American Psychology Association) oficializa o Aconselhamento Psicológico como uma prática terapêutica.
O novo movimento encerra dados teóricos e técnicos da psicoterapia, inclui orientação profissional e ocupa-se sobretudo do indivíduo como indivíduo, procurando ajudá-lo a adaptar-se com sucesso aos vários aspectos da vida. Os aconselhadores ou orientadores, nesse ponto de vista, ocupam-se de pessoas normais podendo, ainda, cuidar daquelas que apresentam deficiências e são mal ajustadas, porém, de maneira diferente daquela que caracteriza a Psicologia Clínica (SUPER, 1955 apud FORHIERI, 2007, p.43-44).
A atual conjuntura apresenta-se como um entrave nas escolhas acerca da vida. Os acontecimentos que antes eram isolados pelas distâncias que separavam as pessoas umas das outras, hoje, acontecem quase que em tempo real, pela rapidez dos meios de comunicação, redes sociais, entre outros. É nesse movimento frenético do ser humano, em busca de trabalho, da realização pessoal, de sua emancipação como pessoa na sociedade, que o aconselhamento psicológico acontece (FORGHIERI, 2007).
O aconselhamento psicológico visa prestar ajuda de uma forma mais rápida ao indivíduo, no que tange às suas decisões relacionadas a escolha profissional, relacionamentos, família, entre outros. Preocupa-se, sobretudo, em auxiliar a pessoa a encontrar um norte para o seu existir, quanto esta se vê emaranhada pela tristeza, angústia e sem uma perspectiva de vida. Além disso, não consegue perceber em meio as dificuldades de seu cotidiano, uma solução que possa dirimir tais angústias.
Diante disso, Forghieri cita dois extremos envolvidos no processo de aconselhamento terapêutico
A saúde existencial consiste no bem-estar geral que cada um de nós experiencia no decorrer da própria existência, caracterizado por uma vivência global de liberdade, acolhimento e sintonia em relação a si, aos seus semelhantes e ao mundo em geral (…). Inversamente, o adoecimento existencial consiste em mal-estar, contrariedade e angústia, caracterizando-se por uma vivência global de impotência, insatisfação em relação a si mesmo, à proposta vida e aos seus semelhantes, e por uma revolta, ou uma apatia, um conformismo pessimista de que nada adianta fazer para melhorar ou mudar essa situação (…). Saúde e adoecimento existenciais fazem parte da vida de todos nós. São como dois polos constituintes da totalidade da existência. São maneiras de existir de certo modo opostas, paradoxais, que se alternam constantemente no decorrer de nossa vida, às vezes tão próximas que chegam a se entrelaçar (FORGHIERI, 2007, p.103).
Sendo assim, o terapeuta do aconselhamento psicológico deve estar à escuta do cliente, compreendendo os fatores contextuais, o tipo de problema situacional ou a um desconforto emocional. Caso seja identificado algo patológico, o cliente deve ser encaminhado para a psicoterapia (atendimento em longo prazo), pois tal sentimento refere-se a um estado de passividade diante de uma situação que o indivíduo não consegue resolver sozinho.
O aconselhamento psicológico tem seu foco no acompanhamento breve onde o psicoterapeuta e o cliente desenvolvem um diálogo. A duração do aconselhamento psicológico/terapêutico é fixado entre o aconselhador e cliente. Logo, pode ser realizado em uma ou mais sessões. Vale ressaltar a importância de haver uma reciprocidade na relação entre terapeuta-cliente, sendo que o terapeuta deve-se mostrar disposto a ajudar o cliente e este, disposto a discorrer sobre suas dificuldades. (FORGHIERI, p. 127).
Ou seja, o cliente fala e o aconselhador vai dando devolutivas, no sentido de estar mobilizando o cliente a fazer o que só ele pode fazer por si mesmo, diante de algo que sua existência lhe apresenta. Essa escuta proporciona um clima para que o cliente comece a ressignificar sua vida, constituindo um comportamento de aceitação diante de suas necessidades. O cliente deve sentir-se acolhido pelo aconselhador, e este oferecer-lhe uma compreensão daquilo que se trata, deixando claro o quanto é importante e benéfico o aconselhamento psicológico, pois rememorar certas situações difíceis de sua vida o ajudará a transcender e tornar sua caminhada existencial mais prazerosa.
Sobre Carl Rogers e sua teoria
Diante do exposto, o Aconselhamento Psicológico contempla os aspectos da Abordagem Centrada na Pessoa (ACP) de Carl Rogers (1902-1987). Tal abordagem possui suas bases na Psicologia Fenomenológica, oriunda da Fenomenologia de Husserl (1859-1938). A partir de protestos no século XX, este filósofo “colocou em questão a diversidade dos sistemas filosóficos da época, assim como o emprego exclusivo do método experimental pelas ciências na aquisição de conhecimento, que predominava nessa ocasião” (FORGHIERI, 2007, p.91).
A ACP não se constitui apenas como sendo de domínio psicológico, mas também é uma filosofia de vida, pautando seus princípios na “honestidade, a dedicação, o respeito e a consideração para com o outro como se o outro fosse você mesmo (…), promovendo cura, desenvolvimento, crescimento e aprendizagem (SANTOS; ROGERS; BOWEN; 2004, p.43).
Os principais fundamentos da ACP dividem-se em três etapas. A primeira delas é a congruência que consiste na ideia do terapeuta ser ele mesmo na relação com o cliente, de modo a dirimir as fronteiras profissionais e/ou pessoais com o outro, além de qualquer resistência por parte desse profissional. A segunda etapa consiste na aceitação positiva incondicional que o terapeuta deve ter para com o cliente, aceitando-o em sua integralidade sem julgamentos previamente estabelecidos. A terceira etapa refere-se a empatia, onde o terapeuta deve permitir-se entrar no mundo interno de seu cliente, ao compreender os sentimentos deste último e o significado dado a eles (ROGERS, 1987). Vale ressaltar que estas três etapas não seguem uma ordem cronológica dos fatos.
Essas etapas são apenas atitudes que Rogers se baseia para o bom desenvolvimento dos relacionamentos interpessoais que devem ser levadas em consideração. Enfim, congruência, aceitação positiva incondicional e empatia, contribuem para abertura do cliente em seu processo e avanço no atendimento psicológico, seja ele Aconselhamento Psicológico ou a Psicoterapia.
Justo (2002) diz que Rogers fez a escolha pela abordagem fenomenológica, haja vista que a mesma é menos suscetível a erros e eficaz na prática, sendo assim, mais concernente aos seus objetivos enquanto terapeuta. Assim sendo, a ACP leva o indivíduo, ao longo de sua existência, a uma tomada de consciência, ensinando-o a trabalhar sua própria dimensão psicológica, bem como seu lado emocional.
Diante do exposto, podemos observar que as várias fases da saúde-doença, desde a pré-história até os tempos de hoje, contribuíram para a história e evolução do aconselhamento psicológico. Yolanda Forghieri utiliza-se do termo “Aconselhamento Terapêutico”, porém, nos utilizamos tanto desta denominação quanto “Aconselhamento Psicológico”. Além disso, essa autora teve influência de diversos filósofos, psicólogos e psiquiatras, sendo uma das precursoras dessa especialidade da Psicologia no Brasil.
O campo de aconselhamento ampliou-se focando na relação cliente- terapeuta, onde através da escuta e devolutivas, o terapeuta tem como objetivo ajudar o cliente a tomar decisões e não adoecer existencialmente. Yolanda (2007) diz que a relação entre terapeuta e cliente requer humanidade de ambos, mas também profissionalismo do terapeuta, a fim de auxiliar o indivíduo para que este se conheça melhor e exista no mundo de maneira satisfatória.
Tendo em vista que o indivíduo vive em busca de sua realização pessoal, o Aconselhamento Psicológico é um meio para auxiliá-lo nesse intento. Para tal, Rogers asseverou sua abordagem na “terapia centrada na pessoa”, com o intuito de auxiliar o indivíduo a encontrar respostas para suas indagações no seu próprio interior, pois é ele mesmo que possui condições de fazer suas próprias mudanças no que tange às suas necessidades; o terapeuta apenas o auxilia.
Nessa perspectiva, consideramos o Aconselhamento Psicológico, um campo de extrema importância para a Psicologia, conforme as considerações realizadas por Forghieri acerca dessa prática. Além disso, demonstramos aqui sua execução a partir da Abordagem Centrada na Pessoa de Carl Rogers, a qual possibilita um clima facilitador de crescimento na relação entre terapeuta e cliente.
REFERÊNCIAS:
ROGERS, C. Os fundamentos de uma abordagem centrada na pessoa. In: Um jeito de Ser. São Paulo: EPU, 1987.
FORGHIERI, Y. C. Aconselhamento terapêutico: origens, fundamentos e práticas. São Paulo: Thomson Learning, 2007.
_____________. O aconselhamento terapêutico na atualidade. Rev. Abordagem Gestalt, Goiânia, v.13, n.1, p. 125-133, jun. 2007. Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-68672007000100009&lng=pt&nrm=iso>. Acessado em 21 de abril de 2016.
JUSTO, H. Abordagem centrada na pessoa: consensos e dissensos. São Paulo: Vetor, 2002.
SANTOS, A.M; ROGERS, C; BOWEN, M.C.V. Quando fala o coração: a essência da psicoterapia centrada na pessoa. São Paulo: Vetor, 2004.
STRAUB, R.O. Psicologia da saúde: uma abordagem biopsicossocial. Porto Alegre: Artmed, 2014.
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Psicoterapia Infantil na Abordagem Centrada na Pessoa
Nos últimos anos, tornou-se frequente nas clínicas de psicologia a busca por atendimentos infantis. Nesse sentido, o presente texto discorrerá sobre os principais aspectos da psicoterapia infantil, embasando-se no referencial teórico da fenomenologia existencial, sobretudo na Abordagem Centrada na Pessoa (ACP), tendo como um dos autores principais Carl Rogers.
A abordagem humanista surge nos Estados Unidos, a partir de uma guerra tortuosa, onde as pessoas saíram desoladas, desnorteadas e fragilizadas. Dessa maneira, criou-se uma teoria que evidenciava os sentidos que os seres humanos atribuíam à sua própria vida, entendendo-os como responsáveis pelos seus atos (BEZERRA; BEZERRA, 2012).
Nessa direção, Rogers afirma tal abordagem e enquanto foco terapêutico preza pelo aqui e o agora, isto é, as experiências advindas no momento terapêutico é que ganham destaque. Assim, esta teoria defende o terapeuta como facilitador do processo, quando se torna participante direto na intervenção. Porém, ressalta que em alguns momentos, deve aparecer como observador “distante”, a fim de obter melhor análise acerca do caso (BEZERRA; BEZERRA, 2012).
Concomitante ao Humanismo tem-se o Existencialismo, que de acordo com a autora Natacha Miguel Monteiro (s/d), é também uma corrente filosófica no qual pressupõe o homem dotado de autonomia e liberdade em suas decisões e totalmente responsável pelas consequências destas (MONTEIRO, s/d).
Portanto, na Psicoterapia Infantil, o psicoterapeuta é um facilitador perante a criança, sendo que este deve ajudar a descobrir suas potencialidades por meio de um ambiente acolhedor, tendo o lúdico como material de apoio, pois a linguagem não-verbal do cliente mirim pode oferecer o conteúdo da realidade que o cerca (MONTEIRO, s/d; LIMA; LIMA, 2015).
Imagem extraída do site: http://www.zazzle.com.br/pontos_de_interrogacao_relogio_para_parede-256532000288651226
QUAL É A HORA CERTA DE TRAZER A CRIANÇA À PSICOTERAPIA?
Muitas são as dúvidas dos pais com relação ao momento em que deve procurar a psicoterapia para seus filhos. Em 1980, Violet Oaklander, publicou o livro “Descobrindo Crianças: a abordagem gestáltica com crianças e adolescentes” que descrevia suas experiências decorrentes do processo de psicoterapia infantil. Elucidou que não há motivo para que os pais corram para um terapeuta toda vez que aconteça qualquer conflito ou problema, uma vez que eles “precisam aprender a ser, num certo sentido, ‘terapeutas em casa’ (OAKLANDER, 1980, p. 206). Assim, em muitos casos, as intervenções resumem-se a orientar os pais em algumas sessões, a fim de propor um espaço reflexivo para que eles possam resolver a conflitiva dos filhos (OAKLANDER, 1980).
Virginia Axline é outra autora do universo da psicoterapia infantil, na qual foi parceira de Carl Rogers (1902- 1987), fundador da Abordagem Centrada na Pessoa. Ela adotava o método não diretivo na sua prática em atendimento com crianças. Publicou o livro “Ludoterapia” (1972) que discorria “os princípios que considera indispensáveis para os que se propõem a atender crianças e que dizem respeito muito mais à atitude do terapeuta do que a técnicas ou informações teóricas” (MATTAR, 2010, p. 82).
Seu papel não é passivo e sim de alerta, de sensibilidade e de constante apreciação daquilo que a criança diz ou faz. São necessários uma compreensão e um genuíno interesse pela criança, de modo a encorajá-la a compartilhar seu mundo interior. Mantém uma atitude profissional em seu trabalho e não revela as confidências da criança aos pais, professores ou quem quer que seja que pergunte sobre o que ela fez ou disse durante a sua hora de terapia. Esta hora é da criança, e o que faz ou diz é estritamente confidencial (AXLINE, 1972 apud MATTAR, 2010, p. 82).
Sobre a hora certa de trazer a criança à psicoterapia, Oaklander (1980, p. 206) questiona: “Como pode alguém determinar a “hora certa”, ou saber se o problema vai se resolver por si só?” A autora relata que não é algo fácil avaliar o momento adequado para levar uma criança à psicoterapia. Contudo, adianta que na maioria das vezes a criança começa a dar sinais, buscando chamar a atenção de quem está ao redor. Comumente, as escolas são as primeiras a perceber, mas hesitam em pedir ajuda enquanto a situação não se agrava.
Embasando-se na perspectiva de Axline (1972) acerca das atitudes que o psicoterapeuta deve ter junto à criança, Mattar (2010) sublinha que
a hora da terapia pertence à criança, para ser usada como ela quiser. A criança escolhe usar ou não usar o material, o terapeuta não a encoraja nem faz sugestões. O objetivo, segundo Axline, é levar à autossuficiência, independência e capacidade de autodireção. O terapeuta aceita o silêncio, como qualquer outra expressão. A criança, segundo a autora, resiste aos esforços para mudá-la, e, por vezes, o seu silêncio, ou o fato de não brincar podem ser “testes” para o terapeuta, quando a criança está atenta se ele também deseja modificá-la e se, de fato, ela é livre para agir ali como quiser (MATTAR, 2010, p. 82).
Mattar (2010) explana que Axline possui uma concepção não diretiva, fundamentada nos princípios da Psicologia Humanista, que preconiza a importância de espaço reflexivo que possibilite a atualização dos potenciais de crescimento da criança, bem como a sua capacidade libertação e tendência autorrealizadora, auxiliando o indivíduo a ser o próprio autor da sua vida.
Às vezes, a criança entra na terapia acompanhada de vários documentos (relatórios diagnósticos, procedimentos legais, registros escolares, etc.). E, apesar da leitura desses papéis serem interessante para o conhecimento da história do cliente, é importante ter cautela e não se ater às impressões e julgamentos descritos por outras pessoas. É necessário ter uma conduta apriorística ao iniciar com a criança, considerando as suas particularidades e entendendo-a como um indivíduo multifacetado, capaz de muitas formas de ser. Por exemplo, a criança pode demonstrar uma parte de si para o terapeuta que sinta dificuldade de expressar para os pais e/ou professores (OAKLANDER, 1980).
Oaklander relata que existe uma tendência dos pais em esperar muito até buscar o auxílio psicológico e que, na maioria das vezes, busca ajuda em virtude de uma situação muito difícil, quiçá intolerável, seja para os próprios pais e/ou para a criança. Por exemplo, a morte de um ente querido, maus tratos, acidente, etc.(OAKLANDER, 1980). Todavia, nos dias atuais essa prática de levar o filho ao psicoterapeuta tem sido bem mais recorrente talvez uma das primeiras alternativas, tendo em vista que a lógica de mercado, o capitalismo, o “fenômeno tempo”, os discursos midiáticos, a pressão escolar, etc. são catalisadoras dessa prática.
Imagem extraída do site: http://psicoitaim.com.br/tratamentos/psicoterapia-infantil/
RECURSOS PSICOTERAPÊUTICOS NA ACP
Diferentemente dos adultos que costumam se expressar verbalmente na psicoterapia, as crianças necessitam de recursos mais lúdicos para que consigam transmitir seus reais sentimentos (frustração, medo, tristeza, alegria, etc.). Desse modo, o brincar é considerado o meio mais comum da criança projetar ações que fazem parte do seu ser, logo, acaba tornando-se o instrumento de linguagem e conexão dela com o terapeuta (OAKLANDER, 1980; LIMA; LIMA, 2015).
Oaklander (1980) acrescenta que
o brincar das crianças no consultório do terapeuta é proveitoso para outros propósitos além do processo direto da terapia. Brincar é divertido para a criança e ajuda a promover a afinidade necessária entre o terapeuta e a criança. O medo e resistência iniciais por parte desta muitas vezes é drasticamente reduzido quando ela se defronta com uma sala cheia de brinquedos atraentes (OAKLANDER, 1980, p. 189).
Diante disso, um dos recursos a serem primordialmente pensados é o ambiente. O local onde será realizado o atendimento infantil deve trazer conforto, segurança e liberdade, para tanto, deverá obter espaço, claridade e cuidado com a privacidade (sala acústica). Assim sendo, estes aspectos se mostram relevantes por trazerem à criança condições facilitadoras para que elas expressem quem realmente são no processo terapêutico (BRANCO, 2001).
Nesse ínterim, alguns instrumentos que o terapeuta poderá utilizar no seu local de atendimento lúdico são: papéis (Ex: A4), lápis grafite e colorido, pincéis, jogos, bonecos (as), família de bonecos, carros, testes projetivos, entre outros, os quais, por sinal,deverão abarcar diferentes faixas etárias (BRANCO, 2001; OAKLANDER, 1980).
A título de exemplo, os jogos podem ser preciosas ferramentas para o envolvimento das crianças na terapia, haja vista que suscitam comportamentos referentes às situações diárias, além de servirem como quebra das resistências das crianças e fortalecimento do vínculo/confiança entre a mesma e o terapeuta, e vice-versa. Alguns jogos são tipicamente encontrados em clínicas psicoterápicas infantis, tais como: dama, dominó, jogo da velha, quebra-cabeça, jogo da memória, dentre outros (OAKLANDER, 1980).
Oaklander (1980) destaca que existem muitos instrumentos destinados para este público em situação terapêutica, contudo, eles não podem ser cristalizados e usados para um determinado fim, pois o profissional deve entender que o sujeito é singular e, logo, trará comportamentos peculiares e dignos de uma sessão imprevisível. Portanto, psicoterapia é uma arte e deve-se combinar conhecimento, preparo, experiência, sentido intuitivo e criativo, bem como gostar de criança para trabalhar com elas.
Imagem extraída do site: http://terapiaocupacionaleparalisiacerebral.blogspot.com.br/
INSERÇÃO DE LIVROS DE HISTÓRIAS NA PSICOTERAPIA INFANTIL
Em sua dissertação de mestrado, Taciane Marques Castelo Branco (2001) aborda os livros de histórias infantis como importante recurso na Psicoterapia centrada na criança. Para tanto, faz uma retrospectiva do surgimento dos livros infantis e os principais objetivos destes. Neste tópico, abordar-se-á a utilidade desses livros e seu benefício atrelado aos conceitos da Abordagem Centrada na Pessoa.
Os livros Infantis foram criados com a pretensão, por parte da Literatura, de ajudar as crianças a se desenvolverem e a se prepararem para as questões presentes e vindouras da vida humana. Portanto, unindo as forças, a Psicologia também pode atuar utilizando desses recursos para cumprir seu papel terapêutico de ajudar no emponderamento e surgimento de resiliências do cliente (BRANCO, 2001).
De acordo com Branco (2001), os livros pertencentes na Literatura Infantil Brasileira são
(…) livros que escolhem como problemática temas de sempre, – como a morte; ou temas mais recentes e não menos dolorosos, – como a separação dos casais e o problema dos filhos divididos; o problema dos tóxicos; as injustiças sociais; o racismo; as crianças abandonadas; a marginalização da mulher; etc. (BRANCO, 2001, p. 57).
É interessante notar que ao final das histórias infantis é possível verificar lições de vida que incentivam posicionamento moral frente às questões trazidas pelo conto. Além disso, essas questões trazidas como problemáticas podem ser as demandas presentes do cliente também. Cabe ao psicoterapeuta, a habilidade de observar se realmente este recurso é válido, e isso é possível a partir das correlações que o cliente faz das histórias com a sua própria vida.
Imagem extraída do site: http://revistacrescer.globo.com/Revista/Crescer/0,,EMI26334710536,00.html
DESAFIOS, ENTRAVES E ENCERRAMENTO NA PSICOTERAPIA INFANTIL
Independente do pressuposto teórico e prático seguido pelo psicoterapeuta, muitos são os desafios encontrados por esse profissional em seu fazer clínico, em especial no âmbito infantil. Levando em consideração as especificidades dessa área, Costa e Dias (2005) elucidam que um dos maiores obstáculos presentes na prática da psicoterapia infantil consiste nos entraves e dificuldades em obter o apoio dos pais. Assim, é presente a dificuldade de se estabelecer uma aliança de compromisso e parceria com os responsáveis e os outros membros significativos da rede social do cliente. Segundo os autores, o progresso terapêutico da criança fica, por vezes, estagnado o comprometido por questões particulares dos pais.
Somado a isso, Costa e Dias (2005) enfatizam que, atualmente, há um número relativamente baixo de profissionais que se dediquem a essa área de atuação, bem como ao estudo e pesquisa. Nesse ínterim, ocorre uma dificuldade nas trocas mútuas e nos encaminhamentos entre profissionais que atuam nessa especialidade. Logo, “se existem poucas pessoas trabalhando na prática clínica e, considerando que a teoria é fruto dela, então são também escassas as pesquisas bem como a literatura a respeito da prática infantil nas abordagens estudadas” (COSTA, DIAS, 2005, p. 47).
Quanto ao encerramento da psicoterapia infantil, Oaklander (1980) elucida que, em muitos casos, as crianças não devem permanecer por muito tempo em terapia. Segundo a autora, as crianças não possuem muitas camadas de problemas inacabados ou acumulados como se verifica com os adultos. Assim, notam-se progressos suficientes, entre o terceiro e sexto mês de psicoterapia que permitem o seu encerramento. Acredita-se que toda criança precisa de uma oportunidade para integrar e assimilar com seus próprios mecanismos de maturação e crescimento as mudanças resultantes da psicoterapia.
De acordo com Oaklander (1980), a criança começa a demonstrar indícios para quando chega a hora de encerrar o processo. Desse modo, o comportamento da criança começa a mudar e esse fato é expresso nos relatos dos pais e professores. Outro aspecto sublinhado consiste na possibilidade do cliente se envolver em atividades extras curriculares, como esportes, clubes e a psicoterapia começa a “atrapalhar” o caminho da criança, pois torna-se o tempo em que poderia ser preenchido com outras atividades.
Contudo, a autora destaca que uma melhora no comportamento da criança não pode ser motivo suficiente para encerrar a terapia. Nessa direção, todo o material que é evidenciado durante as sessões deve ser levado em consideração.
Outro aspecto relevante refere-se ao fato de que a criança precisa ser preparada para o encerramento da terapia, pois esta não pode ocorrer de forma abrupta. Embora cada terapeuta ajude o cliente a adquirir o máximo possível de independência e autossustentação, certamente, são estabelecidos vínculos afetivos mútuos, que devem ser bem trabalhados durante o encerramento final.
Oaklander (1980) elucida ainda que, nesses casos, o término da psicoterapia não precisa, necessariamente, apresentar a finalidade explícita do nome. Desse modo, término significa chegar a um lugar de parada, um final neste exato momento e não um adeus definitivo. De acordo com essa autora, algumas crianças precisam ter uma segurança de que poderão retornar ao processo terapêutico caso sintam necessidade (se isto for realmente possível e necessário).
Imagem extraída do site: http://mdemulher.abril.com.br/familia/claudia/devo-levar-meu-filho-ao-terapeuta
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho buscou discorrer acerca do processo psicoterapêutico infantil desde a chegada da criança, a utilização dos recursos facilitadores nos atendimentos, até a forma de finalização da psicoterapia à luz da Abordagem Centrada na Pessoa.
Sobre a forma como a criança chega à terapia, ficou evidente que a maioria das vezes ela não sabe o porquê de um atendimento psicológico e pode ser uma portadora de demandas dos pais e não dela, cabendo ao psicólogo orientar os genitores se esse for o caso.
Concernente aos recursos terapêuticos possíveis, a forma lúdica é considerada a mais apropriada quando se trata de atendimento infantil, uma vez que é por meio do brincar que a criança se comunica e expressa seus sentimentos. Aliado a isso, tem-se a sugestão da leitura de histórias infantis que, dependendo do cliente, pode suscitar identificação da criança com os personagens fictícios e posterior formulação de estratégias para lidar com suas situações conflitantes.
Quanto ao encerramento da psicoterapia, as crianças (maioria delas) não precisam de muito tempo de psicoterapia, afinal não possuem a mesma carga de problemas de um adulto que possui mais tempo de vida. Além disso, tratou-se também a respeito dos entraves dessa área, podendo ser caracterizada pela dificuldade de estabelecer compromisso entre os pais das crianças e o processo terapêutico, bem como a escassez em pesquisas que tratem do assunto.
Sugere-se, portanto, mais pesquisas de técnicas e recursos na psicoterapia infantil, para que dessa forma, seja possível um diálogo entre profissionais e melhoria nos atendimentos.
REFERÊNCIAS
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