Diferente de outras “histórias de câncer”, John Green procura abordar essa temática de uma forma mais descontraída em seu livro “A culpa é das estrelas”, que esteve por sete semanas consecutivas na lista de best-sellers do New York Times na época do seu lançamento.
O livro conta a história de uma adolescente de 16 anos diagnosticada com câncer de tireoide aos 13 anos de idade, logo após a primeira menstruação (o que é muito raro nessa faixa etária). Logo a doença fez metástase no pulmão, o que obrigou Hazel Grace a andar puxando um carrinho com um cilindro de Oxigênio e um cateter nasal, e dormir conectada a um CPAP, que ela chamava de Felipe. Os médicos não viam chances de cura, por isso o tratamento era paliativo, ou seja, apenas para impedir o crescimento dos tumores. Depois de experimentarem várias drogas, encontraram uma que conseguiu um resultado nesse sentido, o Falanxifor. O uso desse medicamento não era bem sucedido na maioria das pessoas, mas incrivelmente funcionou com Hazel. E isso era uma forma de aumentar os seus dias de vida.
Os pais de Hazel conviviam com a dura ideia de que a qualquer momento poderiam ter que se despedir de sua filha. Por isso valorizavam cada minuto ao seu lado como se fosse o último.
Hazel teve que deixar a escola antes que terminasse o ensino médio, mas conseguiu seu certificado de conclusão; ela dizia que isso era “privilégio do câncer”. Depois disso, passou a frequentar uma faculdade e um grupo de apoio, obrigada por sua mãe, pois a mãe acreditava que seria reconfortante ela conviver com pessoas que estão praticamente na mesma situação. Mas, como todo adolescente, Hazel não achava que “aquilo” a curaria ou a melhoraria em algum aspecto.
Patrick era um rapaz jovem, sobrevivente do câncer, e era quem ministrava as reuniões do grupo de apoio. Diariamente ele contava sobre sua batalha incansável contra a doença, encorajando todos que ali estavam para que não desistissem. Sempre repetia uma frase: “Viver o melhor da sua vida hoje” que era também repetida por todos como um grito de guerra. Ela achava tudo muito cansativo e utópico, pois não acreditava que uma pessoa poderia ser feliz “carregando” uma doença incurável nas costas. Ela não queria ser lembrada como uma pessoa que lutou contra um câncer, queria ser reconhecida por outros motivos.
“… o que me deixou com medo de que, quando eu morresse, eles não tivessem mais nada a dizer sobre mim exceto que lutei heroicamente, como se a única coisa que eu tivesse feito na vida fosse Ter Câncer.” Hazel Grace
No grupo de apoio, um rapaz lhe chamou a atenção por sua beleza e pelo fato de olhá-la o tempo todo. Augustus Waters tinha uma perna amputada devido a um osteossarcoma, mas estava sem evidência da doença há algum tempo.
Da troca de olhares à aproximação. Hazel nunca pôde imaginar que alguém se interessaria por uma pessoa visivelmente doente, mas Augustus conseguia enxergá-la na sua essência, jamais levando em conta sua doença exteriorizada pelo cateter de oxigênio preso em sua face. Perto dele ela percebia que a vida era mais do que o simples fato de estar doente. Trocavam experiências boas e ruins, falavam sobre hobbys, livros. Havia um livro que ela gostava muito e que também chamou a atenção de Gus, foi o motivo de vários encontros e conversas intermináveis sobre como a história acabaria, pois o autor escrevera uma história sem fim. Ela passou um bom tempo escrevendo para o autor em busca de uma explicação, até que finalmente Augustus conseguiu marcar um encontro deles com o autor na casa do próprio autor na Holanda por meio de sua secretária. Era o maior desejo de Hazel que incrivelmente ele conseguiu realizar.
Embora não tivessem alcançado todos os seus objetivos no encontro, foi algo mágico que nem de longe ela imaginaria poder vivenciar. Hazel começa a conseguir contornar a doença permitindo-se fazer o que qualquer adolescente saudável faria (dentro de suas possibilidades é claro). Eles passavam a maior parte do tempo juntos como se um buscasse no outro seu porto seguro.
O livro nos faz viajar pela realidade de uma pessoa que tem câncer, de como se sente em relação à doença, como pode ser estereotipada e também como o sentimento de pena das pessoas em torno do doente pode tornar seus dias ainda mais difíceis. Na maioria das vezes o paciente sofre com o fato de se tornar o centro das atenções e, por causa disso, alguns ficam depressivos. A depressão pode fazer com que a pessoa não consiga lidar com sua condição podendo até mesmo abandonar o tratamento. Eu, como uma “futura” enfermeira, acredito que o paciente não é só sua patologia e não precisa do sentimento de pena de ninguém. Quer ser reconhecido e lembrado por seus dons, seus feitos, sem aliená-lo ao seu estado de saúde.
O câncer é uma doença ainda sem muitas explicações, sabemos que as chances de cura não são as maiores e que a possibilidade de incapacitação é grande. Cremos na velha ideia de que nascemos, envelhecemos e depois morremos.
“… o diagnóstico veio três meses depois da minha primeira menstruação. Tipo: Parabéns! Você já é uma mulher. Agora morra.” Hazel Grace
Para um jovem que recebe esse diagnóstico é como se pulasse uma etapa de sua vida, pois na maioria das vezes tem-se que abrir mão de quase tudo por não conseguir mais realizar as mesmas tarefas de antes, quando ainda estava saudável. É difícil lidar com a ideia da imprevisibilidade da vida, ou seja, um dia temos vários planos e, repentinamente, podemos ter que conviver com o fato concreto da morte. E já é complexo encarar tal fato como uma mera hipótese.
Nesse contexto, os grupos de apoio podem colaborar muito com a recuperação de um paciente, lá eles descobrem que não são os únicos que estão passando por um dado problema e encontram força na dor do outro, pois é uma forma de compartilhar seus medos de igual para igual, porque a pessoa que vai te ouvir entenderá o recado. E é muito importante a oportunidade de se socializar e dividir seu “peso” com alguém.
Apesar de o autor retratar uma doença que ainda é motivo de angústia para muitas pessoas, ele faz isso sem tanto peso, quebrando a imagem de que quem tem câncer tem que viver em função da doença. A vida está além do tempo em que permaneceremos nela, pois nós nunca saberemos o que poderá nos ocorrer e quanto tempo ela vai durar. Só devemos acreditar que mesmo que esse tempo não seja tão grande assim, ele seja aproveitado da melhor maneira possível. Não podemos simplesmente sentar na plateia da nossa vida e esperá-la passar. “Alguns infinitos são maiores que outros”.
Análise do filme: http://ulbra-to.br/encena/2014/06/09/A-culpa-e-das-estrelas-quando-o-infinito-e-breve
FICHA TÉCNICA DO LIVRO
A CULPA É DAS ESTRELAS
Título Original: The Fault in Our Stars
Autor: John Green
Editora: Intrínseca
Páginas: 288
Ano: 2012