O leitor, o telespectador, o ouvinte, passou a fazer parte da maioria dos noticiários, usando das mais variadas ferramentas tecnológicas para interagir com quem antes “dava as cartas”.
Mesmo assim para muita gente essa participação ainda causa espanto e a quem torça o nariz para a conduta de alguns jornalistas. Mas será que o modo de falar, a roupa, o cabelo, os adereços, pode influenciar no resultado final da mensagem executada?
Na busca por essa resposta, nós do (En)Cena procuramos um jornalista experiente, que hoje vive aqui no Tocantins.
Repórter de rede na TV Anhanguera afiliada da Rede Globo de Televisão, Carlos Moreira respondeu algumas perguntas relacionadas ao tema.
Carlos Moreira tem 14 anos de experiência no jornalismo. Produtor, editor, editor-chefe, apresentador, repórter e repórter nacional da TV Globo. Palestrante em cursos práticos de telejornalismo. Vencedor do Prêmio ACERJ, melhor cronista esportivo do Rio de Janeiro, categoria televisão, no ano de 2012. Atualmente, é chefe de redação e repórter do Núcleo Rede Globo, no Tocantins.
(En)Cena: O que você acha da interatividade dentro dos telejornais?
Carlos Moreira: Hoje, a interatividade é estratégica para um telejornal. Ela traz dinamismo, aproxima o telespectador do produto. Ainda há muito que avançar nesse aspecto, achar os formatos ideais e eficientes, mas o telejornalismo brasileiro já começa a entender essa lógica. A repercussão e desdobramentos de uma reportagem exibida num determinado telejornal, por exemplo, em poucos segundos, ou minutos, repercute na internet, nas redes sociais. E o telespectador é o agente principal disso. Esse já é um grande passo de interatividade.
O telespectador não apenas assiste passivamente, e sim provoca desdobramentos, amplia discussões, encontra novos pontos de vista. Aplicativos como o QVT (QUERO VER NA TV), da TV Anhanguera, também reforçam a interatividade com o público. É uma ferramenta extraordinária, que aproxima a comunidade dos telejornais da emissora. E o melhor de tudo é que essa relação não fica no virtual. Na grande maioria das vezes, as demandas apresentadas pelos internautas/telespectadores são resolvidas “in loco”. A internet é uma grande aliada da interatividade. Os veículos que compreenderem isso e investirem nessa integração de plataformas, sem dúvida, estarão à frente.
(En)Cena: Na sua opinião, qual a principal mudança do jornalismo dos últimos 20 anos?
Carlos Moreira: No jornalismo, de forma geral, a pluralidade. A quantidade de informação produzida no mundo, hoje, é fascinante. Obviamente, existem questionamentos, mas o acesso à informação é muito maior, melhor e plural.
Mais uma vez, podemos destacar a internet como protagonista nessa transformação.
Especificamente no telejornalismo, a mudança mais visível foi na linguagem, a busca pela naturalidade. A desconstrução do tom “professoral”.
Jornalistas, repórteres, apresentadores mais humanos e menos robotizados.
(En)Cena: A forma de se vestir de apresentadores e repórteres, pode influenciar no resultado final da notícia?
Carlos Moreira: Sim, acredito que isso possa influenciar na recepção da mensagem. Um figurino muito extravagante, por exemplo, pode roubar a atenção do telespectador. Quando somos estimulados a aprender, a receber informação, ativamos os nossos sentidos. Se por algum motivo esses sentidos forem desviados do objetivo principal, no caso entender uma notícia, a comunicação falha. Quem nunca parou pra reparar a gravata torta de um apresentador, o brinco ou cabelo de uma repórter, ou num figurino exagerado e, no fim das contas, perdeu a notícia? Entretanto, tudo pode variar de acordo com o público, a faixa etária, etc.
(En)Cena: Você acredita que veículos como rádio e TV, migrem para internet?
Carlos Moreira: Essa fusão de plataformas já começou. Mas não enxergo como “o fim” desse ou daquele meio de comunicação. A internet é o conjunto de todos eles. Vídeos, áudios, textos, fotos, etc. Acredito na integração. E como podemos levar a internet pra quase qualquer lugar, ela tem o papel natural de liderar essa integração dos meios.
(En)Cena: Qual a principal diferença entre a linguagem usada na internet e nos demais veículos de comunicação?
Carlos Moreira: A internet é ilimitada, infinita. Está em permanente construção, transformação. É um meio democrático, plural. Trabalha com todos os públicos e linguagens. Se você gostou, clica e vê, ouve, interage. Não gostou, fecha e navega pra próxima. TV tem uma linguagem própria. O rádio outra. O jornal impresso também. Mas todos eles cabem na internet. E esse é o grande desafio, é um estímulo para os veículos. Integrar-se à internet. Esse, sim, é um caminho sem volta. A internet já é o presente. É a realidade da comunicação mundial.
Esta semana, li que o “The New York Times” e a BBC vão publicar conteúdo diretamente no Facebook. A comprovação da dimensão que a internet tomou. A confirmação do quanto ela é vital para o jornalismo. Já se discute a produção de cinema com câmeras GO-PRO e iPhone. Fazer filme, novela, séries, em altíssima definição, com um celular e alguns acessórios, até pouco tempo era algo inconcebível.
Era preciso gastar milhares de reais em um caminhão de equipamentos. Daqui pra frente, o domínio das tecnologias e ferramentas fará toda a diferença entre o fracasso e o sucesso dos profissionais e dos veículos.
(En)Cena: Você concorda com o envolvimento emocional de apresentadores e repórteres na hora de dar uma notícia?
Carlos Moreira: Como fingir tranquilidade no meio de uma guerra? Como ser indiferente diante de uma tragédia? Como esconder a alegria diante da conquista de um ouro olímpico? Quando penso na imparcialidade, sempre me remeto à ética, à apuração precisa, penso em fidelidade ao fato, sem julgamentos, opiniões. Mas se estamos na frente da câmera para representar o público, e seja quem for o nosso telespectador, além dos olhos, precisamos ser também os ouvidos, o nariz, as pernas, os braços, e, na minha opinião, o coração de quem se depara com uma notícia. E por mais que nos preparemos para determinadas situações, o choro, a dor, a revolta, a indignação vão nos acompanhar. Como em tudo, é preciso ter discernimento. Mas esconder impressões – o que é diferente de expor opiniões – pode ser uma grave distorção do fato.
Recentemente, a repórter Carol Barcellos, do programa Planeta Extremo, da Rede Globo, fazia uma entrevista no Nepal e começou um terremoto. A reação dela foi de pavor. Nada mais humano e, naquele momento, mais jornalístico diante da situação que a jornalista vivia. O parceiro dela, Clayton Conservani, também participou da cobertura. O cansaço, a tristeza, o estresse, os medos eram visíveis. Ele estava quase sem voz. Mesmo assim, fez várias reportagens e entradas ao vivo. Se partirmos do princípio do “isolamento emocional”, os dois não fariam o trabalho brilhante e marcante que fizeram.
(En)Cena: É possível afirmar que a naturalidade se aproxima da displicência, quando o assunto é noticiário?
Carlos Moreira: Não. Naturalidade é naturalidade. Displicência é displicência. No meu ponto vista, naturalidade é fazer com fluidez. Displicência é fazer de qualquer jeito. Entendo que se soar artificial, displicente, não pode ser natural. Se o sentido é tornar nossos telejornais mais próximos, interativos, objetivos, o caminho é ser natural. E ser natural, nesse caso, é usar as suas próprias características para transmitir a informação de forma eficiente e se comunicar com veracidade.