“A intervenção fonoaudiológica ocorre nos distúrbios de comunicação e linguagem, que são os elementos centrais nos Transtornos do Espetro do Autismo (TEA) e fazem parte dos critérios para o diagnóstico”
Maria Glória, Fonoaudióloga
A Fonoaudióloga Maria Glória em seu ambiente de trabalho. Fonte: Arquivo Pessoal
Maria Glória é fonoaudióloga há 16 anos e desenvolve um trabalho voltado para o público infantil que apresenta dificuldades na linguagem e comunicação. Ao longo da sua carreira tem se dedicado a construção de uma clínica inclusiva, trabalhando com diversos recursos para o acesso e intervenções das demandas que frequentemente chegam no seu consultório.
Nessa entrevista Maria Glória nos oferece informações importantes e nos alerta para sinais relevantes no cuidado desde os primeiros anos de vida, voltados para interação e comunicação, com foco nos transtornos do neurodesenvolvimento.
(En)Cena – Fale sobre sua formação e como é o seu cotidiano de trabalho?
Maria Glória – Eu sou fonoaudióloga há 16 anos pela PUC-Goiás e trabalho na clínica de Linguagem Infantil, especificamente com dificuldades de comunicação na primeira infância. Recebo muitas famílias de crianças que falam pouco e que não falam.
(En)Cena – Qual a importância do atendimento fonoaudiológico para as pessoas com transtorno do espectro autista (TEA)?
Maria Glória – O diagnóstico do Transtorno do Espectro do Autismo é essencialmente clínico, realizado por um médico Psiquiatra da Infância e Adolescência ou um médico Neuropediatra, onde a partir de uma atenção especial à criança são observados indicadores comportamentais com prejuízos na comunicação e interação social, e padrões restritos e estereotipados de interesses; estando esses sintomas presentes na primeira infância e limitantes, prejudicando o cotidiano, conforme os critérios diagnósticos do DSM-V.
A intervenção fonoaudiológica ocorre nos distúrbios de comunicação e linguagem, que são os elementos centrais nos Transtornos do Espetro do Autismo e fazem parte dos critérios para o diagnóstico. Tendo como objetivo o uso funcional de algum sistema de comunicação.
(En)Cena – O que é apraxia da fala? Por que algumas crianças com TEA apresentam essa dificuldade?
Maria Glória – Apraxia de Fala na Infância (AFI) é um importante distúrbio motor na fala (neurológico) caracterizado pela dificuldade no planejamento e programação motora para a fala. Onde existe uma falha no envio das informações do cérebro sobre como e quando os músculos devem movimentar os articuladores (lábios, língua, dentre outras estruturas usadas na fala) para produzir sons, palavras e frases. A AFI pode ocorrer de forma isolada, ou associada a síndrome ou aos transtornos do neurodesenvolvimento, como é o caso do Transtorno do Espectro do Autismo, por exemplo.
(En)Cena – Quais são os níveis de apraxia da fala e quais as características que os diferenciam?
Maria Glória – Sim, a AFI pode ter níveis diferentes de classificação, como leve, moderada e severa. De acordo com a ASHA (que seria a Associação Norte-americana de fala e Linguagem), esta classificação está relacionada ao grau de dificuldade apresentado nas três características mais consistentes nos quadros de AFI: erros inconsistentes em consoantes e vogais em produções repetidas de sílabas e palavras; transições coarticulatórias entre sons e sílabas mais longas e interrompidas; e prosódia inadequada (por exemplo: ressonância e entonação). E além dessas características existem outras relacionadas às habilidades motoras não verbais, habilidades linguísticas e desempenho educacional.
(En)Cena – Quais seriam os principais procedimentos adotados na clínica para o benefício da fala?
Maria Glória – Os procedimentos de qualquer acompanhamento terapêutico infantil, como o acolhimento da família junto à anamnese e avaliação detalhada, observações nos momentos de interações entre a criança, a família e o profissional, discussão inicial com a família sobre os achados e observações do período de avaliação para definir os objetivos e o constante contato entre a família e profissional.
(En)Cena – Quais os sinais de alerta para uma criança com TEA precisar fazer o tratamento fonoaudiológico?
Maria Glória – Na verdade, precisamos estar atentos ao comportamento das crianças, eu me refiro principalmente aos bebês durante o primeiro ano de vida. É necessário observar a forma como os bebês interagem com o mundo. Um ponto muito importante a ser observado são as interações sócio-comunicativas (troca comunicativa intencional) entre o bebê e seu cuidador, presentes antes da palavra dita, por volta dos seis meses de vida. Tenho como exemplo: as trocas de olhares entre os cuidadores e o bebê, o direcionamento da atenção para pessoas e com menos intensidade para objetos, a troca de sorrisos e sons, os comportamentos de imitação, o uso de gestos comunicativos, a diferenciação do balbucio, a atenção às convocações de fala (como se estivesse “conversando”) e as trocas que ocorrem durante as brincadeiras sociais.
(En)Cena – Quais seriam as principais recomendações realizadas à família diante da condição de apraxia da fala de um criança com TEA?
Maria Glória – Que este diagnóstico de Apraxia de Fala na Infância seja realizado por um profissional Fonoaudiólogo capacitado e com experiência em transtornos motores de fala e de linguagem.