Jogos violentos: efeitos psicológicos e comportamentais

Sangue, muito sangue. Cenários macabros. Tiros, socos e gritos. Lutas desleais. Atos de pura crueldade. Não, não estamos falando de filmes de terror (embora esta seja uma boa descrição de um), mas sim de jogos eletrônicos considerados violentos.

 

Foto: Assassin’s Creed 3 / Reprodução

 

Jogar é uma forma de lazer, entretenimento e, até então, fonte de alegria e descontração. Mas quando um jogo apresenta grande volume de violência, será que afeta o comportamento dos jogadores, a ponto de transformar o que era prazer em ódio?  “Acho que muitos são violentos e, sendo violentos, para mim todos estão no mesmo patamar. Olha, a violência já está dentro de cada pessoa. Isso vai muito da cabeça de cada um distinguir o que é real e o que é fantasia”, defende o jogador Tales Cavalieri, de 26 anos.

Para ele, “as pessoas que se influenciam por algum tipo de jogo violento tem problemas mentais e psicológicos e tem que procurar tratamento o quanto antes”. Cavalieri conta que tem vários jogadores que “como eu são ou foram viciados, mas até onde eu saiba, todos são normais em seus estados mentais e levam uma vida normal”.

Nas últimas semanas, o país acompanha as investigações para apurar como e porque o garoto Marcelo Pesseghini, de 13 anos, assassinou os próprios pais, a avó e a tia-avó, todos com tiros à queima-roupa, segundo a perícia, e depois se suicidou. O adolescente era membro de um grupo chamado “Os Mercenários”, inspirados no jogo “Assassin’s Creed”, o que pode ter, de certa forma, influenciado a cometer os homicídios. “Várias coisas podem ter influenciado esse comportamento. Uma das coisas que teria influenciado Marcelo a cometer os crimes foi o game “Assassins Creed”. Colegas relataram que desde abril ele vinha dizendo que mataria os familiares e fugiria para um esconderijo. Algo bem parecido com o personagem do jogo de videogame”, disse Arles Gonçalves, advogado que acompanha as investigações.

A Ubisoft, criadora do jogo “Assassin’s Creed”, divulgou nota de repúdio à ligação feita entre o jogo e o assassinato da família Pesseghini.

 

Veja o que jogadores assíduos pensam sobre jogos violentos:

“Eu zerei todos e nunca briguei na rua. Só briguei com um primo meu quando era criança e esses jogos nem existiam ainda. Jogo é jogo. Dizer que porque matei uma pessoa atropelada no GTA vai me motivar a passar por cima dos outros na rua, é brincadeira. Uma pessoa que está fazendo isso deve estar nesse estado de raiva por outras coisas que ninguém sabe e faz um ato absurdo. Cresci jogando CS, mas nunca peguei uma arma e sai metendo headshot (tiro na cabeça) porque era “top” (muito bom) fazer no jogo. Para mim, jogo é igual a filme e desenho. Assim como tem jogo de tiro, existem filmes e seriados sobre psicopatas que todo mundo gosta” – Moisés Bissoto, 22 anos.

“Isso vai de cada um. Para mim não faz diferença. Acredito que acaba influenciando, sim. Veja só, um jovem entre 13 e 16 anos acaba se empolgando um pouco com isso, mas também vai da educação dada pela família né” –Willian Santana, 30 anos.

 

 

Em entrevista ao portal (En)Cena a psicóloga Izabela Almeida Querido, especialista em Saúde Mental e Terapia Cognitivo-comportamental aplicada à crianças e adolescentes, explica como a exposição à estes softwares, muitas vezes proibidos pela justiça, pode afetar o comportamento dos jovens e como é feito o tratamento nestes casos.

 

(En)Cena – Quais os danos psicológicos que o consumo excessivo de jogos considerados violentos pode trazer para a vida dos jovens (usuários em geral)?

Izabela Querido –Em primeiro lugar, é preciso esclarecer que o excesso no comportamento de jogar, em especial os virtuais e violentos, nos aponta a uma disfuncionalidade e, para tal, é necessário analisar a função e motivadores desse comportamento. Isso é feito para cada caso, objetivando identificar e intervir nos fatores que o influenciam.

Outro aspecto importante é que os jogos em rede levam os adolescentes a passarem muito tempo no computador. Existem jogos online onde o indivíduo necessita de no mínimo uma hora e trinta minutos de frequência no jogo para continuar inscrito, uma quantidade de membros convidados para receber gratificações, e etapas do jogo a serem vencidas que levam horas.

 

(En)Cena – Até que ponto um jogo ou programa deste tipo pode influenciar um jovem a cometer atos violentos?

Izabela Querido –Esse comportamento, tão comum em nossos jovens hoje, quando disfuncional pode levar a alterações na socialização (passa a ser apenas no ambiente virtual e/ou condicionada ao jogo), no tempo em que dedica às outras atividades (estudo, atividades domésticas, esporte, lazer, entre outras). Pode ainda estimular outros comportamentos disfuncionais no indivíduo, como exemplo o manejo da raiva, e/ou características de sua personalidade que levam a sofrimentos psíquicos. Os jogos muitas vezes permitem uma realidade (virtual/imaginária) onde se pode ser, pensar e agir como se verdadeiramente é ou ainda de uma maneira diferente à do mundo “real” e que é desejada pelo indivíduo (mais corajoso, uma pessoa de sucesso, etc.).

 

(En)Cena – Existe algum tipo de tratamento psicológico para pessoas com vício em jogos?

Izabela Querido –Em nossos atendimentos esse é um tema muito corriqueiro, seja na clínica e na escola quando falamos das crianças e adolescentes. Ou ainda de adultos que procuram psicoterapia no intuito de trabalhar o “vício” em jogos. Como primeiro passo, retomo a orientação inicial de investigar o que esta acontecendo com essa pessoa e quais são os fatores e ambientes envolvidos nessa situação disfuncional. Todo comportamento só é mantido por que existem consequências reforçadoras.

 

(En)Cena – Como a Psicologia trata casos como este do garoto que cometeu homicídios contra próprios familiares e depois tirou a própria vida?

Izabela Querido –O psicólogo, de posse desses conhecimentos, estabelece um plano terapêutico. Segundo sua orientação de trabalho e com o que melhor se aplica ao caso, ele prepara intervenções e técnicas a serem utilizadas no acompanhamento psicológico.

 

(En)Cena – O consumo de um jogo com atos de crueldade pode ter influenciado o jovem a matar os familiares?

Izabela Querido –Não é possível determinar com precisão, numa visão superficial do caso, quais os motivadores do comportamento desse jovem em especial. Mas podemos observar que não há um fator apenas. É necessário conhecer e avaliar cada caso.

 

GTA (Grand Theft Auto)

Saiba mais:

GTA (Grand Theft Auto) é um jogo que explora a violência (roubo, homicídio) e a prostituição e sempre foi alvo de críticas contra a sua temática, causando processos/protestos contra a criadora.

CS (Counter Strike) – É um jogo de tiro em primeira pessoa baseado em rodadas no qual equipes de contra-terroristas e terroristas combatem-se até a vitória.

Segundo estudo, jogos violentos não levam a conduta antissocial:http://games.terra.com.br/jogos-violentos-nao-levam-a-conduta-antissocial-diz-estudo,b73e40b1b9faf310VgnVCM3000009acceb0aRCRD.html

Confira: 10 dos jogos mais violentos e polêmicos da históriahttp://www.gamevicio.com/i/noticias/162/162067-10-dos-jogos-mais-polemicos-e-violentos-da-historia-1/index.html

Leia também: 5 jogos que sofreram censura ou foram banidos http://criticalhits.com.br/5-jogos-que-sofreram-censura-ou-foram-banidos-parte-3/