Tenho CNH, mas não dirijo!

Um dos ritos de passagem para a vida adulta é a conquista da Carteira Nacional de Habilitação (CNH). No entanto, a aquisição não representa, necessariamente, uma alegria na vida de pessoas que fizeram todo o processo, passaram nas provas, mas não se sentem seguras de sentar à frente do volante e sair dirigindo carro ou moto.

Entre os fatores que impedem o condutor estão o medo, a ansiedade e a própria insegurança. Adrielly Rodrigues, 24 anos, é um exemplo neste caso. Há mais de um ano habilitada não consegue conduzir um veículo normalmente. Dificuldade que ficou evidente ainda na época da formação como motorista. Na auto-escola, a estudante apresentava nervosismo nas aulas, “tinha pressa para acabar aquilo, ficava agoniada”, desabafa.

Adrielly não tem veículo próprio e prefere não dirigir, mas quando precisa  pegar o volante, ela começa um ritual de orações durante todo o trajeto. Veja alguma das suas desventuras. “A moto apagou no sinal uma vez e eu fiquei muito nervosa com tantos carros atrás de mim. Sai empurrando a moto para o canteiro, com medo. Já foi o caso de eu passar em todos os sinais vermelhos com medo de parar e voltar marcha e a moto apagar”.

Para entender a situação vivida por pessoas como Adrielly, a equipe do Portal (En)Cena entrevistou a empresária Nárryma Máximo, responsável por uma escola de formação de condutores. Ela busca ajudar aqueles que enfrentam problemas envolvendo o medo de dirigir.

Nárryma Máximo, Diretora de Ensino da empresa Reforço – Treinamento para Condutores Habilitados
Foto: Arquivo Pessoal

(En)Cena – Em média, quantas pessoas vocês atendem?

Nárryma Máximo – A empresa Reforço – Treinamento para Condutores Habilitados está no mercado tocantinense há apenas nove meses. Nesse período, atendemos uma média de cinco alunos por mês. A quantidade reduzida de aluno é para ajudar no acompanhamento individual, o que melhora a aprendizagem.

(En)Cena – O que vocês fazem para ajudar os clientes (serviços)?

Nárryma Máximo – Nossos clientes possuem diferentes deficiências de aprendizagem veicular. Nosso trabalho consiste em identificar essas diferenças através de avaliação prática e mapear psicologicamente como está o grau de medo e receio de dirigir desse aluno. Todo o mapeamento psicológico é feito de acordo com o Instituto Paulista de Déficit de Adenção (IPDA). Após o mapeamento é feito um plano de aula, de acordo com a deficiência encontrada. Se o grau psicológico quanto ao medo de dirigir é bastante elevado o aluno é encaminhado para uma sessão com psicólogo competente. O que fazemos com nossos clientes é levar gradativamente eles para o trânsito. É preciso ter noção de estacionamento, espaço, velocidade, enfim ter controle sobre o carro. Dirigir não é receita de bolo, é preciso sentir o ambiente ao qual o motorista está inserido.

(En)Cena – Quando são procurados, qual é o estado da pessoa (físico e mental)?

Nárryma Máximo – Temos dados de que cerca de 90% dos nossos alunos tem medo moderado de dirigir, o que acontece mais frequentemente pela falta de prática de direção veicular. Outro agravante é a família e os amigos. Zombar de um motorista que não tem experiência ao volante é a pior atitude que alguém pode tomar. A pessoa se sente incapaz.

(En)Cena  Quem mais procura os seus serviços? Homens ou mulheres?

Nárryma Máximo – Os dados de nossa pesquisa dizem que 95% dos nossos alunos efetivos são mulheres. Os homens chegam até a procurar o serviço, mas grande maioria não chega a efetivar um horário.

(En)Cena –  Os seus clientes são motoristas recentes com em média um ano de habilitação ou são veteranos no volante?

Nárryma Máximo– Grande parte dos nossos alunos tem mais de cinco anos habilitação. É quando eles vão renovar o processo de CNH que se deparam que ainda não tem prática de direção e acabam nos procurando. Os recém habilitados são apenas 10% do todo.

(En)Cena – Para finalizar, cite algum exemplo (não precisa citar nomes) do serviço prestado para algum cliente. Como ele chegou e como saiu depois de concluir o procedimento?

Nárryma Máximo – Temos um caso de uma cliente que assim que tirou habilitação foi entrar na garagem de sua casa com o carro, errou o pedal de freio, pisou no acelerador e acabou acertando o muro em cheio. O carro teve perda total e ela ficou seis anos com o trauma. Seis anos depois do acontecido, ela resolveu nos procurar. O trabalho foi intenso. Muita conversa e exercícios para que voltasse a ter confiança em dirigir. Hoje ela dirige em Palmas e já nos relatou que foi até no estado do Maranhão dirigindo, sem a ajuda do esposo.

Outro caso bastante interessante é o da aluna que se mudou recentemente para Palmas. Com habilitação há quatro anos, ela disse que nunca tinha dirigido porque morava perto de tudo que precisava e quando queria fazer algo mais longe da sua casa pedia ao esposo. Com a mudança de cidade e de rotina ela se viu em uma realidade jamais vista, morando longe de tudo, principalmente da tão querida Padaria. A aluna era fanática por pão quentinho, mas o marido trabalhando a noite, só acordava tarde. Desta forma ela resolveu nos procurar. Assim que pegou o carro, já sem a nossa ajuda ela nos ligou e falou: hoje eu comi pão quentinho.