Marcos Carneiro – (Jornalista e servidor público federal )girassolpalmas@gmail.com
A vida é um tema cuja explicação é tão desejada, buscada, estudada em todos os seus aspectos. Fisiológicos, espirituais, psicológicos. Mas há algo além da vida, e não é o que vem depois da morte não, tá?
Há a existência humana. Essa sim é uma expressão que pode até ser chamada ou confundida com a alma, para os crentes na continuação após a morte. Viver é respirar, comer, dormir. Existir é ser. Ser alguém, ser algo com significado, para os outros e, principalmente, pra você mesmo. Só de se ter a consciência da diferença entre esses dois conceitos, vida e existência, o aventureiro já se atreve a enveredar por essas condições humanas, num labirinto do qual, raramente sai ileso.
Esse labirinto pode virar até uma espiral sem fim. Um buraco onde a queda é livre, e como no mito de Sísifo, não há fim. A existência, como uma condição complexa do ser humano, sempre me atraiu. Mas quando me deparei com mais outro fato da vida, que é a finitude, não tive como fugir, mesmo que em minha limitada capacidade de homem ordinário, de minha existência. Sim, porque só posso falar da minha. E esses pensamentos vão de como a esse labirinto, e essa jornada me afetam, me significam para mim e para os outros e, em especial, para aqueles que amo e que são ligados à minha existência. Para o bem e para o mal.
Fonte: Frecpik.com
A existência perfaz o caminho da filosofia, da antropologia, e de tantas outras ciências do homem, num emaranhado de significados que levam a um único lugar: o autoconhecimento, ou para os mais religiosos, a maçã que Eva deu para Adão.
Eu entrei na espiral, no labirinto. Não caí no buraco ainda mas, por vezes, gostaria que minha busca fosse a “de um sono tranquilo”, como canta Maria Bethânia, no dueto com Chico Buarque, na música Sinal Fechado (1975), e me entregar ao ócio livre de pensamentos existenciais, e ser levado pelo doce cotidiano alienante. Mas como o tempo, que se diz “rei”, a existência é uma estrada de mão única.
Questioná-la é um jogo perigoso de questões como “minha existência importa para quem?”, “ela, além das intempéries da vida, também dá alento, paz, prazer?” “E para quem?”
Vou dizer-lhes, meus caros, que a existência é algo importante para você, mas é o que ela representa para quem você ama, que realmente o coloca na berlinda entre a solidão e o alento.
Minha mãe vive, hoje, um processo degenerativo, uma espécie de demência que, aos poucos, a torna outra pessoa, completamente diferente daquela que eu tanto idealizava. Quando a vi, após os sintomas começarem a aparecer, eu me enlutei. Mas como se pode enlutar por alguém, cujo prognóstico não é a morte próxima.
Demorou muito, mas percebi que o luto era por mim, não por ela. Era pelo ideal de mulher, e por aquela segurança emocional/afetiva que eu acreditava que seria imune a esse tipo de condição. Eu, aos 42 anos, seria aquele que cuida e não o que é cuidado e, para muito além disso, ter saído de casa aos 17 anos, e não ter acompanhado tantos momentos da vida dela, me trouxe a consciência da finitude das coisas e, consequentemente, sua existência. A dela e a minha. A minha para ela.
Sempre andei pelo mundo, no conforto de que a minha família estava no mesmo lugar e que, quando eu precisasse, era só correr para lá. Mas o amor não é a existência. Minha mãe me ama, mas quando me visita é nítido, num breve período, que ela já quer voltar, e não para a casa dela, mas para a existência daqueles que sempre estiveram com ela. Arrependo-me de pouquíssimas coisas, mas não ter deixado a existência dela se cruzar com a minha, de uma forma mais duradoura, é a angústia do que se perde para sempre.
O tempo leva tudo pra frente. A vida, a existência, as relações, e essa é a dinâmica nossa, do mundo. Mas, há vezes em que a roda do destino podia girar ao contrário.