Cansaço mental e Instagram

A falsa teoria do descanso nas redes sociais

 

Glaub Santos – glaubsantos@rede.ulbra.br

 

Vivemos em um tempo de extrema sobrecarga de informações, não importa a idade, o status social, renda, ou qualquer outro parâmetro, estamos sendo bombardeados a todo tempo por uma quantidade enorme de informações, sobre uma infinidade de temas, dos mais relevantes aos mais banais, passando a todo instante diante dos nossos olhos, seja por meio da televisão, dos aplicativos de celular, das redes sociais ou até mesmo por propagandas.

Atualmente, o desenvolvimento tecnológico tem um papel importante em nossa forma de trabalho e relacionamento, que se tornaram cada vez mais exigentes não apenas para o corpo, mas também para a mente. A necessidade de resolução de problemas complexos, aliada à facilidade de comunicação proporcionada pela tecnologia, faz com que o trabalho deixe de estar restrito ao ambiente físico e passe a integrar todo o tempo dos indivíduos. Além disso, a quantidade de informações disponíveis também contribui para essa sobrecarga, aumentando a demanda por capacidade cognitiva e adaptabilidade para lidar com as mudanças constantes.

Fonte: Foto de Mikael Blomkvist no Freepik

Nos submetemos a maiores jornadas de trabalho, a duplas; triplas jornadas, para atender às nossas necessidades financeiras e realizações almejadas, porém, isto tem um custo: nossa mente trabalha em seu limite, e por vezes se cansa muito mais que o nosso corpo. Por estarmos sempre a resolver uma quantidade enorme de problemas das empresas, junto com nossos problemas pessoais e familiares, experimentamos a vida em um constante estado de alerta, e a todo instante se faz necessário decidir entre algo que se nos é apresentado.

Herbert Simon, ganhador do prêmio Nobel, buscava uma palavra que representasse o que seria para a sociedade como sendo algo bom o suficiente, que daria pro gasto, não a melhor escolha dentre todas as inúmeras opções que se tem. Assim Herbert emprega o termo satisficing, uma opção que nos seja satisfatória, que para aquele momento supra as nossas necessidades, pois não temos tempo, nem energia para testar e comprovar qual realmente representa a melhor opção, o que nos traria um desgaste cognitivo ainda maior. (LEVITIN, 2015)

Se a cada momento experimentamos a necessidade de escolher, dentre coisas mais simples a realidades mais complexas e elaboradas, tudo isso nos gera desgaste e em certa medida também nos gera desconforto. Nenhuma outra época na história da humanidade fomos expostos a tantas demandas no período de um só dia, o homem não precisa mais lidar com o medo das grandes feras que o fazia viver em estado de alerta, preparado para a caça e para sobrevivência, no entanto, na atualidade, vivemos imersos no estresse das demandas incalculáveis e mesmo que não tenhamos mais um grande predador a nos caçar, vivemos taquicardia, angústia, preocupação excessiva e medo da morte em situações que claramente não se há risco real de morte, sintomas estes tão comuns em transtornos de ansiedade. (LEVITIN, 2015)

Conforme dados do último grande mapeamento feito pela OMS, o Brasil se encontra no primeiro lugar dentre os países com maior prevalência de transtornos de ansiedade, com alarmantes 9,3% da população vivendo em sofrimento psíquico (G1, 2023), sem contar os demais transtornos que têm consequências profundas não somente na vida dos indivíduos como na sociedade como um todo.

Grande parte da população trabalha com computadores, celulares ou em funções que demandam grandes exigências físicas, cumprindo cerca de 40 horas por semana, se expondo a incontáveis estímulos, além de suas demandas padronizadas. Quando finalmente chega o momento de desacelerar, estes trabalhadores consomem seu tempo de descanso aplicando-o nas redes sociais, como facebook e Instagram, buscando um “descanso” para mente e corpo, no entanto, pelo excesso de informações, os cérebros são hiperestimulados.

Esses fatores podem provocar mudanças  no  padrão  de  sono que podem desencadear um quadro de privação de sono, e consequentemente, a curto prazo, levar a um aumento da sonolência diurna, mau humor, cansaço, dor de cabeça, baixo desempenho acadêmico e no trabalho, e ,a longo prazo, pode provocar doenças cardiovasculares e o câncer. (BELÍSIO, 2015, p. 89)

Fonte: Foto de SHVETS production no Freepik

A privação de sono é caracterizada pela falta de tempo adequado de sono, podendo ser devida a diversos fatores, tais como trabalho noturno, estresse, ansiedade, entre outros. A falta de sono pode levar a diversos efeitos negativos na saúde, como fadiga, dificuldade de concentração, diminuição do desempenho cognitivo, alterações de humor, além de aumentar o risco de acidentes e doenças crônicas, como a obesidade e diabetes. Segundo a Associação Brasileira do Sono (ABS), um adulto saudável necessita em média de 7 a 9 horas de sono por noite (ABS, 2021). Portanto, é importante manter um sono adequado e evitar a privação de sono, buscando hábitos saudáveis e aconselhamento médico quando necessário.

Tais problemas já citados causados por privação de sono, por vezes podem ser regulados por coisas simples que podem ser feitas no tempo de descanso que temos, como atividade física regular, musculação, funcional, corrida, natação, ciclismo, caminhada, inúmeras possibilidades, tendo também outras atividades como meditação, dança, teatro.

Atualmente, as redes sociais são supervalorizadas, tanto como meio de trabalho como vender produtos de patrocinadores e ser influenciador digital – quanto como meio de busca ou descanso entre as atividades diárias. Nos últimos anos, houve uma grande mudança na forma como os anúncios são veiculados, sendo cada vez mais direcionados para perfis específicos com o objetivo de aumentar o consumo.

A cada dia tem sido criada uma nova forma de ser e de estar no ambiente digital, e as crianças cada vez mais cedo vão entrando neste universo, e por vezes a negligência dos pais gera comportamentos de uso exacerbado de telas, que a curto prazo fazem com que a criança perca o interesse em outras atividades que não emitam tanta dopamina (hormônio do prazer) quanto estar exposto a uma gama de possibilidades praticamente infinitas. A longo prazo cria viciados em celular, ou pessoas com grande dificuldade de se relacionar de forma presencial, pessoas inseguras, e com grande tendência ao imediatismo, e busca exacerbada do prazer pelo prazer. (LIVINGSTONE; HELSPER, 2008)

Para a baixa maturidade de uma criança não haverá a capacidade cognitiva necessária para pensar que aquilo que agora está muito bom, pode gerar grandes problemas no futuro, cabe então aos cuidadores dar exemplo para as crianças de como viver e experimentar o descanso e o lazer de formas prazerosas sem riscos à integridade.

Fonte: Freepik

Podemos sim fazer uso das redes sociais como forma de interação com a sociedade, como encurtador de distância entre os que sentimos afeto, no entanto, há um grande risco em usá-la como descanso, pois nosso cérebro não é capaz de recebê-la da forma como pensamos, recebe as redes sociais como mais um momento de selecionar informações às quais vai dar atenção, e para quais não dará, buscando memórias de coisas que já vimos e se parecem com o que tivemos contato agora, o que ao contrário descansar pode causar desgastes.

 

Referências:
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DO SONO. Distúrbios do Sono. Disponível em: <https://www.absono.com.br/disturbios-do-sono/>. Acesso em: 04 mai. 2023.

BELÍSIO, Aline Silva. Dormir bem: uma questão de saúde. Revista Humano Ser, v. 1, n. 1, p. 88-98, 2015.

CARVALHO, Rone. Por que o Brasil tem a população mais ansiosa do mundo. G1, 27, de fevereiro de 2023. Disponível em: https://g1.globo.com/saude/noticia/2023/02/27/por-que-o-brasil-tem-a-populacao-mais-ansiosa-do-mundo.ghtml

LEVITIN, Daniel J. A mente organizada: como pensar com clareza na era da sobrecarga de informação. Objetiva, 2015.

LIVINGSTONE, Sônia; HELSPER, Ellen J. Mediação parental do uso da internet pelos filhos. Journal of broadcasting & electronic media , v. 52, n. 4, pág. 581-599, 2008.