O problema que a criança estabelece com relação à ingestão de alimentos por não apresentar comportamentos de consumação de alimentos na quantidade adequada ou uma variedade apropriada de comida para ganhar peso e crescer é descrito na literatura como ‘recusa alimentar na criança’. Embora a não ingestão alimentar seja mais comum para o consumo de frutas e vegetais, pode haver recusa parcial ou total de outros tipos de alimentos. Este tipo de problemas alimentares é freqüente e atingem cerca de 25 a 30% das crianças, mas só em 1% se pode considerar um problema grave (Piazza, Patel, Gulotta, Sevin & Layer, 2003).
Vários estudos sugerem que procedimento baseados no reforçamento pode ser efetivo para aumentar o consumo alimentar, conforme proposto pelos estudos de Gulotta, Piazza, Patel e Layer (2005). Estes autores demonstraram que os procedimentos baseados tanto no reforçamento positivo quanto no reforçamento negativo voltado tipicamente para crianças com recusa grave alimentar, obtiveram resultados de sucesso ao engolir o alimento.
Riordan, Iwata, Wohl e Finney (1980), trataram a recusa alimentar e seletividade de alimentos em duas meninas com problemas no desenvolvimento, utilizando comidas preferidas como reforçador para consumir comidas que não tinham preferência.
Fonte: http://poliananutricionista.blogspot.com.br
Em estudos similares, Riordan, Iwata, Finney, Wohl, e Stanley (1984), utilizaram o reforçamento positivo como tratamento em quatro crianças com deficiência. Sugeriram que o reforçamento positivo sozinho poderia ser responsável pelo aumento da freqüência alimentar em três dos participantes, e outro procedimento que era de forçar o alimentar-se foi feito com o outro participante.
Os estudos de Riordan e cols. (1980; 1984) demonstraram que o reforçamento positivo com comestíveis pôde ser estabelecido nestes participantes porque já existia algum repertório alimentar, ou seja, os participantes destes estudos apresentavam uma seletividade de comidas, no qual ingeriam algumas comidas e outras não, ao invés de recusar totalmente o alimento.
Fonte: guiadobebe
Ainda, Viana e colaboradores (2008) investigaram o comportamento alimentar de um grupo de crianças com perturbações alimentares. Avaliaram 124 crianças dos dois sexos com idades entre os 3 e 13 anos, sendo que 26 tinham perturbações alimentares, 33 eram normo-ponderais, 32 tinham excesso de peso e 33 eram obesas. Chegaram a conclusão que os quatro grupos se distinguiam quanto ao comportamento alimentar. Os fatores classificados como de atração pela comida associam-se positivamente às categorias de peso, enquanto os fatores de recusa alimentar se associam negativamente com as mesmas categorias. Os resultados confirmam a interesse da investigação sobre o estilo alimentar não só na obesidade mas também nas perturbações alimentares.
Os genitores e/ou cuidadores apresentam comportamentos ansiosos acerca da ingestão alimentar e recusa alimentar das crianças, gerando conflitos manifestados por sentimento de culpa, incompetência e frustração. Com isso, decorre o emprego de estratégias coercitivas e controladoras na alimentação das crianças (Kachani, 2005).
As genitoras também apresentam comportamentos ansiosos pela administração de alimentos conforme o seu julgamento do que é reforçador para criança se alimentar. Para Salve e Silva (2009), as mulheres demonstram seu conhecimento através da chamada “sabedoria popular” e, a partir disso, definem o que é ou não adequado para o filho. Dessa forma, sentem-se seguras para continuar seguindo suas próprias percepções em relação à alimentação da criança.
Pesquisar sobre a alimentação das crianças e o significado de recusa alimentar no processo de recuperação do apetite significa, então, interrogar sobre os valores que orientam a alimentação e a saúde das pessoas. É considerar que os genitores, figuras determinantes na educação alimentar e no trato à saúde infantil, trazem consigo experiências, vivências e um pensar que influenciam de maneira significativa essas atitudes, que serão aprendidas pela criança por modelagem, modelação ou instrução e levados para a vida adulta (Simon, Souza & Souza, 2003; Chuproski & Mello, 2009).
Uma vez que recusa alimentar pode ser um déficit comportamental, apresentado muitas vezes em forma de inabilidade, os esquemas de reforço pela passagem do tempo poderiam ser utilizados. Estes esquemas ensinam as crianças a esperarem por um determinado período de tempo ou emitirem baixo número de respostas para terem acesso a reforçadores. Isto seria possível através do uso de esquemas de reforço de Intervalo Fixo (FI) e Intervalo Variável (VI). Outros esquemas de reforço também podem ser utilizados no tratamento de crianças com recusa alimentar. Procedimentos utilizando reforço diferencial têm sido amplamente usados para reduzir comportamentos inapropriados e treinar repertórios socialmente eficazes, tais como reforço diferencial de outro comportamento (DRO), reforço de comportamentos alternativos (DRA) e reforço de comportamento incompatível (DRI) (Catania, 1999; Millenson, 1975).
Referências
Catania, A. C. (1999). Aprendizagem: comportamento, linguagem e cognição. Tradução organizada por D. G. Souza. 4ª Edição. Porto Alegre: Artmed. (Trabalho original publicado em 1998).
Chuproski, P. & Mello, D. F. Percepção materna do estado nutricional de seus filhos. Rev. Nutr. Campinas, v. 22, n.6 , nov./dez. 2009.
Gulotta, M. R., Piazza, C. C., Patel, C. S. & Layer, S. A. (2003). Using food redistribution to reduce packing in children with severe fod refusal. Journal of Applied Behavior Analysis, 38, 39-50, n 1.
Kachani, A. T.. Seletividade alimentar da criança. Pediatria, São Paulo-SP, v. 27, n. 1, p. 48-60, 2005.
Millenson, J. R. (1975). Princípios de análise do comportamento (A. A. Souza & D. Rezende, Trad.). Brasília: Coordenada: Editora de Brasília (Obra original publicada em 1967).
Piazza, C. C., Patel, M. R., Gulotta, C. S., Sevin, B. M. & Layer, S. A. (2003). On the relative contributions of positive reinforcement and escape extinction in the treatment of food refusal. Journal of Applied Behavior Analysis, 36, 309-324, n 3.
Riordan, M. M., Iwata, B. A., Finney, J. W., Wohl, M. K., & Stanley, A. E. (1984). Behavioral assessment and treatment of chronic food refusal in handicapped children. Journal of Applied Behavior Analysis, 17, 327–341.
Riordan, M. M., Iwata, B. A.,Wohl, M. K., & Finney, J.W. (1980). Behavioral treatment of food refusal and selectivity in developmentally disabled children. Applied Research in Mental Retardation, 1, 95–112.
Salve, J. M. & Silva, I. A. Representações sociais de mães sobre a introdução de alimentos complementares para lactentes. Acta Paul Enferm, v. 22, n. 1, p. 43-48, 2009.
Simon, V. G. N.; Souza, J. M. P. & Souza, S. B. Introdução de alimentos complementares e sua relação com variáveis demográficas e socioeconômicas, em crianças no primeiro ano de vida, nascidas no Hospital Universitário no município de São Paulo. Rev. Bras. Epidemiol., v. 6, n. 1, p. 29-38, abr. 2003.
Viana, Victor, Guerra, Paula, Coelho, Alda Mira, Almeida, Paulo, Guardiano, Micaela, Vaz, Rute, & Guimarães, Júlia. (2008). Caracterização do estilo alimentar de crianças com perturbações alimentares. Psicologia, Saúde & Doenças, 9(2), 233-243. Recuperado em 21 de janeiro de 2018, de http://www.scielo.mec.pt/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1645-00862008000200004&lng=pt&tlng=pt.