Manejo da Ansiedade pela Terapia Cognitivo Comportamental

Fabiola Bocchi– Psicóloga Clínica – E-mail: fabiolabocchi@hotmail.com – Instagram:  @fabiola.bocchi

 

No transcorrer da nossa existência, experimentamos maiores ou menores níveis de ansiedade, de raiva, medo e preocupação, principalmente quando estamos diante de situações novas, difíceis ou que sejam importantes pra nós. Sendo assim, a ansiedade é uma manifestação fisiológica intrínseca e necessária ao ser humano, que exerce um papel gerador de motivação, estimulando os sujeitos a se prepararem para encarar as situações da vida. Além disso, ela é super importante para lidar com situações que ameacem ou desafiem os sujeitos. Segundo Barlow, ela é um sinal de alerta sobre perigos iminentes e capacita o indivíduo a tomar medidas necessárias para enfrentar os perigos presentes.

O problema está em quando esta reação natural perde sua função adaptativa e protetiva e torna-se patológica. Este sentimento estimula o indivíduo a entrar em ação, contudo, exageradamente, o que ocasiona exatamente o contrário do que se espera, impedindo que o sujeito aja de forma eficaz para resolver a situação.

Com a crescente globalização, o atual avanço tecnológico e o ritmo de vida do mundo contemporâneo, o crescente número de exigências, expectativas e pressões existentes sobre os indivíduos, traz dificuldades para os sujeitos se comportarem de forma saudável e equilibrada neste novo cenário que se apresenta.

Fonte: Imagem no Freepik

Os transtornos de ansiedade acometem pessoas que, geralmente, se preocupam intensamente .

Sendo assim, a ansiedade patológica acontece quando a preocupação se  manifesta de forma que se torna de difícil controle e produz um mal-estar significativo em várias áreas importantes da vida do sujeito, como no âmbito social, acadêmico, profissional, afetivo, etc. Segundo o DSM-5, o sintoma é de intensa inquietação e de uma preocupação desproporcional à situação ou ameaça, com intensidade e duração consideráveis (durante pelo menos 6 meses) causando grande sofrimento, prejuízos e comprometimento na vida diária da pessoa acometida, onde as preocupações decorrentes do problema sejam constantes e duradouras, a ponto de consumirem grande parte do seu tempo, impossibilitando o controle destes pensamentos intrusivos.

Existem algumas categorias dentro dos Transtornos de Ansiedade, como a ansiedade generalizada, pânico, transtorno obsessivo-compulsivo, fobias e estresse póstraumático. Para que o indivíduo possa ser diagnosticado com algum destes transtornos, é necessário que os sintomas apresentados por ele cumpram os critérios diagnósticos definidos nos manuais de Psiquiatria.

O tratamento para pessoas com transtornos de ansiedade se dá através de uma      intervenção profissional adequada, com psicoterapia combinada (se necessário) com tratamento farmacológico. A Terapia Cognitivo Comportamental é uma prática baseada em evidências e foi considerada especialmente eficaz no tratamento dos transtornos de ansiedade. Esta abordagem amplamente reconhecida como o “padrão ouro” nos tratamentos de ansiedade, pois nenhum outro tipo de terapia possui tantas pesquisas que apoiem sua eficácia.

A TCC tem como princípio fundamental investigar a maneira como os indivíduos percebem e processam a realidade influenciará a maneira como eles se sentem e se comportam. O foco do tratamento TCC é encontrar soluções práticas para os gatilhos e sintomas de ansiedade que uma pessoa está experimentando. As sessões de TCC consistem em ensinar habilidades às pessoas para interromper e mudar pensamentos e comportamentos negativos ou problemáticos que ajudam a manter os sintomas e trazer prejuízos na saúde mental dos sujeitos. Os terapeutas cognitivo-comportamentais  tendem a ser mais estruturados em sua abordagem, com foco na solução, usando sessões para ensinar habilidades e conceitos específicos da TCC e encorajando o cliente a aplicar o que aprenderam entre as sessões, sempre de uma forma colaborativa entre cliente e terapeuta, buscando a melhor direção para atingir os objetivos.

As primeiras sessões de TCC podem abranger muitos detalhes, pois são as sessões avaliativas. O profissional tentará obter o maior número possível de dados em  uma anamnese minuciosa, com o máximo possível de informações relevantes para obter uma compreensão completa do cliente, seus sintomas e seus objetivos dentro da terapia. Eles também delinearão as expectativas de tratamento e um curso de tratamento proposto, tudo sendo feito de forma colaborativa entre cliente e profissional. Todas as sessões iniciais de terapia devem ter uma discussão sobre confidencialidade, consentimento e combinados relevantes ao tratamento. O plano de tratamento deve incluir metas realistas com um cronograma provisório de conclusão. Deve ser modificável e referido frequentemente nas sessões.

Fonte: Imagem de Mohamed Hassan por Pixabay

O foco do tratamento da Terapia Cognitivo Comportamental é encontrar soluções práticas para os gatilhos e sintomas de ansiedade.

As principais técnicas utilizadas dentro desta abordagem são:

          Psicoeducação da Ansiedade

 É importante fornecer uma psicoeducação para que o cliente entenda sobre seu transtorno de ansiedade específico, como os sintomas se formam, como eles são mantidos e o curso de ação proposto. Essa fase do tratamento pode levar apenas alguns minutos ou algumas sessões, dependendo da complexidade da situação e da compreensão de sua ansiedade.

        Registro de Pensamentos Disfuncionais- RPD 

Pedir ao cliente para registrar seus pensamentos, sentimentos e comportamentos é uma ferramenta de TCC usada com frequência. O processo pode ajudar o cliente a entender a si mesmo e sua experiência, mas também pode ajudar o terapeuta a entender melhor a pessoa e seu ponto de vista.

  • Pensamentos – especialmente durante os momentos em que experimentam estresse ou ansiedade (por exemplo, quaisquer pensamentos “e se” que aumentam a ansiedade)
  • Emoções – experimentadas e a intensidade dessas emoções (por exemplo, leve nervosismo versus pânico total);

Comportamentos e reações quando ansiosos, e quaisquer consequências ou recompensas a que esses comportamentos levam exemplo, perceber a evitação alivia a ansiedade de curto prazo, mas aumenta a ansiedade de longo prazo);

  • Circunstâncias externas ou internas que causam pensamentos, sentimentos e respostas específicas (por exemplo, ansiedade desencadeada por certas situações sociais ou ao pensar sobre o desconhecido);

        Reestruturação de pensamentos 

Reestruturar é uma habilidade que envolve interromper um pensamento desadaptativo e tentar repensá-lo de uma maneira mais útil. Por exemplo, uma pessoa pode reformular um pensamento ansioso sobre uma próxima consulta médica pensando nas maneiras como isso pode beneficiar sua saúde.

A reestruturação cognitiva pode ajudar as pessoas a ajustar seus pensamentos de forma a reduzir a ansiedade e levar a respostas mais eficazes, ajudando a pessoa introduzir padrões de pensamento mais racionais durante os momentos em que o pensamento de uma pessoa se tornou excessivamente emocional.

        Avaliação e teste de pensamentos

 Desafiar pensamentos envolve testar a precisão de um pensamento por meio de processos racionais, como listar evidências de que o pensamento é verdadeiro ou falso ou considerar outras explicações viáveis. Pensamentos ansiosos desafiadores podem reduzir a ansiedade e também reduzir decisões irracionais e impulsivas durante momentos de estresse ou preocupação.

Por exemplo, listar as evidências a favor e contra uma certa crença ou suposição é um método comum da TCC para desafiar pensamentos disfuncionais. Essa habilidade pode ajudar as pessoas a reconhecer quando seus pensamentos podem estar distorcidos por causa de sua ansiedade, em vez de acreditarem automaticamente que são verdadeiros.

        Exposição comportamental

 Como as pessoas ansiosas tendem a evitar situações que as deixam ansiosas, as tarefas de exposição são frequentemente recomendadas para limitar a evitação, reduzir a ansiedade e aumentar a confiança. Tarefas de exposição envolvem o enfrentamento gradual de situações temidas e a construção de situações mais intensamente temidas e evitadas.

Por exemplo, uma pessoa com medo de falar em público pode começar praticando um discurso na frente de um ou dois amigos e progredir para um pequeno grupo no trabalho. Os terapeutas da TCC também ensinam habilidades de relaxamento aos clientes (como respiração profunda ou relaxamento muscular) para se preparar para essas exposições. As exposições funcionam ajudando as pessoas a ganhar confiança em sua capacidade de enfrentar seus medos, ao mesmo tempo em que desenvolvem as habilidades para gerenciar melhor sua ansiedade.

Outro exemplo é o terapeuta auxiliar o indivíduo a identificar padrões de procrastinação, quando e onde é mais provável que eles apareçam e como resistir aos impulsos de procrastinar. Assim sendo, uma pessoa pode ser incentivada a dividir a tarefa em partes menores que sejam mais fáceis de concluir, em vez de fazer a tarefa toda de uma vez.

       Solução de problemas

 A solução de problemas envolve os clientes sendo encorajados a pensar nas opções e avaliar as possíveis consequências de curto e longo prazo de cada opção. Como muitos comportamentos motivados pela ansiedade são focados apenas em encontrar alívio de curto prazo, essas habilidades são necessárias para ajudá-los a tomar melhores decisões.

Por exemplo, cancelar planos pode ser tentador para alguém com ansiedade social porque significaria evitar uma situação desconfortável, mas pode levar ao isolamento, depressão e ainda mais ansiedade social a longo prazo. O uso de uma abordagem de solução de problemas pode identificar essas consequências com antecedência, ajudando a pessoa a evitar uma má escolha no momento.

          Ativação Comportamental

 A ansiedade tende a tornar as pessoas menos ativas social e comportamentalmente. As pessoas podem pensar que fazer menos e evitar seus problemas diminui a ansiedade, mas na verdade aumenta os sintomas. Portanto, os terapeutas trabalharão para que a pessoa vá a lugares, faça coisas e se envolva com outras pessoas para diminuir o impacto da ansiedade.

         Habilidades de relaxamento

As atividades de exposição e ativação comportamental induzirão níveis mais altos de ansiedade no curto prazo. Aprender e usar habilidades de relaxamento pode ajudar a amortecer o impacto da ansiedade e diminuir os sintomas de forma mais rápida e eficiente.

De acordo com Leahy (2011), as pessoas ansiosas costumam ter maneiras de pensar típicas, denominadas como distorções cognitivas ou erros cognitivos. Isso inclui pensamentos preocupados de ‘pior cenário’ ou ‘e se…’ que muitas pessoas “remoem” quando se sentem ansiosos e outros pensamentos negativos que uma pessoa tem sobre si mesmos ou suas vidas.

Fonte: Imagem no Pixabay

O objetivo principal da TCC é mudar os sistemas de significados dos pacientes para alterar suas emoções e comportamentos com relação às situações.

Beck (1997) nos traz que “pessoas com transtornos psicológicos […], com frequência, interpretam erroneamente situações neutras ou até mesmo positivas e, desse modo, seus pensamentos automáticos são tendenciosos”. Ao identificar tais pensamentos, examiná-los e corrigir os seus erros, os pacientes podem se sentir melhor.

Os erros cognitivos são erros de julgamento ou equívocos dos nossos pensamentos na forma de avaliar o que nos acontece. A catastrofização configura-se na antecipação do futuro em termos negativos e o paciente acredita que o que acontecerá será tão horrível que ele não vai suportar. Com a leitura mental, o paciente acredita que conhece os pensamentos e intenções de outros (ou que eles conhecem seus pensamentos e intenções) sem ter evidências suficientes. A generalização significa tomar casos negativos isolados e os generalizar, tornando-os um padrão interminável com o uso repetido de palavras como “sempre”, “nunca”, “todo”, “inteiro” etc.

A partir da reestruturação cognitiva pode-se, então, passar à resolução de problemas e possibilitar as escolhas conscientes do paciente, tornando-o mais autônomo para tomar suas decisões.

Para finalizar, gostaria de trazer aqui algumas técnicas que você pode experimentar por conta própria, mas dependendo do incômodo que você ou alguém que você conhece está enfrentando, é sempre indicado procurar uma avaliação precisa de um profissional habilitado para isso.

         *Tome consciência de seus pensamentos ansiosos

 Faça uma lista dos pensamentos que alimentam sua ansiedade, os pensamentos que a tornam maior e mais forte. Torne-se mais consciente desses pensamentos e de quais situações tendem a desencadeá-los.

          *Avalie seus comportamentos

 Faça uma lista de coisas que mudam em seu comportamento durante os momentos em que você está ansioso e avalie cada uma, considerando se é útil ou não. Lembre-se de considerar os efeitos de curto e longo prazo de cada comportamento. Você também pode usar esse modelo para ajudá-lo a tomar decisões, pensando nas possíveis consequências de cada opção.

          *Use afirmações positivas

 Escreva afirmações positivas em post-its e coloque-os estrategicamente em sua casa ou escritório. Podem ser pequenos lembretes ou frases que o convidem a respirar, fazer uma pausa ou solicitar que você diga algo pelo qual está ansioso.

          *Fale consigo mesmo como um amigo

 Normalmente, as pessoas falam consigo mesmas de uma maneira que nunca falariam com mais ninguém, ou seja, nossa autocrítica tende a ser   mais elevada. Combata essa conversa interna negativa falando consigo mesmo da mesma forma que falaria com um amigo ansioso durante os momentos em que sua ansiedade aumenta.

         *Tente uma ação oposta

 Como comportamentos, pensamentos e sentimentos estão todos conectados, agir com coragem ou confiança durante momentos em que você está ansioso às vezes pode fazer uma grande diferença. Essa técnica às vezes é chamada de “ação oposta” e pode ser usada para neutralizar sentimentos difíceis por meio de comportamentos que parecem opostos ao que você normalmente faria quando se sentisse assim. Por exemplo, quando você sente vontade de se isolar, encontrar uma maneira de se conectar com outras pessoas (por exemplo, trabalho voluntário ou passear com um amigo) pode ajudar a mudar seu humor.

 

REFERÊNCIAS:

 LENHARDTK, Gabriela; CALVETTI, Prisla Ücker. Quando a ansiedade vira doença? Como tratar transtornos ansiosos sob a perspectiva cognitivo-comportamental. Aletheia: Revista Interdisciplinar de Psicologia e Promoção de Saúde, Canoas, v. 50, pg 1-2, dez./2005. Disponível em:http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php? script=sci_arttext&pid=S141303942017000100010 Acesso em: 10 abr. 2023.

OLIVEIRA, M. I. S. D. Intervenção cognitivo-comportamental em transtorno de ansiedade: Relato de Caso. Revista Brasileira de Terapias Cognitivas, Aracaju – SE, 7, n. 1, dez./2005. Disponível em: https://www.rbtc.org.br/detalhe_artigo.asp?id=137. Acesso em: 6 abr. 2023.

NATIONAL LIBRARY OF MEDICINE. Terapia cognitivo-comportamental para transtornos de ansiedade: uma atualização das evidências empíricas. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4610618/. Acesso em: 15 abr. 2022.