Está ocorrendo a 21° edição do Big Brother Brasil (BBB), a versão brasileira do reality show Big Brother (nome e ideia inspirada no livro ‘1984’ de George Orwell) que consiste em confinar um número X de participantes em uma casa vigiada 24h por dia, na qual a única comunicação com o meio externo é o ‘’Big Brother’’ que seria o apresentador do programa que instrui os participantes, e durante 3 meses ocorrem diversos desafios e provas, nos quais semanalmente através dos paredões, elimina-se um participante, até que no final tenha o grande finalista (esse que atualmente ganha o prêmio de 1,5 milhão de reais).
A edição desse ano é a primeira que apresenta o maior número de pessoas negras, além de ter aberto muitos debates a respeito de raça, gênero, dentre as pautas sociais, e já na primeira semana de reality ocorreram desentendimentos entre os participantes, que levantaram temas e comportamentos para muito além do jogo que acontece dentro da casa. Toda a comoção interna e externa gerada pela casa mais vigiada e famosa do Brasil, trouxe-me diversos questionamentos e pensamentos que irei expor aqui, não tenho como foco tomar partido de nenhum participante.
A começar pela ideia gerada na internet de enxergar a terapia como método calmante dos ânimos da pessoa ou a terapia como solução para os problemas da vida do indivíduo, duas concepções extremamente equivocadas, rasas e elitistas. Ocorre uma fetichização da terapia, na qual ela é vista como um mecanismo de tornar as pessoas agradáveis, domesticar e padronizar os sujeitos, como se através dela fosse possível (e necessário) alcançar uma regulação de comportamentos.
Alimentar a ideia de que a tristeza, choro, raiva (em situações diversas) é sinal de que se precisa urgentemente buscar um consultório psicológico, fomenta a visão individualista tanto de que a clínica é o único lugar existente para se lidar com essas emoções ‘adversas’ quanto se exclui todo o contexto sócio-histórico que se deve levar em conta, visto que em muitas situações se precisa garantir os direitos básicos humanos antes de pensar de maneira clínica.
Outro ponto muito debatido, principalmente em redes sociais como o Twitter e Instagram, é sobre a militância e a cultura do cancelamento. Primeiro gostaria de fazer uma breve explicação sobre os termos: militância vem do latim ‘’militar’’ que significa servir como soldado, no sentido de combate, lutar por algo ativamente buscando uma transformação; a cultura do cancelamento é um termo criado pelos próprios usuários da internet que se remete à quando alguma pessoa comete algum erro (e esse é levado a público), e um grupo de pessoas não permite que o acusado se retrate ou que se defenda, impingindo-lhe xingamentos, linchamento ou exclusão dos ambientes.
É notável que nesse BBB está ocorrendo uma mistura/confusão entre essas duas posturas, chegando a níveis que ferem a saúde física e mental dos participantes. Há uma cobrança pelo processo de desconstrução, valendo ressaltar que esse é gradual e singular para cada pessoa, destruir um padrão e reconstituí-lo/ressignificá-lo pode ocorrer através tanto da vivência quanto pelo estudo, sendo também de suma importância trazer o lugar de fala nesse debate, uma vez que esse carrega em sua essência a consciência do papel dos sujeitos nas lutas, podendo ser de protagonista ou coadjuvante na discussão, mas deixando aberto o espaço para que diversas vozes sejam ouvidas; porém quando o debate e postura não sai do academicismo pode acabar banalizando/invalidando a experiência do outro, distanciando cada vez mais as pessoas da efetiva desconstrução.
Com isso, cria-se um cenário contraditório no qual de um lado há toda uma luta por direitos que respeitem a diversidade e resguardem a saúde mental e física dos indivíduos, porém, por outro há uma reprodução de violências e opressões dentro do ambiente que deveria ser de acolhimento e escuta, que por vezes dentro do próprio BBB, diz ser em nome de uma militância (atitude que acaba por banalizar o termo, tirando-o do seu real significado), assim eu questiono: que batalha em nome de uma justiça e garantia de direitos, oprime, intimida e retalia uma pessoa?