A aproximação do Dia dos Namorados, celebrado em 12 de junho, marca também o aumento da procura por atendimentos em consultórios de psicologia voltados a questões relacionais. Entre os principais fatores que mobilizam essa busca estão sentimentos de insegurança, medo de abandono, e dificuldades em estabelecer limites em relações afetivas.
A data, tradicionalmente associada a gestos simbólicos e demonstrações públicas de afeto, vem sendo atravessada por fenômenos recentes como o culto à performance emocional nas redes sociais. Fotos, declarações e registros de intimidade são compartilhados em grande escala, reforçando modelos idealizados de relacionamento que nem sempre correspondem à realidade dos vínculos afetivos cotidianos.
“Quando o amor é compreendido como um espaço de validação constante, o sujeito tende a deslocar suas inseguranças para o outro, criando um ciclo de expectativa e frustração que intensifica a ansiedade”, explica a psicóloga Maria Klien.
A idealização do par, somada à comparação constante com padrões externos, pode acionar mecanismos psíquicos ligados à dependência emocional. Essa dinâmica muitas vezes se expressa por meio de comportamentos de vigilância, ciúme, medo de rejeição e autoanulação. De acordo com Maria Klien, esse cenário dificulta a construção de relações baseadas em autenticidade e respeito mútuo.
“Relações codependentes se estruturam quando há uma sobreposição entre o bem-estar individual e o afeto recebido. A pessoa passa a medir seu valor a partir da atenção que recebe, anulando a própria autonomia em nome da permanência do vínculo”, afirma a psicóloga.
Além da clínica individual, cresce também a demanda por terapia de casal nesse período. As sessões, segundo os profissionais da área, têm revelado o quanto a pressão simbólica da data interfere na avaliação do próprio relacionamento. Presentes, declarações públicas e planos compartilhados tornam-se, muitas vezes, medidores de afeto, gerando conflitos e mal-entendidos.
Para a psicóloga, é necessário rever a função atribuída ao amor no imaginário social. “O amor não deve ocupar o lugar de reparação daquilo que nos falta. Ao contrário, é preciso que cada sujeito esteja implicado em sua história, reconhecendo seus vazios e limites antes de buscar completude no outro”, observa Maria Klien.
Nesse contexto, a prática terapêutica pode oferecer subsídios para a construção de vínculos mais conscientes. Trabalhar a insegurança afetiva, compreender padrões de repetição e desenvolver recursos de autorregulação emocional são aspectos centrais nesse processo.
Relações duradouras não se configuram como uma única experiência contínua, mas sim como uma sucessão de diferentes pactos afetivos ao longo do tempo. Um vínculo de dez anos pode ser entendido como dez vínculos de um ano, dados os processos de transformação que cada sujeito atravessa no decorrer da vida. Mudanças individuais demandam reformulações nos acordos que sustentam o convívio, exigindo escuta, revisão e disposição para recomeçar de maneira consciente e consentida.
Outro ponto relevante diz respeito à honestidade desde o início da relação. Nomear aquilo que é negociável e aquilo que não é permite um encontro mais lúcido entre os desejos das partes envolvidas. Quando um dos sujeitos manifesta com clareza uma condição pessoal — como a impossibilidade de ter filhos biológicos — e isso representa um limite inegociável para o outro, o término precoce pode evitar sofrimentos futuros. Reconhecer tais incompatibilidades com maturidade é um exercício de responsabilidade e preservação psíquica para ambos.
A celebração do Dia dos Namorados, portanto, pode ser um ponto de partida não apenas para trocas simbólicas, mas também para reflexões mais amplas sobre os modelos de afeto que sustentam as relações. Desidealizar o amor, ao invés de enfraquecê-lo, pode ser o primeiro passo para consolidar vínculos mais livres, maduros e saudáveis.
Sobre Maria Klien
Maria Klien exerce a psicologia, se orientando pela investigação dos distúrbios ligados ao medo e à ansiedade. Sua atuação clínica integra métodos tradicionais e práticas complementares, visando atender às necessidades emocionais dos indivíduos em seus universos particulares. Como empreendedora, empenha-se em ampliar a oferta de recursos terapêuticos que favorecem a saúde psíquica, promovendo instrumentos destinados ao equilíbrio mental e ao enfrentamento de questões que afetam o bem-estar psicológico de cada paciente.