Histórias de deslocamento como técnica terapêutica sistêmica

Dentro da Teoria Familiar Sistêmica desenvolvida por Murray Bowen estão algumas técnicas terapêuticas para auxiliar no processo, sendo uma delas as histórias de deslocamento, que são recursos utilizados para o entendimento do próprio papel no sistema familiar e o reconhecimento de problemas semelhantes em outras famílias.

Segundo (Nichols, 1995), contrariamente à crença popular, os casais não resolvem seus problemas apenas conversando a respeito. Entregues a si mesmos, eles tendem a discutir improdutivamente, projetar a responsabilidade no outro e se queixar em vez de negociar. A mudança requer falar e escutar. Devido à tendência universal de enxergar apenas a contribuição dos outros para os problemas, são necessárias técnicas especiais para ajudar os membros da família a enxergar o processo, não apenas o conteúdo, de suas interações; a enxergar a sua parte no processo, em vez de apenas culpar os outros, e, finalmente, a mudar.

Philip Guerin (1971) – aluno destaque de Bowen – recomenda a “história de deslocamento” como um instrumento para ajudar os membros da família a obterem distância suficiente para ver o próprio papel no sistema familiar. NICHOLS, Michael P.; SCHWARTZ, Richard C (2011) explicam que a história de deslocamento é sobre outras famílias com problemas semelhantes. Por exemplo, um casal tão ocupado em atacar um ao outro que não conseguia escutar poderia ouvir a seguinte história: “deve ser frustrante não conseguir chegar até o outro. No ano passado, eu atendi um casal que simplesmente não conseguia parar de brigar o tempo suficiente para escutar o outro. Só depois que eu os dividi e eles se acalmaram em algumas sessões individuais foi que pareceram demonstrar alguma capacidade de escutar o que o outro dizia”.

A técnica de histórias de deslocamento pode ser utilizada, por exemplo, em casais ocupados em atacar um ao outro e a se comportarem de forma reativa, não conseguindo resolver seus conflitos. Assim como em terapias com indivíduos e famílias, a terapia boweniana tem como pilar nas terapias com casais o objetivo de reduzir a ansiedade para os parceiros para que o foco do self seja elevado e mantido.

A ferramenta também pode ser utilizada na estruturação de perguntas do processo que não provoquem respostas defensivas com o objetivo dos familiares perceberem o que os outros fazem e como são as reações diante dos seus problemas. Perguntas do processo são indagações destinadas a explorar o que acontece dentro das pessoas e entre elas: “quando seu namorado a insulta, como você lida com isso?” “Quando sua filha sai com um namorado, o que acontece dentro de você?” Perguntas do processo destinam-se a reduzir o ritmo das pessoas, diminuir a ansiedade reativa e fazer com que pensem – não só sobre como os outros os incomodam, mas também sobre como participam dos problemas interpessoais (NICHOLS, Michael P.; SCHWARTZ, Richard C, 2011).

Conforme ressaltam Michael P.; SCHWARTZ, Richard C. (2005), em vez de perguntar a alguém que está magoado e irritado quando ele acha que superará esses sentimentos para começar a trabalhar para mudar as coisas – o que poderia levá-lo a pensar que seus sentimentos estão sendo negados –, o terapeuta poderia perguntar: “Você acha que é possível superar toda essa raiva e mágoa?” Ou, se perguntar a alguém por que não conseguiu realizar determinada coisa talvez o deixe na defensiva, o terapeuta poderia perguntar: “Na sua opinião, por que é tão difícil para as pessoas dar este passo?”.

Como materiais das histórias de deslocamento também podem ser utilizados filmes, músicas, histórias e metáforas, que devem ser de conhecimento antecipado e analisado pelo terapeuta para que sejam adequados com a subjetividade dos casos. A técnica pode ser bastante efetiva para a compreensão sobre os pensamentos, sentimentos, o funcionamento dos sistemas e minimização da defensividade, pois a experiência emocional possibilita o deslocamento de sua história para outra e torna viável a reflexão de forma mais funcional caso o nível de ansiedade esteja elevado.

REFERÊNCIAS

NICHOLS, Michael P.; SCHWARTZ, Richard C. Terapia familiar: conceitos e métodos. 7. ed. Porto Alegre: ArtMed, 2011. (biblioteca virtual)