Interdisciplinaridade: A nova fronteira no tratamento de pacientes em Home Care

Como diferentes profissionais colaboram à promoção da saúde mental do paciente em home care.

Primeiro, precisamos entender o que é home care. O conceito de “cuidado em casa” surgiu como forma de atender a necessidade de tornar os serviços de saúde mais acessíveis, personalizados e centrados no paciente, permitindo que o cuidado fosse oferecido no ambiente familiar, e proporcionasse conforto e segurança, especialmente para aqueles com doenças crônicas, idosos ou pacientes em fase terminal. A transição dos cuidados de saúde para o domicílio é uma evolução importante em relação ao modelo tradicional, que era predominantemente focado em unidades de saúde, como USF (Unidade de Saúde da Família) e hospitais de grande porte. Esse modelo centralizado, embora eficaz para tratamentos agudos e intervenções cirúrgicas, mostrou-se limitado para atender às necessidades de cuidados continuados e personalizados, especialmente para pacientes com condições crônicas ou aqueles que necessitam de cuidados paliativos e com dificuldade de mobilidade.

O aumento da expectativa de vida e a prevalência de doenças crônicas, como diabetes, hipertensão e doenças cardíacas, pediram por uma reavaliação de como os cuidados de saúde são oferecidos no Brasil. A demanda por um atendimento mais próximo e humanizado impulsionou a expansão do home care como uma alternativa viável e necessária.

Os benefícios desse serviço são diversos e vão desde a personalização do cuidado, pois permite que o paciente seja tratado de maneira individualizada e com um plano específico de cuidados relacionados às suas necessidades, como a redução de riscos hospitalares, maior autonomia, qualidade de vida e conforto. Para que o sucesso do home care aconteça, faz-se necessário a Equipe Multidisciplinar, uma junção de vários profissionais da saúde trabalhando em conjunto para atender às diversas necessidades do paciente. Essa equipe pode incluir médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, nutricionistas, psicólogos, assistentes sociais, cuidadores e terapeutas ocupacionais, cada um desempenhando um papel específico e direcionado na manutenção e melhoria da saúde do paciente.

O trabalho em equipe no home care permite a divisão de responsabilidades na tomada de decisões sobre o direcionamento dos tratamentos, o que não significa que a responsabilidade individual de cada profissional seja reduzida em relação ao paciente, mas sim que a colaboração entre diferentes perspectivas aumenta as chances de considerar todas as implicações antes de definir as condutas. Além disso, essa abordagem facilita o atendimento, pois um único profissional não precisa lidar com todas as queixas do paciente, especialmente aquelas que se referem a áreas fora de sua expertise. Contudo, como a formação acadêmica individual geralmente não prioriza o trabalho em equipe, essa forma de atuar só pode ser desenvolvida na prática.

Observando o funcionamento da Equipe disciplinar, tem-se: o médico, que coordena o plano de tratamento e monitora a saúde do paciente; o enfermeiro, administrando medicamentos, realizando curativos e monitorando sinais vitais; o fisioterapeuta, que trabalha para melhorar a mobilidade e prevenir complicações físicas; o nutricionista, profissional que elabora planos alimentares que atendem às necessidades específicas do paciente; o terapeuta ocupacional, que adapta atividades diárias para promover a independência; o fonoaudiólogo, auxiliando com dificuldades de fala e deglutição; o assistente social, oferecendo apoio logístico e conectando a família a recursos comunitários; e o cuidador, que auxilia nas atividades diárias, proporcionando apoio contínuo e companhia. Perceba que para todos, existem funções muito específicas e necessárias à saúde física e mental do paciente, e é claro que a Equipe Multidisciplinar pode mudar de formação, a depender da disponibilidade de profissionais na cidade. Mas e o psicólogo, onde fica nisso tudo?

O papel do psicólogo nos serviços de home care

“O psicólogo que participa de uma equipe que faz atendimento em domicílio pode trazer, para os outros membros que a compõem, a subjetividade do paciente, do seu cuidador e da família. É seu papel, também, facilitar a comunicação entre a equipe e os pacientes e/ou familiares.” (Laham, 2004)

                                                                                                                                   Fonte: Freepik

A atuação do psicólogo no home care faz-se fundamental na garantia de um cuidado integral que vá além das necessidades físicas do paciente, abordando também seus aspectos emocionais e psicológicos. De uma escuta ativa ao acolhimento, o psicólogo exerce por diversas vezes, um papel de apoio diante das circunstâncias às quais se envolvem o paciente e sua família em meio à doença. Esse apoio pode versar inclusive sobre o desenvolvimento de estratégias de enfrentamento para lidar com as mudanças em sua vida, como a perda de independência, a adaptação a uma nova realidade física ou mental, e o enfrentamento de diagnósticos graves ou terminais. Em situações de crise, o psicólogo pode trabalhar para reduzir o sofrimento imediato e proporcionar um alívio emocional que permita ao paciente e à família uma melhor gestão da situação.

É importante frisar que o suporte não se limita ao paciente, mas se estende também à família e aos cuidadores, que frequentemente enfrentam altos níveis de estresse e exaustão emocional ao lidar com as demandas do cuidado domiciliar. O psicólogo nesse caso, pode oferecer momentos de acolhimento para os familiares, ajudando-os a compreender as dinâmicas emocionais que surgem nesse contexto e fornecendo estratégias para manter o equilíbrio emocional. O psicólogo desempenha ainda um papel importante na psicoeducação, informando e educando o paciente e sua família sobre como os aspectos emocionais podem influenciar a saúde física. Esse trabalho pode ser desenvolvido com técnicas de relaxamento, manejo do estresse e comunicação eficaz, capazes de serem utilizadas no dia a dia para melhorar a qualidade do cuidado e a convivência familiar. Nos casos em que o paciente está em cuidados paliativos, o psicólogo ajuda tanto o paciente quanto a família a lidar com o processo de fim de vida. Isso inclui trabalhar na aceitação da condição, auxiliar no alívio do sofrimento emocional e preparar a família para a perda iminente, de maneira que o processo seja vivido com dignidade e o mínimo possível de sofrimento.

De maneira geral, o psicólogo contribui na promoção da qualidade de vida do paciente e dos seus. Isso envolve ajudá-los a ressignificar a experiência da doença, encontrando novos significados e propósitos que podem proporcionar um senso de bem-estar e realização, mesmo diante das limitações impostas pela condição de saúde. Lembrando que a atuação do psicólogo não acontece de maneira isolada ou autossuficiente sobre as outras atuações dentro da equipe multidisciplinar, ao contrário! É “a intervenção em equipe [que] possibilita que diferentes olhares auxiliem a criação de diferentes hipóteses”. (Brandão, 2001, p. 90).

Referências

 

BRANDÃO, S. N. Visita Domiciliar: Ampliando Intervenções Clínicas em Comunidade de Baixa Renda. Dissertação de Mestrado, defendida na Universidade de Brasília, 2001.

GAVIÃO, A. C. D., & PALAVÉRI, F. K. C. (2000). O papel do psicólogo. In Y. A. O. Duarte & M. J. D. Diogo, Atendimento Domiciliar: Um enfoque gerontológico. São Paulo: Atheneu. 

LAHAN, C. F. (2004) Peculiaridades do atendimento psicológico em domicílio e o trabalho em equipe. São Paulo. Disponível em: https://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1677-74092004000200010#2 . Acesso em 19 de agosto 2024.

SILVA, L. B. Doença Mental, Psicose e Loucura: Representações e Práticas da Equipe Multiprofissional de um Hospital-dia . São Paulo: Casa do Psicólogo, 2001.