Giselle Carolina Thron: giselle.thron@ceulp.edu.br
A icônica série televisiva Game of Thrones estreou em 2011 e se tornou um fenômeno mundial. Adaptada dos livros de George R.R. Martin, Crônicas de Gelo e Fogo, a saga épica apresenta um mundo repleto de intriga política, batalhas sangrentas e personagens complexos. A série se passa em um mundo fictício, com inspiração medieval, tendo como local o continente de Westeros e Essos e a luta pelo Trono de Ferro. Westeros é um continente dividido em Sete Reinos, cada um governado por uma família nobre. As principais famílias envolvidas são os Stark, Lannister, Targaryen e Baratheon, cada uma com suas próprias motivações, interesses, intrigas e rivalidades.
A série explora as complexidades do poder político, mostrando as estratégias, alianças e traições entre as diferentes casas nobres. Os personagens estão constantemente tentando obter vantagens políticas, seja através de casamentos, negociações diplomáticas ou manipulação, o que gerou durante sua narrativa várias guerras e batalhas sendo estas de inspiração nas guerras e conflitos ocorridos no período medieval. Além disso, conta, também, com vários elementos de fantasia, tais como dragões, lobos gigantes, zumbis, os caminhantes brancos e antigas formas de magia.
Cada personagem tem sua própria motivação, história e arco narrativo. Ao longo da série, acompanhamos as jornadas individuais dos personagens, que são confrontados com escolhas difíceis e consequências impactantes. Ao pensarmos na gama de personagens interessantes da série, e sobretudo, o que se trata o texto, o universo feminino, as quais desempenham papéis importantes na trama da série, desafiando estereótipos de gênero e demonstrando força, coragem e inteligência nos lembramos inicialmente da poderosa Daenerys Targaryen ou a ardilosa Cersei Lannister, mas, no contexto do texto que hora desenvolvemos o destaque será dado à personagem Arya Stark.
Arya Stark é a filha mais nova da Casa Stark, e se desenvolveu como uma notável determinação e habilidades de combate. Ao longo da série, ela passa por uma jornada de autodescoberta e se torna uma assassina treinada e destemida. Arya desafia os papéis tradicionais de gênero e se torna uma figura de resiliência e vingança. Uma personagem corajosa, teimosa e determinada desde o início da história. Ela se destaca por não se encaixar nos papéis tradicionais esperados das mulheres em Westeros. Diferente de sua irmã Sansa, Arya não se interessa por atividades femininas, como costura e etiqueta. Em vez disso, ela prefere lutas de espadas, arco e flecha, e se envolve em atividades consideradas mais “masculinas”.
Fonte:HBO Entertainment
Percebe-se a quebra de estereótipos que a personagem representará logo quando ela é apresentada na primeira temporada da série. Uma menina de 11 anos de idade que rejeita as tarefas tipicamente femininas como bordado e costura e é apresentada treinando esgrima vestindo camisa, calça e botas tipicamente masculinas. Os gostos pessoais da menina se apresentam como fonte de preocupação para seus pais que, assim como idealizaram um bom casamento para a irmã mais velha, sonhavam com um casamento para ela. Em um diálogo entre pai e filha Arya deixa claro que as aspirações que seus pais sonhavam para ela não era o que a própria menina queria:
Arya: – Eu posso ser Senhora de um castelo?
Ned: – Você se casará com um Senhor e governará o castelo dele. Seus filhos serão cavaleiros, princesas, senhores.
Arya: – Não. Essa não sou eu. (T01E04).
Logo no início da série e as conspirações pelo poder levaram Arya a se separar de sua família. Primeiro, ela precisa se disfarçar de menino para não ser reconhecida e se une a um grupo de recrutas com o intuito de fugir da cidade onde as conspirações levaram à execução de seu pai. Sozinha, em um ambiente totalmente hostil, a menina consegue se defender de todos os perigos que a cercam enquanto planeja sua vingança a todos e todas que conspiraram para a morte de Ned Stark, seu pai. Logo após, Arya se une à outro personagem da série, Clegane, personagem rude conhecido como Cão de Caça, o qual representa uma espécie de anti-herói no contexto da história. O encontro dos dois é também marcado por interesse, pois ele leva a menina como refém na esperança de ganhar uma boa recompensa. O desenrolar do relacionamento dos dois leva a crer, inicialmente, que ele assumiria um papel de figura paterna/protetiva, no entanto, Arya se aproveita dos dotes de guerreiro de seu sequestrador para se aperfeiçoar na esgrima e autodefesa.
Finalmente, conseguimos observar uma relação construída entre os dois conferindo um ar de hostilidade mas também compreensão mútua e até mesmo respeito, uma vez que os dois estavam em busca de vingança. Por fim, os dois se separam quando ele, ferido, é deixado por ela que segue seu caminho e se torna aprendiz de uma comunidade conhecida como Sem Rosto, uma organização de assassinos e adoradores do Deus de Muitas Faces em Braavos, sendo uma das habilidades mais notáveis desta comunidade a transmutação de rostos, ao que Arya se aproveita para aprimorar suas habilidades de combate e disfarce. Neste ponto da trama, ela enfrenta desafios mentais e físicos, incluindo enfrentar seu próprio passado e abandonar sua identidade. No entanto, ela também questiona o objetivo e os métodos daquela comunidade, especialmente quando eles lhe pedem para renunciar à sua identidade e matar indiscriminadamente. Eventualmente, ela recupera sua independência e se recusa a completar uma missão de assassinato, optando por seguir seu caminho. Embora ela tenha deixado os Sem Rosto, Arya ainda mantém as habilidades que aprendeu lá e a usa ao longo da história para se vingar daqueles que prejudicaram sua família.
Ao deixar a comunidade dos Sem Rosto, Arya se mantém no desejo de vingar a morte de seu pai e agora outros membros de sua família, que também foram assassinados devido a conspirações. Sua mãe e seu irmão mais velho foram assassinados em um momento de grande drama da série, o Casamento Vermelho. Assim, Arya, utilizando-se da habilidade de transmutar o rosto, consegue se infiltrar no castelo dos assassinos, envenena toda a linhagem da casa e oferece a carne de seus descendentes para o lorde da casa comer o assassinando em seguida. Outro marco importante para a personagem Arya Stark foi a morte do Rei da Noite um dos grandes vilões da história, o líder dos Caminhantes Brancos, espécie de zumbis, o Rei da Noite marchava para o ataque e possível eliminação da região de Winterfell e foi morto justamente por Arya que o apunhalou com uma adaga especial.
A morte do Rei da Noite, um dos grandes antagonistas da série, pelas mãos da personagem Arya é um evento significativo no desenrolar da história. A forma como ele é derrotado por ela possui pontos de relevância, o primeiro deles é a subversão das expectativas, pois ao longo da história somos levados a acreditar que Jon Snow, o protagonista e herói em muitos aspectos, seria aquele que finalmente derrotaria o Rei da Noite. No entanto, a escolha de Arya Stark para realizar o ato subverte as expectativas tirando da sempre figura heroica masculina a cartada final para exterminar o grande vilão. A morte do Rei da Noite também é entendida como o ápice do arco de desenvolvimento de Arya a qual passou por um treinamento rigoroso com ao longo de sua jornada, adquirindo habilidades de combate e assassinato. Sua jornada de vingança pessoal, combinada com seu treinamento, a transforma em uma assassina altamente habilidosa e determinada, tornando-a capaz de enfrentar aquela que se apresenta como a grande ameaça sobrenatural.
Ao analisarmos a trajetória da personagem Arya Stark podemos extrair vários elementos importantes: ela desenvolve um forte senso de justiça e busca vingança contra aqueles que causaram mal a ela e sua família. Arya Stark é admirada por sua determinação, habilidades de sobrevivência e força de vontade. Ela desafia as expectativas de gênero em um mundo dominado pelos homens e é uma figura que representa resiliência e independência, uma das principais características de Arya é sua determinação inabalável. Desde o início, ela se destaca por sua personalidade independente e sua recusa em se conformar com os papéis tradicionais de gênero desafiando as expectativas familiares e sociais e se esforça para encontrar seu lugar em um mundo brutal e complexo. Arya passa por uma série de experiências traumáticas e perdas ao longo da história, o que a obriga a se adaptar e sobreviver em circunstâncias adversas, aprende a lutar, a esconder sua verdadeira identidade e a confiar apenas em si mesma. Essas experiências moldam sua mentalidade e a tornam uma personagem resiliente e corajosa. Além de sua força física e habilidades de luta, Arya também possui uma inteligência aguçada e uma habilidade única de observar e aprender com as pessoas ao seu redor. Torna-se uma mestra na arte do disfarce e da manipulação, usando essas habilidades para sobreviver e se vingar daqueles que causaram mal a ela e sua família.
Arya também é uma personagem complexa, com uma mistura de raiva, tristeza e desejo de justiça, enfrenta dilemas morais ao longo de sua jornada, e sua busca por vingança a leva a questionar suas próprias noções de justiça e até onde está disposta a ir para alcançar seus objetivos. Uma das partes mais fascinantes da personagem de Arya é seu relacionamento com a identidade e a conexão com sua família carregando o nome e a honra da Casa Stark, mas também adota várias identidades falsas ao longo da série. Ela luta para equilibrar seu desejo de vingança e sua necessidade de preservar sua verdadeira identidade. Arya Stark é frequentemente analisada de uma perspectiva feminista devido à sua representação de uma personagem feminina forte, independente e desafiadora dos papéis de gênero tradicionais. Sua jornada e características específicas são frequentemente consideradas empoderadoras e inspiradoras para os que acompanham a história.
Aqui estão alguns aspectos da personagem que podem ser analisados sob uma lente feminista: Desafio aos estereótipos de gênero rejeitando as expectativas tradicionais de comportamento feminino em uma sociedade patriarcal. Ela demonstra interesse em atividades consideradas “masculinas”, como lutas de espada e arco e flecha, em vez de se envolver com as tarefas e habilidades femininas esperadas. Essa quebra de estereótipos reforça a mensagem de que as mulheres têm o direito de seguir seus próprios interesses e paixões, independentemente das normas de gênero impostas.
A sua busca constante por autonomia e independência fizeram-se presentes durante todo o seu percurso. Arya busca constantemente sua própria independência, navegando por um mundo perigoso por conta própria. Ela desafia as expectativas sociais e reivindica sua própria agência, buscando seu caminho e tomando suas próprias decisões. Sua busca por vingança e justiça é um exemplo de sua determinação em moldar seu próprio destino, em vez de ser uma figura passiva. Ela é resiliente e adapta-se às circunstâncias adversas, aprendendo com suas experiências e fortalecendo-se. Essa resiliência é um aspecto inspirador da personagem, mostrando que as mulheres podem enfrentar desafios e se recuperar com força e determinação.
Outro ponto a ser destacado é a quebra de padrões de beleza convencionais, pois ela não se preocupa com a aparência ou em se enquadrar nos padrões de beleza estabelecidos pela sociedade. Ela se recusa a se conformar com as expectativas de feminilidade e valoriza suas habilidades, inteligência e força interior em vez de sua aparência externa. Isso envia uma mensagem de que a autoestima e o valor pessoal não devem depender de aparência física. Assim como as noções de camaradagem e sororidade uma vez que Arya desenvolve relacionamentos fortes com outras personagens femininas ao longo da série. Ela compartilha momentos de camaradagem e apoio mútuo com personagens como Brienne de Tarth e Yara Greyjoy, mostrando a importância das conexões e do apoio entre mulheres em um mundo onde são frequentemente subestimadas.
O final de Arya Stark é sobremaneira sugestivo, enquanto sua irmã mais velha assume o trono de sua casa, ela se recusando a permanecer na casa de sua família e indo em busca de seus sonhos infantis de conhecer o mundo, a sua última cena é a bordo de um navio rumo à outros continentes e o desconhecido.
Referências:
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