Quais aprendizados absorver a partir do Comportamento da personagem Emília?

Ana Paula de Lima Silva – ana.paulalms@rede.ulbra.br

Caricatura de Monteiro Lobato, autor da obra “Sítio do Picapau Amarelo”.
André Koehne, CC BY-SA 3.0, via Wikimedia Commons

O Sítio do Pica-pau Amarelo é uma das obras de Monteiro Lobato e é sua obra de maior destaque na literatura infantil, Lobato foi um dos primeiros autores da literatura Infantil do Brasil e da América Latina. A literatura infantil de Monteiro Lobato apresenta um aspecto moralista e pedagógico, alguns anos essa obra foi levada à televisão no seriado O Sítio do Pica-pau Amarelo, onde bonecas falam, crianças convivem com mitos e fábulas entre os personagens criados por Lobato, destacam-se Dona Benta, Tia Nastácia, Pedrinho, Tio Barnabé, Visconde de Sabugosa Saci, a Cuca, Narizinho e sua boneca falante Emília.

A boneca de pano Emília, foi feita por tia Nastácia para a menina Narizinho, ela era muda, porém, após tomar a pílula falante, Emília se tornou muito comunicativa e suas características são: Tagarela, curiosa e egoísta, donas de opiniões fortes. Ela comete birras, malcriação, teimosia e espertezas, fala o que pensa e quando é chamada a atenção finge demência e não teme a nada, é cheia de vontades, ela também deixa os dias de Narizinho muito mais divertidos e cheios de aventuras.

Segundo Skinner o condicionamento operante é um método de aprendizagem que ocorre por meio de reforços e punições. Através do comportamento operante, uma associação é feita entre um comportamento é uma consequência para esse comportamento, quando o resultado desejado segue uma ação o comportamento torna-se mais provável de ser emitido novamente em outra ocasião parecida.

Emília é uma personagem que não usa o controle inibitório com cautela, ou seja “fala o que pensa”, é um pouco autoritária e tem dificuldade de lidar com opiniões contrárias às suas. É querida por todos no Sítio e é reforçada frequentemente por esses comportamentos inadequados, os quais só tendem a acontecer em outros momentos, pelo fato de a mesma receber atenção ao emitir tais comportamentos.

Pesquisas demonstram que histórias infantis podem influenciar o comportamento.
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Pesquisas apontam que histórias infantis podem ter função de instrução, pois são estímulos verbais que podem controlar determinados comportamentos. (Almeida, Bataglini, & Verdu, 2009). A literatura Infantil, pode ser objeto de apreciação, ela favorece criar contextos lúdicos e discutidos conceitos importantes para a cultura, como o certo ou o errado, o bem e o mal (Vasconcelos, 2008) Comportamentos inadequados dos personagens são geralmente punidos nas estórias educativas, evitando que se tornem modelos de ação, pois comportamentos apropriados e reforçados terão maior probabilidade de serem reproduzidos. 

Narizinho até levantou a hipótese de que Emília se tornou assim após ingerir uma pílula falante e talvez se o dr. Caramujo fizesse ela vomitar a pílula e recebesse uma dose mais fraca, Emília falasse menos e fosse menos desobediente. Algumas das características dos comportamentos apresentados pela personagem envolvem risco de reação indesejável, produzindo consequências positivas para si e não para os demais do grupo social a qual está inserida. 

É esperado na fase inicial infantil que a criança viva a fase do egocentrismo, ela entende o mundo a partir da vivência dela, e ainda não tem a capacidade de se colocar no lugar do outro de pensar e chegar à conclusão de que uma atitude dela pode prejudicar o outro, na medida que a criança vai crescendo cognitivamente ela tende a receber instruções de adultos e perceber o que pode e o que não pode ser feito, esses comportamentos geralmente são aprendidos por meio da modelagem.

Mesmo diante das relações comportamentais responsáveis pela aprendizagem de um determinado comportamento, há que se levar em consideração também o processo de modelação, sendo provável que os comportamentos de Narizinho tenham a função de modelo de agressividade para Emília, pois a presença de Narizinho pode eliciar um estímulo discriminativo para a resposta agressiva da boneca Emília.

Por outro lado, essa punição também não garante um novo repertório (Skinner, 1953/2007), mais assertivo, caso não esteja associada com modelagem, instruções de um repertório apropriado. Entende-se que alguns comportamentos de Emília poderiam ser considerados importantes no repertório de crianças e jovens que leem as histórias do Sítio do Pica-pau Amarelo, porém outros comportamentos dessa personagem poderiam facilitar a aprendizagem de padrões de comportamentos agressivos.

A partir de uma Análise Funcional do comportamento as birras podem ser trabalhadas e novos comportamentos serão aprendidos.
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É de fundamental importância que tanto o egocentrismo como as birras devam ser trabalhados com naturalidade, por meio de brincadeiras e material concreto para que possa fazer sentido para a criança e assim absorver o significado do compartilhar e de lidar com o outro, pois para Skinner, o comportamento é controlado é influenciado por suas consequências. A partir de uma análise funcional do comportamento pode-se investigar o antecedente, a resposta e a consequência de determinados comportamentos e o que fazer para aumentar ou diminuir a probabilidade dele se manter.

Todo e qualquer comportamento tem uma função no repertório comportamental do indivíduo, o ser humano opera no ambiente provocando modificações nele que por sua vez age modificando padrões comportamentais. Atualmente existem diversas técnicas terapêuticas eficazes baseadas no behaviorismo que permite que pesquisadores possam investigar o comportamento observado de maneira científica e sistemática, dentre essas abordagens a Terapia Comportamental é muito útil na mudança de comportamento desajustados em crianças e adultos.  

No caso específico das estórias de Emília, a análise sobre consequências imediatas e prováveis, em médio e longo prazo, podem contribuir para refinar regras sociais e valores culturalmente estabelecidos, bem como os padrões de comportamentos sociais valorizados, reprovados e tolerados pelo grupo.

Referências

DEL P. A., & DEL P. Z. A. P. (2003). Assertividade, sistema de crenças e identidade social. Psicologia em Revista, Belo Horizonte, v. 9, 125-136.

VASCONCELOS, L. A. (2008). Brincando com histórias infantis: Uma contribuição da análise do comportamento para o desenvolvimento de crianças e jovens. Santo André, SP: ESSEtec.

ALMEIDA, C. G. M., BATTAGLINI, M. P., & ALMEIDA, V. A. C. M. (2009). Comportamento verbalmente controlado: Algumas questões de investigação do controle por estímulos textuais e pela palavra ditada. In T. G. M. Valle (Eds.), Aprendizagem e desenvolvimento humano: Avaliações e intervenções (pp. 9- 32). São Paulo: Cultura Acadêmica.

ARANTES, A. K. L., & ROSE, J. C. (2009). Controle de estímulos, modelagem do comportamento verbal e correspondência no Otelo de Shakespeare. Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva, 11, 61-76.