O (En)Cena entrevista Valeska Zanello, psicóloga e doutora em Psicologia, que irá abordar a “Saúde mental e gênero” no encerramento do CAOS
Durante os dias 21 a 25 de agosto de 2017, período em que se comemora o Dia do Profissional de Psicologia, o Caos – Congresso Acadêmico de Saberes em Psicologia– será realizado no Ceulp/Ulbra e contará com uma série de atividades que irão se debruçar sobre um dos temas mais emergentes da contemporaneidade, a violência. Temas como ‘Manejo clínico de vítimas de violência doméstica’, ‘Violência no Trânsito’, ‘Prevenção ao Suicídio e automutilação’, ‘Violência nas redes: em que momento nos tornamos tão insensíveis ao outro?’, ‘Alienação Parental no contexto sociojurídico’, ‘Violência e Sofrimento Psíquico no Trabalho’, ‘Violência e Desigualdade Social no Sistema Prisional’, ‘Arquétipos da violência nos contos de fada’ e ‘Mídia, Corpo e Violência’ serão alguns assuntos abordados, dentro de uma programação que envolve aproximadamente 30 atividades.
Uma das palestrantes confirmadas no evento é a professora da UNB Valeska Zanello, que irá fazer a conferência de encerramento do evento. Valeska possui graduação em Filosofia pela Universidade de Brasília (2005), graduação em Psicologia pela Universidade de Brasília (1997), e doutorado em Psicologia pela Universidade de Brasília (2005) com período sanduíche de um ano na Université Catholique de Louvain (Bélgica). Professora adjunta 3 do departamento de Psicologia Clínica da Universidade de Brasília, orientadora de mestrado e doutorado no Programa de Pós-Graduação em Psicologia Clínica e Cultura (PPG-PSICC).
Zanello tem experiência na área de Psicologia, com ênfase em Saúde Mental e Gênero, atuando principalmente nos seguintes temas: saúde mental, gênero, psicanálise e filosofia da linguagem. Coordena o grupo de pesquisa “Saúde Mental e Gênero” (foco em mulheres) o qual realiza uma leitura do campo da saúde mental sob um viés feminista das relações de gênero (e interseccionalidades com raça e etnia) no que diz respeito à epistemologia, semiologia, diagnóstico psiquiátrico e prática profissional. Foi representante do Conselho Federal de Psicologia no Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (SPM) e no GEA (Grupo de Estudos do Aborto) no período de 2014 a 2016. Membro do Grupo de Estudos Feministas (GEFEM) da UnB. Participou do TEDx Universidade de Brasília com o talk “Por que xingamos homens e mulheres de formas diferentes?”. Gravou o (vídeo aula) ORIENTAPSI, do Conselho Federal de Psicologia, sobre o tema “Saúde Mental e Gênero”.
Abaixo, confira a entrevista concedida ao portal (En)Cena
EnCena – Recentemente a professora Márcia Tiburi disse que algumas pessoas consideram o tema “mulheres” e “feminismo” como batidos, mas que se trata de assuntos que nunca podem sair de pauta. Por que ainda é necessário lembrar sistematicamente deste tema?
Valeska Zanello – O que eu vejo é que há uma demanda cada vez mais crescente de parcelas da população que desconheciam este debate. Eu penso que há um problema quando se usa a palavra gênero, que é uma palavra que acabou tomando acepções muito distintas e cobrando pautas muito diversas. Todas estas pautas são importantes, no entanto existe um problema político, pois em muitos destes debates as mulheres são esquecidas. Então percebemos que há um avanço nas políticas públicas, na saúde mental por exemplo, relacionado contra o público LGBT, o que é excelente, mas não vemos a mesma ênfase na violência contra a mulher. É importante, dentro das pautas de gênero, retomar a perspectiva das mulheres.
EnCena – Esta é uma temática bem trabalhada pelos meios de comunicação, em sua opinião? E na Psicologia, de que modo o tema poderia ocupar lugar central?
Valeska Zanello – Não creio que é uma temática bem trabalhada pelos meios de comunicação. Pelo contrário, creio ser importante problematizar mais esse tema nos meios de comunicação. A principal tecnologia que reitera os valores de gênero são justamente os meios de comunicação. As propagandas, as telenovelas, os filmes… na Psicologia tem sido tema de estudo, porém não é algo que a Psicologia tenha tomado pra si para refazer no sentido de se repensar. Por isso acho que é muito importante que se fala uma faxina epistemológica na Psicologia, porque grande parte das teorias com as quais trabalhamos, as teorias clássicas, ainda possuem valores sexistas, que são repassados, reificados nas práticas de muitos psicólogos.
EnCena – Quais as formas de violência mais comuns enfrentadas pelas mulheres? Existe uma espécie de violência institucionalizada e que, portanto, já está aceita pelo tecido social?
Valeska Zanello – As mulheres sofrem todos os tipos de violência. Então existem aquelas violências que estão sendo mais problematizadas, com a popularização da Lei Maria da Penha, mas existem as microviolências, que são aquelas ocorridas no cotidiano e que estão presentes nesta cultura, que se diz cultura do estupro – eu não gosto deste termo, eu prefiro “cultura da objetificação sexual das mulheres” – e que tem efeitos nefastos na saúde mental delas. Este é um dos temas que eu irei abordar na minha conferência na Ulbra.
Portanto, existe uma espécie de violência institucionalizada. A nossa cultura é misógina, e essas microviolências, de tão repetidas, de tão institucionalizadas são invisíveis. E elas se fazem presentes tanto no cotidiano comunicacional – quando ligamos uma TV, por exemplo – quanto nas relações pessoais. Aqui entra o caso do estupro no casamento, que é herdeiro do débito conjugal, que mesmo que tenha sido retirado do código penal há pouco mais de uma década, continua presente no cotidiano dos casais heterossexuais. Eu nunca atendi uma mulher em contexto de clínica que nunca tenha transando pelo menos uma vez na vida sem estar com vontade. Então a mulher hétero é aquela que aprendeu a barganhar com seu corpo as relações amorosas.
EnCena – Qual será a tônica de sua palestra em Palmas?
Valeska Zanello – Será o impacto da violência na saúde mental da mulher, mas vou sair das violências óbvias para pensar exatamente sobre estas microviolências. Então eu vou abordar quais são os caminhos de subjetivação que vulnerabilizam homens e mulheres no sofrimento psíquico.
Por que Caos?
A subversão de conceitos aparentemente fechados é uma das marcas das mentes mais invejáveis de todos os tempos. E pensar de forma subversiva é também quebrar com a linearidade das considerações pré-concebidas. Assim, resignificar e despir as “verdades” são a tônica de toda a produção científica, de toda a produção de saberes. Caso contrário, não se estaria produzindo ciência, mas, antes, dogmas.
A palavra CAOS, neste contexto, ganha especial sentido, já que remete à possibilidade do princípio da impermanência e da criatividade. A Física diz que é do princípio do CAOS que surge parte dos fenômenos imprevisíveis, cuja beleza se materializa na vida que se desnuda a todo instante.
É neste sentido que, também, para a Psicologia, o CAOS possibilita pensar sobre uma maneira de enxergar o Ser para além de rótulos ou de concepções a priori. Este microcosmo humano que é objeto de escrutínio do profissional de Psicologia guarda uma gama de imprevisibilidade e de originalidade que representam a própria riqueza da existência. Afinal, pelo CAOS podem-se iniciar intensos processos de mudanças, autossuperações e singularidades. É pelo princípio do imprevisível e do radicalmente distinto que se vislumbra a beleza da diferença. Estas são, em súmula, as bandeiras da Psicologia, área da ciência calcada essencialmente no Humanismo, que busca elevar a condição humana em toda a sua excentricidade, sem amarras, sem julgamentos. Esse é o princípio do CAOS, o Congresso Acadêmico de Saberes em Psicologia do Ceulp/Ulbra.
Serviço:
O que: Palestra “Saúde mental e gênero: o que as (micro)violências contra as mulheres têm a ver com isso?”
Quando: 25 de agosto de 2017 às 9h
Onde: Auditório Central do Ceulp/Ulbra
Realização: Curso de Psicologia do Ceulp/Ulbra
Apoio: Conselho Regional de Psicologia – CRP-23, Prefeitura de Palmas (SEMUS), Jornal O Girassol, Psicotestes, GM Turismo, Coordenação de Extensão do Ceulp/Ulbra, Coordenação de Pesquisa do Ceulp/Ulbra.
Mais informações:
Coordenação de Psicologia: Irenides Teixeira (63) 999943446
Assessoria do Ceulp/Ulbra: 3219 8029/ 3219 8100
Programação e Inscrições: http://ulbra-to.br/caos/
Notícias do Evento: http://encenasaudemental.com/mural