“Eu antes tinha querido ser os outros para conhecer o que não era eu. Entendi então que eu já tinha sido os outros e isso era fácil. Minha experiência maior seria ser o outro dos outros: e o outro dos outros era eu”. Clarice Lispector
Primeiramente é importante frisar a diferença entre Solidão e Solitude. A segunda é estar só, desacompanhado, solitário, remetendo a unidade. Solidão remete a dor e sofrimento, originada da perda de algo. Em termos psicológicos, a solidão é caracterizada por uma dinâmica afetiva ineficiente, em que resulta em sentimentos de incompletude, necessitando da companhia de outro para o preencher o vazio existencial. Segundo Sri Prem Baba, este vazio existencial não pode ser preenchido por outro, ou por objetos, pois só cabe a pessoa a capacidade de preencher verdadeiramente o seu próprio vazio. ´´Nós temos amor dentro de nós, mas acreditamos que precisamos receber esse amor de alguém.“, declara.
A visão de Baba foi construída no ponto de vista sociológico, em que a solidão é vista como resultado da produção social de um homem egoísta, individualista e narcisista. O homem acha ser o centro do universo, buscando controlar a natureza ao seu favor, assim como manipular o próximo para satisfazer necessidades individuais. Para Baba tal manipulação não é suficiente para suprir a solidão. Tamayo e Pinheiro (1984) compartilham da mesma linha de pensamento, já que consideram a solidão com um modo se relacionar se há uma deficiência de valores e comunicação, existindo a possibilidade de estar acompanhado, mas se sentir só.
Através da música Wave, Tom Jobim declara sua opinião de que ´´ é impossível ser feliz sozinho“. Seria a opinião de uma pessoa envenenada com a porção da paixão, que responsabiliza o outro pela própria felicidade? Já para o Psicólogo Domingos Sávio, estar sozinho é sentir-se bem sozinho, ou ao menos tentar, é uma forma de viver a vida buscando conhecer e entender a si próprio. O autoconhecimento pode ser útil na delimitação de barreiras, evitando problemas e buscando sentir a felicidade mesmo dentro de um mar turbulento e arrebatador de emoções.
Vou te contar
Os olhos já não podem ver
Coisas que só o coração pode entender
Fundamental é mesmo o amor
É impossível ser feliz sozinho
– Verso da música Wave
Paul Tillich, sociólogo, foi o criador da palavra solitude. De acordo o sociólogo ´´A linguagem criou a palavra solidão para expressar a dor de estar sozinho. E criou a palavra solitude para expressar a glória de estar sozinho´´. Para Schopenchauer, significa liberdade: “Um homem pode ser ele mesmo apenas se está sozinho; e se ele não ama a solitude, ele não vai amar a liberdade; pois é apenas quando ele está sozinho que pode ser verdadeiramente livre”.
Solitude é considerar-se a melhor companhia de si mesmo. Estar sozinho e sentir-se bem, é uma forma de se potencializar, higieniza a mente e possibilita maior facilidade de homeostase. É uma possibilidade de expandir a consciência e conectar-se consigo mesmo e/ou com o universo. De acordo com a perspectiva existencialista, este momento consigo mesmo facilita uma expansão da consciência, aproximando-se do propósito existencial. Para oferecer o que se tem de melhor, é preciso estar bem consigo mesmo. Oferecemos o que estamos cheios. Se estamos transbordando confusão, raiva e rancor, influenciamos os outros, já que o inconsciente coletivo é constituído por inconscientes individuais.
De acordo com as informações anteriores, seria realmente possível estar sozinho? É na solidão que podemos transformar em céu o inferno que existe dentro de nós, ou seria transformar em inferno o céu que habita em nós? Partindo do viés de que o inconsciente individual se funde ao inconsciente coletivo, resultando em um cosmo, sendo parte de nossas constituições, as opiniões e expectativas de outros, estar sozinho é estar em contato direto como o cosmo? É habitar e ser habitado por diversos constructos que talvez nem seja pessoal, mas de outras pessoas, inclusive com o antepassado e/ou até mesmo o futuro? Estar sozinho seria então estar verdadeiramente acompanhado?
Referências
MANSUR, L. Solitude: virando a solidão pelo avesso. Disponível em < http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-31062008000100007 > acessado em 22/08/2018.
SOUZA, F. Diferença entre solitude e solidão – Você conhece a diferença? Disponível em < http://www.psicologiamsn.com/2014/08/diferenca-entre-solitude-e-solidao-voce-conhece-diferenca.html > acessado em 22/08/2018.
FONSECA, A. Descubra o que é solitude e como ela pode te ajudar profissionalmente. Disponível em < http://blog.unipe.br/pos-graduacao/descubra-o-que-e-solitude-e-como-ela-pode-te-ajudar-profissionalmente > acessado em 22/08/2018.
Fãs da Psicanálise. Solitude e solidão – Você conhece a diferença? Disponível em < https://www.fasdapsicanalise.com.br/solitude-e-solidao-voce-conhece-diferenca/ > acessado em 22/08/2018.
JOBIM,T. Wave. Disponível em < https://www.letras.mus.br/tom-jobim/49074/ > acessado em 22/08/2018.
BABA, S. Propósito – A coragem de ser quem somos. Editora: Sextante; Edição: 1ª, 2016.