“Não tivemos tempo para chorar a nossa dor”

Maria Bernardo, 63 anos, a professora aposentada reside em Goianésia-Go. Seus pais faleceram em 2020 acometidos pela COVID-19.

Um furacão ocorre em um curto período de tempo, porém, provoca estragos de terríveis proporções. 2019 foi um ano marcado pelo início dessa grande peste, COVID-19, como ficou conhecido e que pela sua dimensão e proporção que foi tombado, trouxe pânico para muitos e indiferença para outros, alguns pensavam que não se passava de notícias e dados exagerados e até mesmo fake news.

Enquanto só ouvíamos falar dela, tudo parecia distante de nós, porém quando casos foram acontecendo em nossa cidade, bairro, a preocupação é o medo iam tomando conta de nossas emoções, pessoas trancadas em suas casas, sem poder sair para as inúmeras necessidades. Ninguém tinha informações concretas a respeito dessa enfermidade, muito menos a forma de contágio e tão pouco os medicamentos eficazes no combate desse mal. Foi algo tão impactante e ao mesmo tempo tenebroso que gerou polêmicas no Sistema de Saúde, na política, no meio social, enfim, nas diversas esferas da vida. De tudo acontecia e de nada se sabia. As coisas iam acontecendo e delas as experiências, trazendo aprendizado em algumas e prejuízos em outras. O fato é que nem os médicos se sentiam capacitados a lidar com a situação que se desenvolvia em uma velocidade alarmante.

Meu marido e eu fomos os primeiros da família a sermos sintomáticos do COVID-19. Fomos atendidos, medicados e posteriormente meu marido foi internado, esteve mais de uma semana sendo acompanhado por médicos, enfermeiros e fisioterapeutas. Enquanto éramos cuidados já de alta e em casa, meus pais começaram com sintomas de gripe e foram levados ao hospital para consulta. O médico plantonista prescreveu os medicamentos  como se fosse gripe e retornaram para casa (meus pais). Porém, na segunda-feira retornaram para uma consulta mais minuciosa e já foram internados. Foram submetidos a exames e os resultados mostraram que os seus pulmões já estavam com 85% de comprometimento. Foram imediatamente transferidos para a UTI.

                               Fonte: Acervo Pessoal

Meu pai com 92 anos de idade e minha mãe com 85 anos, já não tinham tanta resistência física para um tratamento mais agressivo, como era necessário.

    Após três dias na UTI, dia 13/09/2020 meu pai veio a óbito. Notícia que causou grande emoção a nossa família. Contudo, o momento era de ação para cuidar dos trâmites do funeral. Não tivemos tempo para chorar a nossa dor e nem os consolos de nossos amigos e conhecidos. A luta pela sobrevivência continuava e buscamos em Deus a força e a esperança de um milagre, especialmente pela nossa mãe que se encontra na UTI. Estávamos unidos (cinco irmãos), em orações e apoio mútuo por meio de informações, recebendo alimentos, chás, tudo que alguém sabia que era bom para a imunidade, era compartilhado entre nós. Nossa família estava na expectativa de um milagre e ficamos frustrados, recebi uma ligação do hospital para comparecer no mesmo, ao chegar recebi a notícia do óbito da minha mãe (24/09/2020).

                                                                                              Fonte: acervo pessoal 

    Nós que éramos uma família de cinco irmãos e nossos pais vivos até então, de uma forma brusca nos encontramos desprotegidos, tristes e impotentes. Todos os membros da minha família, inclusive dos irmãos, seus cônjuges e filhos, foram acometidos do vírus, alguns em estágios mais graves, outros menos, mas não houve novos casos de óbito. Trazendo à memória esses momentos de grande sofrimento, angústias e perdas, é como descortinar uma página de nossa história que ficou congelada no tempo. Foram dias difíceis, de grandes desafios mas de aprendizados também. Fomos tomados de empatia e amor pelo nosso próximo, pois estávamos no mesmo barco e naufragando; tentando nos salvar mutuamente. A tristeza passa, a dor suaviza, a esperança renasce e o amor prevalece! Assim nos apresenta a vida! Viva a vida com intensidade!