“Pequena Miss Sunshine”: um olhar psicológico

O filme “Pequena Miss Sunshine”, dirigido por Jonathan Dayton e Valerie Faris, com roteiro de Michael Arndt conta a história da família Hoover, moradores do Novo México. O pai da família, Richard, é uma espécie de coaching, palestrante motivacional que está tentando vender seu programa de autoajuda chamado Nove Passos, que promete transformar qualquer pessoa em um vencedor. Richard repete sempre que só há dois tipos de pessoas: vencedores e perdedores.

Sheryl, a mãe é uma mulher que trabalha fora, faz as funções domésticas e é responsável por apaziguar os conflitos dentro da família.

Seus filhos são Dwayne e Olive. Dwayne resolveu fazer o voto do silencio até conseguir se integrar na escola de pilotos da força aérea: está sem falar há meses e segue o niilismo, um dos princípios presentes na filosofia de Friedrich Nietzsche. Se sente um incompreendido e gosta de ficar sozinho no seu mundo, sem ser incomodado. Olive é uma menina de nove anos que sonha em se tornar miss.

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Frank é irmão de Sheryl, um professor universitário que se diz maior conhecedor sobre a vida do escritor Marcel Proust, é gay, foi rejeitado pelo parceiro e recentemente tentou o suicídio. Completa o grupo Edwin, o pai de Richard, um senhor que foi expulso do asilo por ser viciado em heroína.

O conflito se inicia quando Olive recebe um telefonema para participar de um concurso chamado de Little Miss Sunshine, no sul da Califórnia. Mesmo com dinheiro insuficiente, a família decide partir para realizar o sonho da menina. Resolvem viajar todos juntos e se esforçam ao máximo para chegar no local em que ocorrerá o concurso de beleza.

Logo no início, o carro da família, uma Kombi amarela, quebra e eles são obrigados a empurrar toda vez que precisa dar partida no veículo. É nesse momento que se mostra a unidade da família. Apesar das diferenças, todos se unem para atingir o objetivo: realizar o sonho de Olive, um sonho incentivado pela cultura americana.

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Durante o trajeto, várias situações vão delineando um pouco da visão dos personagens. Por exemplo, quando param para lanchar e a garota Olive pede um sorvete, o pai tenta dissuadi-la da ideia, utilizando argumentos como o fato de que as modelos geralmente são mulheres magras. Antes ele havia perguntado à garota se ela estava competindo por competir ou competindo para ganhar, tendo ela concordado em competir para vencer o concurso.

Em uma cena anterior, a garota relata sobre seu medo de não vencer e de desapontar o seu pai. O avô explica a ela que perdedor é quem desiste de seus sonhos por medo, e que se ela vai tentar, não é uma perdedora. Ao longo da viagem, muitos contratempos acontecem, o primeiro deles é a decepção do pai, que precisa lidar com o fracasso e rejeição do seu programa de autoajuda. Richard vai até um hotel e procura o responsável, a fim de obter aceitação para o seu programa, numa cena que demonstra uma dualidade: Richard está sem os trajes adequados e os meios para persuadir alguém, está com uma moto que pegou de um estacionamento, contrariando totalmente o pacote de sucesso que pretendia vender, o que acentua a noção de fracasso.

Ao longo da viagem, o perfil dos personagens vai sendo construído: o silêncio de Dwayne, a depressão de Frank, o fracasso de Richard, o desejo de retorno ao passado de Hoover e a impotência de Sheryl se misturam para compor uma cena em que não se sabe o que esperar de cada personagem.

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Durante esse meio tempo, o avô, Hoover, morre enquanto dormia o que desestabiliza ainda mais a família e gera outros contratempos, como o enterro do avô, que ocorre de forma conturbada e já dá um indício da essência transgressora da família.

Em seguida, numa brincadeira em que Olive pergunta sobre uma letra de cor vermelha no centro de um cubo, tio Frank descobre que Dwayne é daltônico, ocasião em que o garoto entra em desespero, grita, reclama da falta de estrutura da família e se afasta de todos, numa espécie de surto. Nesse momento, e expressa através da fala e quebra o silêncio com a família, vindo a expressar um processo de maturidade nas cenas seguintes.

Ao chegar a Califórnia, estão atrasados para as inscrições do evento e são rechaçados por uma das organizadoras do concurso, que demonstra a total falta de empatia pela garota e sua família. Conseguem realizar as inscrições graças a outro profissional, que critica a postura da senhora e se propõe a resolver a situação em poucos minutos.

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No início do concurso, já se observa uma deformação da realidade: um concurso de miss infantil, onde as crianças parecem plastificadas, com roupas, cabelos e trejeitos de adultos, em contraposição à pequena Olive, que é desengonçada e se comporta de forma espontânea. Seu figurino também se diferencia: enquanto as meninas usam roupas mais femininas, Olive se apresenta com um short, blusa, sobretudo, gravata e chapéu, compondo um figurino mais livre e irreverente.

A coreografia ensinada pelo seu avô é ousada e divertida, porém não agrada ao público bem-comportado e conservador, que vaia, faz tumulto e tenta impedir o fim da apresentação, numa resposta clara à transgressão da música/dança/comportamento.

Como forma de reação, os pais da menina invadem o palco a fim de impedir que ela seja retirada de lá e conseguem que ela termine a apresentação. Aqui chega-se ao clímax da narrativa, que tem como resultado a união crescente da família.

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 Apesar de não ter vencido o concurso, a garota demonstra alegria com o resultado, o que foi possível graças às palavras do avô, que desconstrói a ideia da competição, e ao incentivo da família.

Pode-se dizer que a viagem foi uma experiência reveladora, na medida em que vai descortinando a complexidade dos personagens, que estão longe de ser uma-visão-única-uma-coisa-só, que produzem no espectador uma sensação de afeto e compreensão diante dessas pessoas, a quem foi prometido o sonho americano, e das situações decorrentes da não- realização desses sonhos.

FICHA TÉCNICA

Título: Pequena Miss Sunshine
Título Original: Little Miss Sunshine
Origem: EUA
Ano de Produção: 2006
Gênero: Aventura/Comédia/Drama
Duração: 102 minutos
Elenco: Abigail Breslin, Greg Kinnear, Paul Dano
Direção: Jonathan Dayton, Valerie Faris