“Quem é você?”, uma pergunta aparentemente simples que deixa muitas pessoas sem respostas. Geralmente esse questionamento é feito em entrevista de emprego ou em uma consulta com o psicólogo. Mas afinal, por que essa pergunta curta merece tanta atenção? A verdade, é que essa indagação permite a identificação sobre o autoconhecimento. Ou seja, se realmente a pessoa conhece a si mesma, bem como tem a capacidade de explicar sobre o que acontece em seu interior quando algo a desabona.
Em tempos de redes sociais, discutir sobre esse assunto é bem pertinente, ainda mais quando padrões de comportamento e estética são impostos diariamente no universo da internet. O mundo virtual virou a nova esfera pública tão discutida por Habermas (1981). Ademais, implica-se que definição de autoconhecimento reflete o conhecimento que o indivíduo tem sobre si mesmo. Conforme, Brandenburg e Weber o autoconhecimento trata-se da eficiência da pessoa em representar e identificar seu próprio comportamento, ou, com mais dificuldade, suas várias nuances. Para as pesquisadoras, ter consciência de si é desenvolver uma ação proferida tanto de sua autodescrição como de suas variáveis.
Fonte: Free pick
“Nem sempre as pessoas estão atentas às condições que antecedem seu comportamento ou as consequências que ocorrem no ambiente”, reforçam. Elas ainda destacam em seus estudos que, quando o indivíduo se torna consciente de seus comportamentos, além dos fatores determinantes, surgem muitas vantagens, como ser verdadeiramente livre e obter o autocontrole.
Segundo Skinner (1957) o comportamento é uma interação entre indivíduo e ambiente. Isto é, para desenvolver o autoconhecimento é preciso levar em consideração o meio social em que o indivíduo está inserido, bem como entender os sentimentos que muitas das vezes são aprendidos. Por isso, faz-se necessário a descrição dos sentimentos para realmente entender o que verdadeiramente se senti.
Carvalho (1999), em uma mesma abordagem, defende que é preciso detectar por si mesmo os pensamentos e os sentimentos como um primeiro passo para também “aprender a manejá-los e compreender como se relacionam mutuamente para produzir um determinado comportamento.” Para ele, entender as emoções, de uma forma profunda, é uma forma de aliviar o sofrimento. Em seu ponto de vista, a busca pelo autoconhecimento das emoções ajuda a pessoa a lidar com as frustrações do cotidiano, por isso a necessidade de compreender os sentimentos.
Fonte: free pick
A busca pelo autoconhecimento é um trabalho diário que requer esforço e persistência. Por isso, segue algumas dicas para quem deseja entender a si próprio, além de suas emoções. É necessário que, tire umtempo para si, e questione sobre seus sentimentos daquele dia. É sempre bom escrever sobre o que está sentido, por isso sempre tenha em mãos papel e caneta. Procurar ajuda com um profissional de saúde mental é indispensável para que seus pensamentos disfuncionais se tornem alinhados com a realidade. Conversar com alguém próximo sobre suas emoções é muito importante, mas o acompanhamento profissional irá dar clareza sobre o seu comportamento.
Referências
Brandenburg, O. J. & Weber, L. N. D. Autoconhecimento e Liberdade no Behaviorismo Radical. Psicologia-USF, 2005.
Carvalho, G. S. O Lugar dos Sentimentos na Ciência do Comportamento e na psicoterapia Comportamental. Psicologia: Teoria E Prática. 1, 2, 33-36, 1999.
Habermas, Jürgen. Theorie des kommunikativen Handelns Frankfurt: Suhrkamp, 1981.
Skinner, B. F. (1957). Verbal behavior. New Jersey: Prentice-Hall.
“Eles dedicaram suas carreiras ao tentar provar o poder da criação sobre a natureza para finalmente esclarecer a eterna dúvida: poderíamos ter sido pessoas diferentes de quem somos?”
-Narrativa do filme
“Marca de nascença”, filme lançado em 2018, dirigido por Emanuel Hoss-Desmarais, aborda de forma cômica e intensa a “disputa” que permeia pesquisadores há anos: nossa personalidade é resultado da herança genética ou contexto sociocultural? John Watson, psicólogo estadunidense conhecido como pai do Behaviorismo metodológico, realizou em 1922 o Experimento do pequeno Albert, que condicionou a criança a ter medo de rato branco ao correlacionar ele com barulho alto. A partir desse princípio, o casal tenta contrariar a genética, mas de forma muito maior e utilizando métodos positivos.
Ben e Catherine são um casal de cientistas, ambos descendentes de uma longa linhagem de estudiosos, interpretados por Matthew Goode e Toni Collette. Afim de contribuir para o progresso da humanidade e se tornarem renomados, eles propõem um experimento que utilizará 3 bebês: Maya (Megan O’Kelly), vinda de uma família considerada intelectualmente inferior, pretendem transformá-la em um gênio. Maurice (Anton Gillis-Adelman) será criado para ser pacifista, já que seus ascendentes são violentos e agressivos. Luke (Jordan Poole), o único filho biológico, diferente dos seus pais cientistas, será moldado para ser um artista.
Fonte: https://bit.ly/2SzW4WV
“Todo mundo tem potencial para ser o que quiser, ninguém é prisioneiro de sua herança genética.”
– Ben Morin (Narrativa do filme)
Estudando as influências dos fatores diversos no nosso modo de ser, eles preparam um ambiente propício para desenvolver as características individuais de cada criança, por exemplo: Dieta rica em ômega 3 para a memória, tardes e noites de estudo, meditação todos os dias, expressar emoções em sua arte e quartos personalizados, nutrindo a mente para se tornar o que eles quiserem.
De acordo com John Locke, todas as pessoas nascem como uma tábula rasa, ou seja, uma “folha em branco” onde a sociedade “inscreve” suas regras e costumes, formando o ser. Então se uma pessoa ao nascer for colocada em um lugar diferente do seu lugar de origem, será outra pessoa devido às diferenças socioculturais, mudando a si próprio e sua visão de mundo.
Fonte: https://bit.ly/2LNkvNO
“Os doutores usaram os filhos como um chefe usa o ovo, um ingrediente para algo maior, os ovos foram batidos durante 12 excruciantes anos, numa tentativa de fazer a omelete definitiva.”
-Narrativa do filme
No filme, o ciclo social das crianças é restrito, contendo apenas os pais e um cuidador, então chega um momento que as crianças querem socializar com outras crianças. Elas também não entendem o porquê de tantas restrições, surgindo assim o primeiro confronto do filme. Ademais, o patrocinador do projeto pressiona o casal de cientistas à obterem respostas já que o que foi registrado em 12 anos não seria considerado nada surpreendente e revolucionário pela ciência, com risco de ainda serem acusados por falta de ética ao usarem os próprios filhos.
Além de tentar sobrepor o contexto sociocultural à herança genética, apresentar questões éticas sobre um experimento científico usando seres humanos e da rotina deles girar em torno desse experimento científico (o que você pode considerar um horror), é um lar repleto de amor e diversão, o que deixa o filme leve e divertido a quem assiste.
FICHA TÉCNICA DO FILME:
BIRTHMARKED
Título original: Marca de nascença
Direção: Emanuel Hoss-Desmarais Elenco: Matthew Goode, Toni Collette, Megan O’Kelly, Anton Gillis-Adelman, Jordan Poole Ano: 2018 País: EUA Gênero: Comédia
Referências:
BIRTHMARKED. Direção: Emanuel Hoss-Desmarais, Produção: Pierre Even, 2018.
Comportamento humano – interação entre genes e ambiente. Disponível em <: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-40601994000100007 >. Acesso em 23/12/2018.
Compartilhe este conteúdo:
George Politzer: crítica aos fundamentos da psicologia e psicanálise
Iniciando este estudo, há de ficar esclarecido que o nosso intuito aqui é de tornar conhecido no meio acadêmico, a visão crítica sobre a psicologia e psicanálise, que o filósofo George Politzer desenvolveu em 1927, através de uma revisão bibliográfica dos principais conceitos teóricos das abordagens mais importantes de seu tempo e psicologia clássica.
Fonte: https://goo.gl/Kjbm9p
O contexto que proponho é do viés crítico histórico, sugerindo aos leitores que permitam um recorte transversal sobre disciplinas como: História e Sistemas da Psicologia, Processos Básicos em Psicologia, Psicologia da Personalidade e outras disciplinas que apresentam em seus currículos à evolução da psicologia e psicanálise.
Politzer teve o propósito de estudar minuciosamente a psicologia clássica objetiva e subjetiva; a Guestalttheorie; Behaviorismo de Watson e Psicanálise, estabelecendo um cenário, segundo seu entendimento, dos acontecimentos positivos e negativos que caracterizaram o caminhar da psicologia nos últimos 50 anos de seu tempo (1927), afirmando que esses enfoques trilharam muito mais para uma tentativa de se libertarem dos mitos da psicologia clássica do que para o esforço de suas próprias organizações enquanto ciência. (POLITZER, 1975)
Para compreender a condição de subjetividade e objetividade no contexto científico, Politzer (1975) primeiro contextualiza o método introspectivo consiste na observação do sujeito pelo próprio sujeito, sendo que a introspecção atinge o que o sujeito conhece diretamente, os estados de consciência de si e das coisas; sendo essas impressões comunicadas através da linguagem, que tem como função para a introspecção, relatar os estados subjetivos do indivíduo. Segundo o autor, a psicologia introspectiva preocupava-se em saber como o processo mental se desenvolve, ou em classificar os estados individuais, não contemplando a busca de sentido da experiência vivida pelo sujeito.
Continuando o raciocínio, opostamente, a psicologia experimental pelo seu caráter objetivo, se opõe ao método do parágrafo anterior, pelo fato do observador ser distinto do observado. As ciências da natureza (física e matemática) fundamentam o método experimental, portanto o observador deve verificar os fatos físicos por um lado, a situação física em que está exposto o sujeito; por outro lado, seu comportamento nessa situação ambiente. Os fatos físicos, ao contrário dos estados de consciência individuais, podem ser testemunhados por outras pessoas, cujas observações se controlam mutuamente. Procurando superar os limites da abordagem introspectiva tradicional, aqui, por meio de aparelhos o psicólogo se lança na fisiologia, na química ou biologia e, ao invés de se deixar cientificamente renovar, fica preso a velhas tradições científicas, não permitindo a psicologia se desenvolver, conforme Politzer (1975).
O que fica claro para nós é que com esse raciocínio, Politzer não leva em consideração na ciência que ele propõe, a “psicologia concreta” (grifo nosso), o contexto estatístico numérico para um fazer científico a partir das ciências exatas.
O autor distingue o fato objetivo do fato psicológico, contextualiza o seguinte exemplo: “a lâmpada iluminando um objeto X, isso é um fato ‘objetivo’, por ser narrado em ‘terceira pessoa’, por não ser ‘eu’, mas ‘ela’ (grifos do autor). Porém, em sendo eu que subentendo o ser, a lâmpada é um fato psicológico”, conforme Politzer (1975, p. 62).
Fonte: https://goo.gl/H2Zinw
A “transformação” característica da psicologia seria precisamente a que consideraria todos os fatos de que está ciência pode ocupar-se na “primeira pessoa”, mas de tal maneira que a hipótese de uma primeira pessoa seja constantemente indispensável para qualquer ser e para qualquer significado desses fatos. Só a existência da primeira pessoa explica logicamente a necessidade de intercalar na série das ciências uma ciência “psicológica”; e se esta, tal como todas as outras, pode abandonar no decurso da sua evolução os motivos temporais que lhe deram origem, já não poderá certamente abandonar a relação dos fatos à primeira pessoa, relação essa que lhe confere a originalidade de que ela (ciência psicológica) necessita. (POLITZER, 1975, p.64)
Adentrando à visão do pensamento das escolas contemporâneas, há de ficar clarificado que Politzer se propôs revisar criticamente em quatro ensaios as teorias da psicologia, sendo: a gestalttheorie, o behaviorismo e psicanálise, além da psicologia concreta que pretendia desenvolver. Embora tenha discutido rapidamente sobre as vertentes elencadas acima, o único estudo efetivamente pormenorizado e concluído, foi o da psicanálise (POLITZER, 1975).
Doravante vou usar o verbo no passado, por compreender que todas as abordagens aqui discutidas se desenvolveram teórica, clínica e tecnicamente, inclusive com inúmeros desdobramentos conceituais, acompanhando cientificamente as novas demandas e exigências da sociedade contemporânea pós-moderna.
Em sua crítica o autor elenca esforços destas vertentes teóricas, evidenciando que ao mesmo tempo em que as abordagens contribuíram em certa medida com a dissolução dos mitos da psicologia clássica (revisados nos parágrafos anteriores), prenunciando o caminho para uma nova psicologia orientada para o concreto; por outro lado, acabaram incorrendo em erros que as afastaram da tentativa de reformulação da própria psicologia. Em sua visão, isso porque o comportamento humano é tratado como resultado de processos em terceira pessoa, fragmentando o homem e colocando-o como objeto distanciado, ou, como atos do homem em geral, não permitindo a ênfase como atos de um sujeito singular (POLITZER, 1975).
Enfatizou que a Gestalttheorie tem méritos ao negar o procedimento fundamental da psicologia clássica, que consiste em afirmar que a essência última do psicológico é atomística1, ou seja, desfazer a forma das ações humanas, para depois, reconstituir a totalidade, que é sentido e forma (grifo do autor), a partir de elementos amorfos (sem forma), segundo o autor. A Gestalt defende que o psíquico só pode ser entendido como totalidade e não enquanto elementos distintos que são posteriormente associados. No entanto Politzer em sua crítica explicita que a teoria da forma, se equivocou em afirmar que o psicológico é aprendido de forma imediata pela percepção, conforme Politzer (1975). A Gestalt theorie, no sentido lato do termo, entrega-se por um lado, a construções teóricas e, por outro, não consegue liberta-se das preocupações da psicologia clássica. (POLITZER, 1975, p. 34)
O behaviorismo de Watson contribui negando radicalmente a psicologia clássica, introspeccionista ou experimental, sendo que uma de suas negativas diz respeito ao caráter mitológico da psicologia clássica, onde afirma a existência de uma vida interior e outra exterior. Mas segundo o autor, apesar de contribuir com a dissolução de antigos mitos da psicologia com a noção de comportamento (behavior), Watson não consegue superar totalmente esses mitos, acabando por suprimir o enigma do homem; isso ocorreu quando reduziu em seus estudos, o comportamento humano a aspectos fisiológicos ou introduziu novamente de forma disfarçada a introspecção, daquilo mesmo que rejeita. O behaviorismo não conseguiu tratar o comportamento enquanto “drama humano”2 (grifo nosso), conforme Politzer (1975). O Beraviorismo é estéril, ou recai na fisiologia, na biologia ou até mesmo na introspecção mais ou menos disfarçada, em vez de esquecer tudo para só dar atenção às surpresas da experiência. (POLITZER, 1975, p. 34)
Analisando a Interpretação dos Sonhos de Freud, identificou o que considerava ser a verdadeira inspiração da psicanálise, contextualizou que é nesta obra que se pode perceber um caminhar para a psicologia concreta que tanto evidenciou, considerou ser uma nova definição do que vem a ser o fato psicológico, deslocando o interesse das entidades espirituais e/ou metafísicos da psicologia clássica para a vida dramática do ser humano.
Para o autor o problema da teoria psicanalítica, configurou-se em suas explicações teóricas do funcionamento do aparelho psíquico, ao relatar a distinção entre conteúdo manifesto e conteúdo latente. Freud introduziu a hipótese do inconsciente, explicado a partir dos processos internos do comportamento, processos em terceira pessoa, neste sentido, ele incorreu nos mesmos erros da psicologia clássica. Afirma que os psicanalistas não devem acreditar que a psicanálise e o inconsciente são inseparáveis, evidenciando, “esta atitude é incorreta porque a inspiração fundamental da psicanálise é precisamente a sua orientação para o concreto, enquanto o inconsciente é inseparável dos procedimentos constitutivos da psicologia abstrata” (POLITZER, 1973, p. 47-48).
A psicologia não deve aceitar substituir o drama pessoal por um drama impessoal, “devendo através do pessoal, explicar o pessoal”; segundo o autor, a assertiva da psicanálise está nesta orientação, para o sujeito singular, é o sentido que Freud procurou no sonho, não se contendo com o “estudo abstrato e formal dos seus elementos; tampouco procurou uma encenação abstrata e impessoal cujos figurantes sejam excitações fisiológicas e cuja intriga seja constituída pelo passeio através das células cerebrais” (POLITZER, 1975, p. 74-75).
Tem que ser observado que Freud substituiu a introspecção pela narrativa, contemplando o fato psicológico como correspondente da vida de um indivíduo singular, neste sentido para o autor o que interessa no ato psicológico não é “matéria e forma”, mas o “sentido subjetivo” do sujeito único; e esse, só pode ser identificado pela narrativa do próprio sujeito. Neste sentido “Freud não substituiu somente um posto de vista abstrato por um ponto de vista concreto”, vai além, conforme Politzer (1975, p. 107). Numa linguagem mais moderna, podemos dizer que ao empregar o método da narrativa, Freud substituiu o ponto de vista da “intuição” pelo ponto de vista do “comportamento”. (POLITZER, 1975, p. 108).
Fonte: https://goo.gl/NjFoQk
Concluindo o raciocínio do conteúdo exposto, percebemos que a psicologia introspectiva foi uma das abordagens fundadoras da psicologia clássica, investindo em saber como o processo mental se desenvolvia, classificando os estados individuais, não contemplando a busca de sentido da experiência vivida, segundo Politzer. A abordagem experimental da psicologia clássica, utilizando equipamentos, observava fatos físicos do sujeito e o controle do ambiente em que esses sujeitos eram submetidos, testemunhados por um terceiro, o pesquisador; segundo o autor reforçando as ciências fisiológicas e matemáticas e negando a psicologia.
A Guestalttheorie defende que o psíquico só pode ser entendido como totalidade, entretanto o autor criticou a fundamentação que o psicológico é aprendido de forma imediata pela percepção. O Behaviorismo de Watson contribui negando radicalmente a psicologia clássica, em sua introspecção e experimentalismo, no entanto segundo Politzer, se equivocou ao suprimir o enigma do homem. A Psicanálise conseguiu ser a abordagem que mais se aproximava da psicologia concreta que o autor defendia, estabelecendo a narrativa no lugar da introspecção, onde emerge o sujeito singular, ou seja, os conteúdos do sujeito servem de sentido para o próprio sujeito sempre em primeira pessoa o eu subjetivo; por outro lado, negou o inconsciente mentalista de Freud, dizendo que ele não se desprendeu dos fundamentos já superados da psicologia clássica.
Finalizando essa revisão bibliográfica da Crítica dos Fundamentos da Psicologia I e II de Georges Politzer, temos a dizer aos caros leitores, que essa obra, ao nosso entender, pode estimular fundamentações para inúmeros estudos acadêmicos; sua narrativa crítica e literária inspirou pensadores franceses, como: Foucault, Lacan, Deleuze, Guattari, entre muitos outros.
REFERÊNCIAS
BLADÉ, G. Georges Politzer, Crítica de los fundamentos de la psicologia. Barcelona: NODVS XIII, 2005, disponível em: http://www.scb-icf.net/nodus/contingut/article.php?art=
185&rev=27&pub=, acesso em: 02.07.2017.
POLITZER G. Crítica dos Fundamentos da Psicologia I, 2 ed, Lisboa-PT: Presença, 1975.
Crítica dos Fundamentos da Psicologia II, Lisboa-PT: Presença, 1973.
1 Doutrina filosófica que se desenvolveu na Grécia no séc. V a.C. Os atomistas acreditavam que os elementos básicos da realidade eram átomos, partículas de matéria indivisíveis, indestrutíveis, que se moviam no espaço. Fonte: https://www.dicio.com.br
2 Para Politzer, o termo “drama” significa “fato” ele instrui o leitor a retirar o significado romântico “comovedor”. Para ele, vida designa um fato biológico, ao mesmo tempo em que a vida propriamente humana seria a vida dramática do homem, e é esta vida dramática que apresenta todas as características que tornam uma área suscetível de ser estudada cientificamente (POLITZER, 1975, p. 27).
O texto “O hábito é o grande guia da vida humana” aborda alguns conceitos de David Hume (1711-1776) sobre o Empirismo. Hume afirma que nem tudo pode ser explicado pela razão e possui um olhar crítico sobre o racionalismo. Segundo ele existem dois tipos de raciocínios que são denominados como o “dilema de Hume”: o demonstrativo e o provável, onde o raciocínio demonstrativo é considerado evidente, por olharmos e termos a certeza do resultado, e o raciocínio provável exige uma evidência empírica, ou seja, uma busca por aquele resultado. Para Hume esses raciocínios são considerados hábitos construídos pelo homem ao longo da sua vida, como por exemplo, todos sabem que amanhã o sol irá nascer novamente, isso é consequência do condicionamento que nos faz acreditar que todos os dias serão iguais.
No livro “Sobre Comportamento e Cognição”, de Júlio C. de Rose fala sobre o comportamento humano com base no Behaviorismo de B.F. Skinner; o autor divide o comportamento em operante e respondente. O comportamento respondente pode ter respostas condicionadas, referentes a acontecimentos e experiências anteriores, por exemplo, ao sentir o cheiro do limão ou ouvir a palavra limão já causa uma salivação, resposta de estímulos antecedentes. Essa resposta se dá pelo fato do indivíduo já conhecer o limão e lembrar-se do seu gosto forte. Isso se assemelha a teoria de Hume sobre o raciocínio demonstrativo.
O comportamento operante se conceitua como ‘operador do ambiente’, onde não existem relações com estímulos anteriores. Segundo Skinner o comportamento altera o ambiente e a partir dessas alterações, causa a mudança no comportamento do indivíduo. Como dirigir, falar ou andar é preciso ter um aprendizado para que chegue até o resultado. Esse comportamento é semelhante ao raciocínio provável de David Hume.
Fonte: http://migre.me/vrE2k
David Hume na sua teoria, ressaltada no texto “o hábito é o grande guia da vida humana”, na introdução vem tratar do dilema de Hume que argumentou energicamente contra a noção de “ideias inatas”, princípio central do racionalismo. Ele fez primeiramente ao dividir o conteúdo da mente em dois tipos de fenômenos e, depois, perguntando como eles se relacionam com o outro. O problema para Hume, é que muito frequentemente temos ideias que não podem ser sustentadas por nossas impressões. Há hábito mental que interpreta uniformidade na repetição regular, assim como uma conexão causal naquilo que ele chamou de “conjunção constante” de eventos.
William M. Baum em seu livro “Compreendendo o Behaviorismo” aponta no vocabulário técnico da análise do comportamento que a observação científica consiste na formação de discriminações. Uma das atividades mais básicas da ciência é a identificação. O astrônomo olha para a estrela e diz, – aquela é uma gigante vermelha. O biólogo olha para uma estrutura em um corpo celular e diz, – isso é uma mitocôndria.
Da mesma forma a mensuração consiste em dizer ou escrever algo (comportamento operante), e como resultado de olhar algum instrumento (estímulo discriminativo). Essas discriminações compartilham um aspecto peculiar: o cientista não apenas faz descriminações baseadas nas formas, na leitura do contador ou no padrão de números, mas também se comporta de forma a produzir o estímulo discriminativo. Os cientistas são particularmente gratificados pela formação de novas discriminações que são chamadas de descobertas.
Em sentido geral contingência pode significar qualquer relação de dependência entre eventos ambientais ou entre eventos comportamentais (SOUZA D.G, 1995). Por exemplo, podemos ver o nascer do sol toda manhã e inferir que ele nascerá novamente amanhã. Mas a alegação de que a natureza segue esse padrão uniforme é justificável? Alegar que o sol nasce amanhã é um raciocínio demonstrativo (porque o oposto não envolve contradição lógica) nem um raciocínio provável, porque não podemos experimentar já o futuro nascer do sol. Uma relação de dependência não existe quando alguém abre a janela e um relâmpago corta o espaço. Os dois eventos podem ocorrer temporalmente próximos, mas de modos totalmente independentes: o relâmpago teria ocorrido quer abrisse ou não a janela (SOUZA D.G, 1995).
Fonte: http://migre.me/vrCJw
Hume explicou isso simplesmente como “natureza humana”, um hábito mental que interpreta uniformidade na repetição regular, assim como uma conexão casual naquilo que ele chamou de “conjunção constante” de eventos. Na realidade esse tipo de raciocínio indutivo, que é à base da ciência, nos instiga a interpretar nossas inferências como “lei” da natureza. Mas apesar do que possamos pensar essa prática não pode ser justificado pelo argumento racional.
Uma formulação adequada da interação entre um organismo e seu ambiente deve-se especificar três coisas: (1) a ocasião em que a resposta ocorre; (2) a própria resposta e (3) a consequência os reforçadores. As inter-relações entre elas são as contingências de reforço. (SKINNER, 1953, p.5 apud SOUZA D.G, 1995).
Todorav (2007) no seu artigo “A psicologia como estudo das interações”, vem trazer a interação entre o organismo e o ambiente como possível caracterização do objeto de estudo da psicologia, tendo o ser humano como centro de investigações, a partir dos aspectos da análise do comportamento.
O homem é um ser em ação que interfere e é influenciado pelo contexto que faz parte. Essa dinâmica molda o comportamento do sujeito de acordo com as experiências vividas e adquiridas ao decorrer da sua história pessoal com o mundo. Neste sentido, na teoria de David Hume, em relação à interação do sujeito com o meio, é explicito quando ele questiona que nem tudo pode ser explicado pela racionalização, pois existem ações que não podem ser justificadas de forma lógica, mas se sabem que acontecem chamado essas inferências de hábitos/crenças que vão sendo construídos ao logo da história.
De acordo com Todorav (2007, p.57), “em todas as orientações da psicologia, a história passada de interações organismos-ambiente tem um papel essencial na explicação de interações presentes… presume-se que o organismo age agora não apenas em função de ambientes externos presentes”, ou seja, o ser humano é persuadido por evidências passadas que interferem no seu comportamento atual. Sendo que para compreender o seu comportamento, é importante considerar a constituição do organismo pela interação entre o ambiente externo (físico e social) e o ambiente interno (biológico e histórico).
Antes mesmo da existência da análise do comportamento e questões voltadas para as interações organismo-ambiente, Hume com a sua filosofia já ressaltava que o homem tem a capacidade de observar padrões constantes e inferir que estes acontecimentos ocorreram novamente no futuro. Este raciocínio indutivo estar relacionado com a competência do homem de coligir ações a partir de proeminências do passado.
Fonte: http://migre.me/vrDc8
Nesse seguimento, Hume com seu dilema a respeito da racionalização, adverte que muitas coisas não podem ser explicadas pelo raciocínio demonstrativo – onde a verdade e a falsidade são auto-evidentes – e nem pelo raciocínio prováveis – evidências empíricas -, assim na ausência destas explicações racional, o hábito, a causa e efeito são respostas, que vão sendo condicionadas no decorrer da vida e que mostra que amanhã certas coisas serão simplesmente as mesmas, como o nascer do sol. Por isso Hume afirma que “o habito é o grande guia da vida”.
Após a leitura dos textos pode-se inferir que o comportamento humano pode ser explicado de diversas maneiras, tendo em vista que Hume traz de forma considerável os conceitos de dois tipos de raciocínios que são o raciocínio demonstrativo que é considerado evidente, por olharmos e termos a certeza do resultado, e o raciocínio provável que exige uma evidência empírica, ou seja, uma busca por aquele resultado.
Em seguida Skinner traz em sua Teoria a interação entre o organismo e o ambiente, ou seja, que através de estímulos externos o comportamento é representado. O sujeito é moldado pelo contexto em que está inserida, sua história de vida e sua relação com o mundo. Todorav (2007) traz uma rica contribuição explicando que o ser humano é persuadido por evidências passadas que interferem no seu comportamento atual. Pois para compreender o comportamento do sujeito, é importante considerar a constituição do organismo pela interação entre o ambiente externo (físico e social) e o ambiente interno (biológico e histórico).
REFERÊNCIAS:
BANACO, R. A. (Org.). O que e comportamento?. Sobre comportamento e cognição. v.1. p. 79-81, 1995. São Paulo: Arbytes.
BAUM, W. M (1999). Compreender o Behaviorismo. Porto Alegre. Art Med, p. 125-153.
TODOROV, João Cláudio. A psicologia como estudo de interações. Psicologia: Teoria e pesquisa, Brasília, v. 23. p. 57. 61, 2007. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ptp/v23nspe/10.pdf>. Acesso em: 06 set 2016.
O livro Ciência e Comportamento Humano (com a primeira edição brasileira feita em 1979 pela EDART e posteriormente, em 1981, pela editora Martins Fontes, de São Paulo) teve a tradução feita por João Cláudio Todorov e Ricardo Azzi. Esse livro, escrito por Skinner, é um dos mais importantes de sua carreira acadêmica, onde são expostos conceitos e premissas do Behaviorismo Radical de maneira muito clara e detalhada, fazendo correlações entre o comportamento humano e a maneira como ele pode ser estudado e entendido cientificamente.
A obra descreve o que a filosofia da ciência do comportamento entende como comportamento humano, como ele se forma, as diferentes topografias em que ele aparece, seja em paradigmas respondentes ou operantes. Além disso, Skinner aborda temas concernentes ao comportamento como as emoções, pensamento, dando exemplos cotidianos e também expondo estudos laboratoriais. Também traz à baila as concepções de controle que são exercidas sobre o comportamento humano, contemplando desde o ambiente, num modo mais amplo, até agências controladoras do comportamento (religião, psicoterapia, família etc) e a cultura em que o sujeito que está inserido se comporta.
O Ciência e Comportamento Humano possui com XXIX capítulos, divididos em seis seções pertinentes aos assuntos tratados por Skinner, que são ligados de forma temática. Por exemplo, a primeira seção trata de capítulos que abordam a possibilidade de uma ciência do comportamento, a segunda seção já abrange temas concernentes à própria Análise do Comportamento. A terceira e quarta seções contemplam o indivíduo visto como um todo e o comportamento dos indivíduos quando inseridos em grupos, respectivamente. A quinta e a sexta seções já tratam das agências controladoras do comportamento e da cultura que o homem está inserido e como elas refletem na maneira como ele se comporta. Todas as seções e capítulos estão nas 489 páginas que compõem a obra.
Skinner, logo na primeira seção do livro, faz reflexões do que é uma ciência, como ela pode ser usada, suas práticas, suas principais características, além de fazer inferências de como o comportamento humano pode ser estudado por uma ciência, apontando que o homem é, de fato, um ser passível de ser estudado de uma maneira mais científica do que proposta por outras linhas teórico-filosóficas da Psicologia. Para se fazer compreensível tal ponto de vista, o autor explana como o homem se comporta e quais são as possíveis causas de seu comportamento.
No decorrer do livro, o autor explica princípios básicos do Behaviorismo (num paradigma Estímulo-Resposta) e de sua teoria, o Behaviorismo Radical, como comportamentos respondente e operante, modelagem e manutenção de um novo comportamento, discriminação operante, dando exemplos até de como o ser humano consegue desenhar, cantar (e emitir outros comportamentos) a partir de um campo discriminativo; o controle do comportamento pelo ambiente em que o sujeito está inserido, ou seja, como se dá a seleção do comportamento através das consequências obtidas e produzidas no meio, as quais afetam o comportamento de quem as produziu. Também fala dos princípios de privação e saciação como operações estabelecedoras para a ocorrência de comportamentos.
Outro ponto importante que Skinner destaca são as emoções e seus papéis como um comportamento, bem como a relação entre aversão e os comportamentos de esquiva e fuga. A punição também é outro tema em que um só capítulo é dedicado, devido à sua importância. Nesse capítulo, Skinner indaga se a punição realmente funciona, quais os efeitos que ela causa enquanto consequenciação de comportamentos ditos indesejáveis ou desadaptativos, além de apontar os efeitos “colaterais” dessa operação e também as alternativas a essa prática, o que é muito marcado em toda a obra skinneriana, uma vez que o autor não gosta do controle aversivo do comportamento.
Quando Skinner começa a escrever a terceira seção de seu livro, abordando o homem como um todo, explana sobre temas que, para leigos, o Behaviorismo Radical negligencia. Entre eles estão o autocontrole, o pensamento e eventos privados numa ciência natural, vistos como comportamentos assim como eventos abertos, além de dar uma interpretação singular do que é entendido como “o eu” para o comportamentalismo.
Após isso, Skinner analisa o comportamento dos indivíduos que vivem em grupo, abordando o comportamento social, o controle pessoal e o controle do grupo, já puxando para assuntos pertinentes ao tema como agências controladoras do comportamento, onde se encaixam análises do controle exercido pela religião, família, educação, economia e até mesmo a psicoterapia, abordando também as formas de controle que essas instituições utilizam e as maneiras evidentes de contracontrole decorrentes das práticas dessas agências. Ao fim do livro, Skinner continua a falar do controle, porém relacionando este conceito às práticas culturais de uma sociedade, dando especial atenção ao modo como sobrevive uma cultura e como ela pode ser mudada, falando do problema que o controle excessivo causa, de modo a inferir maneiras como o homem pode viver melhor em seu ambiente.
Essa obra é extremamente rica e traz uma compreensão melhor acerca do comportamento humano enquanto passível de estudo científico, em todos os seus âmbitos: seja aberto, seja encoberto, isto é, seja em comportamentos diretamente observáveis ou em comportamentos que ocorrem “dentro da pele”, como as emoções, os sentimentos e os pensamentos. Skinner, nesse livro, de maneira direta, consegue responder muitas críticas feitas por outros teóricos da Psicologia, mesmo que o principal objetivo do livro talvez não tenha sido esse. Isso é de grande valia para aqueles que se interessam por estudar o Behaviorismo Skinneriano e se iludem com críticas feitas por teóricos que não se preocupam em entender o que Skinner realmente diz em sua obra.
O Ciência e Comportamento Humano poderia ser considerado um livro “básico”, com algumas ressalvas, por ser um livro denso para quem começa a se interessar por Análise do Comportamento ou pela filosofia do Behaviorismo Radical. E o seria por abordar de maneira clara (o que não deixa de demandar uma atenção especial por parte do leitor) conceitos simples (porém descritos com completude inigualável) e complexos da teoria comportamentalista radical. Estudantes de Psicologia, a partir do 2º ano de graduação, já podem se debruçar sobre a leitura desse livro que é um dos mais importantes para se compreender não só a obra, mas toda a teoria Skinneriana.
B. F. Skinner foi um psicólogo americano, nascido em 1904, que, influenciado por outros autores como o fisiólogo russo Ivan P. Pavlov, Edward L. Thorndike e o psicólogo e fundador do movimento behaviorista, John B. Watson, deu início a uma nova visão de homem para a Psicologia: a visão do Behaviorismo Radical, sendo considerado um revolucionário entre os teóricos que propõem uma nova visão de homem, mais compreensível e cientificamente válida de comportamento (em todos os seus âmbitos). Entre suas principais obras, além desta resenhada, encontram-se O Comportamento Verbal (Ed. Cultrix e Editora da Universidade de São Paulo), Sobre o Behaviorismo (Ed. Cultrix) e O Mito da Liberdade (Summus Editorial). Além das obras mais técnico-científicas, Skinner escreve uma novela utópica, baseada nos princípios da ciência do comportamento, chamada Walden II: uma sociedade do futuro (Editora Pedagógica e Universitária). B. F. Skinner manteve-se academicamente ativo até a sua morte, ocorrida em 18 de agosto de 1990, decorrente de leucemia.