Dificuldades existenciais no contexto pandêmico

Compartilhe este conteúdo:

Os pesos ocultos da quarentena estão por vezes presos nas realidades de sofrimento, não divulgadas, não levadas em consideração, não fomentadas a partir do incentivo da fala de quem tem sofrido, independente dos pesos ou medidas que esse sentimento tem, em cada subjetividade. Os impactos visíveis ou invisíveis, nossas relações interpessoais, íntimas, estão em constante mudança, e este momento totalmente desafiador, nos joga na posição de necessidade da capacidade da resolução de problemas, ou, a paralisia das nossas faculdades antes normalmente executadas.

A relação cotidiana mudou, e por consequência nossos aspectos relacionais também experimentam neste fenômeno, necessidade de atualização, sendo este termo, longe de ser interpretado como juízo de valor (bom ou ruim), mas é a forma com que o sujeito se insere, ou se expressa, em um movimento orgânico e dinâmico, mas não unilateral, pois se diversifica a partir de uma estrutura psíquica individual e também coletiva, na busca dificultosa da homeostase.

encurtador.com.br/pqvVX

Posso talvez afirmar que cada um se insere da maneira que cabe, em suas possibilidades e angústias, alguns, o medo do incerto, da possibilidade da incapacidade de retornar a uma realidade antes vivenciada; outros, na precisão de estar sempre, e em constante produção; se Freud estivesse aqui diria que este é nosso sintoma? Seria nossa resistência para não ter contato com o desprazer? Estaríamos tomados pela estrutura egóica? Sabe-se lá se Skinner em um momento como esse, talvez fizesse paralelo sobre estes comportamentos, e diria que é fuga e esquiva, em uma tentativa de reduzir ou eliminar os estímulos aversivos.

Eu mesma, estou tentando pôr panos frios em meus sofrimentos, mas seria muito tolo da minha parte dizer que não estou constantemente lidando com o sofrer, e com a vida que me pressiona a uma glorificação de processos criativos para o sofrimento, as produções, afinal, estamos todos confinados, qual seria então minha desculpa? Nós avançamos no tempo, mas as questões não biológicas, estão constantemente sendo negligenciadas no processo de adoecimento, o que me faz pensar que não avançamos tanto assim.

encurtador.com.br/grDMS

Talvez o leitor esperasse que eu me embasasse em apenas uma teoria, enquanto eu misturava sistêmica, psicanálise, análise do comportamento, e agora, Gestalt e psicologia profunda; quem sabe eu só não esteja buscando incessantemente a quintessência, a pedra filosofal, a individuação, e uma possiblidade de me tornar um sujeito autêntico? Me disponho a deixar parte de mim aqui, e ser… não é sobre pontos finais, ao menos para mim, na maior parte do tempo é sobre interrogações, buscando estar aqui e agora, mas tendo também de resgatar lembranças no fundo do inconsciente, que vez ou outra sussurram ou gritam ao meu ouvido, pedindo atenção, para que eu volte novamente a dar atenção aos meus processos.

Eu enquanto acadêmica me sinto confusa diante de tantas formas de ver o mundo, e enfrentando eu mesma, ao mesmo tempo, para entender quem sou eu no mundo, e o que farei com estes sofrimentos latentes ou abafados pelas implicações sociais. Bem, o contexto não tem sido favorável, na verdade, não sei se algum dia foi, mas me força a crescer. Tive que lidar com o medo da perda de pessoas extremamente próximas, tive de ver o sofrimento de quem passa por uma doença nova, de grande enfermo, observar sobre meus olhos alguém que teve experiência de muito tormento, o que me fez recordar de Jung, e as experiências de “quase morte”, as imagens arquetípicas do self se manifestando.

encurtador.com.br/deIYZ

Mais que nunca, estamos sofrendo, e precisamos dizer, para que não seja tão solitário este sentir. Se eu refletisse nas fases do luto de Elizabeth Kubler-Ross, não conseguiria dizer com precisão em qual fase estou, mas felizmente não é necessária tal linearidade. De raiva a depressão, e talvez eu tenha conseguido chegar em parte, na gloriosa, mas não estável, aceitação… afinal, já entendo que preciso sofrer, e dar voz ao que não consigo dizer. E eu sinto muito por tudo que eu jamais diria neste relato, de tão vasto, vívido, e por ser tão confuso, nem sei como diria. Que sorte a minha seria ser analisanda… por mais doloroso que seja, é difícil fugir do que também sou eu, está comigo, mesmo que eu negue.

Compartilhe este conteúdo:

Impactos políticos e psicológicos do discurso feminista

Compartilhe este conteúdo:

Recente palestra apresentada pela egressa do curso de Psicologia Lilian Julian da Silva Guimarães abordou a temática do Movimento Feminista, citando inicialmente as três e importantes Ondas que deram origem e força ao Movimento histórico, na qual cada fase termina sendo marcado por conquistas no âmbito intelectual, político e filosófico que compõem o Movimento, em um panorama de lutas. Assim, entre outros assuntos pertinentes a temática proposta, justifica como chegou a uma escolha pelo tema e ainda a influência da filósofa, escritora, professora e militante feminista brasileira Marcia Tiburi, que norteou seu Trabalho de Conclusão de Curso, além é claro de Beauvoir e Betty Friedan.

No livro O Segundo Sexo, de Simone de Beauvoir, principal obra que marca a revolucionária caminhada rumo aos libertários direitos femininos, aos quais nós enquanto mulheres somos gratas a essa inquietante filósofa e escritora, as importantes conquistas para o nosso atual protagonismo feminino; ainda que seja necessário muitos avanços. De certa forma, enquanto mulher podemos nos sentir amparadas, e até mesmo reconhecidas em nossas angústias, ao nos deparamos com a célebre frase: “Ninguém nasce mulher, torna-se mulher”. Nesse sentido, a palestra em sua maioria assistida por mulheres conseguiu trazer como pano de fundo o papel da mulher na atualidade e acirrar um debate sobre as disparidades, violência e desigualdades ainda presentes em uma sociedade impregnada pelo machismo.

Fonte: https://goo.gl/PFK2DC

Falou por exemplo que a primeira onda possui como marco a Revolução Francesa e a extensão do direito de voto. Na segunda onda, aparecem nomes importantes como Simone de Beauvoir (1908-1986) e Betty Friedan (1921-2006). Na terceira onda, historicamente reconhecida na década de 1990, marcada por questionamentos dentro do próprio movimento que permitiu uma importante redefinição das falhas dos movimentos anteriores, argumentando as diferenças e as condições étnicas e sociais, com intuito de negociar espaços e direitos de forma detalhada.

Além disso, adentrou assuntos como o protagonismo da mulher negra e lésbica, que não se sentiam contempladas no Movimento Feminista das primeiras fases, ou Ondas. Além disso, outra problemática apontada foi a influência desse movimento na vida do homem, como por exemplo, a perda de identidade e as vantagens desse movimento na vida deles. Importante lembrar que o movimento foi amplamente criticado por representar mulheres brancas e de classe alta, havendo de certa forma uma divisão dentro do próprio Movimento.

Foram ressaltados também aspectos culturais envolvidos nas questões de gênero, como a visão da mulher como o “sexo frágil”, a inversão objetal e as críticas ao feminismo. Ademais foram relatados aspectos que evolvem a mulher, seu corpo, o aborto, o mito da maternidade. Citando ainda Butler sobre as complexas estruturas que normatizam e reproduzem as questões de gênero que escreve em nossos corpos um discurso politico marcadamente violento e excludente de ser mulher.

Fonte: https://goo.gl/HYGKq1

O feminismo é um movimento político que tem buscado desde sempre, direitos iguais entre os gêneros; nesse contexto torna-se necessário trazer a tona um debate essencial para o entendimento de que vivemos numa sociedade patriarcal, ao qual Marcia Tiburi muito bem nos lembra, sobre o machismo presente nas mais simples e cotidianas relações às quais é marcadamente imposto pelas diferenças entre os gêneros, segundo ela, derivadas das crenças e também da cultura que é impregnada na história por um cenário discursivo e simbólico desse patriarcado, um legado que traz como centro o gênero masculino em detrimento do gênero feminino como segundo plano. Nesse ponto, incentivando para que a mulher tenha um lugar politico e de criação, sujeito histórico.

Marcia Tiburi apresenta o Feminismo como revolucionário, e nos alerta que a classe conservadora, os que têm medo da mudança, é essa sim que dizem que o feminismo é ultrapassado. Ela aponta o movimento como uma constante dialética, uma prática que é uma teoria e vice versa, sempre em voga e as pessoas devem se apropriar dele, nos fazendo pensar como uma grande questão que nos move. O feminismo é plural, e segundo ela, são muitos escapes que trazem à tona temas como gênero que hoje em dia de certa forma o sistema ainda esconde para que a mulher não perceba seu verdadeiro papel nesse contexto histórico.

Fonte: https://goo.gl/FpVMD5

O Feminismo é uma pergunta que devemos nos fazer: o porquê de tantos privilégios? E o porquê de manter uma sociedade de privilégios? Assim, Tiburi adentra a filosofia de Marx que aponta, sobre como percebeu as mulheres como sendo os proletários do proletário, observando no cerne da classe operária e proletária, o lugar que a mulher operária ocupava como subalterna, sofrendo mais que o homem operário. Devemos quebrar com essa opressão, e o Movimento é forte por lutar pela quebra do domínio patriarcado, e a lógica do machismo é sempre atacar o feminismo.

Dessa forma, foi um debate rico em questões atuais que envolvem a realidade que as mulheres vivenciam na sociedade. O debate contribuiu de forma significativa para o entendimento das questões de gênero, pois proporcionou um momento de reflexão sobre a temática. O Feminismo é uma ética, e historicamente todos os movimentos sociais estão de certa forma, interligados ao Movimento Feminista e suas reivindicações por direitos iguais entre os gêneros. Quando a mulher se auto-proclama feminista ela está marcando sua causa, seu lugar de criação que marca sua territorialidade, sua liberdade, e principalmente pela luta de tantas mulheres que foram e ainda são mortas todos os dias, nesse sistema institucional patriarcal.

Compartilhe este conteúdo: