Compulsão alimentar: “Overcoming Binge Eating”

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O Dr. Christopher G. Fairburn, psiquiatra e pesquisador da Universidade de Oxford, é uma das maiores autoridades do mundo em problemas alimentares. Seu livro, que ainda não possui tradução para o português, Overcoming Binge Eating (“Vencendo a Compulsão Alimentar”) apresenta os fatos sobre a compulsão alimentar e inclui um programa detalhado para a superação da compulsão alimentar na bulimia nervosa e na obesidade.

A compulsão alimentar é provavelmente o transtorno alimentar mais comum, mas seu ciclo de vergonha e sentimentos de impotência podem dificultar a busca por ajuda. Trago aqui alguns pontos principais da entrevista dele para o canal  de saúde Medicine Net para fins de informação de como proceder após identificado um problema alimentar.

No quesito quão prevalente é a compulsão alimentar, ele aponta para as definições técnicas usadas por pesquisadores clínicos, e que essas definições são usadas para definir a compulsão alimentar clinicamente significativa.

Há duas características que precisam estar presentes para que um episódio de alimentação seja classificado como “compulsão”: a quantidade ingerida deve ter sido realmente grande para as circunstâncias da época; em outras palavras, o contexto é levado em consideração, por exemplo, é preciso comer mais no Natal para que um episódio alimentar seja classificado como compulsão, porque todo mundo come mais no Natal, e deve haver uma sensação de perda de controle sobre a alimentação no momento. Em outras palavras, a pessoa deve sentir que sua alimentação está fora de seu controle.

Fonte: encurtador.com.br/jswKW

Ele salienta o quanto é importante que haja esta perda de controle durante o episódio. Pois é essa característica que distingue a compulsão alimentar dos simples excessos que todos nós praticamos às vezes.

Algumas perguntas podem ajudar a identificar:

– Seus episódios compulsivos envolvem comer grandes quantidades de comida?

– Você se sente descontrolado na hora?

– Entre esses episódios de exagero, você faz muita dieta?

– Você fica doente ou vomita depois desses momentos?

Outro ponto importante a ser observado, é se a pessoa se preocupa constantemente com o que vai comer, como vai me sentir depois de comer, tem pensamentos como: “Hoje, não vou comer muito; vou comer isso e isso no café da manhã”, etc.

Muitas vezes a pessoa sente que está prestes a cometer um grande erro e está ciente de que não quer fazê-lo, mas se sente impotente. É uma experiência muito desagradável.

Outro ponto que ele descreve é a dificuldade das pessoas em conseguir lidar com emoções desagradáveis. Como forma de lidar com sentimentos ruins, elas usam a comida para suporte emocional e para ajustar seu humor.

Outro ponto é sobre fazer dietas e como isso facilita o quadro de compulsão alimentar, visto que logicamente o paciente sente mais fome do que o normal. Depois dos excessos, chega a culpa, a vergonha e outras emoções negativas, levando ao vômito induzido. Depois de um tempo, essa liberação de emoções negativas a curto prazo predisporia a voltar à dieta e a recomeçar.

“Fazer dieta cria desejo pelos alimentos que se está evitando e é por isso que as pessoas costumam comer compulsivamente os mesmos alimentos que estão evitando”.

Trago aqui uma figura que exemplifica como funciona este ciclo de compensação, onde a pessoa pode até ter a ideia de que compensar te a deixaria mais livre para comer o que quiser, mas a compensação é uma prisão que dá início a um ciclo que muitas vezes pode ser vicioso.

  1. Comer demais: a restrição leva a comer em excesso ou compulsivamente.
  2. Sentir culpa: arrependimento por não ter conseguido seguir a dieta e ter comido muito mais do que o recomendado.
  3. Compensar excessos: tentativa de corrigir o erro cometido ao comer demais
  4. Repete.

Durante a entrevista, ele faz uma distinção entre o que leva a pessoa a começar a compulsão alimentar e o que mantém sua compulsão alimentar. Sobre encontrar a causa da compulsão alimentar de uma pessoa, ele diz que este é um problema complexo e interessante. Se o objetivo é ajudar alguém a superar seu problema de compulsão alimentar, então a questão principal é por que eles estão comendo compulsivamente agora. Em outras palavras, a questão importante é: o que está mantendo o problema alimentar deles? O que é mantê-lo? Uma questão separada é: o que começou a compulsão alimentar da pessoa em primeiro lugar?

Muitas vezes as pessoas procuram ajuda para problemas de compulsão alimentar muitos anos depois de terem começado a comer compulsivamente. Nesse caso, o que os levou a comer compulsivamente – digamos, quando tinham 15 anos – pode não ser relevante para eles agora, quando têm 25 anos. Então, do ponto de vista da superação de um problema de compulsão alimentar, a questão é o que está mantendo a pessoa comendo compulsivamente agora, e não por que ela começou a comer compulsivamente há muitos anos.

Fonte: encurtador.com.br/mBGLX

Os tipos típicos de coisas que mantêm os problemas de compulsão alimentar são os seguintes:

– Ter regras rígidas sobre o que se deve e o que não se deve comer. Isso torna algumas pessoas propensas a comer compulsivamente.

– Não comer o suficiente em geral. Isso torna um fisiologicamente propenso a comer demais às vezes.

– Ter dificuldade em lidar com estados de humor desagradáveis. Isso, como discutimos anteriormente, torna algumas pessoas propensas à compulsão sempre que se sentem mal consigo mesmas.

Também traz na entrevista quais as principais consequências da compulsão alimentar a longo prazo para a saúde. Diz que não há efeitos adversos da compulsão alimentar em si, mas se alguém comer demais regularmente, corre o risco de desenvolver obesidade. Isso tem muitas consequências adversas para a saúde, como todos sabemos. O outro problema associado é se alguém purgar – isto é, vomitar ou tomar laxantes – após a compulsão alimentar, então a purga tem efeitos adversos na saúde.

Há boas evidências pesquisadas de que certos tipos específicos de terapia têm um efeito marcante nos problemas de compulsão alimentar. Da mesma forma, há certas evidências de que certos tipos de outras terapias são menos eficazes. Portanto, é importante obter o tipo certo de terapia.

Existem duas principais terapias baseadas em evidências. A primeira é a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) e a segunda é chamada de Terapia Interpessoal. Ambas as terapias são bem conhecidas e bem testadas.

Em relação à tratamento medicamentoso, comenta que para pacientes com bulimia nervosa os medicamentos antidepressivos podem ser benéficos. Foi demonstrado que essas drogas reduzem a frequência de compulsão alimentar (e purgação), embora muitas pessoas não parem completamente. Os efeitos benéficos das drogas antidepressivas na bulimia acontecem quer a pessoa esteja ou não deprimida no humor – em outras palavras, não é necessário se sentir deprimido para necessariamente se beneficiar.

Deve-se acrescentar que não se sabe muito sobre quanto tempo dura o efeito benéfico das drogas antidepressivas em termos de seu efeito na compulsão alimentar. Em contraste, está bem estabelecido que os efeitos das duas psicoterapias que mencionadas anteriormente são, na maioria dos casos, duradouras.

Os objetivos prioritários do tratamento são que o paciente ganhe controle sobre a sua dieta, que as cognições sobre peso, silhueta e imagem corporal sejam modificadas e que as mudanças sejam mantidas a longo prazo.

A responsabilidade pela mudança é sempre do paciente, por isso lhe é atribuído um papel ativo. O terapeuta tem o papel de motivar, apoiar e fornecer informações e orientações.

A compulsão alimentar é um grande desafio, mas não é impossível vencê-lo. O primeiro passo é reconhecer o problema e buscar o tratamento adequado.

Fonte: encurtador.com.br/jBJP5

Referências:

MEDICINE NET. Compulsão Alimentar – Um bate Papo com Dr.Christopher Fairburn. Disponível em: https://www.medicinenet.com/script/main/art.asp?articlekey=56553. Acesso em: 12/05/2022.

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A pandemia aumentou a compulsão por doces?

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Quem não gosta de um doce? Para a maioria das pessoas, é algo que proporciona prazer. Porém, o exagero pode indicar um transtorno alimentar. Infelizmente, muita gente tem passado dos limites, como foi apontado pela pesquisa da Fiocruz feita em parceria com a UFMG e a Unicamp.

Entre outros indicadores, o estudo mostrou que, entre abril e maio de 2020, quase metade das mulheres está consumindo chocolates e doces em dois dias ou mais por semana. Esse aumento representa 7% a mais do que antes da pandemia.

Inserido no Código Internacional de Doenças (CID), a compulsão alimentar é um transtorno caracterizado por uma perturbação persistente na alimentação e no comportamento que resulta no consumo ou na absorção alterada de alimentos e que compromete a saúde física, social ou emocional.

A pandemia foi um gatilho para quem já possuía um transtorno alimentar e viu o agravamento da doença. Mas outras pessoas desenvolveram o transtorno devido aos fatores emocionais relacionados à crise sanitária.

Fonte: encurtador.com.br/pqsBX

Os doces provocam a sensação de bem-estar decorrente da liberação de serotonina presente no alimento, o que explica a compulsão. É compreensível nesse momento, já que a imposição do isolamento social trouxe severas crises de ansiedade, estresse e depressão.

No entanto, não é saudável pensar que o chocolate serve apenas como um alento, trazendo bem-estar. O excesso prejudica o corpo de maneiras físicas e psicológicas. Vale lembrar que os brasileiros já consomem três vezes mais doce do que o recomendado, segundo a Organização Mundial da Saúde.

Médicos e nutricionistas apontam que o açúcar, mesmo em pequena quantidade, ativa mecanismos dentro do seu corpo que não se restringem apenas à obesidade ou alergias alimentares, mas podem também alterar o sistema imunológico e prejudicar nossas defesas. Psicologicamente, a compulsão pode afetar a qualidade de vida.

Alguns sinais da compulsão alimentar envolvem comer mais rápido que o usual ou até se sentir desconfortavelmente cheio, comer grandes quantidades na ausência da sensação física de fome e até sentir desgostoso de si mesmo depois de comer.

O recomendado é procurar um psiquiatra e iniciar sessões de psicoterapia. O tratamento deve ser feito por uma equipe de assistência multidisciplinar composta por nutricionista, psicóloga e educador físico. É importante ainda trabalhar o autoconhecimento e buscar entender como a ansiedade, decorrente da compulsão, está afetando sua qualidade de vida.

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Ficar em casa é “oportunidade de reaprendermos a conviver”

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Isolamento compulsório pode ser momento para reforçar laços familiares.

A pandemia do novo coronavírus, responsável pela Covid-19, está impondo uma realidade inédita para as atuais gerações: ter de ficar compulsoriamente em casa. O confinamento obrigatório pode causar desconforto emocional, mas também é um momento em que é possível reavaliar a vida, melhorar o autoconhecimento, instruir-se, divertir-se, reforçar laços sociais e, especialmente, familiares.

Para entender melhor os riscos à saúde mental e as oportunidades para novas descobertas de felicidade, a reportagem da Agência Brasil entrevistou (por escrito) a psicóloga Karoline Paiva e o psicanalista Marcos Wagner, ambos de São Paulo.

Juntos, os dois escreveram a cartilha “Desconforto emocional em tempos de confinamento”, que circula pelas redes sociais e pode ser localizada por meio dos sistemas de busca na internet.

Fonte: encurtador.com.br/gnwxJ

Agência Brasil: Ficar em casa, para algumas pessoas, é extremamente agradável. Para outras, entretanto, é insuportável não sair. Esses traços poderão ajudar ou agravar no período de isolamento?

Karoline Paiva e Marcos Wagner: Pessoas introvertidas tendem a se sentir confortáveis com baixa interação social, enquanto as extrovertidas têm maior necessidade de contatos sociais. Desta forma, pessoas mais “sociáveis” podem sofrer maior angústia na privação do contato. Porém, independentemente do traço pessoal, nesse contexto de pandemia, ambos têm condições internas de enfrentamento, desde que priorizem e se motivem em direção ao bem comum.

Agência Brasil: Que desconfortos emocionais os períodos de isolamento podem causar?

Paiva e Wagner: Os principais desconfortos que percebemos são: sensação de desamparo e abandono, sensação de cerceamento da liberdade. Podem ser acentuadas inclinações já existentes para hipocondrias, depressão, processos ansiosos e manias. É importante também destacar alteração no comportamento alimentar, já que tendemos a ingerir maior quantidade de calorias, aliada ao sedentarismo acentuado neste momento. Além disso, há a luta por sobrevivência, expressa no comportamento de estocar alimentos, produtos de limpeza, etc. As compras em excesso podem ser compreendidas como uma luta pela própria preservação, por parte da população que dispõe de recursos financeiros para este tipo de consumo. Aquela parcela privada de condições se abstém do acúmulo, mas tende também a controlar seu consumo habitual de alimentos.

Agência Brasil: Vocês temem que as pessoas possam desenvolver algum tipo de neurose?

Paiva e Wagner: O contexto social de pandemia pode ser um potencializador de quadros depressivos, ansiosos e compulsivos uma vez que nossa fantasia infantil de onipotência é rompida e nos deparamos com a real vulnerabilidade humana. Há ainda questões relacionadas com [o que os psicólogos chamam de] a ferida narcísica, uma reedição das nossas angústias mais primitivas, uma vez que estamos sob ameaça de impedimento da realização daquilo que nos dá prazer e segurança. Esta desestabilização sublinha negação da realidade ou a exacerbação do medo, a depender da constituição de cada sujeito. Na luta pela sobrevivência, algumas normas e regras sociais que normalmente nos direcionavam podem ser quebradas em virtude do mal estar social generalizado. Por isso, sugerimos que as interações sociais sejam mantidas ainda que virtualmente, respeitando as novas regras como a limitação ao toque físico e proximidade. Busque manter uma rotina saudável e sociável com amigos, parentes, etc. Utilize a tecnologia a seu favor nestes contatos.

Fonte: encurtador.com.br/akTV3

Agência Brasil: Podem surgir conflitos familiares?

Paiva e Wagner: Sim. Na proposta da quarentena, a rotina cotidiana é alterada e faz com que os papeis que normalmente desenvolvemos fiquem restritos. Um exemplo: a mãe que trabalha em home office [trabalho em casa] necessita dar atenção ao filho, arcar com as tarefas do trabalho e de casa, além do papel de esposa e, muitas vezes, de filha. Ela, certamente, estará sobrecarregada. Isso pode acentuar conflitos geracionais, uma vez que são diversas demandas em cada um dos integrantes do grupo familiar. Por outro lado, é uma oportunidade de reaprendermos a conviver de forma simples e mais caseira, respeitando as limitações e perspectivas de cada integrante do grupo social chamado família.

Agência Brasil: Como passar longo tempo com a família com prazer?

Paiva e Wagner: Uma das possibilidades é que pensem juntos numa rotina para o novo, o momento de confinamento. Em vez de impor regras de acordo com a hierarquia de cada família, sugerimos resgatar o lúdico por meio de jogos compatíveis com todas as gerações (jogos de tabuleiro são boas opções); a redistribuição de tarefas domésticas. Vale transformar o momento do preparo das refeições em um momento familiar onde cada um pode contribuir, sugerir, executar de acordo com suas possibilidades etárias e físicas.

Agência Brasil: Que rotinas devemos incorporar dentro de casa para que esses dias não sejam tão difíceis?

Paiva e Wagner: Toda e qualquer atividade cultural como tour virtuais a museus, lives musicais e culturais de outras fontes que levem entretenimento e diversidade de assuntos podem aliviar a carga imposta pelo isolamento.

Fonte: encurtador.com.br/adh48

Agência Brasil: E o que devemos evitar?

Paiva e Wagner: Evite a ansiedade da hiper-informação e as fake news. Mantenha uma rotina e não se entregue ao total ócio. Faça contatos sociais e evite o desequilíbrio nas relações. Enfim, busque aquecer sua alma com as coisas que te fazem bem e te trazem esperança.

Agência Brasil: As redes sociais, os jogos eletrônicos e a programação da TV, algumas vezes vistas como tóxicas quando em excesso, serão bastante úteis ou podem ser problemáticas?

Paiva e Wagner: Todo excesso é prejudicial, uma vez que desvia o foco e pode desencadear quadros ansiosos. O ideal é buscarmos a medida do suficiente. Isso quer dizer buscar o suficiente para o consumo nas compras, nas horas de internet e jogos, nas redes sociais, etc. Há oportunidade de revisitar os vínculos e ressignificar relações. Aproveite o momento para focar nisso!!!

Agência Brasil: Vocês indicam ler?

Paiva e Wagner: Consumir boas leituras pode trazer serenidade, proporcionar novos horizontes e aprendizados, além de uma sensação de liberdade, uma vez que você pode mergulhar na história e, nesse mergulho, aliviar a tensão própria da realidade do confinamento.

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