Klaus: um filme sobre a construção de paradigmas

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Concorre com 1 indicação ao OSCAR:

Melhor Filme de Animação

O quiproquó de premissas nos transmite essencialmente a beleza da trama. O espírito natalino não está em uma magia que irrompe as pessoas em um dia do ano, mas nas relações construídas entre as personagens.

O filme Klaus, dirigido pelo estreante como diretor, Sergio Pablos, foi lançado em 2019 na plataforma da Netflix consolidando ainda mais o serviço de streaming como digno de produzir conteúdos dignos de Oscar. Com oito filmes indicados esse ano, é provável que a plataforma não leve o prêmio de melhor filme de animação com Klaus, uma vez que o favorito é Toy Story. O que é uma pena, pois a película entrega um resultado cativante e bem humorado, além de demonstrar de maneira leve e delicada a forma como aprendemos os nossos paradigmas pessoais e familiares.

Klaus não é um filme de natal, ou pelo menos, não passa essa impressão. Apesar de ter essa finalidade comercial, a trama foge à regra de um espírito natalino que é sua própria essência, como algo pronto. A película, em diversos momentos brinca divertidamente com a construção do imaginário sobre o Papai Noel e as tradições de Natal.

A partir daqui, o texto contém spoilers

Na gélida Smeerensburg, o soberbo estudante de uma rigorosa academia postal, Jesper, chega como novo carteiro devido a uma tentativa de correção moral pelo seu pai e se surpreende com o clima de destruição e guerra entre famílias na cidade. Ninguém manda cartas em uma cidade em que as mensagens são entregues pela violência explicita. Nessas condições, Jesper vê sua porta de saída ao descobrir que o recluso lenhador Klaus entrega um brinquedo a uma criança da qual recebeu um desenho acidentalmente em um envelope de carta.

A principal premissa de Jesse é que “todo mundo sempre quer algo em troca”, e ele precisa trocar 6000 cartas pela sua liberdade da cidade. Jesse começa então a incentivar as crianças a escrever cartas a Klaus. Porém, nesse encontro, seus paradigmas sofrem um grande impacto.

O espírito natalino é, essencialmente, a gentileza humana

Enquanto seres humanos nossos comportamentos são movidos por crenças, regras de percepção do mundo. Para denominar essa forma como percebemos e atuamos no mundo, usamos consensualmente o termo paradigma. Nossos paradigmas (ou premissas) são resistentes filtros que selecionam dados para nossa percepção, de um modo que acreditamos muitas vezes, que a nossa forma de fazer/ver algo é a única forma “correta” de ter êxito em uma situação (VASCONCELLOS, 2016).

Jesper não era o único a exercitar seus paradigmas na cidade, pois Klaus também era pulsionado por uma forte premissa: “um ato gentil de verdade sempre gera mais gentileza”. Os brinquedos doados suscitaram atos de paz e alegria entre as crianças, e as mensagens agora eram de harmonia e mais gentileza. Essa reação em cadeia faz com que os inocentes descendentes das famílias arquirrivais Krum e Elingboe brinquem juntos.

Nem sempre conseguimos lembrar quando foi que aprendemos nossas premissas, mas as pequenas crianças são levadas ao hall do ódio entre suas famílias, relembrando séculos de conflitos, dos quais nem suas famílias lembram como começou. Talvez essa seja a grande questão que a película deixa como provocação ao espectador: como aprendemos a acreditar que deveríamos nos manter dentro de um determinado paradigma? O que nos leva a seguir rigidamente nossas premissas?

Para as famílias Krum e Elingboe o paradigma do ódio foi tão rígido que se transformou em um paradoxo, pois, precisaram “se unir em paz para acabar com a paz”. Nesse sentido, Jesper e Klaus e seus aliados precisaram ser corajosos para cumprir a ideia de distribuir presentes na véspera de natal. Para difundir um novo paradigma é necessário que haja confiança e fé nas novas ideias, pois isso representa um novo jeito de fazer as coisas, implicando em resistência (VASCONCELLOS, 2016). Desse modo, para que Jesper siga sua jornada, a flexibilização de paradigmas faz-se necessária. O jovem deve confiar e ter fé na premissa da gentileza para cumprir sua missão e desfrutar do amor de seus amigos.

Esse quiproquó de premissas nos transmite essencialmente a beleza da trama. O espírito natalino não está em uma magia que irrompe as pessoas em um dia do ano, mas nas relações construídas entre as personagens, no esforço para seguir a premissa da gentileza apesar dos sofrimentos da vida, e no amor que é construído a partir da união por um propósito. Propósito é, definitivamente o que não falta em Klaus.

FICHA TÉCNICA: 

KLAUS

Direção: Sérgio Pablos
Elenco: Jason Schwartzman, J. K. Simmons, Rashida Jones;
Ano: 2019
País: Espanha
Gênero: Animação, aventura, comédia;

REFERÊNCIA:

VASCONCELLOS, Maria José Esteves. Pensamento sistêmico: o novo paradigma da ciência. 10 ed. Papirus Editora, 2016.

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Pensamento Sistêmico e Perguntas Reflexivas: uma prática clínica ampliada

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O princípio da complexidade se apresenta como resposta a dinâmica das coisas. No sentido de explicitar que não há uma lógica, causalidade ou verdade absoluta sobre os sistemas do universo

A teoria sistêmica se constituiu por meio da influência de vários movimentos, esses movimentos serviram para construir as noções do que não seria parte da composição da teoria sistêmica. Dentre eles tem-se o Mecanicismo Cartesiano, que defendia a ideia de que seria possível “compreender o todo a partir das propriedades das partes (GOMES; BUENO; CREPALDI, 2014, pág.5).

Em seguida surgiu o Movimento Romântico que acreditava que todas as coisas existentes se formavam e se concentravam em torno da forma orgânica, onde tudo seguiria um padrão e funcionaria de forma harmoniosa (JR. et al, 2000). Em contraposição às ideias até aqui apresentadas, se apresenta no cenário das ciências o Organicismo. Segundo esse, não seria possível entender um fenômeno apenas pelas propriedades das partes, mas somente a partir do entendimento do todo. Dessa forma, é necessário se entender a relação entre as partes na constituição do todo (GOMES; BUENO; CREPALDI, 2014). O Organicismo é o primeiro movimento que se aproxima do que a teoria sistêmica propõe.

Complementarmente, nascem a Ecologia e posteriormente a Física Quântica. A primeira focava na interconexão dos organismos, implementando o conceito de “redes que se formam dentro de outras redes (CAPRA, 2006 apud GOMES; BUENO; CREPALDI, 2014)” para explicitar que na natureza todos os sistemas vivos se relacionam entre si. A segunda, traz a ideia da interconexão e interrelação dos fenômenos subatômicos, alegando a impossibilidade da fragmentação das partículas como fim, já que estas estão interconectadas entre si (JR. et al, 2000).

Fonte: encurtador.com.br/lwK04

Finalmente em 1920, Ludwig Von Bertalanffy cria a Teoria Geral dos Sistemas. A TGS tem como premissa central a concepção de que “os fenômenos não podem ser considerados isoladamente, e sim, como parte de um todo (ESTEVES DE VASCONCELLOS, 2018).” Bertanlanffy distinguiu seis conceitos principais da sua teoria: globalidade, não-somatividade, homeostase, morfogênese, circularidade e equifinalidade. A globalidade diz que mudanças em uma parte do sistema acarretaram mudanças em todo o sistema devido a sua característica interrelacional. A não-somatividade defende que o todo não é a soma das partes, mas sim a interrelação, complexidade e organização das partes que o formam.

Continuamente, tem-se que a homeostase se caracteriza pela constante busca do sistema em manter sua estabilidade, praticando sempre a autorregulação. Em contraste, a morfogênese é o processo de incessante absorção de aspectos externos ao sistema, que provocarão mudanças em seu funcionamento. Por fim, a circularidade diz respeito ao comportamento não-linear dos sistemas, uma vez que existe uma relação de influência constante entre as partes, que vai para além da ideia de causa e efeito (ESTEVES DE VASCONCELLOS, 2018).

Cabe ainda destacar o conceito de retroalimentação ou feedback, sendo esse a capacidade do sistema de circular informações, uma vez que uma informação que sai, pode retornar para o mesmo e provocar mudanças (GOMES; BUENO; CREPALDI, 2014).

Fonte: encurtador.com.br/sTYZ7

Maria José Esteves de Vasconcellos (2018) define o pensamento sistêmico como o novo paradigma da ciência. Para ela, rompe-se com os pressupostos da ciência tradicional baseada na simplicidade, objetividade e estabilidade e passa-se a pensar ciência com base na complexidade, instabilidade e intersubjetividade.

O princípio da complexidade se apresenta como resposta a dinâmica das coisas. No sentido de explicitar que não há uma lógica, causalidade ou verdade absoluta sobre os sistemas do universo, mas que se faz necessário olhar para a natureza como incerta, acolhendo as contradições e entendendo que ela vai para além dos dualismos (ESTEVES DE VASCONCELLOS, 2018).

Nesse sentido Esteves de Vasconcellos (2018) chama atenção também para o conceito de realidade observada/percebida. Para isso ela questiona essa tal realidade, lançando o sujeito a se perguntar “Realidade de quem? Realidade em relação a que?”, uma vez que a realidade é aquela que é percebida pelo sujeito em singularidade, sendo dessa forma impossível estabelecer uma ideia única e irrefutável do que seja real ou não real.

Fonte: encurtador.com.br/uAHL4

O princípio da instabilidade entende que o mundo não é estável e ordenado, mas está em constante desordem, produzindo assim fenômenos imprevisíveis e indeterminados. Nesse cenário, toda e qualquer teoria que se defina como exata e inabalável, se coloca alheia aos processos instáveis da existência, correndo risco de cair numa ilusão aparente (ESTEVES DE VASCONCELLOS, 2018).

Por fim, o princípio da Intersubjetividade que entende que não é possível pensar em um observador que não esteja inserido no sistema, defendendo assim que existe uma influência direta do observador no sistema e do sistema no observador (ESTEVES DE VASCONCELLOS, 2018).

Diante desses três princípios trazidos pelo novo paradigma da ciência, Maria José Esteves de Vasconcellos dá as ferramentas para a atuação de um psicoterapeuta pautado nessa nova forma de ciência. Esse psicoterapeuta será um especialista em relações humanas, uma vez que ele não terá um olhar limitado de causa e efeito, e não focará no conteúdo como norteador das suas práticas, mas sim nas relações que permeiam os sistemas envolvidos.

Fonte: encurtador.com.br/bltz6

O terapeuta sistêmico novo-paradigmático entende que os sistemas não “são”, eles “estão” e por isso ultrapassa formas de intervir baseadas em uma postura cristalizada que busca por ditar o que é certo ou errado, ou ainda querer decidir pelo sujeito. Pelo contrário, o terapeuta assume uma postura de colaborador, num processo de criação de contextos para mudanças que sejam desejadas/propostas pelo próprio indivíduo. Nesse contexto, ainda cabe ao terapeuta  entender que o sistema é autônomo, e que a sua postura não será instrutiva, mas coconstrutiva, na medida em que ele construirá junto com o cliente os caminhos que poderão ser tomados. Como recurso, ele poderá fazer uso de “Perguntas Reflexivas” que serão abordadas no próximo tópico.

O uso de “Perguntas reflexivas” auxiliará tanto o terapeuta como os sistemas a olharem o fenômeno com um foco ampliado, percebendo relações que formam “uma teia de fenômenos recursivamente interligados (VASCONCELLOS, 2018, pág.151)”. As perguntas reflexivas se apresentam como ferramentas ao terapeuta sistêmico nas suas “intervenções” clínicas ou para além da clínica. Tomm (1988) definiu duas dimensões em quatro tipos de perguntas.

A primeira dimensão se refere a intenção do entrevistador, que pode ser de orientação ou de influência. Quando o entrevistador deseja orientar-se ele faz perguntas que irão alterar sua percepção em relação ao fenômeno. Quando o entrevistador deseja influenciar ele faz perguntas que tem a intenção de mudar a percepção do cliente.

A segunda dimensão fala sobre os pressupostos do entrevistador. O pressuposto da linearidade, se baseia em perguntas que buscam entender a linearidade dos eventos e as relações de causa e efeito. O pressuposto da circularidade se baseia em perguntas que buscam entender a circularidade dos eventos, se atentando para as relações de relações.

Fonte: encurtador.com.br/loPY5

Em se tratando dos quatro tipos de perguntas tem-se: perguntas descritivas lineares, perguntas interventivas lineares, perguntas descritivas circulares e perguntas interventivas circulares. As perguntas descritivas lineares pretendem orientar o terapeuta sobre a situação do cliente buscando relações de causa e efeito. As perguntas interventivas lineares buscam influenciar o cliente usando de instruções que se baseiam em causa e efeito. As perguntas descritivas circulares buscam padrões de relações e contextos para orientar o terapeuta quanto a situação do cliente. E as perguntas interventivas circulares, almejam levar o cliente à reflexão através de uma visão circular dos fenômenos, que possibilite a perturbação do sistema culminando em uma possível mudança (VASCONCELLOS, 2018).

REFERÊNCIAS:

GOMES, Lauren Beltrão et al. As Origens do Pensamento Sistêmico: Das Partes para o Todo. Pensando Famílias, Santa Catarina, v. 18, n. 2, p.3-16, dez. 2014. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/penf/v18n2/v18n2a02.pdf>. Acesso em: 18 abr. 2019.

PHILIPPI JUNIOR, Arlindo et al. Interdisciplinariedade em Ciências Ambientais. São Paulo: Signus, 2000. 319 p. Disponível em: <http://www.unievangelica.edu.br/files/images/Interdisciplinaridade%20e%20Ci%C3%AAncias%20Ambientais%20(3).pdf#page=62>. Acesso em: 18 abr. 2019.

ESTEVES DE VASCONCELOS, Maria José. Pensamento sistêmico: o novo paradigma da ciência. 10. ed. Campinas: Papirus, 2013.

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‘Você’: uma perspectiva Sistêmica das relações

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Série exalta complexidade, instabilidade e intersubjetividade do ser humano

Amar e ser amado! A grande máxima da vida de milhares de pessoas. ‘Você’, série recém-lançada pela Netflix, traz um enredo que flutua em torno da busca incessante de Joe por alguém que o ame assim como ele ama. E como ele ama? De uma forma uma tanto intensa e assassina!

Vários personagens estão envolvidos nessa trama, no entanto, essa análise se atentará a três principais: Joe, Beck e Peach.

A história de amor construída por Joe – Joe trabalha numa livraria que herdou de seu acolhedor, por ter sido ele abandonado pelos seus pais que eram adictos. Em um dia comum de trabalho, Beck adentra a livraria e os dois se conhecem. Esse primeiro encontro não rende muita esperança para ele, já que Beck deixa suas intenções soltas no ar.

E o que Joe faz? Segue a vida normalmente e espera ver se o tempo colabora com esse romance? Não mesmo! Ele determina que esse romance irá acontecer e para isso começa procurando por ela nas redes sociais e descobrindo seu endereço, para então passar a espiá-la todos os dias pelas janelas de sua casa.

De início Joe descobre que ela tem uma relação com um homem chamado Bengi, que na verdade é um completo mulherengo que não sente nada por Beck. Vendo o quão ruim era esse relacionamento para ela, o que Joe faz? Mata Bengi, porque para ele é totalmente compreensivo que ele tire esse homem da vida dela, já que ele só piora as coisas e se coloca como um obstáculo para seu possível namoro.

Fonte: encurtador.com.br/cqLQS

Na cabeça de Goldberg (Joe) facilitar os acontecimentos da vida de Beck para que eles possam ter um relacionamento sem nenhum impedimento ou complicação, é simples e o correto a se fazer. E ele realmente consegue estar na hora certa e no local certo para que o namoro aconteça, e ele acontece.

É incrível pensar a partir dessa ótica, como seria se pudéssemos controlar todas as ações que envolvessem as pessoas que “amamos”, com o intuito de nunca perdermos elas. É como se realmente tivéssemos o poder de controlar a vida, fazendo com que tudo aquilo que quiséssemos acontecesse, e tudo que não gostássemos não acontecesse mais. Essa habilidade traria muita segurança para a pessoa dotada, já que nada sairia do seu comando. Entretanto, o que Joe não sabia era que mesmo que ele tentasse controlar as coisas, as coisas não se tornariam constantes e estáveis, porque afinal o indivíduo é um ser Complexo, Instável e Intersubjetivo (VASCONCELLOS, 2002).  

A seguir uma analogia será feita entre os três personagens citados no início e os três pilares do Pensamento Sistêmico Novo-paradigmático trazido por Maria José Esteves de Vasconcellos.

Fonte: encurtador.com.br/hst14

Joe e a ‘Complexidade’ – Joe sabe muito bem o que quer desde o início, ficar com Beck acima de qualquer coisa e fazer todo o possível por ela. É por isso que a partir do momento em que eles se conhecem, ela passa a ser o único foco da vida dele, e é para esse foco que ele direciona toda a sua atenção e importância.

Dessa forma, ele não estabelece outros tipos de relacionamentos ou de hobies. E a sua visão geral de felicidade na vida, está totalmente atrelada a um relacionamento perfeito com Beck.

Joe age totalmente de forma oposta ao olhar da complexidade sobre a vida. A dimensão da complexidade da vida traz que é necessário entendermos que pensar a existência de maneira complexa, é ampliar o foco de observação, percebendo que um único fenômeno isolado nunca será livre das mais variadas influências (VASCONCELLOS, 2002). Portanto, uma tentativa de manter um relacionamento livre de complicações ou estímulos de outras pessoas, é no mínimo uma tentativa fracassada e ingênua de estabelecer uma ordem, o que Joe descobrirá apenas na prática.

A complexidade implica no conhecimento de que múltiplos sistemas estão em contato uns com os outros, e se afetam mutuamente. Esses sistemas são definidos como “um conjunto de componentes em estado de interação” (VASCONCELLOS, 2002, pág. 198). Na vida de Beck existiam vários sistemas, que eram suas amigas, sua vida de escritora, seus flertes no Tinder, seu psicoterapeuta, seu pai adiccto, seus próprios comportamentos e dilemas existenciais, e esses sistemas influenciavam sua relação com Joe e, portanto, de acordo com a visão reducionista de funcionamento vital dele, todos esses sistemas deveriam sumir e não os atrapalharem nunca mais.

Fonte: encurtador.com.br/ftzGO

Beck: a ‘Instável’ – Beck é a personificação da instabilidade. Formada em Literatura, egressa num programa de mestrado, residente em uma casa fornecida pela universidade, professora de Yoga, amiga de três garotas ricas, interessada em homens instáveis e voláteis, aventureira no Tinder, escritora. É a garota que em um dia sabe tudo o que quer e no outro duvida se realmente quer aquilo, uma hora pensa que consegue lidar com sua vida, outra hora se sente totalmente incapaz. Beck é a realidade do jovem nova-iorquino de classe média, e porque não dizer da maioria dos jovens da geração millenium.

A instabilidade da vida se compara exatamente a forma como Beck vive, já que a dimensão da instabilidade retrata o quão imprevisível e incontrolável os acontecimentos podem ser. Apresentando ainda como devemos enxergar essa desordem que é viver, como normal, já que é inevitável que as coisas mudem e evoluam independente se muitas vezes achamos estar no controle (VASCONCELLOS, 2002).

E como já deu pra perceber, é óbvio que Beck daria “muito trabalho” para Joe. É possível notar na maioria das cenas de desentendimento do casal que Beck era a quem sempre saía transtornada e sem ver solução para os conflitos, e Joe era o que sempre tinha uma solução para normalizar a situação. Essa diferença de paradigmas, ou seja, de maneiras de pensar (VASCONCELLOS, 2002), ia desde escolher a comida para o jantar, escolher entre sair com as amigas ou sair apenas o casal, decidir sobre a hora certa de escrever ou não. Para Joe todas essas decisões eram simples de serem feitas, mas para Beck eram difíceis de serem tomadas, e quando eram, podiam e mudavam facilmente. Beck era a tempestade impetuosa no mar calmo da vida de Joe.

Fonte: encurtador.com.br/ryIV4

Peach: a ‘Intersubjetiva’ – Peach era o centro da complicação do relacionamento do casal antagônico. A amiga de Beck que queria a todo custo separá-la de Joe. Peach vinha de uma família rica, tinha glamour, fama, viagens, roupas bonitas e caras, beleza, casa luxuosa, mas não tinha relações profundas com ninguém, e foi na amizade com Beck que ela estabeleceu a sua intersubjetividade e conseguiu se ver parte de um processo de intimidade na relação com o outro.

A intersubjetividade coloca as interações e as relações entre os indivíduos como construtora da experiência da realidade, é através dela que tudo pode existir. O indivíduo quando sabe que sua intersubjetividade nasce na interação com o outro, se percebe como parte de algo e entende que tudo pode ser coconstruído nessa relação (VASCONCELLOS, 2002).

E o que seria essa coconstrução? A coconstrução é a capacidade de unir aquilo que é de sua existência com a existência do outro, sem o estabelecimento de qual experiência é correta ou não, porque na verdade qualquer uma delas é válida partindo do princípio da intersubjetividade (VASCONCELLOS, 2002).

Mas é importante ressaltar que essa coconstrução não parte do pressuposto de algo positivo ou negativo, mas sim de um reconhecimento da realidade do outro como importante e válida também para a sua realidade. Isso é o que acontece com Peach e Beck, já que apesar de o relacionamento delas ser marcado por uma toxicidade e instabilidade, as duas em diversos momentos aprendem a serem e existirem uma com a outra.  

Fonte: encurtador.com.br/iACEL

‘Você’ e a performance do Pensamento Sistêmico – Joe, Beck e Peach, o que eles têm em comum? A busca pelo amor. E o que acontece nesse meio tempo de 10 episódios, é o que o Pensamento Sistêmico defende. Dez episódios que nos mostram o quanto a visão do que é amor para cada um deles é totalmente diferenciada. Cada um viveu e experimentou as experiências românticas a sua maneira, acreditando ser a maneira como eles experimentaram a única correta e aceitável.

No entanto, isso não é possível a partir do instante em que você percebe e leva em consideração as três dimensões da teoria Sistêmica: Complexidade, Instabilidade e Intersubjetividade. Maria José Esteves de Vasconcellos diz que “(…) se não há leis definitivas sobre a realidade, se só temos afirmações consensuais, não teremos mais as expectativas da previsibilidade e controlabilidade. E encontrar diferentes afirmações nos levará a perguntar pelas condições, pelos contextos em que foram feitas (2002, pág. 152).”

Fonte: encurtador.com.br/pyDLR

É aqui que você deve se perguntar, em quais condições e em quais contextos cada personagem viveu? O que os levou a ver e construir as formas de amar da maneira como elas são apresentadas na série. Talvez aí você entenda e coconstrua junto com os personagens, ou talvez não. Pode ser que de acordo com a sua experiência de vida, nem mesmo esse texto inteiro faça o menor sentido para você. Porque é realmente disso que se trata, da complexidade, da instabilidade e da intersubjetividade do ser humano, do ser ‘VOCÊ’!

REFERÊNCIA:
VASCONCELLOS, Maria José Esteves de. Pensamento Sistêmico: O Novo Paradigma da Ciência. Campinas: Papirus, 2002. 272 p.

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#CAOS2018: Família e Tecnologia é tema de minicurso

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O minicurso é parte da programação do CAOS 2018 que acontece no Ceulp até o dia 25 de maio.

No dia 22 de maio, ocorreu no Ceulp/Ulbra o minicurso “Família e Tecnologia – Contribuições do Pensamento Sistêmico”, ministrado por Cristina D’Ornellas Filipakis. O minicurso faz parte da programação do Congresso Acadêmico de Psicologia (CAOS), que ocorre entre os dias 21 e 25 de maio.

Segundo Cristina, ela queria trazer algo que não é muito comum se debater em tais oportunidades. Para isso, começou conversando com os participantes sobre a influência das tecnologias na dinâmica familiar, de forma introdutória, mas logo passou a falar sobre o pensamento sistêmico, que diz que família é um grupo de pessoas que possuem relações, comunicação e troca de afetos. Disse também que estabelecemos quem somos nas relações e não somos iguais em todas elas.

Foto: Acadêmicos participando da dinâmica do avião

Cristina utilizou-se de dinâmicas para falar sobre os cinco axiomas da comunicação, propostos por Paul Watzlawick. Os participantes do minicurso se engajaram na atividade e aproveitaram a oportunidade para debater sobre dúvidas, tecer comentários e aumentar o conhecimento na área.

Mais informações sobre o evento podem ser obtidas no site do evento: http://ulbra-to.br/caos/edicoes/2018#programacao

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Maria José Esteves de Vasconcellos e a visão sistêmica novo-paradigmática

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Nesta segunda feira 06, o Ceulp recebeu a visita de Maria José Esteves de Vasconcellos, que ministrou a palestra “Visão sistêmica novo-paradigmática: um convite para transformarmos nosso viver”. O evento ocorreu às 19 horas, no miniauditório 543, promovido pelo Ceulp em parceria com a equipe MAS, com o objetivo de ampliar essa visão sistêmica dos ouvintes e também como lançamento da pós-graduação “Atendimento sistêmico: fundamentos e práticas com famílias e redes sociais”, que acontecerá também no Ceulp.

Maria é mestre em Psicologia pela Universidade Federal de Minas Gerais, tem experiência na área de Divulgação Científica, com ênfase em Novo Paradigma da Ciência e é autora de diversos livros, entre eles “Pensamento Sistêmico: o novo paradigma da ciência”, no qual ela apresenta desde as origens do paradigma do conhecimento científico até as evoluções e transformações que esse paradigma sofreu ao longo do tempo, apontando também para novas formas de perceber e enxergar o mundo, pensando sistemicamente.

Fonte: Irenides Teixeira

O EnCena entrevistou Maria, que fala das ideias tradicionais como dificuldade em adotar uma visão sistêmica e colaborativa.

Encena – Quais os maiores desafios em buscar promover um atendimento colaborativo e sistêmico entre os profissionais?

Maria José: Eu acho que os desafios são as ideias tradicionais que ocupam as nossas mentes. O desafio em fazer uma mudança de paradigma não está nas ideias novas, mas nas ideias antigas que nos tomam completamente e muitas vezes nos impedem de optar por essas novas alternativas.

EnCena – Quais as vantagens em adotar uma visão sistêmica novo-paradigmática?

Maria José: Eu não sei se é do ponto de vista prático que a gente tem que pensar em vantagens, mas acho que é mais a gente acompanhar o movimento de mudança que está acontecendo no âmbito da ciência. Estar junto desse pessoal que está na linha de frente, promovendo a divulgação dessas mudanças.

EnCena – Você acredita que há um paradigma nas próprias instituições de ensino que limita a formação e o desenvolvimento da ciência, que precisa ser quebrado?

Maria José: Eu acho que é inevitável que as instituições de ensino ainda sejam muito tradicionais, muito embasados no paradigma tradicional da ciência. Mas já existem algumas experiências de cursos com projetos pedagógicos inovadores que a gente pode distinguir como sistêmica. Eu mesma sou consultora sistêmica do projeto pedagógico do curso de engenharia de energia da Puc-Minas que é um projeto pedagógico revolucionário ao meu ver.

EnCena – Você acredita que está próxima ou distante a realidade em que a visão e pensamento sistêmicos prevaleçam, tanto em atendimento quanto na relação com o outro, com o mundo?

Maria José: Infelizmente eu acho que ainda está distante, porque ainda somos muitos poucos que tivemos essa oportunidade de refletir sobre essas questões da mudança de paradigma e de trazer as implicações dessa visão sistêmica para o nosso cotidiano. Mas vamos caminhando para chegar lá, por isso que a gente não pode parar, tem que ir semeando essas ideias.

Nota: Aos interessados em se inscrever na pós-graduação presencial ou se deseja mais informações, procure a coordenação de pós-graduação do Ceulp ou entre em contato pelo telefone (63) 3219 – 8006 ou pelo email posgrad@ceulp.edu.br

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