CAOS 2020: Avaliação Psicológica no desenvolvimento de pessoas e organizações

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Em suas falas, Fernanda frisou sobre o compromisso ético do psicólogo em utilizar testes originais, folhas de teste e todo o material original.

Na última quarta-feira, 4 de novembro, ocorreu o minicurso “Avaliação Psicológica no contexto organizacional: aspectos práticos para processos seletivos com foco no desenvolvimento de pessoas e organizações” ministrado pela psicóloga especialista Fernanda Gomes de Oliveira (CRP 23/1476).

Fernanda Oliveira é psicóloga organizacional na multinacional Bunge, Pedro Afonso Açúcar e Bioenergia, que está localizada no munícipio de Pedro Afonso – TO a 252km de Palmas. A ministrante apresentou aspectos práticos de como é realizada a avaliação psicológica no âmbito organizacional, onde ela exibiu e explanou sobre testes que são utilizados.

Fonte: encurtador.com.br/depGZ

Em suas falas, Fernanda frisou sobre o compromisso ético do psicólogo em utilizar testes originais, folhas de teste e todo o material original. De forma a evitar quaisquer tipos de cópias ou materiais impróprios ou não originais para que a avaliação seja congruente, ética e científica. Ela apontou também sobre o teste palográfico, abordando em sua fala sobre como ele pode ser utilizado nesse processo de avaliação psicológica e a sua imensa contribuição.

Fernanda apontou sobre a importância do desenvolvimento de pessoas e como a avaliação psicológica pode auxiliar nesse processo, visto que, a partir da avaliação é possível traçar de forma mais ampla o perfil do trabalhador e encaixá-lo no cargo onde suas habilidades possam ser aproveitadas da melhor forma possível. Ela apresentou argumentos que sustentam a ideia de que a partir da avaliação psicológica tanto o trabalhador quanto a empresa podem se beneficiar, pois o trabalhador irá ocupar uma função confortável para o seu perfil e a empresa terá melhores rendimentos.

Fonte: encurtador.com.br/opuFU

Além disso, Fernanda argumentou sobre a importância de o psicólogo manter-se firme e ético diante de possíveis situações onde a empresa não queira arcar com os custos da avaliação psicológica, ou queira utilizar materiais copiados ou de origem não adequada e recomenda pelos órgãos regulamentadores. Ela apresentou argumentos que podem ser utilizados em diálogos com os gestores da empresa, de modo que eles possam compreender o porquê da utilização de materiais corretos e legais, e como a avaliação psicológica pode contribuir para a empresa.

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Multidão

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Em meio à multidão… em meio aos que me querem bem e aos que realmente se importam. Ainda sim estou vivendo a solidão. Não por falta de pessoas maravilhosas! Mas porque no momento eu estou perdida de mim e por mais que no momento tentem me fazer olhar por outra perspectiva eu não posso ver agora, porque eu estou perdida em mim!

Eu sei que para quem está de fora é difícil compreender, não tenho necessidade de que me compreenda, esse é o meu momento, um único momento. Tenho a compreensão de que tudo o que eu ando sentindo não é por acaso e faz parte da vida, faz parte do processo de evoluir.

A vida é mesmo um estilhaço de sensações, hora estamos inteiros e hora aos pedaços! O tempo inteiro estamos nos colando e nos repartindo… Faz parte! No momento estou juntando os cacos, tentando me achar. Eu sei onde me perdi, agora me custa lembrar… e com isso acabo de transpor nessa escrita mais um cuidado a mim.
Só eu posso me ajudar. É isso que faço quando também escrevo. Porque sei que não existo no mundo sozinha e tem muita gente que também sente os dias frios… tristezas e alegrias.
É só uma forma de lembrar que os dias em embaraçosos existem, assim como os dias de esplêndidos… então essa exatidão é necessária, pelo menos agora!

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Descartáveis urbanos

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A série “Descartáveis Urbanos” nos apresenta, segundo as palavras do próprio autor, momentos, lugares e situações, os quais, na correria do dia a dia, passam desapercebidos pelos olhares apressados e despretensiosos. Apresenta-nos detalhes impactantes, por vezes belos, por vezes tristes (por vezes muito mais do que isso ou mesmo nada disso), do cotidiano que levamos e que nos leva.

Trata de um olhar sensível e engajado, que traz a nossa visibilidade cenas que, por motivos diversos, negligenciamos. O autor referencia suas capturas como arte cotidiana, feita pelo mundo e por nós, num ciclo urbano constante. Ao intitular cada um de seus olhares, nos apresenta a completude de sua poesia ao falar de brasis, rodas vivas, prega dores, metáforas e mesclagens, feitas à cores fortes ou em preto em branco pelo senhor tempo, em momentos e lugares diversos, cheios de luz e vida.

Angela Marques

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As palavras e As Coisas – os Conhecimentos, as Pessoas e Suas Ordens

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O ser humano como o objeto/sujeito de estudo da Psicologia. A qualquer estudante de graduação nas ciências psicológicas este prato é oferecido, entre suas primeiras refeições formativas. É partindo dessa premissa que podemos traçar um caminho relativamente seguro por entre as páginas de “As Palavras e As Coisas: Uma arqueologia das ciências humanas” (do original Les mots et les choses – une archéologie des sciences humaines), de Michel Foucault, que conheci pela primeira vez em uma edição de 2000, pela Martins Fontes.

O subtítulo, Arqueologia…, decorre da proposta de Foucault em demonstrar que o discurso científico sobre as humanidades é uma prática social complexa que obedece a determinadas normas localizadas historicamente.

– Las Meninas, by Diego Velázquez, (1656-57). Museu do Prado, Madri.

Nesses 14 anos, o que aprendi com As Palavras e As Coisas?

As ciências são fundamentadas em epistemologias, “épistémès”, como ressalta Foucault, retomando a etimologia original desse termo grego, que significa conhecimento, ciência, e que em As Palavras e As Coisas é aplicada a partir do contexto histórico que possibilita certos saberes e discursos em determinadas épocas – epistemes, constituintes de sistemas de saber-poder estabelecidos e podendo interagir com as epistemes de diferentes tempos, também entendidas como condições do discurso.

Dentre as concepções possíveis acerca da realidade, a episteme de nossa época irá definir as que são aceitáveis dentro de um campo científico, em termos, inclusive, de julgamentos de valorsobre o que é ou o que não é científico, seja no âmbito das teorias ou das práticas.

As consequências desse pensamento são mais profundas para o pensamento científico do que costumam supor os defensores de uma ciência imparcial, que reconhece as limitações paradigmáticas em seu fazer, porém hesitam em refletir sobre o impacto da realidade sócio-histórica sobre seu pensamento e sua práxis: nossas teses, recursos e ações não apenas são delineados por pressupostos claramente estabelecidos pelo paradigma vigente na época, eles se fundamentam em ideias simples, e algumas vezes contraditórias e subjetivas, que apesar de ignorarmos, orientam nossas práticas e definem nossos discursos como cientistas.

E mais do que isso, o pensamento social, em determinada conjuntura histórica, constitui a própria ciência. Cada ciência tem seu tempo, e os saberes são anteriores aos discursos.

Erodidas de fora para dentro, as epistemes são marcadas fortemente por três momentos (em uma perspectiva eurocêntrica): o Renascimento (século XVI), a Idade Clássica (séculos XVII e XVIII) e a Modernidade, a partir de fins do século XVIII, seguidos por um quarto momento que se desenvolve desde 1955, a Hipermodernidade, que alguns também chamam de Pós-Modernidade.

No Renascimento, as palavras são compreendidas por semelhança com as coisas, sendo, preponderantemente, entendidas como indistintas das coisas, detendo uma certa autonomia: tudo era visto como linguagem, entendida conforme o contexto, por analogia. Não é por acaso que, nessa época, surge o conceito de “Livro do Mundo”, que deveria ser decifrado pelos cientistas.

A Idade Clássica é a era da representação, onde a relação entre significantes e significados é binária, por identidade ou diferença: as palavras não têm mais um estatuto de concretude, elas não são mais as coisas, elas representam as coisas. As palavras tornam-se representação e são representáveis.

É nesse momento que Foucault aponta uma perda de consciência epistemológica sobre o homem, que passa a ser visto com um construto de si mesmo, desvinculado de contextos históricos, linguísticos, laborais, da própria vida, enfim. É o que ele chama de “A Morte do Homem” (inevitável para mim não pensar aqui na morte/assassinato de Deus, anunciada na Gaia Ciência e no Assim Falou Zaratustra, de Friedrich Nietzche).

A Modernidade, por sua vez, é caracterizada pelo reconhecimento de um terceiro elemento na relação significante-significado: a inclusão do sujeito como criador de signos, e de significados para os signos. Nesse momento, o conhecimento científico, não excluindo-se as ciências humanas, passa a se entender como gerador de interpretações, e não apenas como decifrador de códigos.

A Psicologia, como ciência, é muito recente, é uma criação da modernidade. Isso não é novidade, também aprendemos nos bons cursos de graduação, nos quais se mostra como as obras de Aristóteles, Descartes e outros filósofos, anteriores à formulação da Psicologia Científica de Wilhelm Wundt, perscrutavam a “alma”, a “psique”, a mente e o coração dos homens — homens como humanidade, o que se tornou um significante para a própria ciência, no seu viés masculinista, que definiu os seres humanos definidos como homens enquanto os referentes centrais para se pensar a humanidade, em detrimento das mulheres.

Os psicólogos são sequiosos por precisar o nascimento de sua ciência nos trabalhos do Laboratório de Psicologia Experimental da Universidade de Leipzig, na Alemanha, em 1879. Fins do século XIX. A Psicologia é portanto, segundo o entendimento de Foucault, mais do uma ciência recente, moderna, é uma invenção tardia, uma especialidade discursiva formatada na episteme da modernidade.

Pergunta Foucault: “Que relação existe entre a linguagem e o ser do homem?” (p. 468), entre as palavras e as coisas? Essa indagação se mostrará crucial, mesmo que prevalentemente implícita, para o pensar-fazer psicológico.

O ser humano, entendido por Foucault como moldado pelas mesmas estruturas históricas da linguagem e do conhecimento, surgido na modernidade como sujeito do conhecimento, será o objeto de estudo das ciências humanas, entretanto, somente será possível estudá-lo a partir de tudo o que o constitui e, paradoxalmente, constitui a própria ciência que o estuda: normas que definem formas e conteúdos.

A Psicologia emerge como ciência a partir das exigências e das regras da sociedade industrial que se consolida no século XX, que se indaga sobre a pessoa, como indivíduo e como integrante de uma coletividade, não por acaso, não por “natureza”, mas porque herdou esse domínio quando de seu processo formativo.

Um alerta apontado em As Palavras e As Coisas é com relação ao risco dos psicologismos, antropologismos, sociologismos e mesmo historicismos que, irrefletidamente, levem-nos acreditar que o ser humano é uma construção desvinculada de si mesma, pretendendo-se a um universalismo que ignora “os modos de ser da vida, do trabalho e da linguagem” (p. 481).

Destruindo a ilusão de invariabilidade e permanência, ansiada pelas ciências humanas, Foucault defende que elas sempre vivenciarão um conflito, no âmago de uma complexa relação entre as dimensões biológicas, econômicas e linguísticas que compõe os sujeitos e as ciências.

Nesse sentido, por mais que a Psicologia por vezes aspire traçar os mesmos caminhos das ciências exatas, sua episteme e discursos se movimentam entre os domínios da causalidade, da ontologia e da reflexão, sem poder se garantir perpetuamente fixa em apenas um ou mais desses conhecimentos científicos.

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aniversário

Impermanência da Vida

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Hoje ao celebrar mais um ano de vida eu estou a pensar no vai e vem da vida… Eu ouso dizer que estou melhor que antes.

Meu corpo já não responde aos mesmos estímulos de antes; minha voz já não é a mesma; meu rosto em frente ao espelho se depara com as marcas que a comemoração dessa data deixou ao longo dos anos. Ainda assim ouso dizer que estou melhor.

O filósofo Heráclito disse que “nada existe de permanente a não ser a mudança, assim como ninguém pode entrar duas vezes no mesmo rio”. A vida é exatamente isto: um rio que jamais é o mesmo…

Ao amanhecer já não sou a mesma. Me deparo todos os dias com um novo ser, diferente do que ontem fui e diferente do que amanhã serei. Assim como o rio que ora refresca, ora acalma. Ora fascina, ora desanima…

É necessário manter o curso diariamente, é necessário fazer um leito por onde um rio novo surgirá e, mesmo que haja obstáculos, é imprescindível termos a coragem de atravessá-los e deixar que aqueles que nos rodeiam se deliciem nas águas do rio que hoje sou.

Na maioria das vezes sofremos por querermos viver o que se foi. Nos entregamos a momentos que não são mais possíveis e, como não é possível sermos os mesmos, a tristeza e a dor tomam conta de nossa vida e não conseguimos perceber que a vida segue assim como o rio, não podendo ser a mesma de antes.

É profundamente refrescante nos entregarmos a essa realidade e, quando somos capazes de perceber a verdade contida na frase de Heráclito, descobrimos que o fardo fica mais leve e a vida mais bela.
Vou mais longe quando leio Guimarães Rosa dizendo:

“Deus nos dá pessoas e coisas, para aprendermos a alegria…
Depois retoma coisas e pessoas
para ver se já somos capazes da alegria sozinhos…
Essa… a alegria que Ele quer.”

O grande mal é que, quando possuímos essas pessoas e essas coisas que nos fazem felizes, queremos construir uma redoma e tê-las permanentemente conosco. Nos esquecemos de que o leito do rio – o curso da vida – existe para que novas águas passem e, mesmo não sendo o mesmo, rio permanece belo como o de antes. Refrescando e lavando a alma com as novas águas que substituem as anteriores…

Neste dia em que celebro a vida, reconheço o passar do tempo e desejo imensamente que o rio que a cada dia amanhece seja refrescante e belo para aqueles que necessitam mergulhar. Mais que isso, reconheço a dádiva das pessoas e das coisas que Deus me deu e, assim, eu aprendi a alegria. Mesmo que Deus já tenha retomado muitas delas, todas serviram para que eu construísse um rio de águas profundas, límpidas e refrescantes…

Cito novamente Guimarães Rosa que nos abre os olhos, o coração e a cabeça sobre esse correr da vida, sobre essa impermanência, quando diz:

O correr da vida embrulha tudo.
A vida é assim: esquenta e esfria,
Aperta e daí afrouxa,
Sossega e depois desinquieta.
O que ela quer da gente é coragem.

É a mais perfeita realidade. Com o passar do tempo, tudo se justifica, tudo se modifica e tudo tem sua razão de ser. E ela – a vida – é a grande dádiva que possuímos e que por vezes não percebemos as escolhas necessárias e as verdades escondidas ao longo do leito percorrido.

“O mais importante e bonito no mundo é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, mas que elas vão sempre mudando.” É esse o maior de todos os aprendizados; amadurecermos o suficiente para percebermos que mudamos com o correr do rio que é a nossa vida e ainda maior que nos reconhecermos na mudança é aceitar a mudança daqueles a quem amamos e queremos sempre por perto.

Guimarães nos pede para enxergar beleza na mudança, tão difícil de ser aceita para nós, seres humanos… A mudança assusta e é sempre mais fácil permanecer igual, por isso, mesmo o que a vida nos pede é para que tenhamos coragem.

E a maior coragem é colocar em prática o que Heráclito diz: “Paremos de indagar o que o futuro nos reserva e recebamos como um presente o que quer que traga o dia de hoje”.

Hoje, com o rosto marcado, com os passos mais cansados, a voz mais humilde, vivo o hoje como a dádiva maior e procuro fazer de minhas escolhas o caminho para que as águas que sou corram amanhã no leito que for colocado a minha frente.

E que ela – a vida – com toda a sua impermanência seja a mola mestra, sempre. Assim, percebo que no correr diário das águas, me entrego ao encanto de passar todos os dias por novas paisagens e, quando o fim do leito em que corro chegar à minha frente, estarei preparada para me transformar em águas do mar. Aí não terei mais leito e sim a imensidão para navegar e me sentirei transformada e eternizada…

Finalizo com Heráclito: “O homem que volta ao mesmo rio, nem o rio é o mesmo rio, nem o homem é o mesmo homem. Nós não podemos nunca entrar no mesmo rio, pois como as águas, nós mesmos já somos outros…”

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Concretude da autogestão como reinvenção das lutas de massas (ou Assim, nunca voaremos!)

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O que precisamos é de um jeito de fazer democracia que esteja grudado na nossa pele, e que faça cada vez mais pessoas sentirem que sua pele pode ter o dom de emanar democracia. Talvez o nome “democracia” não seja tão bom, já esteja muito desgastado, usado para mentiras. Então vou usar outro termo, igualmente polêmico, ou ainda mais: nossas peles precisam emanar autogestões.

A autogestão, é o que me parece, é o principal problema da psicologia do artifício. Para quem não sabe, já há algum tempo que vem sendo feito esse esforço: sistematizar uma série de ideias oriundas de diversas teorias psicológicas, cruzá-las com pesquisas e diversas formas de investigar a natureza da psique, e assim formular um novo campo de conhecimento, dedicado à instrumentalização das pessoas oprimidas e exploradas para a sua libertação através da luta coletiva. Parece-me que as próximas investigações vão continuar teimando em repetir o que todas até aqui já nos disseram: que se trata de um problema de autogestão.

Quero começar a formular essa problemática, no seio da psicologia do artifício, trazendo uma questão concreta para o movimento estudantil de psicologia da UFES, para o movimento estudantil de psicologia e para o movimento estudantil da UFES (assim como, acredito, para todo tipo de movimento social e para todo o movimento socialista, hoje!): o fortalecimento e crescimento das vanguardas deve ser causa ou consequência do fortalecimento e crescimento das bases?

Hoje, ao contrário do que desejamos, temos poucas pessoas de fato implicadas na luta transformadora. O modo corrente de pensar e de viver, é fundado na ideia de que os interesses individuais são o único parâmetro possível, e que a dedicação a interesses coletivos é, ou perda de tempo, ou loucura, ou um atalho para atingir posições de status, e assim usar essas posições para atender a interesses próprios. Diante deste individualismo, vanguarda e massas estão esvaziadas. Isso não é, porém, uma condição irreversível, e a vanguarda hoje é exatamente aquele setor pequenino da sociedade que busca inflamar nas massas a vontade de tomar posição contra o individualismo e contra a atual sociedade.

Porém, há um desafio posto às vanguardas, que acho que elas não compreenderam por completo: como fazer uma multidão, composta por uma infinidade de indivíduos tão diferentes, com tantos interesses distintos, se mobilizar coletivamente em torno de seus interesses coletivos, e legitimar essa pequena elite crítica e pensante como vanguarda?

O primeiro passo, entendo eu, é justamente despir as vestes da arrogância. Precisamos entender que não temos o programa completo da transformação, que essas massas precisam ser cativadas não a comprar o programa que nós, minoria iluminada, construímos, e sim a construí-lo junto conosco. Para isso, é claro, é preciso aceitar a dura situação em que estamos: construir tal programa é trabalhoso, e à primeira vista, nenhum pouco atrativo a quem já está em cômodas posições. Portanto, nosso desafio passa por desmistificar a comodidade em que cada indivíduo das massas está inserido, e mostrar que a condição atual não só é degradante, mas pede um empenho coletivo.

Porém, esse processo de desmistificação se torna mais difícil quando a realidade aparece para as pessoas como inalterável. Quando a construção deste projeto parece ser da mesma natureza que a reforma da atual sociedade, através da política convencional (essa que todo mundo conhece cotidianamente como A política), fica muito difícil atrair as pessoas para a construção coletiva. Na verdade fica difícil até para nós, que já estamos até o pescoço de tão dentro dessa luta (nós, que somos supostamente vanguarda), participar deste processo de transformação. Por isso o que se põe como desafio é justamente isso: inventar formas imanentemente democráticas de decidir como a vida vai funcionar daqui pra frente. Eis o problema da autogestão.

Não devemos reunir as massas e depois começar a experimentar a autogestão. É através do convite para as experiências de autogestão que devemos trazer as massas ao protagonismo da transformação social.

Retomo o problema que coloquei acima. A vanguarda fragilizada que temos hoje, não deve ter como preocupação prioritária o seu próprio fortalecimento (não que isso deva ser deixado de lado! De forma alguma! Mas não deve ser o carro-chefe de sua ação!). Ao invés de se dedicar a uma autoconstrução, iludida de que, se reestruturando, ela será capaz de posteriormente fortalecer e reestruturar as massas, eu proponho outro caminho: entendo que o crescimento quantitativo e qualitativo das vanguardas deve vir como consequência “natural” do crescimento quantitativo e qualitativo das massas. Precisamos entender cada indivíduo como uma importante conquista, e entender que no convencimento político de cada pessoa, se abre o caminho tanto para seu crescimento qualitativo na luta estudantil e socialista, quanto para o convencimento político de outras pessoas a partir daí (crescimento quantitativo). Precisamos fazer da autogestão uma experiência de democracia urgente, apaixonante e compreensível para cada pessoa concreta, e não apenas um utópico e intangível objeto a ser perseguido, como se a democracia no cotidiano daquelas e daqueles que lutam fosse confinada ao campo do futuro.

Insisto que o movimento estudantil, assim como todo o movimento socialista, está confinado ao constante fracasso, caso não se reinvente neste aspecto mais elementar, que é: nunca perder a oportunidade de fazer cada indivíduo se sentir parte de uma construção coletiva, e ao mesmo tempo fazer cada contribuição individual ecoar enriquecendo, da maneira mais imediata possível, os processos coletivos.

A democracia precisa ser palpável, compreensível, precisa ter papel pedagógico ininterrupto na vida de cada uma das pessoas que o movimento socialista organiza. A autogestão precisa ser algo simples de explicar por qualquer transeunte nas ruas da cidade, porque algo vivido de fato (e não apenas teorizado) por cada pessoa em suas comunidades, em suas associações de moradores, em seus conselhos de fábrica, em seus sindicatos, em seus conselhos de escola, grêmios, centros e diretórios acadêmicos, em cada um de seus espaços vividos. A vanguarda que temos hoje, precisa sim se aperfeiçoar, precisa sim se formar politicamente, precisa sim repensar seus modelos organizativos, mas o que ela precisa se dedicar com mais afinco, é a entender que vanguarda não sabe mais do que base, que a palavra da vanguarda nunca pode valer mais do que a palavra da base, e que a base só respeitará de fato a vanguarda quando não se tratar de uma relação de obediência a uma liderança, e sim de uma relação de confiança nas pessoas que dedicam com afinco sua vida à militância. Essas pessoas são admiradas, porque admiram sua base, porque dedicam sua voz a ser voz desta base, porque fazem com que essa base aprenda o que é socialismo com a inteligência da pele (uma autogestão que paira no ar, que se faz tensa nas musculaturas, e não apenas na verbalidade). Uma vanguarda que se posiciona de tal maneira, que não perde oportunidade de fazer a opinião de cada indivíduo e de todo o coletivo ser aplicada da forma o mais imediata possível, naturalmente conquista o coração de novas pessoas para esse exercício de dedicar a vida com afinco à militância. O crescimento qualitativo e quantitativo de qualquer vanguarda, só vai ocorrer de forma saudável, se for assim.

Não estou defendendo qualquer basismo ou qualquer assembleísmo mesquinho. Precisamos apresentar para nossas bases a importância de formas indiretas, mediadas, de deliberação. Precisamos entender que, em certas circunstâncias, será necessário tomar decisões que não podem fazer a consulta individual a cada membro das coletividades envolvidas, e é por isso que delegamos a certas pessoas, em certos momentos, a função de decidir certas coisas. Porém, não podemos continuar na atual postura idiota da quase totalidade da esquerda, de achar que o conjunto da população explorada vai ver sentido em nossos rituais de militância, em que convidamos as massas à ação revolucionária, mas a grande maioria dos próprios quadros das nossas organizações, entidades, coletivos, partidos, mal participa dos processos decisórios sobre como serão essas ações. Nós naturalizamos que é “mais prático”, “mais rápido”, “mais eficiente”, “menos desgastante”, ou qualquer coisa do tipo, utilizar as boas e velhas formas de deliberação acumuladas pelo movimento socialista (e que não devemos jogar fora, enfatizo!). No entanto, acho que precisamos dar um espaço cada vez mais restrito às formas indiretas, mediadas, de deliberação, e não cometer o erro brutal de usá-las no momento em que está em nossas mãos a possibilidade “um pouco mais trabalhosa” de escutar a opinião da maior quantidade de indivíduos possível, e permitir que essas opiniões enriqueçam a formulação coletiva que buscamos. Isso educa as pessoas para a sociedade em que não seremos mais alienadas e alienados da gestão de nossas vidas.

Autogestão é um modo de gerir a vida que precisamos entender como aplicar em cada caso, e até nesse sentido vale a pena escutar as pessoas ao invés de chegar com fórmulas prontas. Que nós, vanguardas, levemos ideias, mas deixemos que as mãos das massas as moldem, ou mesmo que as descartem e as substituam por ideias trazidas por essas massas. Não estou dizendo que as ideias das massas são em si melhores do que as das vanguardas, estou dizendo apenas que o oposto não é sempre verdade, como nos acostumamos de forma viciada a acreditar, convencidos por interpretações equivocadas de algumas experiências verdadeiras.

Sim, a vanguarda tem seu papel indispensável. Sim, sua existência é inevitável, independente das muitas formas que ela possa tomar. Mas o que a psicologia do artifício tenta trazer neste momento é uma verdade sobre seres humanos, que não pode continuar sendo ignorada pelo movimento estudantil e pelo movimento socialista: ações baseadas em saberes estranhos aos nossos corpos, repelem nossos corpos. Quando nossos corpos se reconhecem em certas ações a agir, e em certos saberes, nossos corpos agem. A verdade revolucionária não está pronta, ela está sendo criada a cada nova luta travada pelo movimento socialista, e ou a gente desfaz os edifícios burocratizados de luta que alienam decisão e ação, e edifica novos instrumentos de luta, em que lutar faça sentido para os corpos das exploradas e dos explorados, das oprimidas e dos oprimidos; ou estamos destinadas e destinados a rodar em círculos, sob os comandos massageados de uma vanguarda tão desorientada quanto as massas (ou mais), enquanto achamos que estamos aprendendo a voar.


Nota: Texto originalmente publicado em: http://artificiosocialista.blogspot.com.br/2012/10/concretude-da-autogestao-como.html

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O silencioso movimento do frio de Palmas

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Frio em Palmas? Sim. O App do tablet indica 21°, que para quem mora aqui pode ser sentido em uma temperatura bem menor… Estamos começando a sentir nossa neve! Só que à revelia do frio do gelo, o frio das chuvas no sertão indica para uma mudança diferente. É tempo de mudanças, é tempo de a vida aparecer e de sentimentos florescerem!

Na graciosa capital Tocantinense, no coração do Brasil, dia de chuva é dia de recolhimento. Aqui, as ruas normalmente movimentadas até o começo da madrugada cedem à calmaria com que as ruas são frequentadas nesse momento. A cidade está calma! Todos se recolhem de forma quase ritualística, como se respeitassem um rito de transformação do ambiente e de si (não há dissociar essas duas). Há aqui uma espera pelos dias que virão, onde o recolhimento e o cultivo interior são as formas mais festivas de sentinela. A paisagem urbana está a beira da transformação com as oscilações entre temperaturas quentes e menos quentes, com um clima, agora, bem mais úmido.

Os nossos hábitos, próprios de dias quentes, começam a pedir descanso e por mais que nos demandem as mesmas rotinas, o cotidiano não consegue se manter na mesmice. Há com nosso frio uma necessidade primária de proteção e aconchego, de reclusão. A baixa da temperatura que sente o corpo emana também de uma necessidade de receber energia e calor, características que estamos habituados a distribuir.

Sem perceber, começamos um movimento que indica uma necessidade de reflexão, de imersão em nossas casas, relacionamentos e em nós mesmos. Vem de nós um dado medo de que a vida não seja eternamente solitária, como são características dos dias frios, e ainda que reclusos, cada um em sua casa, estamos juntos pela necessidade de vida social. É a partir de agora que todo esse movimento íntimo se prepara para ver a sorrir a cidade que por meses ficou sedenta.

Aqui a grama que recobre parte dos canteiros das avenidas, praças e logradouros começam a mostrar o verde que expressa vida. A paisagem cheia de preto-asfalto e cinza-concreto começa a deixar a companhia do amarelo-palha e tem consigo a intensidade do verde-grama. A Serra que em sua grandiosidade nos protege, começa a muitas vezes se esconder em meio ao nevoeiro como se dissesse “não olhem pra mim, olhe pra vocês”. A beleza citadina nos dias de chuva começa a ser mais graciosa do que grandiosa. Não é que ambiência do frio seja melhor do que a paisagem dos dias de calor, mas mostra as transformações dos lugares, dos homens e da vida. E nós nas noites frias, reclusos, introspectos e às vezes apenas preguiçosos, estamos unidos pela epifania da transformação.

O frio envolve nossa pele e desperta novos pensamentos, sentimentos, ações e percepções sobre o mundo. Não há ser humano, especialmente em Palmas, que não o sinta, que não demande com ele a necessidade primária de proteção. O frio, corporalmente, aproxima pessoas próximas e afasta pessoas distantes, no entanto ele nos une em nossa humanidade e une mostra quão os vários aspectos de nossa vida são integrados. Num movimento possivelmente harmoniosos mudam-se nossos hábitos, nossa movimentação e nossa ambiente. O frio há de nos unir, até porque mesmo em períodos frios, haverá dias quentes, ou podemos deixar quentes os dias.

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Imagem: The Corporation

The Corporation: a busca patológica por lucro e poder

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A Corporação (The Corporation) é uma produção canadense dirigida por Mark Achbar (Manufacturing Consent: Noam Chomsky and the Media) e Jennifer Abbot a partir do best-seller de Joel Bakan (The Corporation: The Pathological Pursuit of Profit and Power) sobre os poderes das grandes corporações no mundo contemporâneo como a Nike, Shell e IBM. No documentário, de acordo com os diretores, as corporações controlam a sociedade economicamente e agem de forma predatória, mas não têm a punição devida. Nos EUA, a lei aplicada nas ações dessas empresas é a mesma aplicada aos cidadãos do país. Portanto, a partir da concepção apresentada no documentário, as corporações são como psicopatas que não são punidos, se avaliarmos suas “atitudes”.

No documentário constam depoimentos de mais de 40 pessoas, incluindo Noam Chomsky, Milton Friedman, Mark Moody-Smith (ex-presidente da Royal Dutch Shell) e os jornalistas Jane Akre e Steve Wilson, ex-funcionários da Fox News. Temas que variam desde fábricas de fundo de quintal no Terceiro Mundo até a destruição do meio ambiente, passando pela patente do DNA, fazem parte dessa narrativa cinematográfica.

O documentário começa com um breve histórico das grandes empresas do ponto de vista legal, jurídico. Na primeira parte é colocado que as corporações há 150 anos eram empresas sem expressão e hoje são instituições que seguem uma dinâmica própria, que transcende as vontades individuais de seus acionistas e executivos, e que têm poderes, controlam e influenciam a vida das pessoas.

As corporações são comparadas a peças de um quebra-cabeça da sociedade, um time esportivo onde cada um tem uma função, mas com finalidades definidas; é como se fossem um “sistema telefônico” que tem o poder de transformar a vida do indivíduo. As mesmas são também comparadas a animais: aos tubarões por terem objetivos bem definidos (são frios e não param enquanto não atingirem suas metas), às águias por serem competitivas sempre prontas a atingirem seus objetivos e às baleias por serem grandes e “gentis”, mas capazes de engolir com facilidade seu alvo.

“Que tipo de pessoa é uma corporação?” é uma questão feita aos consumidores. Mac Donalds é um jovem empreendedor, Nike é um jovem energético, General Eletric é um velhinho com muitas histórias para contar, Microsoft é um jovem agressivo etc. É enfatizado que as corporações têm direitos de pessoas mortais, mas não têm consciência moral.

No documentário é enfatizado o fato de que, de acordo com a lei, as firmas têm os mesmos direitos que os indivíduos: podem processar, ser processadas, alugar, acionar judicialmente, sofrer perdas, capitalizar ganhos, incorporar patrimônio e tantas outras ações que as pessoas físicas realizam durante suas existências.

A partir dessa ótica, a produção se envereda em mostrar que existe uma grande diferença entre os indivíduos e a corporação. Espera-se dos indivíduos que demonstrem responsabilidade ética e social. Já a corporação tem, por lei, apenas uma responsabilidade: garantir a seus acionistas o maior lucro possível. É perceptível que a principal razão de ser da corporação é a obtenção de lucro, mesmo que isso se oponha ao bem estar comum de toda a coletividade humana. Concerne aqui afirmar, com base nos depoimentos do longa-metragem, que esta abordagem conduz à exploração da força do trabalho, à devastação do meio ambiente, a fraudes contábeis e várias outras coisas do gênero que fazem parte do mundo do capital.

Num momento do documentário um executivo de uma multinacional se diz impotente para mudar qualquer ação da empresa onde trabalha, mesmo considerando que muitas das práticas contrariam seus princípios e filosofia de vida. Há outro depoimento, de um destacado consultor do mercado financeiro, que atesta que graves crises, como o ataque terrorista ao World Trade Center, ou guerras, como aquelas que são travadas no Oriente Médio, são um ótimo negócio para os investidores que apostam seu dinheiro em ouro, petróleo, indústria bélica etc.

Entenda-se que o modo como as corporações se “comportam” reflete-se também nas relações de trabalho. Como relata o documentário, “seja no que diz respeito à dissociação entre atos individuais de funcionários e realizações criminosas cometidos pela companhia, seja na desumanização do processo de produção, existe, no ideal corporativo, algo próximo da diminuição do homem à condição de máquina”. Escândalos de grandes empresas são relatados mostrando uma realidade assustadora.

Assim, casos reais são analisados (como um psiquiatra faria) visando a um diagnóstico. É mostrada uma ficha que vai sendo preenchida mediante os estudos de casos. Abaixo um paralelo das “atitudes” da corporação e a análise de seu “comportamento”:

 

Personality Diagnostic ChecklistWorld Health Organization ICD-10

Manual of Mental Disorders DSM-IV

Danos aos trabalhadores (demissões, exploração) Indiferença com os sentimentos alheios

Incapacidade de construir relações estáveis

Danos a saúde (produção de lixo tóxico, poluição) Indiferença negligente de segurança alheia
Danos aos animais (destruição do habitat, confinamento) Mentir e enganar os outros por ganância

Incapacidade de sentir culpa

Dano para o meio ambiente (emissões de CO2, desperdício nuclear) Incapacidade de se inserir nas normas sociais
Diagnóstico: PSICOPATA
Abott, Achbar. The Corporation. Canadá, 2004.

Para tanto, a loucura de uma corporação é como a loucura de um indivíduo. Nesse estudo apontado no documentário as corporações são tidas como a tirania de diversas gerações e representam o tipo Psicopata. O indivíduo recebe mensagens das corporações, por meio da mídia, que ditam e gerenciam as suas percepções e direcionam o modo de cada um pensar. As marcas ficam cada vez mais significativas e o que consumir passa a ser um desejo não mais oculto.

FICHA TÉCNICA DO FILME:

THE CORPORATION

Direção: Jennifer Abbott e Mark Achbar
Roteiro: Joel Bakan e Harold Crooks
Elenco: Mikela J. Mikael (narração), Noam Chomsky, Michael Moore, Jane Akre;
País: Canadá
Ano: 2004
Gênero: Documentário

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