A Era do Ressentimento: um mal-estar contemporâneo

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Você é uma pessoa ressentida? A palavra ressentimento nos aparece de forma negativa nas relações, mas se torna essencial na convivência e procedimentos internos de cada um, sobretudo a partir da visão do filósofo e psicanalista Luiz Felipe Pondé, em seu livro a Era do Ressentimento. Publicado em 2014, a obra traz uma reflexão sobre o ressentimento e suas características na contemporaneidade. Faremos uma análise da obra de Pondé, e como esse sentimento afeta os relacionamentos e a vida social, numa perspectiva de que ninguém está fora dele. Esta proposta de trabalho, surgiu por meio do projeto “Psicologia em Debate” que é executado dentro do Ceulp/Ulbra.

Como professor da Universidade Católica de São Paulo, Pondé possui graduação em filosofia, mestrado e doutorado nesta mesma área pela USP, além de pós-doutorado pela universidade de Tel Aviv em Israel, tem experiência na área de filosofia e filosofia da religião, fazendo reflexões dos problemas da sociedade, entre eles o ressentimento que analisaremos neste artigo. O livro em questão fala do ressentimento, e é divido em ensaios que definem o ressentimento e suas características, apontando causas, meio e fim do tal sentimento, mostrando as falhas do ser humano e suas atribuições nesse processo. Aponta ainda a possibilidade de fazer do ressentimento um processo de superação pessoal e social.

Fonte: http://zip.net/bjtHFZ

Uma sociedade narcisista, que busca nas suas atitudes um reconhecimento afetivo, se torna uma geração de pessoas medrosas e incapazes de lidar com a morte, com a dor e com o fracasso. Pondé, chama o homem contemporâneo de covarde, o qual irá deixar a sua marca de incompetência por não saber lidar com essa realidade, buscando na maioria das vezes subterfúgios para fugir dela.

A imagem de um mundo feliz e uma busca por felicidade perene, faz dos homens seres medíocres na sua forma de vida e de relação (PONDÉ, 2014). O que seria então o ressentimento?  O ressentir para o filósofo Nietzsche seria uma marca humana essencial. Ressalta Pondé: “O ressentimento tem sua raiz profunda (o pânico diante da indiferença do universo vazio), mais um dos seus efeitos marcantes é exatamente a tendência de tornar as pessoas superficiais, por que assim nos protege da consciência do próprio ressentimento” ( PONDÉ, 2014, p.43).

Ele cita o exemplo do consumo como uma forma de vida superficial, que leva as pessoas a não se perceberem ressentidas e a não encararem suas próprias verdades. O autor evidência que não existe cura para o ressentimento, apenas formas de enfrentá-lo ou evitá-lo. “A covardia contemporânea é nosso modo específico de evitar essa verdade íntima” (PONDÈ, 2104, p.44).

Fonte: http://zip.net/bqtJHg

A moral, e a existência das religiões e da metafísica seriam uma forma de ressentimento, na qual Pondé cita Nietzsche, onde este teria uma solução para o ressentimento a partir da morte de Deus. Mas a praga do ressentimento sobrevive até a morte de Deus, e assume novas formas que para Pondé são: Estéticas, Política, ética e sexual. Esses ressentimentos do mundo contemporâneo, veem mostrar que a contemporaneidade não é um conceito temporal mas um estilo de vida. As pessoas buscam realização pessoal de forma narcisista como uma autopromoção, ou, uma forma de se mostrar melhor que a outra.

O ressentimento é um drama Ontológico, o qual não vai deixar de ser o que é, por que é imutável. O autor cita uma frase conhecida por todos dentro da filosofia dita por Sócrates, mas na verdade citada por Platão: ‘Conhece-te a ti mesmo’, indicando que o conhecer a si mesmo não é meramente composto pela história, mas diz respeito também a mortalidade do ser humano. Segundo Pondé o ressentimento humano nasce aí: a inveja dos deuses, nunca morrer, nunca ser traído, nunca fracassar, nunca adoecer. “O ressentimento é a nossa fúria para com a mortalidade que nos define e torna quase todas as nossas qualidades irrelevantes” (PONDÈ, 2014, p.55). Reconhecer que o outro é melhor ou tem algo melhor é um passo de redenção.

Os medos contemporâneos de encarar a realidade faz com que as pessoas fiquem acuadas. Pessoas que tem medo de amadurecer onde a vida é o tempo inteiro uma “balada”.  “Eu me invento”, eis o mandamento máximo do ressentindo, cita Pondé (2014, p.62). O medo de envelhecer e a ilusão de uma juventude ou alma eternamente jovem são mediocridades contemporâneas. “A solidão, essa ataca como um exame de abelha” (PONDÈ, 2014, p. 66). Enfermidade social que vem maquiada entre baladas e depressão, camufladas entre fotos nas quais nunca se viu uma de verdade.   ‘A solidão é o paraíso maldito dos livres’ ,Pondé cita Bauman, revelando que a solidão de valor é rara e exige personalidade sofisticada e singular, não sendo a solidão da vida contemporânea. E o medo do amor, sentimento este que exige demais para as personalidades dos contemporâneos, pois estes estão fechados em si mesmos.

Fonte: http://zip.net/brtHJP

A beleza observada pelo autor é como algo obsessivo dessa era, na qual se propaga as marcas da exterioridade e se fala pouco do mundo interior. Pondé vê a revolução sexual como uma farsa. A medida que a pílula foi lançada nos lançamos também a solidão, pois jogamos a sociedade nas mãos dos “crentes”, e as pessoas que se denominam seculares estão estéreis e solitárias.

Pondé aponta os fracassos, baseado no sucesso, como alimento do ressentimento, características que podem matar o indivíduo contemporâneo. A busca pelo sucesso, a democracia de direitos, a medicina sem limites na vida, a felicidade como objetivo final e sentimento perene. Consequentemente tendo como pano de fundo a crença em si mesmo, transformado-se em um indivíduo indiferente, egoísta e o orgulhoso, como se não dependesse de ninguém.

O silêncio seria uma forma verdadeira de viver antepondo uma vida de baladas e desejos, afirma o autor. Em busca de prazer sem limites, as pessoas vão negando as contradições da realidade, assim fugindo, camuflando sua existência dentro da ilusão dos bons desejos. A busca pela perfeição trará um estádio de tédio para a sociedade contemporânea, já “a ideia de relação perfeita é entediante” (PONDÈ 2014, p.101). Para Pondé não existe uma vida perfeita, e se vivemos essa busca de perfeição, vivemos uma falácia.

As formas de defesa do ressentimento seriam uma masmorra na sociedade, fala Pondé. Um dos efeitos do ressentimento para Pondé é o “coitadismo”, onde os indivíduos se tornam vítimas e não assumem suas próprias realidades, apontam sempre os outros e as estruturas sociais como culpados dos seus fracassos e dores. O se sentir coitado, é não reconhecer que o ser humano é um ser de falta como nos fala a psicanálise, sujeitos sempre insatisfeitos consigo mesmos, incapazes de suportar essas ausências. Com isso Pondé afirma: “Um mundo incapaz de suportar essa falta é um mundo povoado de adultos retardados mentais”. (PONDÈ,2014, p. 128).

Fonte: http://zip.net/bttJp4

Para Pondé, a política de direito se torna uma forma de ressentimento, quando se nega a responsabilidade diante dos fatos e acontecimentos, e assumimos estruturas que não condizem com o que somos e buscamos.  Quando o indivíduo busca ser reconhecido o tempo todo, é sinal que está em alta no ressentimento, esse vício da sociedade contemporânea é um insulto aos que sofreram na face da terra.

Uma das partes do reconhecer e entender o ressentimento é encarar a vida como ela é: “O ressentimento destrói em nós a capacidade de pensar e compreender a realidade” (PONDÈ,2014, p 147).  A busca pela singularidade se torna uma projeção e defesa para Pondé, já que quanto mais me auto afirmo me torno ridículo, não assumindo que sou um conjunto e uma construção psicossocial. A medida que o indivíduo assume quem é, vai reconhecendo o ressentimento dentro dele, com isso Ponde afirma: “A solução para o ressentimento é não nega-lo, mas nomeá-lo, ler sobre ele, perceber que é impossível não o ter em nós em alguma medida por que sempre conviveremos com pessoas melhores que nós” (PONDÈ, 2014, p. 158).

A não capacidade de produzir esperança e gratidão é um dos efeitos destruidores do ressentimento, pois gera sempre a negatividade e o egoísmo no ser humano. A esperança, a gratidão e a generosidade, são estruturas que envolve alguém que pode superar e ressignificar o sentido ontológico do ressentimento, assim superando o narcisismo que envolve o ser, eliminando a expectativa e dando vez a Esperança. Olhar e ver no outro e na sociedade algo a me acrescentar e no qual posso ajudar e contribuir.

FICHA TÉCNICA:

A ERA DO RESSENTIMENTO

Fonte: http://zip.net/bytH9m 

Autor: Luiz Felipe Pondé
Editora: Leya
Páginas: 172
Ano: 2014

REFERÊNCIAS:

PONDÉ, Luiz Felipe, 1959. A era do ressentimento: uma agenda para o contemporânea. São Paulo: LeYa, 2014.

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O Ressentimento é sempre do Outro?

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A Era do Ressentimento: Uma Agenda para o Contemporâneo, do filósofo e psicanalista Luiz Felipe Pondé, através da palestra organizada pelo Psicologia em debate, em uma exposição claramente proferida pelo acadêmico em Psicologia Lenicio Nascimento, no dia 08/03/2017, deixou todos os presentes já de início reflexivos, ao questionar: “Você é uma pessoa ressentida?”.

Penso que nesse momento, todos se voltaram para seus próprios pensamentos, e se deixaram refletir acerca desse tema, que coloca em xeque, um sentimento tão forte e negativo, quanto o ressentimento. Sabe por quê? Acredito que talvez seja, por pensarmos que o outro seja um ressentido, porém nós não somos. Nesse sentido, o autor coloca de maneira expressiva sua visão desse homem que age pelo ressentimento, sequer questionando sua verdadeira essência, entre o ter e o ser.

Fonte: http://zip.net/bctGbv
Fonte: http://zip.net/bctGbv

Nesse diálogo contemporâneo da Psicologia com a Filosofia, o autor segue apontando críticas pertinentes aos relacionamentos sociais, em que as pessoas estão preocupadas muito mais com a quantidade de “curtidas” nas redes sociais, que mostram em tempo real tudo o que elas desejam que vejam; tendo assim seus segundos de fama. Para o autor, vivemos a era do ressentimento, perdemos tempo vivendo pela exteriorização, individualismo onde “eu me basto”, um consumismo exacerbado; e constantemente correndo atrás de uma singularidade, assim buscando um reconhecimento dessa imagem que criou; imagem que não corresponde ao seu eu real; fora a isso, essa geração vive a solidão e o adoecimento com as psicopatologias, que nasce desse descompasso em não olhar para nosso interior, como somos de verdade.

Para o autor, a palavra ressentimento carrega um teor negativo; porém acredita que o primeiro passo é se perceber como sendo um ressentido, aceitando e assim buscar uma mudança que poderá trazer um crescimento pessoal. No desespero, a auto superação será a única e viável saída para uma cura e melhora interior.

Fonte: http://zip.net/bxtG7B
Fonte: http://zip.net/bxtG7B

O filósofo, apontando várias nuances dos relacionamentos superficiais, dos casais modernos que não desejam ter filhos; a secularização do papel da mulher na qual ela vive em busca de uma autonomia frente à sociedade, que nos permite perceber essa mulher correndo em busca de uma realização superficial; em que a perfeição do corpo surge como uma feminilidade vazia e inútil. Nesse ponto, possibilitamos entender a preocupação que o autor demonstra frente às demandas que nosso tempo se apresenta.

Portanto, para fugir disso, o autor sinaliza para que sejamos extra contemporâneos; seria basicamente lutar contra essa onda de ter mais do que ser; em um movimento socrático de levar o individuo a sair de dentro para fora. E, principalmente não colocar a culpa do seu ressentimento no outro, procurar a verdade, o sentido da vida.

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Ressentimento: uma perspectiva provocante

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Sou uma pessoa ressentida? Com tal questionamento, fomos inseridos ao oportuno e interessante tema, extraído da obra do filósofo Luiz Felipe Pondé: A Era do Ressentimento – Uma Agenda para o Contemporâneo. Um rico diálogo da Filosofia com a Psicologia, explanado no Psicologia Em Debate do dia 08/03/2017 pelo acadêmico em Psicologia Lenício Nascimento, oportunizou o entendimento das demandas dos relacionamentos atuais, principalmente quando traz como pano de fundo, o ressentimento gerado pela exteriorização e superficialidade, o consumismo e a individualidade, aos quais estamos nos adequando sem ao menos contestar o porquê desse embate entre o ter e o ser, e suas consequências.

Dizemos a nós mesmos que: “eu me basto”, não preciso de ninguém, gerando uma via para a solidão e o ressentimento; nesse ponto o palestrante intencionalmente nos remete a uma reflexão necessária. Por meio de uma contextualização e interação com os alunos, o palestrante aponta o tema do ressentimento, como um embate que travamos em nosso ego, com o que a contemporaneidade foi forjando para que a sociedade do consumo e dos relacionamentos superficiais chegasse à atualidade com os dramas que acabam por gerar em nós uma série de psicopatologias, além da solidão, pela qual estamos de certa maneira cercados.

Fonte: http://zip.net/bvtGDN
Fonte: http://zip.net/bvtGDN

Contudo, o autor nos alerta quanto ao fato de que a palavra ressentimento pode possuir em si mesma, forte conotação negativa; alegando ainda que podemos retirar dessa experiência, uma forma de superação contra as nossas próprias adversidades; lutar contra o ressentimento para que alcancemos nosso crescimento como pessoa. E, ainda segundo o autor, no desespero ou auto superação, podemos trabalhar esse sentimento negativo, transformando em algo positivo.

O autor, sinalizando para uma geração de pessoas ressentidas, que vivendo sob a ótica narcisista, enxergando-se a eles mesmos como pessoas singulares, sempre procurando um reconhecimento público para seus feitos; exemplificado pelo palestrante como as pessoas que levantam uma bandeira em defesa da natureza, porém não conseguem suportam a convivência com a própria irmã ou outro parente qualquer. Assim, seguimos negando que somos pessoas ressentidas, e a culpa sempre será do outro.

Para tratar desse problema, o autor tem como possibilidade de solução, não negar o ressentimento, e sim aceitar o que está sentindo e procurar a verdade, o sentindo verdadeiro da vida. Quanto a isso, essa obra que nasce do olhar filosófico e psicanalista do autor, observando nessa geração que são sete bilhões de pessoas no mundo inteiro, procurando seu pedaço de felicidade. Estamos afogados numa espécie de ressentimento, dado circunstâncias por estarmos sempre achando merecedores dessa felicidade, somos mimados, achamos que Deus nos abandonou. Em contrapartida, o problema se estende para além, já que estamos sempre ressentidos por algo ou alguém que não nos ouviu, não retribuiu nosso amor, enxergamos a vida do outro como melhor que nossa própria; assim vivemos com as nossas feridas narcísicas abertas, expostas.

Fonte: http://zip.net/bltFJM
Fonte: http://zip.net/bltFJM

Portanto, mapeando uma série de sintomas dessa contemporaneidade, o autor abre espaço para conferirmos a grande tragédia que estamos vivendo, conseguinte trocamos a vida real e seus dramas, por plataformas e redes sociais que mostra ao outro, o que queremos ser, ainda que esse outro não seja meu eu real. Assim, seguimos nossa jornada para no futuro sermos lembrados como pertencentes a “Era do Ressentimento”.

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