Por Dr. Rafael Siqueira
Vivemos em uma era em que tudo é mensurado, comparado e exposto. O desempenho deixou de ser um mérito e passou a ser uma obrigação. É preciso ser eficiente no trabalho, presente em casa, sociável nos encontros e, como se não bastasse, impecável na cama.
Nesse sentido, a sexualidade masculina, há muito atravessada por estereótipos, sofre uma pressão silenciosa, mas poderosa: a de provar, sempre, que é capaz. Dentro desse contexto, não surpreende que procedimentos estéticos, como o preenchimento peniano ou a “harmonização peniana”, tenham ganhado espaço no debate público.
Não se trata de condenar a busca por melhorias estéticas ou funcionais. Aliás, eu mesmo realizo esses procedimentos em consultório. O problema é quando essa procura se torna apenas mais um capítulo de uma corrida infinita pela performance, em que o corpo é fragmentado como se fosse uma gaveta que pode ser ajustada isoladamente.
Ao enxergar a sexualidade de forma compartimentalizada, como se bastasse “melhorar” uma parte para resolver o todo, corre-se o risco de ignorar que o desempenho sexual não depende apenas de medidas, duração ou frequência. Depende, antes de tudo, da qualidade da relação, do afeto, da autoestima e da saúde física e mental.
O corpo humano não é uma coleção de peças independentes. É mais parecido com um caleidoscópio: cada mudança em um ponto reverbera no todo. Quando a intimidade é reduzida a números e comparações, ela perde parte de sua essência.
No caso do preenchimento, esse recurso tem uma grande vantagem, pois funciona de maneira temporária, quase como um corte de cabelo. Se o resultado não agradar, não é permanente. O efeito do ácido hialurônico passa com o tempo, e o pênis volta à circunferência original.
Por outro lado, essa característica também representa uma limitação: o efeito é transitório. Além disso, o procedimento é caro, só deve ser realizado por um profissional habilitado, preferencialmente um médico urologista, e não é coberto pelo SUS nem por planos de saúde.
Ainda assim, para muitos homens, o preenchimento oferece um impulso de confiança e autoestima que vai além da estética, atuando também na forma como se sentem consigo mesmos.
Por isso, ao mesmo tempo que avanços médicos e estéticos oferecem novas possibilidades, é fundamental que cada homem se pergunte: estou buscando isso por mim ou pela expectativa dos outros?
A verdadeira “harmonização” talvez não esteja apenas na circunferência, mas no equilíbrio entre desejo, cuidado próprio e conexão genuína. É possível aproveitar os benefícios de procedimentos estéticos sem perder de vista que intimidade, afeto e autoconhecimento continuam sendo insubstituíveis.