Co-relação da epilepsia, depressão e a tentativa de suicídio, à luz da Fenomelogia Existencial

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O Ministério da saúde, junto à Secretaria de Atenção à Saúde, define a epilepsia como “a uma doença cerebral crônica causada por diversas etiologias e caracterizada pela recorrência de crises epilépticas não provocadas”, sendo uma alteração do Sistema Nervoso Central (SNC), e sua expressão clínica se inclui sintomas cognitivos psiquiátricos em concomitância com crises epilépticas. (MS, 2013 p.1). Essa condição traz implicações diretas à qualidade de vida do sujeito afetado, pois tem consequências neurobiológicas, cognitivas, psicológicas e sociais. Diversas pesquisas apontam que a predominância de transtornos depressivos em pacientes com epilepsia é expressivo (MARTINS; GONÇALVES, 2017).

No que diz respeito aos aspectos psicossociais envolvidos como causa de depressão, a estigmatização e discriminação que perpetuam no contexto atual, o controle ineficaz das crises e as significativas mudanças nos hábitos, vêm se tornando fatores constantemente relacionados com a depressão. Deste modo, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a estimativa é que mais de 350 milhões de pessoas vivem com depressão, e na pior das hipóteses, a depressão pode levar ao suicídio (OMS, 2016).

Fonte: encurtador.com.br/ivIMQ

O objetivo deste trabalho é identificar e reconhecer algumas contribuições da fenomenologia-existencial para trabalhar o contexto da depressão, a partir de publicações científicas sobre a relação com a epilepsia x depressão. Justifica-se o presente estudo diante da necessidade de se conhecer e acolher melhor tal patologia e transtorno depressivo, para que possamos tratá-la de modo mais eficaz. Depressão e epilepsia podem compartilhar mecanismos patogenético que facilitariam a ocorrência de um na presença do outro, sendo mais provável encontrar a depressão em pacientes com epilepsia quando comparado com sujeitos sem estarem.

Para a finalidade metodológica deste artigo foi utilizado à pesquisa bibliográfica. Utilizou-se da abordagem qualitativa com objetivo metodológico exploratório. A pesquisa se desenvolveu no levantamento bibliográfico, fundamentado em artigos científicos, dissertações e teses de mestrado em conformidade ao tema. Foram analisados artigos em periódicos e teses encontrados nas plataformas Scielo, BVS-PSI e PEPSIC. Tal escolha para o percurso metodológico se dá pela urgência de se abrir debates sobre este tema à luz da fenomenologia-existencial.

Um transtorno que requer atenção

O referido trabalho consiste em um estudo bibliográfico sobre a co-relação da epilepsia como fonte desencadeadora para a depressão, sendo estimulo para a ideação ou tentativa de suicídio, sob o enfoque da fenomenologia existencial. Diante disso, a prevalência mundial de epilepsia ativa foi estimada em torno de 0,5%-1,0% da população, dos quais, aproximadamente 30% continuam sofrendo crises, apesar do tratamento adequado com medicamentos anticonvulsivantes, ou seja, são pacientes refratários (MS, 2013). Sendo considerado o transtorno neuropsicológico de maior hegemonia, que pode trazer como consequência a morte súbita, lesões, transtornos mentais e disfunções psicológicas (MARCHETTI; DAMASCENO, 2000). Para ser diagnosticado com epilepsia, o indivíduo precisa apresentar um conjunto de convulsões que não podem ser provocadas por algum estímulo que seja facilmente tratável, ou seja, que não sejam por alterações da glicemia, por abstinência ou abuso de álcool e drogas, e não apresenta nenhuma alteração hidroeletrolítica tratável. É de suma importância compreender a diferença entre convulsão e epilepsia. A convulsão é um sintoma, e ocorre pela despolarização de uma área do cérebro.

O cérebro funciona a partir de estímulos elétricos, por isso quando pensamos, raciocinamos, movimentamos algum membro do corpo, etc, ocorre à despolarização, uma atividade elétrica em determinada região do cérebro, denominado hiperexcitabilidade, e um excesso de atividade elétrica da área ocorre à convulsão (MARTINS; GONÇALVES, 2017). Isso se dá pelo fato da diminuição da função serotoninérgica, noradrenérgica e GABAérgica que são identificados como neurotransmissores fundamentais no mecanismo patogenético da depressão, e formam a base do tratamento (OLIVEIRA; PARREIRAS; DORETTO, 2007).

Fonte: encurtador.com.br/jPU45

Os autores Kandratavicius, Hallak e Leite (2007), afirmam que há um encadeamento de acontecimentos comuns entre depressão e epilepsia, entre eles estão à redução da laboração serotoninérgica e noradrenérgica, além de anormalidades nas estruturas e funcionalidade no sistema límbico.  Exames de neuroimagem funcional mostram que uma diminuição da atividade no lobo frontal é condição essencial para o desenvolvimento da depressão. Essa disfunção levaria a um hipometabolismo nas regiões do cérebro, aumentando a vulnerabilidade à depressão. Contudo, se considerarmos os sintomas devastadores que a depressão apresenta na qualidade de vida, de pacientes nesta patogenética, embora ainda seja difícil fazer uma correlação entre depressão e ansiedade, nestes casos clínicos, torna-se evidente e de suma importância o tratamento adequado de depressão a estes pacientes (OLIVEIRA; PARREIRAS; DORETTO, 2007).

Em pacientes com epilepsia ficam evidentes os principais sintomas como, modificações na capacidade de sentir prazer ou vivenciá-los, perda e/ou diminuição de interesse e concentração, cansaço físico ou mental acentuado. Todos estes sintomas são presentes em pacientes depressivos, como também vistos em epiléticos, juntando-se ainda a baixa autoestima, autoconfiança e sentimentos de indignidade e culpabilidade. Os autores Santiago e Holanda (2013) apontam que existem alguns principais fatores que se elucidam como fatores de risco para a depressão, acontecimentos que se elevam o estresse, uso abusivo ou perdas de drogas ou medicamentos, histórico familiar de depressão, episódios de depressão anteriores e doença física. OMS (2011) relata que se torna uma questão mais difícil tanto em países desenvolvidos mesmo que estes tenham uma atenção maior à saúde mental, como os em desenvolvimento, o fato de muitas pessoas não conseguirem se beneficiar dos serviços psiquiátricos ofertados. Pelo fato da relação preconceituosa existente aos sujeitos que são portadores de transtornos comportamentais e mentais.

Fonte: encurtador.com.br/fgjW4

Pesquisas apontam que esses estigmas são fatores que podem potencializar o sofrimento do sujeito acometido pela depressão, dificultando assim, o diagnóstico e adesão ao tratamento de maneira correta e eficaz. A complexidade em se elaborar e fechar um diagnóstico a partir das diversas manifestações da depressão acaba em confundir as expressões de depressão que não são clínicas, ou se assemelham com estados de tristeza. Aqui se julga necessário e pertinente não confundir o diagnóstico depressivo com sentimentos melancólicos e/ou de tristeza, haja vista que estes, acompanham o indivíduo por diversos momentos da vida, pois, são acontecimentos estressantes do dia a dia.

A depressão é um transtorno psicopatológico ao qual seu diagnóstico precisa ser coeso para que assim, se possa ofertar um tratamento adequado em conformidade com sua necessidade e gravidade. Como seus encaminhamentos para um completo tratamento. Os autores ainda teorizam que a nomenclatura correta a ser usada é “transtorno depressivo”, pois assim é possível diferenciar o sentimento normal de tristeza temporário da depressão clínica (PARKER; BROTCHIE, 2009). Desta forma, pacientes epiléticos, encontram-se em profunda tristeza, sem ânimo para seguir por vergonha da sua condição, enxergando somente como solução o suicídio, já que o suicídio é uma forma de agressão que o próprio sujeito faz a si, procurando por fim a dor e vergonha que sente, dando fim aos seus problemas, ou seja, fim à própria vida.

Fonte: encurtador.com.br/yMV57

Não podemos esquecer que existem vários outros meios de autoagressão, aos quais não podemos classificar como ato suicida, porém, nos revelam particularidades no tocante as tentativas de suicídio, ao passo que nos demonstra completo desinteresse pela vida. Pois quando não se tem um sentido pela própria vida, ou seja, falta deste sentido, isso se torna um aliado importante para a tomada de decisão ao ato violento de se matar (ROCH; BORIS; MOREIRA, 2012). Logo, Santiago e Holanda (2013) teorizam que pesquisas mostram a eficácia na utilização de psicoterapia no tratamento de pacientes/clientes com depressão, seja ela em grau leve, moderado ou mais grave. Neste contexto, a psicologia fenomenológico-existencial compreende e diferencia os fenômenos psicopatológicos, se comparados aos outros modelos focados ao biológico e fisiológico. Torna-se necessário para o psicoterapeuta existencial, saber reconhecer que cada ciclo da vida acarreta suas dificuldades, para que assim a psicoterapia possa atender com total competência não apenas as queixas explícitas do seu cliente, mas sim acolhê-lo em sua completude existencial. Ou seja, o foco da psicoterapia existencial seja que o cliente experimente sua existência como real, tornando-se apto para suas potencialidades e assim saber agir sobre elas (GOMES; CASTRO, 2010).

Assim, fundamenta-se a tomada de consciência, o insight na psicoterapia. Conclui-se que ajustamentos depressivos por dado paciente, são ajustamentos criativos, onde se configura um padrão depressivo de contato, ou seja, barreiras de contato conflituosas, onde não se percebe as disfunções, mas que se torna importante para um ajustamento em várias situações da vida.

Fonte: encurtador.com.br/bnsGH

Define-se que o ajustamento depressivo, nada mais é que uma maneira encontrada para economizar a regulação, para se evitar tomadas drásticas pelo indivíduo acometido pela depressão (YANO, 2016). Logo indivíduo se torna capaz para lidar com as frustrações da vida que surgem, presentificar e tomar compreensão de maneira a usufruir destas para fazer um ajustamento criativo e a partir dessas frustrações adquirindo conhecimento, e crescer com tais demandas (ROCH; BORIS; MOREIRA, 2012). Rogers (1961/1997, p. 196), “é apenas quando vivencia um aspecto de si mesmo negado até então, num clima de aceitação, que a pessoa pode tentar assumi-lo como parte de si mesmo”. Tal experiência é dolorosa, mas somente desta maneira se possibilita aceitação genuína de maneiras a lidar com a nova percepção antes não cogitada, ou até mesmo enxergada.

Ainda para Rogers (1961/1997), é a partir da experiência humana na autenticidade de se tornar quem se é que ao mergulhar por inteiro neste processo de autoconhecimento, provocando mudanças, somente aí se encontra de forma fácil quem verdadeiramente se é. Só a mudança diante deste processo, diante de novas escolhas, de forma criativa e autentica, permite-se uma avaliação organísmica de tal experiência. Ao se tornar pessoa, consideramos nossas experiências em possibilidades existenciais, passamos a ser responsáveis por nossas atitudes e escolhas, e isso tem significado potencializador.

Partindo das considerações expostas sobre a epilepsia, a depressão e a tentativa de suicídio, é notório o efeito negativo na qualidade de vida dos indivíduos acometidos de tal sintomatologia. Para tanto, percebe-se a importância de um tratamento adequado a estes pacientes, buscando um vínculo de empatia e autenticidade para com estes. Nesta relação terapêutica se torna essencial entender à subjetividade de cada indivíduo quanto ao processo de saúde/doença na fenomenologia, pois nesta abordagem evidencia-se o próprio fenômeno e o indivíduo quanto sua consciência, como seus sentimentos, fantasias e memórias. Desta forma, torna-se necessário a aceitação do indivíduo como ele se mostra no aqui – agora, acolhendo o seu modo de se expressar.

REFERÊNCIAS:

OLIVEIRA, Bruno Lucio Marques Barbosa de; PARREIRAS, Mariane Santos; DORETTO, Maria Carolina. Epilepsia e depressão: falta diálogo entre a neurologia e a psiquiatria? Journal Of Epilepsy And Clinical Neurophysiology, Porto Alegre, v. 13, n. 3, p.109-113, set. 2007. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1676-26492007000300004>. Acesso em: 05 set. 2018.

SANTIAGO, Anielli; HOLANDA, Adriano Furtado. Fenomenologia da Depressão: uma Análise da Produção Acadêmica Brasileira. Revista da Abordagem Gestáltica – Phenomenological Studies, Paraná, v. 1, n., p.38-50, jul. 2013. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rag/v19n1/v19n1a06.pdf>. Acesso em: 05 set. 2018.

 ROCH, Marcio Arthoni Souto da; BORIS, Georges Daniel Janja Bloc; MOREIRA, Virginia. A Experiência Suicida numa Perspectiva Humanista-Fenomenológica. Revista da Abordagem Gestáltica, Fortaleza, v. 1, p.69-78, jun. 2012. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rag/v18n1/v18n1a10.pdf>. Acesso em: 06 set. 2018.

Organização Mundial de Saúde. (2011). Relatório sobre a saúde no mundo. Genebra: Organização Mundial de Saúde. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rag/v19n1/v19n1a06.pdf. Acesso em: 06 set. 2018.

PARKER, Gordon; BROTCHIE, Heather. Depressão maior suscita questionamento maior. Revista Brasileira de Psiquiatria, Austrália, v. 31, p.53-56, jan. 2009. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rbp/v31s1/a02v31s1.pdf>. Acesso em: 06 set. 2018.

YANO, Luciane Patrícia. A CLÍNICA EM GESTALT-TERAPIA: A GESTALT DOS ATENDIMENTOS NOS TRANSTORNOS DEPRESSIVOS. p.67-85, abr. 2016. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rnufen/v7n1/a05.pdf>. Acesso em: 07 set. 2018.

ROGERS, C. R. (1997). Tornar-se pessoa (5ª ed.). São Paulo: Martins Fontes (Original publicado em 1961)

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Ansiedade à luz da Gestalt-Terapia: o aqui e agora corrompido

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A Gestalt-terapia é uma abordagem construída a partir de inúmeros pressupostos, como a filosofia existencial, a teoria organísmica, a fenomenologia, entre outras. Esta abordagem percebe e considera que o homem é um ser único e capaz de se realizar durante sua existência. Considera, ainda, este como um ser para a relação, que se constrói a partir da experiência com o outro.

Ribeiro (2012) ressalta que

Tanto a proposta gestaltistica como a existencialista se encontram e se irmanam no sentido de privilegiar o homem como ser que se possui, como ser livre e responsável. (…) a crença no homem, aqui e agora presente, capaz de tornar-se cada vez mais consciente de si próprio, a partir da experiência vivida agora e da certeza de sua extensão para depois (…) (p.61).

A Gestalt-terapia possui inúmeros conceitos. Destacar-se-á alguns destes para melhor compreensão da temática deste trabalho como o campo, auto regulação ou homeostase, fronteira de contato, ajustamento criativo, Awareness e o aqui e agora.

O campo refere-se à relação entre o indivíduo e seu meio. Segundo Perls (1977 p. 31) esta relação homem/meio determina o comportamento do ser humano sendo que se a relação entre ambos é satisfatória o comportamento é tido como normal, mas se esta é conflituosa o mesmo já é colocado na posição de anormal. A auto regulação ou homeostase diz respeito ao equilíbrio do indivíduo na interação com seu meio. É onde este satisfaz suas necessidades na busca de equilibrar-se de forma dinâmica (SANTOS; FARIA, 2006, p. 268).

Quanto à fronteira de contato entende-se como o local da experiência do indivíduo-meio.

Fonte: https://bit.ly/2LmYVmi

As fronteiras são processos de separação e ligação, os quais possibilitam a diferenciação entre o organismo e o seu meio, bem como a seleção dos elementos nutritivos daqueles que são tóxicos, sendo que essa diferenciação ocorre por meio dos órgãos sensoriais e pelas respostas motoras frente ao ambiente. (SANTOS; FARIA, 2006, p. 267)

Já o ajustamento criativo consiste na natureza do contato existente na fronteira do campo onde o indivíduo se regula e se ajusta as situações ali experienciadas (DACRI; LIMA; ORGLER, 2012, p. 20-21). Outro conceito importante é o da Awareness que não tem uma tradução específica e pode ser compreendida como “tornar presente”, “presentificar”, “conscientização”. Refere-se à capacidade de discriminar aquilo que é bom e ruim o que resulta em crescimento no processo de ajustamento criativo (SANTOS; FARIA, 2006, p. 267).

Para melhor compreensão da temática ansiedade, faz-se necessária a compreensão deste ultimo conceito, o aqui e agora. Este se refere ao momento presente, Perls (1977 p. 77) acredita que “O agora nos mantém no presente e nos põe a par do fato de que nunca é possível uma experiência, exceto no presente.”. Portanto, entender o sujeito ansioso e os fenômenos que o cercam envolve a compreensão de que “a ansiedade é o vácuo entre o agora e o depois.” (PERLS, 1969, p.15).

A ansiedade é um fator que está presente com frequência nos sujeitos da atualidade, muito mais em uma época de globalização e capitalismo exacerbado com constantes oscilações de mercado, extrema velocidade de informações e novidades tecnológicas que terminam por contribuir para que as pessoas se sintam mais ansiosas, e assim desenvolvendo os adoecimentos e transtornos característicos dessa época.

Fonte: https://bit.ly/2v3QSQi

Desenvolvemos no mundo contemporâneo um cenário social de esvaziamento, banalização, solidão, insegurança, individualismo, e tantos outros sintomas que parecem sugerir, diante dos avanços científicos e tecnológicos que o problema não reside tão somente nesse contexto, e sim na forma como ele foi sendo construído, se formando sob as bases de um sistema complexo e calcado no capitalismo neoliberal, um crescimento político econômico e social que não considera a dimensão holística e subjetiva do homem, e das outras formas de vida. “Gestalt-terapia transcende a visão dicotômica, reducionista e pouco complexa do mundo, delineando uma visão de homem e de mundo que substitui a conjunção alternativa ‘ou’ – que separa e fragmenta – pela aditiva ‘e’ – que relaciona e integra”. (NUNES, 2008, p.187).

Lima (2009) acrescenta que as preocupações com a competência, a seriedade e a eficiência na vida diária do homem contemporâneo, muito mais por parte dos que vivem nos grandes centros urbanos, e que lutam pelo seu sustento, experimentando um processo de esvaziamento do contato, uma espécie de redução dos sentimentos e das sensações e emoções, em que nos tornamos mais distantes de nós mesmos e também dos relacionamentos afetivos mais profundos, tem afetado e, desse modo, vamo-nos tornando apenas repetidores de papéis, sem criatividade pagando um preço por vivermos um tempo de medo, que de certa forma paralisa nossa ousadia e criatividade. Com isso, os quadros de ansiedade, pânico e demais fobias são cada vez mais frequentes em nossa sociedade atual.

Desse modo, sendo o termo “Gestalt”, enfatizando o sentido de totalidade, configuração e interdependência nas partes que formam um todo, e assumindo uma concepção revolucionária na qual o mundo, a pessoa ou qualquer outra coisa poderá ser compreendido para além das somas das partes que o compõem. “Ou seja, ao interagir no todo cada parte é superada, ao ser afetada e transformada pelas outras ‘partes’ com que se relaciona. Da mesma forma, o próprio ‘todo’ supera a soma das partes que o compõem, transcendendo-as”. (NUNES, 2008, p.187).

Henckes e Santos (2017) acrescentam que ansiedade para a Gestalt Terapia pode ser compreendida como uma interrupção, ou mesmo como um movimento e sintoma de que o sujeito procura se adaptar, na tentativa de lidar com situações, que porventura venha a trazer lembranças e pensamentos daquilo que muitas vezes o faz sofrer.

Fonte: https://bit.ly/2JOhU3L

Importante ressaltar que para a Gestalt Terapia, o sujeito é constituído na relação, com isso ele é parte de um contexto sócio cultural, devendo ser observado dessa forma; e ao trabalhar na clínica acerca do diagnóstico, é acima de tudo ter o cuidado de não usar uma visão que venha a reduzir ou mesmo despersonalizar a pessoa que está buscando ajuda. Portanto cabe ao terapeuta na clínica da Gestalt, uma busca pela valorização da singularidade do sujeito e ainda nas implicações que fazem parte da vida e do processo terapêutico desse cliente.

Santos e Faria (2006) apresentam a Gestalt-Terapia por meio da definição do self como a fronteira do contato em movimento. Falando ainda que ao tocar algo no mundo, imediatamente essa pessoa também é tocada, experiência essa que sustenta e define o self, como sendo também o self a experiência de contato que acontece com o mundo no aqui e agora, e por meio da fronteira, se dá o momento a momento. Esse é o leve movimento e processo do organismo que busca no meio uma forma de satisfação de suas necessidades e mesmo de um objeto que seja importante, no tempo e lugar determinado, e ainda relacionando-se assim com o que os autores chamam de auto-regulação organísmica; como sendo o processo por meio do qual acontece a interação entre o organismo e o meio, assim o organismo procura o equilíbrio homeostático.

Desse modo, e buscando essa homeostase e auto-regulação organísmica, apesar de tratar-se de um processo natural por meio do qual o organismo busca o equilíbrio, assim ao buscar a assimilação de um novo elemento, nesse movimento e busca de algo novo, apresenta-se a ansiedade que pode vir com níveis que termina por comprometer esse processo natural pelo qual acontece o contato com os elementos que são importantes e necessários ao organismo. Sendo assim, por ser incapaz de satisfazer suas necessidades organísmicas, é que o organismo adoece, e permanece em estado de desequilíbrio.

Por receio antecipado aos efeitos dos novos elementos, que são integrados no seu organismo é que o indivíduo ansioso, termina por inibir o processo natural que é o de contato e assimilação dos novos elementos que são necessários ao seu crescimento, assim diante da ansiedade, e ainda dessa constante renovação que acontece por meio da relação dialética que se dá com esse indivíduo, e deveria acontecer de forma espontânea, o mesmo não consegue priorizar o objeto principal e importante, que se apresenta no aqui e agora, assimilando e indo ao seu encontro.

Fonte: https://bit.ly/2LzGlXG

Santos e Faria (2006) verifica que o resultado para o surgimento da ansiedade deriva de situações por meio das quais as excitações não acham uma saída ou caminho em direção ao mundo, por assim dizer, não são expressas e também por não se transformarem em atividades, assim acontece a mobilização muscular por meio do sistema motor, processo resultante em ansiedade.

Henckes e Macedo (2017) verifica que os sintomas da ansiedade, apresenta em conjunto uma série de sintomas físicos, como por exemplo, a diminuição da respiração, que é por meio e de forma explícita que acontece o contato do sujeito com o meio externo; e ainda a distorção do tempo, como importante para apontar como um fator presente que o sujeito passa a sofrer em virtude de uma pressão muito grande.

A experiência, presente na fronteira de contato, acontece em configurações inteiras trazendo um significado direto para o organismo, e se não apresenta de acordo com essas características pode ser descrita como fora da fronteira, por assim ser ou uma abstração ou ainda potencialidades; ao contatar o ambiente o organismo passa a selecionar e também a assimilar apenas os elementos que são nutritivos e com isso acontece a rejeição para com os elementos tóxicos. Portanto, na manutenção do organismo, é que acontece a assimilação de elementos novos que possibilitaram esse crescimento necessário.

Importante abordar que outras teorias sobre a ansiedade complementam os textos gestálticos. Na psicanálise, Freud elaborou três teorias sobre a angústia, sucessivamente: “[…] a de 1893-1895, sobre a neurose de angústia; a de 1909-1917, em que examinou as relações entre angústia e libido reprimida; e a última, em 1926-1932, na qual retomou suas teorias anteriores, sobre o seu conceito do aparelho psíquico” (ROBINE, 2006, p.114). Assim, a abordagem da Gestalt-terapia, leva em consideração ao assemelhar-se à essas duas últimas teorias freudianas, levando-se em conta, algumas diferenças e reservas de suporte teórico (ROBINE, 2006).

Fonte: https://bit.ly/2JS9OHg

Com esse desdobramento, surge a abordagem da angústia. “Essa abordagem da angústia (ou ansiedade, pois no contexto de nosso comentário, podemos assimilar os dois conceitos limitando-nos a diferenciá-los apenas no que diz respeito ao aspecto quantitativo)“. (ROBINE, 2006, p.114).  Outrossim, o sentimento de angústia se manifesta por meio de uma excitação bloqueada, quando resulta da interrupção que se dá pela excitação do pensamento criativo. Com isso, o surgimento da angústia impede o sujeito de certa forma, a acessar, seja em si, ou no ambiente, recursos que necessita ao suporte.

 Segundo Vogel (2012, p.106) “Baseado na teoria de campo da física, Lewin propõe que as atividades psicológicas do homem ocorrem em uma espécie de campo psicológico, que ele denominou espaço vital”. Este campo ao qual Lewin pontua, é formado pelos eventos da vida da pessoa, ou ainda, que os mesmos possam influenciar o comportamento dela, quer estejam no passado, presente ou futuro. Espaço que é importante por ser construído e constituído, através da interação das necessidades que a pessoa tem com o ambiente psicológico, revelando assim algumas variáveis, que agem de acordo com as experiências que o indivíduo acumulou na vida.

Uma grande influência dentro da Gestalt-terapia foi a conceituação e suporte teórico construído pelo neurofisiologista Kurt Goldstein, com a Teoria Organísmica, no qual buscou uma explicação holística para as mudanças ocorridas na personalidade da pessoa, não acreditando sobre a possibilidade de explica-las a partir e somente no ambiente ou ainda nos aspectos físicos. “Para isso, baseia-se na lei de figura e fundo da Teoria da Gestalt, por ser um de seus adeptos, apoiando-se na ideia da percepção como uma dinâmica na formação de figuras e fundos”.  (VOGEL,2012 p.107). Acreditando com isso que seus estudos com pessoas lesionadas na guerra, serviriam para compreender os comportamentos adaptativos de forma geral. “Essa capacidade do organismo de interagir com o meio de forma que possa se atualizar, respeitando sua natureza, é o que Goldstein denomina auto-regulação organísmica”. (VOGEL, 2012, p.108).

Lima, (2009, p.88) lembra que “Para que a auto-regulação aconteça, é fundamental que o organismo possa ter respostas novas para as situações pelas quais ele passa na sua permanente interação com o meio ambiente”. Sendo assim, é possível perceber que ser criativo de certa forma é condição importante para o processo de auto-regulação, um critério básico para que a pessoa se considere em harmonia e satisfeita com o meio. (LIMA, 2009).

 Quanto à ansiedade, Goldstein entendia que o indivíduo ao se defrontar com a ansiedade e diante de situações que causam essa sensação, ou o indivíduo que tenha um funcionamento normal, reagirá evitando passar por essa situação que experimentará a ansiedade, desse modo criando certos padrões rígidos comportamentais, ou ainda por meio disso, ele entrará em contato com essas novas experiências, com isso criando uma expansão de novas possibilidades à ação e também à reflexão. De forma, que ambas são igualmente valiosas, com destaque para a criatividade, bem como a potencializar a autoregulação-organísmica (VOGEL, 2012).

Ribeiro (2005, p.178) ressalta que “Os sintomas têm a ver com partes, processo, totalidade. É essa totalidade que nos interessa no processo terapêutico”. Nessa direção, e buscando o jeito específico e íntimo, que o cliente tem de estar no que o mais torna singular no universo, desse modo, o psicoterapeuta está de certa forma, procurando nele e ainda com ele, a sua parte criadora, o seu “todo”. Nesse sentido, o autor refere-se ao todo, como a ipseidade, o resultado, ou o fruto do que foi se tornando a sua evolução, como foi sendo constituído, fazendo contatos e assim numa individualidade única.

Fonte: https://bit.ly/2LIaAIzed

O modo como “[…] as “doenças psicopatológicas” na Gestalt-terapia aproximam-se muito mais do que poderíamos considerar perda de flexibilidade nesta permanente interação com o meio do que a apresentação de um quadro sintomatológico […]”. (LIMA, 2009, p.91). Diante de padronizações de sintomas e doenças, a pessoa perde a fluidez, e com isso a impossibilidade de ser criativa, ou ainda criar respostas às demandas apresentadas pelo meio que vivencia. (LIMA, 2009).

Ribeiro (2005, p. 57) afirma, ainda, que “A abordagem gestáltica está solidamente edificada na psicologia da Gestalt, na teoria do campo e na teoria holística”.  Através desses conceitos-chave, o autor direciona o embasamento teórico e epistemológico, pois assim são os que lhes permitem fazer uma descrição da realidade, feitas a partir do que foi observado, acerca da experiência imediata.

Desse modo, é possível afirmar que a experiência é formada por uma celeridade e concretude, como também uma ação aqui-e-agora. E, o corpo sendo visto como um veículo para a vivência, e por meio dele é que o mundo dá entrada em nós, desse modo nós fazemos e participamos do mundo, e assim somos alterados por ele, possibilitando ainda mudá-lo também. Por meio dessa interação dialógica com o mundo é que produzimos nossa experiência cotidiana, vivencial, intelectual e emocional. (ALMEIDA, 2010).

Diante da relação do sujeito com o mundo, Brum (2016) chama a atenção para um contexto atual da sociedade afirmando que “Estamos exaustos e correndo. Exaustos e correndo. Exaustos e correndo. E a má notícia é que continuaremos exaustos e correndo, porque exaustos-e-correndo virou a condição humana dessa época.”. Todas as condições em que a sociedade é submetida tornam-se disparadores para a instalação da ansiedade.

As projeções para o passado e futuro estão intimamente ligadas à noção de tempo existente. “O tempo, para o indivíduo ansioso, da mesma forma, apresenta-se contraído. O tempo é vivenciado como por demais estreito para conter satisfatoriamente o desenrolar dos fenômenos espaciais.” (SANTOS E FARIA, 2006, p. 271). Assim, a noção de tempo de um sujeito ansioso é também de redução, ou seja, o tempo nunca é suficiente. Além do mais há a pressão por desempenho e satisfação que não corresponde ao tempo existente.

A “falta de tempo” é geradora da não presentificação da experiência, algo muito comum de ser encontrado no contexto clínico. Falta tempo para tudo, mas o ideal de futuro e inúmeros planejamentos rígidos são frequentes e presentes, por que no “vácuo entre o agora e o depois” (PERLS, 1969, p.15) corrompe-se a experiência aqui e agora.

Fonte: https://bit.ly/2Oc762F

A não correspondência do tempo em relação às atividades cotidianas ocasiona o fenômeno já citado por Brum (2016) onde o corpo não se satisfaz e já não suporta a “correria” em que vive. Compreender a vivencia do aqui e agora é entender que o “aqui” diz respeito ao espaço em que se encontra e o “agora” diz respeito ao tempo (MESQUITA, 2011, p. 62).

Frente à discussão, é possível perceber que “o vácuo entre o agora e o depois” (PERLS, 1969, p.15) é o limbo da existência onde o sujeito ansioso se encontra. Vivemos a sociedade do cansaço, como afirma Han (2015) “A sociedade do século XXI não é mais a sociedade disciplinar, mas uma sociedade de desempenho. Também seus habitantes não se chamam mais “sujeitos de obediência”, mas sujeitos de desempenho e produção. São empresários de si mesmos” (p.22). Esta busca pelo desempenho tem a tendência de conduzir os sujeitos a evitação de contato e por isso experimentar da ansiedade com maior frequência.

É preciso encarar o contexto atual de maneira assertiva, onde filtra-se aquilo que deve ser introjetado ou não na construção do ser. A introjeção dessa condição, cujo foco é o desempenho e a independência por meio de ganhos financeiros e status social tornam os sujeitos dependentes e tolhidos da liberdade de serem fecundos em seus sentimentos, sejam eles bons ou ruins. É cansativo não ser autêntico e tolhido da liberdade própria do ser para gozar das experiências presentes.

Viver o aqui e agora numa sociedade ocidental capitalista é um grande desafio. Mas a verdade é que esta concepção ao passo que é imprescindível é também difícil de ser compreendida na prática. O aqui e agora pressupõe mudança e aceitação. Mesquita (2011) argumenta que

Para que haja mudança, segundo a visão gestáltica, o indivíduo precisa se apropriar de si e integrar suas polaridades. Tem que se reconhecer, aceitar-se para poder mudar. Quando isso não é feito, toda a energia de impulso e motivação é jogada para o futuro, para o que se deseja ser. Mas, como o futuro é sempre um sonho, um para além do presente, podemos dizer, então, que o momento atual esvazia-se de projetos, de impulsos e, consequentemente, nenhuma mudança real acontece. (p.63).

Uma realidade está ligada a outra e assim compõe a totalidade do ser. O indivíduo nunca é visto separadamente, conforme a Gestalt-Terapia. Este está se relacionando com o meio e atuando nele, se trata de uma relação de reciprocidade. Incansavelmente a Gestalt-Terapia trabalha o resgate do cliente que flutua no vácuo do agora e depois para que presentifique sentimentos e sensações a fim de atribuir a estes novos significados para si. (MESQUITA, 2011, p. 65).

 Viver o presente permite ao sujeito desenvolver as próprias potencialidades na medida em que se encontra, na certeza de que não se pode ser aquilo que não é. Perls (1969) afirma que “Se você estiver no agora não pode estar ansioso, por que a excitação flui imediatamente em atividade espontânea. Se você estiver no agora, você será criativo, inventivo.” (p.16). ainda segundo Perls (1969) o agora possui uma base segura na qual a preocupação com o futuro não possui, por isso que estar ansioso gera angústias.

Fonte: https://bit.ly/2A61Fzg

O autor também chama a atenção para os papéis sociais acreditando que a ansiedade também parte deste pressuposto. Como mencionado anteriormente por Han (2015), esta é a sociedade do desempenho. E diante disto há a busca exacerbada por status social, onde a performance do sujeito frente aos demais precisa ter um desempenho que indique que ele é competente o bastante. Por isso que Perls (1969) afirma que nem sempre a ansiedade é existencial, mas que pode ser uma preocupação com estes papéis que podem não ser socialmente aceitos. Todavia, para compreender de onde parte isto é necessário mergulhar em si mesmo e lá encontrar respostas.

A ansiedade pode ser compreendida como produto de um aqui e agora corrompido. O que corrompe esta experiência pode partir de diversos pontos tais como o contexto social, que citado anteriormente tem seguido um ritmo muito acelerado no qual fica impossível experienciar o contato com sentimentos e sensações, ou mesmo pela inautenticidade diante da sociedade, a preocupação com os papéis a serem desempenhados impedindo de ser quem se é.

O fato é que a ansiedade está cada vez mais presente na vida dos sujeitos ocasionando uma série de problemas nas relações interpessoais, na tomada de decisões, servindo de empecilho para o contato com os próprios sentimento, etc. Todos estão propensos a, em algum momento, desenvolver a ansiedade. Por isso, torna-se necessária a compreensão acerca do aqui e agora e de estudos relacionados, pois a ansiedade o afeta diretamente.

Perls (1969) destaca que “quanto mais a sociedade muda, mais ela produz ansiedade” (p.52), pois afeta não só a vivência do aqui e agora, como também produz inseguranças acerca das representações sociais que se tem. Desempenhar um papel socialmente aceito, viver no limbo da existência, são condições da ansiedade e que precisam ser trabalhadas na busca de homeostase. Para isso o sujeito precisa aceitar as condições em que se encontra e a partir disso elaborar estratégias de mudanças. É por isso que a ansiedade precisa ser compreendida com profundidade, levando em consideração a totalidade dinâmica de cada um, sendo este um ser inserido em ambientes diversos e exposto a situações variadas nas quais a ansiedade pode se instalar.

REFERÊNCIAS:

ALMEIDA, Josiane Maria Tiago de. Reflexões sobre a prática clínica em Gestalt-terapia: possibilidades de acesso à experiência do cliente. Rev. abordagem gestalt.,  Goiânia ,  v. 16, n. 2, p. 217-221, dez.  2010 .   Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-68672010000200012&lng=pt&nrm=iso>. acessos em  15  abr.  2018.

BRUM, Eliane. Exaustos-e-correndo-e-dopados. El PaÍs Brasil, Brasil, v. 00, n. 00, p.1-10, jul. 2016.

D’ACRI, Gladys; LIMA, Patricia; ORGLER, Sheila. Dicionário de Gestalt-terapia: “Gestaltês”. 2. ed. São Paulo: Summus, 2012.

HAN, Byung-Chul. Sociedade do Cansaço. São Paulo: Vozes, 2015

HENCKES, Aislin Cristina Corbellini; SANTOS, Maria Luisa Wunderlich dos. Ansiedade e Gestalt-Terapia. 2017. Boletim EntreSIS V.2, n.1 (2017). Santa Cruz do Sul- RS. Disponível em: <http://online.unisc.br/acadnet/anais/index/php/>. Acesso em: 28 mar. 2018.

LIMA, Patrícia Albuquerque. Criatividade na Gestalt-terapia. Estud. pesqui. psicol.,  Rio de Janeiro ,  v. 9, n. 1, abr.  2009 .   Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1808-42812009000100008&lng=pt&nrm=iso>. acesso em  14  abr.  2018.

MESQUITA, Giovana Reis. O aqui-e-agora na Gestalt-terapia: um diálogo com a sociologia da contemporaneidade. Rev. abordagem gestalt,  Goiânia ,  v. 17, n. 1, p. 59-67, jun.  2011 .   Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-68672011000100009&lng=pt&nrm=iso>. acessos em  27  abr.  2018.

NUNES, Lauane Baroncelli. Pensando gestalticamente a contemporaneidade. 2008. Rev. IGT na Rede, v 5, n.9, 2008 p.185-199. Disponível em: <http://www.igt.psp.br>. Acesso em: 14 abr. 2018.

PERLS, F.. A Abordagem Gestáltica e Testemunha Ocular da Terapia, 2 Ed. Rio de Janeiro: LTC, 1977.

PERLS, Frederick Salomon. Gestalt-terapia explicada. São Paulo: Summus, 1977.

RIBEIRO, Jorge Ponciano. Do self e da ipseidade: uma proposta conceitual em Gestalt-terapia. São Paulo: Summus, 2005. 206 p.

RIBEIRO, Jorge Ponciano. Gestalt-terapia: Refazendo um caminho. 8. ed. São Paulo: Summus Editorial, 2012.

ROBINE, Jean-marie. O Self desdobrado: perspectiva de campo em Gestalt-terapia. São Paulo: Summus, 2006. 254 p. Tradução: Sonia Augusto.

SANTOS, Letícia Pimentel; FARIA, Luiz Alberto de Freitas. Ansiedade e Gestalt-Terapia. 2006. Revista da Abordagem Gestáltica: Phenomenological Studies, vol. 12, n.1, jan., 2006 pp. 267-277. Goiânia-GO. Disponível em: <http://www.redalyc.org/articulo.oa.=357735503027>. Acesso em: 28 mar. 2018.

VOGEL, Andréa Rodrigues. O papel do terapeuta na relação terapêutica de Família Sistêmica Construcionista Social.2012. Rev. IGT na Rede, v 9, n.16, p.97 de 152. Disponível em: <http://www.igt.psc.br/ojs/issn 1807-2526>. Acesso em: 14 abr. 2018.

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TDAH: Transtorno situacional ou patologia? Um olhar à luz da fenomenologia

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TRANSTORNO DO DÉFICIT DE ATENÇÃO COM HIPERATIVIDADE (TDAH): O que é e quais suas causas? É um transtorno neurobiológico, de causas genéticas, que tem surgimento na infância e frequentemente acompanha o indivíduo por toda sua vida adulta, tem como características a desatenção, inquietude e impulsividade. É reconhecido por vários países e pela Organização Mundial de Saúde (OMS) (ABDA, 2002). Como já descrito o TDAH se caracteriza pela junção de dois sintomas, a desatenção e a impulsividade. Ao nos depararmos com um diagnóstico de um Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), nos deparamos também com problemas de atenção focalizado no perceptor e hiperatividade no motor. Podemos dizer que essa perturbação/problema pode se caracterizar por uma desorganização de atuação do indivíduo com o meio em que se relaciona, entre espaço e tempo (MATOS, 2013).

Segundo Abda (2002), o TDAH trás a tona as dificuldades que crianças sentem em se relacionar com outras crianças como também com os próprios pais e, por conseguinte, professores. Desta forma essas crianças seguem com estereótipos do tipo “crianças lentas, estabanadas, sem noção de lateralidade, ligadas nos 220 w, etc.” Assim, visualizamos que se há problemas na percepção e motor dessas crianças, de fato acumulam-se todos esses sintomas de desatenção e impulsividade, limites e regras se tornam mais complexos para serem atingidos. Na vida adulta ocorrerá no trabalho dificuldades de iniciar e terminar o que foi proposto, sempre se esquecendo das atividades laborais, ansiedade em alto grau, e inquietação.

Assim, Seno (2010), retrata que o TDAH afeta de 3 a 5% das crianças e é na vida escolar que pais e educadores conseguem perceber este transtorno, mesmo a priori não se conseguindo identificar cura para tal transtorno, a manifestação deste segue tendência a diminuir com uso de fármacos, para melhor aprendizagem e concentração a fim de alcançar os objetivos pedagógicos. Podemos identificar a relação estreita entre a medicação e o transtorno frente às possibilidades que quietude nestas crianças, mas também se torna visível o outro lado destes fármacos, como sonolência e aumento da agressividade até se conseguir a dose certa para cada caso/criança.

Tentamos aqui identificar a hiperatividade como algo que pode aparecer na relação mente (psicológico) e corpo de uma criança de forma que expressa seu modo de ser ou constitui uma patologia. Tal transtorno tem sido estudado incansavelmente em pesquisas científicas para que possam ser aprimorados seus critérios diagnósticos a fim de conhecer melhor e saber o surgimento, causa deste transtorno, em contrapartida em relação à dimensão psíquica da criança é pouco discutida e estudada.

Fonte: https://goo.gl/q23tSh

Foco no indivíduo e não no TDAH- O Olhar FenomenológicoNa fenomenologia existencial buscamos trabalhar com a multidimensionalidade do ser humano, nosso enfoque é a relação (contato) e estudo desse ser.

A tendência do pensamento científico moderno começa a sinalizar uma mudança na concepção de saúde e doença. A nova noção de doença apresenta uma perspectiva de múltipla causalidade, renunciando à ideia antiga de que há apenas um único fator etiológico. Salienta a influência ambiental nas ações e no comportamento do indivíduo e a importância da subjetividade nas formas de manifestação da patologia. Antony e Ribeiro (2005)

A abordagem fenomenológica enxerga a patologia como intrapsíquica ou individual, vista como produto da subjetividade que se caracteriza por ser, ou seja, intra-subjetividade. Portanto a Gestalt-Terapia traça um histórico de pensamentos que tudo é uma totalidade, tudo muda e tudo se relaciona com algo mais. É um prisma relacional, que assinala a patologia com um produto da desconfirmação do ser enquanto existente, enxergando o homem como um ser de relações (HOLANDA, 1997). “A doença é relacional. Não existe doença em si. Doença é fenômeno como processo; como dado, existe em alguém, e não como realidade em si mesma”. O enfoque gestáltico, assim, visa ir além da descrição dos sintomas, busca o sentido da patologia e as vivências da pessoa adoecida (ANTONY; RIBEIRO, 2005).

Pela Fenomenologia caracterizamos o indivíduo pelos seus anseios, vontades e necessidades que geram impulsos internos, destacando-se a figura do fundo. Deste modo é necessário que haja contato com o meio a modo de realizar a tomada de consciência para que o indivíduo possa estabelecer experiências frente aos tipos de contato.

A hiperatividade nos últimos anos vem sendo estudada a partir da perspectiva de que é um tipo de transtorno que tem uma visão singular voltado para os princípios diagnósticos e a origem, em que cientistas atribuem à criança como o transtorno. Diversas pesquisas estão sendo pautadas na busca de encontrar uma causa que seja de ordem biológica que esclareça o que é o transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH). Porém comprovações de lesão e disfunção neurofisiológicas são pouco relevantes e permanecem incertas (ANTONY; RIBEIRO, 2005). No entanto tem se aumentado a procura de pais que desejam um diagnóstico plausível e saber o que realmente os filhos possuem, nesta busca procuram por profissional afim de que sejam sanadas tais dúvidas e incertezas.

 

Fonte:https://goo.gl/NZ7ju1

Então, uma criança hiperativa ou distraída, vai se encaixar em três processos caracterizados pelos autores (ANTONY & RIBEIRO 2005, apud MUNHOZ, 2011) como o da deflexão, que é identificado pelo contato rápido que ela instaura em seu meio, é uma atitude de defesa em combate a ansiedades e tensões, tal como não fosse possuinte dos seus desejos, e não tivesse a compreensão de si a ponto de se direcionar a alguma coisa ou alguém, que a induza a constituir ligação, ou seja, evitasse o contato direto, desvia o olhar e a energia do objeto primitivo; a projeção, um mecanismo obstante da sua atitude, já que ela própria, depois de ser tanto repreendida, acaba acreditando que não consegue fazer de um jeito diferente, o que indica que a sua baixa autoestima é resultante de seus lapsos em sua estrutura corporal, deslocando assim, a própria responsabilidade para o meio; e o egotismo que a faz toda poderosa, com instabilidade emocional e comportamentos impetuosos, apesar de em forma de mecanismo de compensação, tendendo a ser generosa com relação à separação de seus bens, é um reforço deliberado das fronteiras de contato para reinvestir a energia do ego, é narcísica e uma etapa do processo terapêutico.

TDAH é, juntamente com o Transtorno Desafiador Opositivo e o Transtorno de Conduta, um dos três transtornos mais comuns no dia a dia profissional de pediatras, psicólogos e psiquiatras. Sua prevalência é estimada em 3% a 6% da população infantil geral, mas outros estudos encontraram índices de prevalência com ampla variância (de 3% a 26%) no mesmo tipo de população (MATOS, 2013).

Tamanha variação não deixa de impactar o nível de diagnósticos dados, um desvio considerado do desenvolvimento infantil que afeta de 3% a 5% das crianças, uns que a consideram uma doença biológica, neste seguimento o índice populacional afetado é bem maior e se tornando cada vez mais impossível de ser definido. Chegamos à discussão relevante de que uma visão patológica biológica do TDAH, quando diagnosticado uma criança passa a fazer uso de medicações anfetaminas e metilfenidato, partindo do pressuposto que a síndrome é uma disfunção neuroquímica. Assim o transtorno está intimamente ligado ao uso desta medicação metilfenidato, onde se teve um aumento de 700% de crianças fazendo uso de psicoestimulante, onde surgiu uma overdose de diagnósticos errados (MATOS, 2013).

Esses dados são uma forma de alarmar tanto aos pais quanto os profissionais da saúde que diagnósticos feitos de maneira errônea podem trazer consequências graves as crianças que foram somente medicadas sem ter um acompanhamento preciso, ocasionando um excesso de tantos medicamentos que foram ingeridos de forma descontrolada. Dessa forma esses dados são um jeito de repensar a maneira de se diagnosticar e adequar um tratamento que seja preciso, e não só a base de medicamentos.

A síndrome de déficit de atenção foi identificada em 1902 por um médico inglês que na época associou a hiperatividade ao aspecto motor da consciência, assim essas funções perturbadas são as mesmas as quais Freud atribuiu à inibição, desta forma encontramos aqui um modo para começar a pensar a esclarecer o TDAH, seria este pensamento pela inibição, percebemos que essa vinculação não é feita pela psiquiatria (MATOS, 2013). Começamos então a entender sobre a psicopatologia clássica a fim de esclarecer como se trata o pensar mais que um transtorno, mas como também a respeito da função que é perturbada por tal transtorno, a consciência.

Fonte: https://goo.gl/z9ghbd

Define-se a consciência de forma clássica como a junção de dois vocábulos latinos: cum (com) e scio (conhecer), indicando o conhecimento compartilhado com outro e, por extensão, o conhecimento “compartilhado consigo mesmo.” Já na língua portuguesa, a palavra consciência tem três diferentes definições: A primeira pela neuropsicologia define consciência no sentido de estado vígil, para consciência é fundamental estar desperto, acordado, lúcido, ou seja, um nível de consciência. Na segunda temos a definição psicológica, onde a conceitua como soma total das experiências conscientes de um determinado momento pelo indivíduo, é a dimensão subjetiva da atividade psíquica que se volta para a realidade, relação do Eu como o meio, é a capacidade de entrar com a realidade, perceber e conhecer seus objetos. E por último a definição ético-filosófica, usada com mais frequência na ética, filosofia e direito, aqui se refere à consciência a capacidade de tomar ciência de seus deveres éticos e assumir seus direitos. Tratando-se da consciência moral e ética (DALGALARRONDO, 2008).

Quanto à atenção a definimos como a direção da consciência, conjunto de processos psicológicos que torna o indivíduo capaz de selecionar, filtrar e organizar informações significativas. Já com as anormalidades da atenção encontramos a hipoprosexia que se relaciona com a perda básica da capacidade de concentração e fragilidade quanto à percepção de estímulos ambientais. Encontramos também a hiperprosexia a qual consiste em um estado exacerbado de atenção somente em algum estímulo, tais transtornos podem ser encontrados em pessoas com transtorno de humor, obsessivos compulsivos e esquizofrênicos (DALGALARRONDO, 2008).

Torna-se perceptível que toda essa alteração na capacidade de estado vígil, tanto em aumento quanto em diminuição altera-se também a percepção de tempo cronológico, uma vez que altas e baixas perdas de concentração implicam-se a falta de ordem temporal e espacial, tais eventos ficam perceptíveis no ambiente a partir que consciência é afetada (MATOS, 2013).

Diante disso, precisamos estar atentos aos sintomas do transtorno de déficit de atenção/hiperatividade que provavelmente pode começar na vida escolar, falta de concentração na escola, percepção de ordem espacial e temporal afeta também na vida das crianças que são diagnosticadas, por isso é importante o acompanhamento diário dos pais na vida e no desenvolvimento das crianças, para estar atentos aos sintomas, que quanto mais cedo forem percebidos melhor para iniciar o tratamento o quanto antes.

Fonte: https://goo.gl/tP6Y7W

No TDAH, o marcante é a dificuldade de prestar atenção a estímulos internos e externos, sentem dificuldades em organizar e planejar tarefas, como também controlar seus comportamentos e impulsos. Crianças com TDAH têm dificuldades na filtragem de estímulos irrelevantes, embora questionasse aqui se essa filtragem é ou não o principal problema das pessoas com TDAH (DALGALARRONDO, 2008).

Se compararmos os modos de vida de indivíduos contemporâneos aos sintomas do TDAH, iremos identificar semelhanças quanto ao modo acelerado de fazer as coisas, a falta de envolvimento com tarefas dentre tantos outros. Se estas são características de crianças e adolescentes com TDAH podem identificar também hiperatividade, desatenção e impulsividade em pessoas que não são diagnosticadas com TDAH (ARAÚJO, 2015). Entende-se que o TDAH é uma forma que expressa um adoecimento manifestando múltiplas variáveis e que ainda não são tão claras. Se os sintomas que caracterizam a patologia são ditos normais encontrados em outras pessoas, então o que separa o normal do patológico não são os aspectos qualitativos e sim a intensidade em que se apresentam.

Em busca de aprimorar conhecimentos, conhecer a história de vida e todo contexto familiar e social de uma criança ou adolescente, a psicopatologia fenomenológica busca ir ao contrário de julgamentos pré-estabelecidos, desta forma procura aproximar a experiência de vida do indivíduo. Tal postura fenomenológica compreende a genética dos fenômenos psicopatológicos não se restringindo a descrição, mas buscando aspectos construtivos a fim de aproximá-los, é ir além do que ser observável (ARAÚJO, 2015).

Muitas vezes, a certeza de um diagnóstico é formada de modo prematuro, não havendo tempo para um olhar mais global, que considere os seus aspectos biológicos, psicológicos, sociais, culturais, históricos e políticos, dentre outros, que se apresentam entrelaçados no fenômeno psicopatológico, Araújo (2015).

Como a característica marcante de uma criança com TDAH é a impulsividade por estar em movimentação corporal durante uma execução de uma atividade, a criança responde aos múltiplos estímulos ambientais, sem selecionar com consciência entre tarefa e ação/objeto. Isso revela uma desarmonia entre o sentir, pensar e agir. Na Gestalt o contato e a awareness formam o eixo básico para ser compreendida esta forma de pensar, agir e sentir. A awareness trás o significado e sentido desta experiência, contato então é o processo psíquico ou comportamental por onde o indivíduo fará relação consigo e o outro (ANTONY; RIBEIRO, 2004).

O caminho da saúde é o resgate da consciência sobre o seu corpo, pensamentos e sentimentos, de forma a tornar-se uma presença consciente. Aprender a assumir responsabilidade sobre suas ações e escolhas. Ser capaz de criar metas e reconhecer limites para dar sentido a sua existência. Exercer a auto-regulação de forma consciente para poder hierarquizar as suas necessidades e se ajustar criativamente ao meio. O TDAH vem anunciar a totalidade da condição humana que está inserida em uma totalidade mais ampla que forma a realidade holística relacional. O TDAH está nas crianças assim como está no mundo com seu ritmo acelerado, retratando a desatenção humana e a inquietação ansiosa presentes na sociedade moderna. O todo está nas partes e a parte está no todo. Somos a sociedade que produzimos e que nos produz.  O TDAH é colocado totalmente no domínio da patologia, o que não é correto. Há talentos oriundos dessa alta excitabilidade – a intuição, a criatividade, a afetuosidade, a vitalidade – que devem ser sobrepostos aos supostos déficits, Antony e Ribeiro (2004).

Portanto, é preciso haver a consciência do seu corpo e seus pensamentos e sentimentos para que no caminho da saúde haja o que chamamos de tornar-se uma presença consciente. Poder criar metas, e tornar-se responsável pelas suas escolhas para que sua existência tenha um sentido. Exercendo a sua autorregulação, e tornando como prioridades as suas necessidades e ir se ajustando criativamente ao meio em que vive. Por conseguinte o TDAH vai estar presente na vida dessas crianças assim como o mundo está dentro delas, e por isso seremos frutos do que produzimos na sociedade e o que ela produz em nós.

Fonte: https://goo.gl/xhPHmL

As principais características de que uma criança pode estar com o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade é a inquietação, por exemplo, professores direto acabam lidando com crianças que não conseguem ficar quietas por muito tempo em sala de aula, questionamentos exagerados, quando a criança faz perguntas frequentes, crianças que não conseguem prestar atenção na metodologia da aula, ou seja, da didática aplicada pelo professor, acaba se distraindo facilmente, não ter paciência para estudar, e a criança também acabar fazendo mais esforço do que os colegas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao final de toda pesquisa podemos descrever que o TDAH é visto como uma excitação de alto nível do organismo e suas funções emocionais se eleva pela mudança de altos e baixos, vivenciando o mundo e respondendo com hiperatividade. Com diagnósticos muitas vezes mal elaborados descrevem qualquer mudança de comportamento em crianças ou adolescentes como TDAH.

As crianças hiperativas vão ter dificuldades em se adequar em determinados contextos como nas escolas, por exemplo, onde os profissionais educadores terão que analisar como é o processo de aprendizagem da criança e de forma flexível e criativa criar atividades onde a criança consiga aprender da forma como ela consegue, ou seja, adaptar atividades da escola de acordo com a forma que ela consegue aprender, visando também suas habilidades onde possui talento, não somente focando em suas deficiências.  Em casa também há um grande desafio para os pais em se adaptar ao desenvolvimento da criança, então é importante que ao dar informações e instruções que sejam pequenas e abreviadas, fazer com que a criança reforce o que foi dito ou educado, destacar e trabalhar com a criança mais suas habilidades do que as suas dificuldades (ANTONY; RIBEIRO, 2004).

As relações que acercam o modo em que é tratada por família, amigos e sociedade devem estar de acordo com o que essas crianças necessitam; muitas vezes por termos preconceitos culturalmente estabelecidos, pela forma que enxergamos superficialmente essas crianças, tal ato nos impede de ter um olhar diferenciado e tratá-las de forma mais amável e respeitosa. Não é fácil lidar com crianças que fogem dos padrões estabelecidos pela sociedade, porém se faz necessário que tenhamos esse olhar diferenciado, pois enquanto psicólogo fenomenológico esse é nosso papel, enxergar no outro potencialidades.

Fonte: https://goo.gl/4h9i1K

Desse modo, crianças com o transtorno de hiperatividade precisam ser trabalhadas para que tomem consciência de si, das suas necessidades e as do meio em que vivem, a todo o momento buscando se ajustar criativamente de forma que a ajude no seu progresso, ou seja, no seu desenvolvimento.

Buscar um diagnóstico tardio é capaz de ocasionar falhas relevantes no processo de aprendizado e matemática o que geralmente acarretará complicações na vida escolar da criança. Dentro do ambiente escolar é preciso que os educadores saibam conhecer o diagnóstico para identificar se a criança está devidamente medicada. É preciso também que haja uma metodologia mais interessante, onde o tom de voz seja de forma que a criança entenda, para que ela se sinta compreendida e reconhecida pelo desenvolvimento da sua aprendizagem.

REFERÊNCIAS

ANTONY, Sheila; RIBEIRO, Jorge Ponciano. Hiperatividade: doença ou essência um enfoque da gestalt-terapia. Psicologia: Ciência e Profissão, Brasília, v. 25, n. 2, p.186-197, 30 jun. 2005. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98932005000200003&lng=en&nrm=iso&tlng=pt>. Acesso em: 29 mar. 2018.

ARAÚJO, Juliana Lima de. Fenomenologia do Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) em Adolescentes. 2015. 185 f. Dissertação (Mestrado) – Curso de Psicologia, Universidade de Fortaleza – Unifor, Fortaleza, 2015.

ANTONY, Sheila; RIBEIRO, Jorge Ponciano. A Criança Hiperativa: Uma Visão da Abordagem Gestáltica. Psicologia: Teoria e Pesquisa, Brasília, v. 20, n. 2, p.127-134, ago. 2004. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ /ptp/v20n2/a05v20n2.pdf>. Acesso em: 30 mar. 2018.

ABDA. O QUE É TDAH. Abda-associação Brasileira do Déficit de Atenção, Rio de Janeiro. Disponível em: <http://tdah.org.br/sobre-tdah/o-que-e-tdah/>. Acesso em: 23 abr. 2018.

DALGALARRONDO, Paulo. Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais. 2. ed. São Paulo: Artmed, 2008.

MATOS, Roberto Pires Calazans. Elementos para entender o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade – TDAH. Estilos da Clínica, Minas Gerais, v. 18, n. 2, p.342-357, ago. 2013. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-71282013000200009>. Acesso em: 29 mar. 2018.

HOLANDA, Adriano. Saúde e Doença em Gestalt-Terapia: Aspectos Filosóficos. Estudos de Psicologia, Florianópolis, v. 15, n. 2, p.29-44, out. 1997. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/estpsi/v15n2/02.pdf>. Acesso em: 29 mar. 2018.

MACHADO, Adriana Marcones. Os psicólogos trabalhando com a escola: Intervenção a serviço do quê?( 2013, pag. 771),

MUNHOZ, Dés Bertran. Revisão de literatura das psicoterapias para crianças e adolescentes com Déficit de Atenção e Hiperatividade, TDAH./ Déa Bertran Munhoz; orientador Andrés Eduardo Aguirre Antúnez. São Paulo, 2011.

ANGELUCCI, Carla Biancha. Por uma clinica da queixa escolar que não reproduza a lógica patologizante.(Pag. 354).

LEANDRIN, kizzy Domingues,SARETTA Paula. Atendimento em grupo de crianças com queixa escolar: Possibilidades de escuta, trocas e novos olhares,(pág 381).

SENO, Marília Piazzi. Transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH): o que os educadores sabem? Revista Psicopedagogia, São Paulo, v. 27, n. 84, p.334-343,  2010. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-84862010000300003>. Acesso em: 23 abr. 2018.

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O Pequeno Príncipe e as bases da Gestalt-Terapia

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Com uma trilha sonora à base de composições do aclamado Hans Zimmer, O Pequeno Príncipe (versão de 2015) repagina a clássica obra do francês Antoine de Saint-Exupéry, ao narrar a estória de uma garota (Mackenzie Foy) que se muda com sua mãe (Rachel McAdams) para um dado setor da cidade – cujo traçado, do alto, provavelmente de forma proposital, lembra os circuitos de um computador -, e acabam por ter como vizinho um piloto idoso (Jeff Bridges) que tenta a todo custo fazer decolar um velho avião estacionado no quintal.

O filme é marcado inicialmente por três traços que saltam aos olhos: a tendência da mãe obsessiva-compulsiva em hiper-racionalizar a vida da filha, criando uma rotina exaustiva e com pouco contato afetivo; uma criança com a infância negligenciada, que vive as projeções da mãe; e um idoso com fantasias que pululam a imaginação – que poderia ser rapidamente associadas a traços de psicose.

A trama começa de fato a se delinear a partir de um acidente provocado por uma das muitas tentativas de o piloto idoso decolar o avião. A hélice se desprende do mesmo e acaba atingindo a casa das novas vizinhas. A criança é tomada de profunda curiosidade e, então, inicia um lento e frutífero contato com o vizinho. Aos poucos, a garota vai entrando no universo de fantasias do piloto, num cenário que recria a trajetória do Pequeno príncipe. Neste ínterim, a mãe insiste em manter a rotina da garota, que aos poucos se distancia do agendamento cotidiano e começa a experimentar uma vida minimamente parecida com um ideal infantil.

O filme aborda algumas das teses centrais da Gestal-Terapia. Como mãe e filha compunham um núcleo narcísico – isoladas do mundo –, aos poucos a garota foi arrastada pela necessidade de relacionar-se com o mundo, com o outro, a partir do conceito de contato. Isso ocorre porque, na visão de Perls, o ato de relacionar-se é algo inerente à condição humana, sob pena de sua ausência criar sérias restrições psicológicas ao sujeito. No entanto, como bem explicita o filme, este contato nem sempre ocorre de maneira fluída e rápida. Cada pessoa possui uma “fronteira de contato” que delimita a interação entre a dimensão interna (subjetividade) e a dimensão externa (meio). Uma coisa é certa, e fica clara no filme: o contato, quando ocorre de modo autêntico, provoca mudanças profundas nos sujeitos. É deste contato que surge a possibilidade de ajustar-se criativamente. Configura-se mesmo como elemento de cura para eventuais desajustes.

Há, portanto, um paradoxo: ao mesmo tempo em que o ser humano necessita de contato para suprir necessidades psicológicas e também biológicas, ele é contingenciado por uma separação visceral. Em Gestalt-Terapia, este fato é comumente associado às células do corpo, que estão em constante processo de troca de moléculas com o meio, em que pese a sua individualidade. Essa troca, no entanto, para que supra as necessidades básicas, deve ocorrer de modo satisfatório. Psicologicamente falando, sem o contato não se obtém as condições necessárias para viver como ser humano.

Na fronteira de contato há o aprendizado que lança o sujeito para a vida. A interação sob a forma do Eu-Tu, onde de fato dois sujeitos se permitem ser “tocados”, afastando a tendência à coisificação da relação, é base para que se possa haver um encontro profundo. No filme, a relação com ausência de afeto e excesso de racionalidade entre mãe e filha é marcada por Eu-Isso, numa troca em que, sobretudo, a mãe objetifica a filha, que claramente é representada como uma projeção de seus desejos. A relação Eu-Tu só começa a ser estabelecida quando a criança se permite (por estar propensa a julgar menos que um adulto) a se aproximar do piloto idoso e, à sua maneira, entender o seu mundo. Nasce então uma amizade balizada pelo coração, com uma linguagem marcadamente afetiva.

O ápice do filme ocorre quando, já transformada pelo contato com o idoso, a criança acaba por influenciar a mãe, que reavalia suas estratégias de atuação e, por fim, também é impactada pela dinâmica.

Por fim, o filme tem forte pegada humanista e existencial (duas das bases da Gestalt-Terapia) ao enfocar questões como medo, alienação, amor, amizade, esperança e projetos de vida. Desta forma, toda a obra mostra uma virada rumo à tomada de consciência, num percurso marcado por incertezas, fantasias, curiosidade e abertura para o novo, cujo processo revela uma das facetas mais belas da condição humana: a capacidade de reinventar-se e lançar-se para o futuro.

Referências

FRAZÃO, Lilian Meyer. Gestalt-terapia. Fundamentos Epistemológicos e Influências Filosóficas. São Paulo: Summus, 2013 (versão e-Pub Amazon).

Resenha do filme O Pequeno Príncipe (2015). Disponível em <: http://www.redecanais.com/o-pequeno-principe-dublado-2015-1080p_0687893a2.html >. Acesso em 05 de dez. 2017.

FICHA TÉCNICA DO FILME:

O PEQUENO PRÍNCIPE

Diretor: Mark Osborne
Elenco: Rachel McAdams, Jeff Bridges, Marion Cotillard, Riley Osborne;
País: Canadá; França
Ano: 2015
Classificação: Livre

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Ser e tornar-se Psicoterapeuta Humanista-Fenomenológico

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No sentido de conhecer os princípios básicos na construção do psicoterapeuta embasados na fenomenologia-existencial, torna-se necessário compreender e refletir as principais influências dessa abordagem para o processo psicoterapêutico. A fenomenologia surgiu no final do século XIX, sendo esta considerada um método e uma filosofia, tendo como principal precursor Edmund Husserl (ARANHA; MARTINS, 2003).

A fenomenologia origina-se da palavra fenômeno, palavra grega, que significa o manifesto, o que se torna evidente, sendo assim fenômeno pode ser considerado como o que é aparente, como se mostra à consciência (ARANHA; MARTINS, 2003, RIBEIRO, 1985). Nesse contexto, as psicoterapias de natureza Fenomenológicas-existenciais, a Fenomenologia de Husserl é uma das mais importantes colaborações filosóficas (RAFFAELLI, 2004), sendo esta uma “ciência descritiva das essências da consciência e seus atos, uma vez que a correlação sujeito-objeto só se dá na intuição originária da consciência” (RIBEIRO, 1985, p. 44). Nessa conjuntura, Aranha e Martins (2003), afirma que a consciência é “ doadora de sentido, fonte de significado ( p. 150).

Para Husserl para que se faça fenomenologia é necessário deixar posturas “ontológicas” e conhecimentos empíricos, nessa perspectiva não se tem a intenção de chegar ao mundo e a realidades tomadas em si mesmas, mas a relação que se estabelece entre o homem e mundo (REHFELD, 2013). Nesse ínterim, Ribeiro (1985, p. 44), aponta que: “não se trata de uma sumária descrição da realidade, pois a consciência é muito mais ampla do que ela própria, nela nós percebemos a essência daquilo que ela não é, o sentido mesmo do mundo em direção ao qual ela não cessa de ‘explodir’ […]”.

Fonte: http://3.bp.blogspot.com

De acordo com Aranha & Martins (2003), na fenomenologia busca a experiência que cada ser humano vivencia, sendo que a realidade torna uma descrição individual do sujeito. Nesse sentido, “a fenomenologia é uma filosofia da vivência”, sendo indispensável às experiências de cada pessoa na compreensão do fenômeno (ARANHA; MARTINS, 2003, p.150, RIBEIRO, 1985).

No processo psicoterapêutico, o cliente se apresenta muitas vezes com contato voltado ao mundo externo das situações, vendo o que acontece, não percebendo o modo que ver, ou o fenômeno deste. Sendo que estas aparências vistas pelo cliente, ocultam o verdadeiro significado do ser. Nesse sentido, a psicoterapia busca separar a aparência do fenômeno, trabalhando com o quê e o como, indo ao encontro com o fenômeno (RIBEIRO, 1985).

O psicoterapeuta humanista-existencial

A relação entre psicoterapeuta e cliente constitui uma ferramenta fundamental no processo psicoterápico. Para Carl Rogers, o processo de desenvolvimento da “pessoa plena” é facilitado por uma relação terapêutica na qual torna possível a emergência de questões subjetivas do cliente, o que não seria possível através do método objetivo e empírico das ciências naturais (BARRETO, 2002).

O poder é retirado das mãos do psicoterapeuta, e a relação estabelecida é permissa e livre, ocasião em que “o próprio contato terapêutico é uma experiência de desenvolvimento” (BARRETO, 2002, p. 173). Dada a importância dessa relação, compreende-se que as características e a postura do psicoterapeuta são variáveis que influenciam esta relação. Neste sentido Rogers (1988) definiu três elementos fundamentais para esse processo, denominados de “atitudes psicológicas facilitadoras”: a) autenticidade, sinceridade ou congruência; b) aceitação incondicional; c) compreensão empática. Antes de esmiuçar tais conceitos, faz-se necessário primeiro compreender alguns aspectos filosóficos envolvidos.

Verifica-se que há uma relação significativamente influente da filosofia fenomenológica-existencial sobre a abordagem criada por Rogers. Considerando isto, analisa-se que ao tomar a experiência prática, vivida, como ponto de partida para formular sua teoria e método psicoterapêutico, ao incluir a subjetividade do terapeuta e do cientista e ao se interessar pela compreensão dos significados atribuídos pela própria pessoa às suas vivências e pelos modos de experienciação dos mesmos, Rogers assume, em seu modo de trabalho, a prática de uma atitude humanista e fenomenológica (BEZERRA; BEZERRA, 2012, p. 23).

Fonte: http://zip.net/bntL4V

Sob o prisma da fenomenologia-existencial, o indivíduo é compreendido como um ser capaz de criar condições para se lançar para frente rumo ao desenvolvimento e liberdade. Esta perspectiva de homem vai ao encontro do que Rogers (1983) definiu como a hipótese central de sua abordagem: a tendência atualizante, na qual “os indivíduos possuem dentro de si vastos recursos para autocompreensão e para a modificação de seus autoconceitos, de suas atitudes e de comportamento autônomo” (ROGERS, 1983, p. 38).

Compreende-se que o terapeuta humanista-existencial trabalha com a concepção dialética de ser humano envolvido na inter-relação entre a filosofia fenomenológica-existencial e a Abordagem Centrada na Pessoa. Embora não seja possível afirmar que Rogers foi direcionado por essa filosofia (BEZERRA; BEZERRA, 2012), uma vez que a conheceu tardiamente, a postura do psicoterapeuta defendida por ele, revela possibilidades de contribuir para o autodesenvolvimento livre.

O primeiro elemento facilitador do processo de crescimento do sujeito é a autenticidade, sinceridade ou congruência, que diz respeito à transparência do psicoterapeuta na relação com o cliente, sendo o que se é verdadeiramente, removendo barreiras profissionais e pessoais (ROGERS, 1983; ARAÚJO; FREIRE, 2014). O segundo elemento é a aceitação positiva incondicional, representada por uma postura de consideração genuína pelo cliente e de suspensão de valores (BARRETO, 2002). Não diz respeito a aprovar ou desaprovar, pois nesta direção ainda caberia um juízo de valor por parte do psicoterapeuta.

Por fim, o terceiro elemento descrito por Rogers (1983) é a compreensão empática, ocasião em que o psicoterapeuta é hábil em captar sentimentos e emoções do cliente e, assim, comunicar isto à ele. Mais do que isto, a empatia envolve o entendimento de que considerar a alteridade é abrir-se para ela, procurar “ouvi-la” com todos os sentidos e acolhê-la com portas e janelas abertas […] o valor do cliente convoca o psicoterapeuta a oferecer uma escuta qualificada, procurando perceber seu campo fenomenológico e compreendendo-o sem distorções, o máximo possível (ARAÚJO; FREIRE, 2014, p. 100).

Fonte: http://zip.net/bltLxL

Para além, Rogers (1983) considera que o processo de comunicação na relação terapêutica é de suma importância, pois o compreende como um processo complexo que diz respeito desde às reações mais íntimas do organismo até os pensamentos, sentimentos e a emissão de palavras. Rogers relata, ainda, que a experiência de se dispor ao processo de comunicação, exercendo a escuta das demandas do outro, favorece o crescimento individual.

Rogers (1997) traz a reflexão de que as demandas nas psicoterapias concernem às falhas nos processos de comunicação. Quando determinado organismo possui dificuldades de adaptação e necessita de trabalhos psicoterápicos, em primeiro plano, houve uma ruptura da comunicação do sujeito com si próprio e que consequentemente influenciaram de forma direta na dificuldade de estabelecimento de comunicação com outros sujeitos. Ao relatar sobre a capacidade de escuta, Rogers (1983) afirma que o ato de ouvir o outro traz consequências, pois quando há uma escuta apurada em um processo de comunicação, não se ouve apenas as palavras que são emitidas, mas todos os significados que são atribuídos em suas experiências, isto é, a pessoa como um todo.

Amatuzzi (2008, p. 68) diz que “não há palavra viva que seja sem emoção, pois ela interfere com a realidade, cria um mundo novo, mais do que simplesmente retrata a realidade. Se ficarmos na mera palavra, então estamos matando sua vida”. Desta forma, o autor traz a reflexão de que o papel do terapêuta concerne em criar mecanismo que favoreçam a expressão da palavra e de seu pleno significado. Desta forma, a construção do ser e tornar-se psicoterapeuta humanista-existencial é dialética, envolve um conjunto de perspectivas filosóficas existenciais aliadas às contribuições das experiências vivenciadas e relatadas por Rogers. Considerando isto, será descrito algumas características inerentes ao psicoterapeuta humanista-existencial.

  1. Psicoterapeuta não seleciona o caminho que o cliente deve percorrer.

Através de uma postura não-diretiva, o psicoterapeuta confia na capacidade de autorregulação da pessoa, entendendo que é inerente à natureza humana possuir condições de autodesenvolver-se, tendo habilidade para decidir sobre a própria vida. Na atitude psicoterapêutica, apresenta-se condições psicológicas facilitadoras para propiciar o processo de autodesenvolvimento do cliente. “Se posso proporcionar certo tipo de relação, a outra pessoa descobrirá dentro de si a capacidade de utilizar esta relação para crescer, e mudança e desenvolvimento pessoal ocorrerão” (ROGERS, 2009, p. 37).

Fonte: http://zip.net/bttMKx
  1. O cliente é um ser-no-mundo.

A natureza humana é relacional. O homem é compreendido como pessoa em inter-relação com o mundo, entrelaçado à ele, cuja experiência não pode ser fragmentada do ser que a vivencia (CORREA; MOREIRA, 2016). Esta noção vai ao encontro da perspectiva de ser-no-mundo, uma visão ontológica desenvolvida pelo filósofo Heidgger. Nesta perspectiva, o indivíduo é “homem na exata medida de seu ser-em, isto é, na exata medida em que possui um mundo ou abre o sentido de um mundo” (BARBOSA, 1998, p. 4).

  1. O psicoterapeuta não é neutro em relação ao seu cliente

Psicoterapeuta se permite afetar e ser afetado pela experiência do cliente, percebendo-o não um como um objeto a ser estudado, mas como um ser relacional e digno de respeito. No processo relacional ocorrido no setting terapêutico, o psicoterapeuta apresenta-se ativo e comprometido com o seu cliente a medida em que divide a carga com o ele. Sobre isto, Moreira (2009) afirma que este processo tem uma grande importância para o cliente que se sente sozinho, mesmo que esteja cercada por muitas pessoas. “Sua solidão é, frequentemente, fruto da sensação de não ser compreendido em sua dor. Dividir a carga desta dor passa a ser, então, um primeiro momento na psicoterapia tendo um grande significado” (MOREIRA, 2009, p. 64).

Perpassando destas atitudes fenomenológicas, o papel do terapeuta será assim o de, “partir do ponto de vista fenomenal do cliente, procurar a compreensão da consciência vivencial da experiência de si e do mundo” (SANTOS, 2004, p. 19). Para tanto, Rogers (1947) propõe, que o terapeuta deve “ver através dos olhos da outra pessoa, perceber o mundo tal como lhe aparece, aceder, pelo menos parcialmente, ao quadro de referência interno da outra pessoa”.

Fonte: http://zip.net/bhtL9N

Uma relação terapêutica estabelecida através dessas premissas (empatia, congruência aceitação) implica uma importante redefinição do seu papel. Mais do que as técnicas ou os instrumentos utilizados, o terapeuta constrói-se por meio de atitudes que trazem para a relação e que compõem o verdadeiro fator impulsionador da mudança. Tendo em conta os princípios que justificam e dão sentido a essas atitudes, o terapêuta humanista torna-se um verdadeiro facilitador do processo de autoconhecimento do cliente, pois sabe que ninguém melhor que ele mesmo para interpretar, construir e modificar sua própria realidade.

 

REFERÊNCIAS:

AMATUZZI, M. M. (2008). Por uma psicologia humana. 2ªed. Campinas: Alínea.

ARANHA, M. L. A.; MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: Introdução à Filosofia. 3. ed. São Paulo: Moderna, 2003.

ARAUJO, I. C.; FREIRE, J. C. Os valores e a sua importância para a teoria da clínica da abordagem centrada na pessoa. Rev. abordagem Gestalt. Goiânia , v. 20, n. 1, p. 86-93, jun. 2014 .   Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-68672014000100012&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em 21 maio 2017.

BARBOSA, M. F. A noção de ser no mundo em Heidegger e sua aplicação na psicopatologia. Psicol. cienc. prof.,  Brasília ,  v. 18, n. 3, p. 2-13,    1998 .   Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S141498931998000300002&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 24 maio 2017.

BARRETO, C. L. B. T. A evolução da Terapia Centrada no Cliente. IN: GOBBI, S. L.; MISSEL, S. T.; JUSTO, H.; HOLANDA, A. (Org). Vocabulário e noções básicas de Abordagem Centrada na Pessoa. São Paulo: Vetora, 2002. p. 167-181.

BEZERRA, M. E. S; BEZERRA, E. do. N. Aspectos humanistas, existenciais e fenomenológicos presentes na abordagem centrada na pessoa. Rev. NUFEN, São Paulo, v. 4, n. 2, p. 21-36, dez. 2012. Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S217525912012000200004&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em 21 maio 2017.

CORREIA, K. C. R.; MOREIRA, V. A experiência vivida por psicoterapeutas e clientes em psicoterapia de grupo na clínica humanista-fenomenológica: uma pesquisa fenomenológica. Psicol. USP, São Paulo, v. 27, n. 3, p. 531-541. 2016 Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010365642016000300531&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 24 maio 2017.

MOREIRA, V. Da empatia à compreensão do lebenswelt (mundo vivido) na psicoterapia humanista-fenomenológica. Rev. Latino-americana de psicopatologia fundamentada.  São Paulo, v. 12, n. 1, p. 59-70, Mar. 2009.   Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S141547142009000100005&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 24 maio 2017.

RAFFAELLI, R. (2004). Husserl e a psicologia. Estudos de Psicologia, 9(2), 211-215. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/epsic/v9n2/a02v9n2.pdf>. Acesso em: 01 jun 17.

REHFELD, A. Fenomenologia e Gestalt-terapia. In: FRAZÃO, Lilian Meyer; FUKUMITSU, K. O (Org.). Gestalt-terapia: Fundamentos Epistemológicos e influências filosóficas. São Paulo: Summus, Cap. 2. 2013.

RIBEIRO, J. P. Gestalt-terapia: refazendo um caminho. 6. ed. São Paulo: Summus, 1985.

ROGERS, C. R. Algumas observações sobre a organização da personalidade. American Psychologist , 2 , 358-368. 1947. Disponível em: <http://psychclassics.yorku.ca/Rogers/personality.htm> Acesso em 09 jun 17.

ROGERS, C. R. Um jeito de ser. 1. ed. São Paulo: EPU, 1983.

ROGERS, C. R. Tornar-se pessoa.6. ed.  São Paulo: Martins Fontes, 2009.

SANTOS, C. B. Abordagem Centrada na Pessoa: Relação Terapêutica e Processo de Mudança. Revista do Serviço de Psiquiatria do Hospital Fernando Fonseca. 18-23. 2004.

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Um Senhor Estagiário – Uma visão a partir da Saúde Mental e do Trabalho (Segunda Parte)

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Depois de aposentado, Ben Whittaker (Robert De Niro) já viúvo, percebe que aposentadoria não era lá um mar de rosas. Entediado com a monotonia de sua vida, resolve “voltar à ativa”, entra como estagiário sênior para uma empresa que gerencia um site de moda. Essa empresa foi fundada e gerida por Jules Ostin (Anne Hathaway), uma jovem, que rapidamente explodiu no mundo na moda e no mercado online.

A empresa tomou proporções que Jules não esperava em tão pouco tempo. Agora ela batalha para o melhor da empresa, o melhor para seus funcionários e para sua vida familiar. Nenhuma dessas batalhas é uma tarefa fácil para essa jovem empreendedora. Filme dirigido por Nancy Meyers. É um filme para crianças, jovens, adultos e idosos, uma comédia que segura a risada do público. Este   trabalho tem como objetivo analisar a empresa de Jules, a partir da visão da saúde mental e do trabalho. Esse texto é a parte dois, ou seja continuação do anterior (parte 01).  A fim de se ser elucidativo foi dividido a temática da Saúde Mental e do Trabalho em oito eixos:

  1. Espaço Físico
  2. Autonomia no Trabalho
  3. Estruturação do Tempo
  4. Pressão e responsabilidades
  5. Reconhecimento
  6. Relacionamentos interpessoais
  7. Lidar e Solucionar Problemas
  8. Bem-Estar dos Trabalhadores

No texto que segue, será explicitado o os quatro últimos aspectos (Reconhecimento, Relacionamentos interpessoais, Lidar e solucionar problemas e Bem-estar dos trabalhadores) do ponto de vista teórico e contrastado com o filme. No trabalho anterior foi apresentado outros quatro primeiros.

RELACIONAMENTO INTERPESSOAL

Cardozo e Silva (2014, p. 25), ressalta que analisando a interação, pode-se perceber que dentro de cada relacionamento interpessoal, efetua-se trocas de sentimentos e experiências e é necessário o empenho de ambas as partes para que esse convívio seja o mais harmonioso possível.

O trabalho é fator primordial na vida de todo ser humano e o relacionamento interpessoal é uma das principais características para o sucesso da organização, visto que uma rede de relacionamentos sadios gera um ambiente satisfatório, contribuindo para o desenvolvimento profissional e pessoal do indivíduo. Sem pessoas, não há produtividade, não existem empresas, ou seja, sempre existirá a relação homem e trabalho (CARDOZO e SILVA, 2014).

Isso é percebido durante a cena em que Ben estabelece um maior vínculo com os estagiários, ajudando-os com dicas sobre relacionamento conjugal e até mesmo chamando um deles para residir em sua casa por algum tempo.Os mesmos autores enfatizam que no mercado de trabalho, a forma como nos relacionamos com as pessoas é um dos fatores mais importantes para manter um bom clima organizacional.

A maneira de ser, pensar e agir influencia diretamente os relacionamentos dentro e fora da empresa. O trabalho requer a convivência com colegas e superiores, requer respeito, confiança e certa liberdade entre meio às relações, para que assim seja necessário conciliar os interesses pessoais com os interesses e objetivos da organização, bem como manter um ambiente de trabalho saudável.

O oposto disso é quando Jules se mostra não tão “participante” nas confraternizações e convivências com equipe, pois ela como uma jovem empresária, cheia de responsabilidades, estava sempre correndo contra o tempo, assim seus relacionamentos com os colaboradores acabam sendo superficiais. Isto é notado na cena em que Jules está andando de bicicleta dentro da empresa e não para pra comemoração de aniversário por causa do “tempo”. Outro momento em que é evidenciado a superficialidade e distanciamento das relações é quando percebe-se o comportamento do motorista em relação à família de Jules. Na cena ele toca a campainha e se distancia para esperar que ela abra a porta.

No entanto, no decorrer do filme ocorre um processo de mudança que dá início quando há aproximação dos colaboradores (eles saem para beber para comemorar grande feito do dia), e há também uma aproximação maior entre Jules e Ben. Ben começa a frequentar sua casa e conhece sua família. Sobre essas interrelações Carvalho (2009, p. 82 apud CARDOZO e SILVA, 2014, p. 25), salienta que “os relacionamentos possuem vida própria e está sempre em processo de mudança. Essas mudanças estão relacionadas ao comportamento e as ligações afetivas, que podem gerar relações brandas […]”.

RECONHECIMENTO

Sendo assim, quando o indivíduo faz algo que acredita ser útil para as pessoas em sociedade e que está contribuindo de certa forma para uma melhoria daqueles que estão sendo afetados, no sentido benéfico do termo.  Logo, essa pessoa quer ser reconhecida. Desse modo, reconhecimento significa ser valorizado por aquilo que faz de melhor, como por exemplo, ganhar um elogio, aplauso ou uma promoção.

No entanto, a insatisfação é dificilmente expressada em palavras. Visto que, apenas percebem quando ela já está instalada como doença. Assim, a falta de reconhecimento, da mesma forma da insatisfação, é um sinal de sofrimento evidenciado. Mas ao mesmo tempo essa falta é muitas vezes identificada como “normal”, com a qual o sujeito se conforma, acostumando-se com o fato de não ser elogiado, de não ter seu trabalho reconhecido. Assim, o sofrimento provocado pela falta de reconhecimento pela falta de reconhecimento é identificado. Mas em seguida é coberto por uma resposta racionalizada “Ah, acontece em todas as empresas mesmo” (VASCONCELOS e FARIA, 2008, p. 6).

Portanto, a empresa que é descrito no filme há reconhecimentos. Porém, reconhecimentos “injustos”. Dado que, funciona para alguns, mas para outros não funciona. Como por exemplo, a pobre Becky que estudou em uma grande universidade e trabalha como secretária, ao buscar reconhecimento de sua chefe, que estava muito ocupada para notar.

É formada e preparada para analisar dados completos, nunca teve a oportunidade de pegá-los, nem trabalhar com eles, o que faz é observar os outros fazerem isso, e se sente cada vez mais infeliz no seu trabalho, pois trabalha muito, em uma rotina caótica (rotina da chefe), tendo que lidar com muitas informações, e resolver situações rápidas em virtude da agenda lotada de Jules, e ainda não faz o que quer e o que gosta. Sempre buscando o tão reconhecimento, mas ninguém vê.

LIDAR/SOLUCIONAR PROBLEMAS

Por outro lado, Ben em tão pouco tempo dentro da empresa, sempre realiza as atividades propostas para ele com êxito, já consegue ganhar um bônus no trabalho e é notável o reconhecimento de sua contribuição e esforço.  No que consiste, os colaboradores da empresa lhe aplaudir e tocar um sino, como era de costume ser feito sempre que alguém colaborasse com algo importante.

No filme é retratado algumas cenas que Ben colabora a identificar e solucionar problemas às vezes pequenos, porém importantes e notório como fatores de risco para adoecimento, como por exemplo, quando ele arruma a mesa que ficava uma grande quantidade de papéis, que acabava incomodando os colaboradores, porém ninguém nunca se disponibilizou antes para arrumar. Ben também esteve disponível e ajudou Jules a esclarecer suas decisões em relação a contratação do novo chefe dela, solucionou o problema do email errado que Jules enviou para sua mãe e ajudou a mesma em suas tarefas de rotina familiar.

No filme mostra Ben sempre muito centrado e paciente, ele sempre buscava uma forma de lidar e solucionar problemas que aparecia na empresa. Isso mostra que Ben com todos os seus anos de trabalho conseguiu adquirir experiência e habilidades. Ressaltando que no filme é visto cenas que de exaustão emocional de Becky, não sabendo como solucionar alguns problemas, assim não deixando de ser um fator prejudicial para a sua saúde mental e interferindo na realização das suas tarefas do trabalho. Sendo assim, a exaustão emocional

 é caracterizada por um sentimento muito forte de tensão emocional que produz uma sensação de esgotamento, de falta de energia e de recursos emocionais próprios para lidar com as rotinas da prática profissional […] (RABIN, FELDMAN e KAPLAN, 1999, apud, ABREU et al, 2002, s/p).

Outro aspecto visível em solucionar problemas é quando Jules tem que tomar uma importante decisão para a empresa, e fica de certa forma pressionada para realizar a mesma, pois ela não queria isso, mas pensando na melhoria da convivência da sua família se viu obrigada decidir isso. Desta forma, com todo esse tumulto de tomada de decisão afetando- se emocionalmente.

BEM ESTAR DOS TRABALHADORES

A preocupação com os ambientes de trabalho e sua influência no processo saúde-doença dos trabalhadores não é recente. Trata-se de uma preocupação frequente, visto que a maior parte do dia se passa no ambiente de trabalho.

A Saúde do Trabalhador é uma área da Saúde Pública que visa intervir nas relações entre o trabalho e a saúde, promovendo e protegendo a saúde dos trabalhadores através das ações de vigilância dos riscos presentes nos ambientes, das condições de trabalho, dos agravos à saúde e da organização e prestação da assistência aos trabalhadores (BRASIL, 2011, s/p apud GRECO e DE MOURA, 2014, p. 4).

É visível o bem-estar que os colaboradores da empresa têm, este deve-se ao espaço físico (confortável e espaçoso), às relações saudáveis entre colegas (não há competitividade), dentre outros fatores. Isto é confirmado à medida em que os colaboradores demonstram satisfação com o trabalho.Uma outra questão que tem sido discutida amplamente no campo da saúde mental do trabalhador e de grande importância, é o trabalho como prioridade, desconsiderando as necessidades fisiológicas como alimentação e as demais vertentes como lazer, família, dentre outros, fator este que reflete na saúde mental, havendo potenciais consequências sobre a saúde.

Jules afirma não dormir, pois preocupa-se com o trabalho que têm a ser feito. Segundo Lima, Assunção e Francisco (2002), o turno fixo noturno é outro elemento que tem sido bastante estudado e associado a distúrbios psíquicos. Estudos afirmam que não há dúvidas de que este é um fator que contribui consideravelmente para o sofrimento psíquico. Sabe-se que, grande parte das pessoas têm suas funções físicas orientadas para atividades diurnas, dedicando a noite ao descanso. Além disso, existem estudos que relacionam períodos prolongados de privação de sono com uma desorganização psíquica, podendo, inclusive, provocar delírios e alucinações.

Os autores supracitados afirmam que um dos principais problemas identificados por esses estudos, refere-se aos ritmos circadianos que se mantêm inalterados, pois, mesmo quando o horário de trabalho é invertido, a vida social continua em movimento: a sociedade e a família permanecem com seu ritmo de atividade inalterado, surgem então os conflitos. As pesquisas revelam que o maior desgaste dos trabalhadores em turnos noturnos consiste no fato de viverem constantemente na contramão da sociedade, o que resulta em um maior desgaste físico e mental.

Este aspecto é visível, quando se trata de Jules. Por ser a chefe, assume uma grande sobrecarga e abstêm-se do lazer, do tempo com a família e de outras atividades fora do ambiente de trabalho. Outro fator consequente dessa sobrecarga demonstrado no filme é o distúrbio do sono apresentado por Jules, caracterizado por Martinez, Lenz e Menna Barreto (2008 apud VIEIRA, 2009) como sonolência, queixas de insônia, qualidade de sono insatisfatória e sono encurtado. Jules sente dificuldade em dormir a noite inteira, por vezes, acorda durante a noite e resolve adiantar o serviço através do uso do computador.

REFERÊNCIAS

ABREU, K.L; STOLL, I; RAMOS, L.S; BAUMGARDT, A; KRISTENSEN, C. K. Estresse ocupacional e Síndrome de Burnout no exercício profissional da psicologia. Brasília: Psicologia: Ciência e Profissão, vol.22, n.2, jun. 2002.Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1414-98932002000200004&script=sci_arttext&tlng=es> . Acesso em: 03 de abril de 2017.

CARDOZO, C. G; SILVA, L. O. S. A importância do relacionamento interpessoal no ambiente de trabalho. Dourados/MS: Interbio. v.8 n.2,  2014.  Disponível em:<http://www.unigran.br/interbio/paginas/ed_anteriores/vol8_num2/arquivos/artigo3.pdf>. Acesso em: 02 de abril de 2017.

GRECO, R; DE MOURA, D. C. A. Condições de Trabalho e a Saúde dos Trabalhadores de Enfermagem. Faculdade de Enfermagem, Universidade Federal de Juiz De Fora, 2014. Disponível em: <http://www.ufjf.br/admenf/files/2015/03/Aula-Condi%C3%A7%C3%B5es-de-trabalho-e-a-sa%C3%BAde-dos-trabalhadores-de_enfermagem-1.pdf> Acessado em: 01 de Abril de 2017.

LIMA, M. E. A; ASSUNÇÃO, Ada A.; FRANCISCO, J. M. S. D. Aprisionado pelos ponteiros de um relógio: o caso de um transtorno mental desencadeado no trabalho. Saúde Mental & Trabalho: leituras, Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.

VASCONCELOS, A; FARIA, J. H. Saúde mental no trabalho: contradições e limites. Florianópolis Sept. /Dec. Psicol. Soc, vol.20, no.3, 2008. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-71822008000300016>. Acesso em: 1 de abril de 2017.

FICHA TÉCNICA DO FILME

UM SENHOR ESTAGIÁRIO

Diretor: Nancy Meyers
Elenco: Robert De Niro, Anne Hathaway, Rene Russo, Andrew Rannells;
País: EUA
Ano: 2015
Classificação: 10

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As novas formas de amor segundo Carl Rogers

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 As formas de amar contemporâneas vão contra ao que Rogers usa como base para uma boa relação, ou melhor, uma relação na qual as pessoas possam fluir suas potencialidades. Hoje podemos atribuir as formas de amar ao que o Zygmunt Bauman denomina de amor líquido, em modelos em que as pessoas se desfazem de maneira fácil, sem que haja um sentimento de partida, as pessoas e os sentimentos escorrem pelas mãos, não há mais tempo nem disposição de construírem relações duradoras.

O porquê disso tudo podemos atribuir a vários fatores, dentre eles as pessoas se desfazem de vínculos, sentimentos, apreços, e a consequência disso é uma sociedade adoecida, órfãos de um encontro existencial no qual se agregue ao invés de desagregar.

Fonte: http://zip.net/bvtLN5

No livro Novas formas de amor, Rogers relata sobre as novas configurações de casais. Dentre estes casais, existem relacionamentos a três, relacionamentos abertos, poliamor, troca de casais, e outras configurações.

Segundo Fahel (2013) a atração sexual por outras pessoas acontece durante qualquer relacionamento sólido e reprimi-la pode ocasionar estresse na relação. Os casais que estão em um relacionamento aberto vivem uma monogamia afetiva em parceria com a liberdade sexual. No entanto, relações com outros parceiros não são tidas como infidelidade, porém a mesma não deve haver envolvimento afetivo/amoroso, o envolvimento afetivo deve pertencer somente ao casal.

Fonte: http://zip.net/bqtMkQ

Segundo a autora pessoas que aderem ao relacionamento aberto, liberam o desejo, mas não o sentimento. “É importante ressaltar que o relacionamento aberto costuma funcionar melhor quando há regras bem definidas e consentidas por ambos para evitar desentendimentos.” Em seu livro Rogers realiza escuta com os casais que discorrem sobre o funcionamento de seus relacionamentos. Através destas entrevistas, foi possível observar a delicadeza de Rogers em executar a escuta, uma vez que o autor se isenta de valores morais e opiniões, demonstrando a necessidade de ouvir sem julgar.

De acordo com Prado (2014) na contemporaneidade grande parte dos indivíduos tende a não permanecer em uma relação amorosa insatisfatória, deste modo, para muitos o relacionamento aberto pode gerar maior durabilidade da relação, já que para os adeptos dessa forma de amor, um relacionamento aberto funcionaria como quebra de rotina, podendo “apimentar” a relação, se o casal conseguir lidar e conviver bem com esse formato de relação podendo até mesmo melhorar a vida a dois. Por outro lado as questões que envolvem filhos, futuro e sacramentos religiosos são uma forma de tentar evitar “cair” numa possível promiscuidade, tudo depende dos valores de cada um.

A empatia tão falada por Rogers, a congruência, as aceitações positivas estão escassas na sociedade contemporânea, nas relações contemporâneas, nas pessoas contemporâneas, por isso vemos em um contexto clinico pessoas que necessitam apenas de outro alguém que lhe entenda, ou que pelo menos se importe de maneira congruente.

Fonte: http://zip.net/bvtLN6

Nota-se nos casos descritos que os casais enfrentam desafios quanto à flexibilidade e à criatividade da dinâmica no relacionamento. Ao mesmo tempo em que a liberdade predomina, essa configuração gera dúvidas e angústias. Alguns demonstram a dificuldade em enfrentar os novos desafios que se estabelecem durante essa liberdade. Rogers coloca o casamento numa perspectiva histórica, a fim de mostrar que a mudança não ocorre só hoje, mas faz parte da história, três aspectos influenciam esta mudança: o primeiro a política racial, o segundo as leis que regem o casamento e o terceiro a história da família.

O que é possível perceber no livro “novas formas de amor” é que quando Rogers atendia casais com diversas formas de se relacionar, ele procurava compreender as pessoas através de uma escuta apurada, gostava de estar em contato com a história dos casais, dos indivíduos. Simplesmente ele encontrava um significado para isso, só dos relatos tirava ensinamentos sobre o desenvolvimento infantil, sobre as relações pai e filhos, sobre o conceito que as pessoas fazem de si mesmas, os elementos dos bons e maus relacionamentos, os fatores que explicam as mudanças pessoais, o ajustamento sexual e assim por diante.

De acordo com Vigonc (2010, s/p) “toda escuta pode ser entendida como decorrente do sistema de significados do qual faz parte a formação teórica e prática do terapeuta, assim como sua bagagem transportada de suas histórias”. A participação ativa do terapeuta pode contribuir para esclarecer os relatos, construir um sentido, compreender os significados do que foi vivido, dar coerência e sentido para as histórias vivenciadas.

Fonte: http://zip.net/bhtLwS

A escuta é realizada a fim de identificar e compreender o modo como essas relações se estabelecem, feito isso, o autor descreve a dinâmica do casal. Em uma pesquisa sobre a sexualidade dos brasileiros realizada pelo DataFolha em 2009, com uma amostra de 1888 pessoas entre 19 e 60 anos em várias regiões do Brasil, descobriu-se que 40% dos entrevistados acham que relacionamentos abertos podem dar certo. Atualmente, estas configurações são mais recorrentes, à medida que se tornaram mais conhecidas e divulgadas. Existem relatos no Youtube sobre experiências com relacionamentos abertos, poliamor, troca de casais, que comprovam a proporção dessas novas configurações na atualidade.

(…) a internet representa também uma extensão da vida cotidiana, os indivíduos estabelecem neste meio novos tipos de relação, e dão significados para esta relação por meio das características deste próprio meio de comunicação. E, além disso, ela dá as pessoas uma sedução de liberdade, por ser um espaço ilimitado de comunicação e de expressão do indivíduo. O autor afirma, ainda, que o valor supremo da pós-modernidade é o desejo por liberdade (BAUMAN, 2004 cit in FERREIRA; FIORONI, 2009).

Estas configurações contemporâneas refletem o que diz Ferreira e Fioroni (2009), que as relações atuais estabelecidas são frouxas e leves, pois, os indivíduos ao mesmo tempo em que dizem querer um relacionamento duradouro, querem acima de tudo preservar sua liberdade.

REFERÊNCIAS:

BAUMAN, Z. Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2004.

FAHEL, Fernanda. Poliamor x Relacionamento Aberto x Amor Livre x poligamia. Disponível em:<https://mundopoliamoroso.wordpress.com/2013/09/30/poliamor-x-relacionamento-aberto-x-amor-livre-x-swing-x-poligamia-x-ficar/>. Acesso em: 04 jun. 2017.

FERREIRA, Luis Henrique Moura; FIORONI, Luciana Nogueira; DA UFSCAR, Graduando. Concepções sobre relacionamentos amorosos na contemporaneidade: um estudo com universitários. Anais do XV Encontro Nacional da ABRAPSO, 2009.

Pesquisa DataFolha: http://datafolha.folha.uol.com.br/opiniaopublica/2010/02/1223647-sexualidade-dos-brasileiros.shtml

PRADO, Vanessa. Relacionamento Aberto Vale a Pena?. 2014. Disponível em: <https://atosfatoseartefatos.wordpress.com/reportagens-2/relacionamento-aberto-vale-a-pena/>. Acesso em: 04 jun. 2017.

ROGERS, Carl R.. Novas Formas do Amor. Rio de Janeiro: Livraria Jose Olympio, 1976.

VIGONCI. 2010. O casal e a comunicação em crise. Disponível em: https://terapiadefamilia.wordpress.com/2010/12/01/o-casal-e-a-comunicacao-em-crise/

 

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Um Senhor Estagiário – Uma visão a partir da Saúde Mental e do Trabalho

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O filme “um senhor estagiário”, dirigido por Nancy Meyers, estrelado por Anne Hathaway (Jules) e Robert De Niro (Ben), trabalha temáticas como, comunicação, tecnologia, criatividade, mulher no mercado de trabalho, gerações, liderança, empreendedorismo e relacionamento de uma forma cômica, romântica e cativante.Um filme leve, carismático, reflexivo e divertido, que sem dúvida agradará da juventude à senescência. Jules, uma jovem que com um start up que rapidamente explodiu na internet, agora é dona de uma empresa, que está crescendo a um ritmo inimaginável.

Além de atrair atenção dos consumidores, atraiu também investidores. Porém, lidar com o crescimento dessa empresa, ser mãe de família e manter um casamento, não é tarefa fácil para essa jovem, carismática, moderna, atraente e gestora. Em paralelo com essa história, aparece o personagem Ben, com 70 anos, viúvo e já se entediando com a vida, a fim de sair do tédio e vazio que sente, busca voltar à ativa se candidatando para ser estagiário nessa empresa. Ben havia sido administrador de uma empresa de lista telefônicas por 40 anos, com vasto conhecimento e experiência na bagagem, passa então a trabalhar como estagiário diretamente com Jules.

Este trabalho tem como objetivo analisar, a partir da teoria, os aspectos relacionados à Saúde Mental e do Trabalho presentes no filme. A fim de se ser elucidativo foi dividido a temática da Saúde Mental e do Trabalho em oito eixos:

  1. Espaço Físico
  2. Autonomia no Trabalho
  3. Estruturação do Tempo
  4. Pressão e responsabilidades
  5. Reconhecimento
  6. Relacionamentos interpessoais
  7. Lidar e Solucionar Problemas
  8. Bem-Estar dos Trabalhadores

No texto que segue, será explicitado o os quatro primeiros aspecto (Espaço Físico, Autonomia no Trabalho, Estruturação do Tempo e Pressão e Responsabilidades) do ponto de vista teórico e contrastado com o filme. No trabalho seguinte será apresentado outros quatro restantes.

ESPAÇO FÍSICO

Em 2010 a Organização Mundial da Saúde (OMS) publicou a cartilha “ambientes de trabalho favoráveis: um modelo para ação”, no qual postula aspectos fundamentais para a promoção da saúde do trabalhador. Ao se tratar do espaço físico, a OMS diz que

o ambiente físico de trabalho se refere à estrutura, ar, maquinário, móveis, produtos, substâncias químicas, materiais e processos de produção no local de trabalho. Estes fatores podem afetar a segurança e saúde física dos trabalhadores, bem como sua saúde mental e seu bem-estar (OMS, 2010, p.09).

 A começar a análise da saúde mental dos trabalhadores da empresa principal do filme, o site de moda, pontua-se o espaço físico. Apesar de ser um site de moda, vendas e divulgação, a empresa se concretiza em uma antiga fábrica de listas telefônica, o lugar é amplo, bem iluminado. As mesas e pessoas estão dispostas lado a lado, aspecto este que privilegia as relações e a comunicação na empresa. A empresa disponibiliza ainda para seus funcionários um espaço de descanso com massagista, ressaltando a importância do trabalho tranquilo, produtivo e saudável.

O filme é romantizado e com teor cômico, logo vê-se no local de trabalho um espaço ideal, porém, existe aspectos que podem ser considerados como fatores de risco para o adoecimento dos trabalhadores. Listando tais fatores, tem-se a início uma poluição sonora, que a longo prazo é um aspecto a se considerar para desencadear estresse dos trabalhadores. Ficou explícito ainda a falta de um lugar para colocar materiais inutilizados, que resultou na “mesa da bagunça” tão incômoda para Jules, gestora da empresa. Apesar do local amplo, nem todos se privilegiaram com isso, exemplo claro de Becky, secretária de Jules que desfrutava de um pequeno espaço.

AUTONOMIA DO TRABALHO

Segundo Cecílio (1999), as questões ligadas ao poder e ao controle estão inevitavelmente presentes na vida das organizações. Amitai Etzioni afirma que o êxito de uma organização depende, em grande parte, de sua capacidade para manter o controle dos participantes (1989). Ainda para o mesmo autor, raramente as organizações podem confiar que a maioria dos participantes interiorize suas obrigações e, sem outros incentivos, cumpra voluntariamente seus compromissos. Desta forma, subentende-se que o poder e o conflito são partes das organizações.

Neste âmbito, nota-se que a presença exacerbada do poder e autoritarismo nas organizações configuram um ambiente altamente estressor, e a longo prazo, adoecedor. A ideia de autonomia remete, numa primeira aproximação, a um plano macro, como visão de projeto de sociedade, autonomia da sociedade entendida como poder latente e possibilidade real que a sociedade possui de governar e organizar a si mesma (MOTTA, 1981 apud CECÍLIO, 1999). É visível a autonomia dos trabalhadores da empresa de Jules, uma vez que estes são cientes de seus deveres e o exercem sem que haja cobranças.

A autonomia existente nessa organização possibilita um ambiente harmônico e contribui para que, à longo prazo, não haja um adoecimento dos colaboradores. O filme contrasta essa perspectiva, uma vez que aborda a autonomia dos colaboradores, com liberdade de criação dos conteúdos da revista, embora, seja necessária a aprovação final de Jules. Esta liberdade promove aos trabalhadores o sentimento de pertencimento à organização, numa função colaborativa.

ESTRUTURAÇÃO DO TEMPO

Nos dias atuais a estruturação do tempo no mercado de trabalho tem sido cada vez mais intensa, devido à busca pela maior produtividade, competitividade, para isso o trabalhador deve trabalhar cada vez mais e acaba “correndo contra o tempo”. Visto que isso, não é bom para a sua saúde mental, pois afeta a qualidade de vida desses indivíduos. Sendo assim, Barreto (2009, p. 5) afirma que

a nova forma de organizar e administrar o trabalho, alterou a relação tempo-espaço, pois os trabalhadores vivem-e-fazem seu trabalho em fluxo continuo, sem tempo para desenvolver vínculos afetivos, para pensar ou descansar. Até mesmo as necessidades biológicas, devem ser consentidas. É uma vida-viva-vivida limitada, disciplinada e intensificada pela fragmentação do processo e especialização das tarefas, pelo uso integral do tempo e ativação do ritmo sob rígida disciplina hierarquizada do corpo que produz.

Dessa forma, pode ser percebido em cenas do filme em que Jules tem várias responsabilidades e todo o seu tempo dedicado ao trabalho, assim não tendo tempo para ficar com a família. E tudo isso refletia na sua secretaria Becky, pois ela tinha que seguir o ritmo da mesma, marcar as reuniões de Jules de cinco minutos para não perder tempo, assim tendo que passar do seu horário de trabalho para cumprir as demandas de Jules. Tais aspectos é adoecedor para duas, pois Jules com elevado número de afazeres passava pouco com a família , afetando a suas relações sociais e interpessoais e Becky sentia-se pressionada em correr contra para não decepcionar Jules.

Em paralelo, temos o personagem Ben, que por ser um senhor com anos de experiência de trabalho, não deixava que o trabalho o adoecesse, e a correria de Jules o afetasse, pelo contrário ele agia de uma forma calma, pacífica e tentava transmitir isso para todos que estava a seu redor. Desse modo Mendes (1995, s/p) ressalta que

o trabalho pode ser considerado como o lugar de satisfação sublimatória, quando o trabalhador transfere sua energia pulsional, que inicialmente é dirigida para as figuras parentais com objetivo de satisfação imediata, para as relações sociais com satisfação mais altruísta.

PRESSÃO E RESPONSABILIDADES

Assim Ben se sentia satisfeito com o trabalho, ele não deixa que o estresse permaneça, sempre buscava formas de relaxar e esse seu equilíbrio psicológico acaba passando para cada um da empresa, até mesmo Jules, e não afetava a sua saúde mental. Mendes (2009), diz que a saúde mental não é a ausência de transtornos, obter essa saúde é uma forma de desenvolver uma existência com uma sensação não apenas portador dela, mas também criador de valores e instaurador de normas vitais.

O equilíbrio seria o resultado de uma regulação que requer estratégias defensivas especiais, elaboradas pelos próprios trabalhadores; porém, a normalidade conquistada e conservada pela força é trespassada pelo sofrimento (DEJOURS, 1994, apud, RODRIGUES et al, 2006.). Assim tendo uma qualidade de vida dentro do que se diz normal e não sofrimento e não adoece por causa do trabalho.

Nos dias que correm, pode-se perceber a frequente pressão por produtividade crescente, em um ambiente extremamente competitivo, na qual os indivíduos enfrentam, sem se importarem com a qualidade de vida desses sujeitos. Isto é, com a saúde mental deles. Visto que, o estresse está cada vez mais preocupante no âmbito mundial. Uma vez que, é uma das principais causas para ocorrência de doenças. Dessa forma, causando sobrecarga, exaustão e pressão devido ao trabalho.

Sendo assim, Costa (2010, p. 2) afirma que

o estresse está intimamente relacionado com a carga mental associada normalmente ao trabalho e é causado por um desajuste entre um indivíduo e o trabalho, pelos diferentes papéis que o indivíduo, tem de desempenhar e pela falta de encontro sobre a vida e sobre o trabalho […]. O termo Stress muitas vezes é utilizado para descrever os sintomas produzidos pelo organismo com resposta à tensão provocada pelas pressões e situações que as pessoas enfrentam.

Dessa forma, pode ser observado na cena, no qual, Jules uma jovem empresária, que agora tem muitos funcionários, um sonho tornado realidade, e muita responsabilidade, expectativa e pressões para suas decisões. A empresa estava funcionando a partir de um sistema centralizador do poder, que todas as decisões deviam passar por ela. Somado isso a sua rotina exaustiva, a jovem empreendedora apresenta alguns comportamentos obsessivos, entre eles o de manter o ambiente sempre organizado, caso não estivesse, apresentava estresse e descontração e o de sempre piscar os olhos, quando alguém conversava com ela . Jules estava distanciando da sua família, e mantendo
dedicação total na empresa, fato que colabora para o adoecimento mental.

Concomitante, temos a personagem Becky, secretária de Jules, que tinha atribuições diárias em excesso. Pois, trabalhava horas a mais do seu expediente com intuito de terminar todas as atividades que foram estabelecidas, para não ocorre reclamações posteriormente. Assim, se sente pressionada e sobrecarregada, acarretando desanimo e tristeza devido à grande quantidade de trabalhos para realizar. Deste modo, a situação de Becky, é configurada como um trabalho adoecedor, ela dorme pouco, alta cobrança e infelicidade pelo cargo inferior que ocupa. Garcia e Silva (2014, p. 26) ressaltam que

no mercado de trabalho, a forma como nos relacionamos com as pessoas é um dos fatores mais importantes para manter um bom clima organizacional. A maneira de ser, pensar e agir influencia diretamente os relacionamentos nas empresas. O trabalho requer a convivência com colegas e superiores, onde é necessário conciliar os interesses pessoais com os interesses e objetivos da organização.

Assim esses mesmos autores, declaram que pode-se considerar o sentido do trabalho em várias dimensões e sentidos diferentes para cada indivíduo e apontar sentimentos e afetos envolvidos dos trabalhadores, tais como o amor, a amizade, o respeito. Assim, aumentando a motivação dos envolvidos, facilita o alcance dos resultados da empresa, além de intensificar o crescimento pessoal e profissional dos trabalhadores. Visto que, o relacionamento interpessoal é uma ferramenta essencial para obter sucesso dentro das empresas é algo primordial nas relações humanas (GARCIA e SILVA, 2014).

No filme, a realidade descrita acima é retratada quando um jovem funcionário ajudou o Ben a ligar o notebook, uma vez que ele era novo no emprego e também não se dava bem com tecnologias. Depois, em outra, Jules estava enviando algumas mensagens pelo seu laptop, e sem perceber enviou uma mensagem por engano para sua mãe, na qual descrevia uma personalidade errônea da mesma.

Então, Jules comunicou a Ben, e o mesmo chamou seus outros colegas, posto que tiveram uma ótima ideia. O qual seria invadir a casa da mãe de Jules, abrir o notebook e apagar a mensagem antes que a mãe dela chegasse em casa. Porém, houve um contratempo, porque o alarme disparou e eles saíram todos correndo para o carro que haviam ido e foram embora. Ainda bem que conseguiram apagar o recado. Jules então, ficou feliz pelo trabalho em equipe que tiveram.

REFERÊNCIAS:

BARRETO, M. Saúde mental e trabalho: a necessidade da “escuta” e olhar atentos. São Paulo: Caderno Brasileiro Saúde Mental, vol.1, n. 1, 2009.

CECÍLIO, L C. O. Autonomia versus controle dos trabalhadores: a gestão do poder no hospital. Ciência & Saúde Coletiva, v. 4, n. 2, p. 315-329, 1999.

COSTA, P. C.. Gestão do Stress Ocupacional. 2010.  Disponível em: <https://pt.slideshare.net/RafaCunegundes/gesto-do-estresse>. Acesso em: 1 de abril de 2017.

MENDES, A. M. B. Aspectos psicodinâmicos da relação homem-trabalho: as contribuições de C. Dejours. Brasília: Psicologia: Ciência e Profissão, vol.15, 1995. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98931995000100009>. Acesso em: 02 de abril de 2017.

OMS – ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Ambientes de trabalho saudáveis: Um modelo para ação. Brasília: SESI/DN, 2010. 26 p. Disponível em: <http://www.who.int/occupational_health/ambientes_de_trabalho.pdf>. Acesso em: 02 abr. 2017.

FICHA TÉCNICA DO FILME:

UM SENHOR ESTAGIÁRIO

Diretor: Nancy Meyers
Elenco: Robert De Niro, Anne Hathaway, Rene Russo, Andrew Rannells;
País: EUA
Ano: 2015
Classificação: 10

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Um senhor estagiário e o sentido do trabalho contemporâneo

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Algo que é observado em relação ao trabalho são as várias mudanças e o avanço das tecnologias, e o homem passa a ser transformado pelo processo desencadeado pelo trabalho, acarretando dificuldades em dar sentido a sua vida se não estiver em atividades laborais. Segundo Hannah Arendt (2004) “cada vez mais temos uma alma operária”.

Em uma sociedade capitalista que faz constante referência ao consumismo, o trabalho poderá tornar-se uma atividade com sentido. Pois a capitalização e a globalização da economia têm promovido enormes transformações no mundo do trabalho, surgindo novas formas de organização e fazendo com que o mesmo venha representar um valor importante para a sociedade contemporânea.

Fonte: http://zip.net/bftK1B

O filme “Um senhor estagiário” relata a vida de uma jovem chamada Jules Ostin, criadora de um bem sucedido site de vendas de roupas, que em pouco tempo de funcionamento já estava com 200 colaboradores na equipe. Ela leva uma vida muito atarefada, pois além das exigências do cargo e sua sobrecarga, ela é esposa e mãe, tendo que se desdobrar para conseguir estar presente em casa.

Sua empresa inicia um projeto de contratar idosos, em uma tentativa de coloca-los de volta ao mercado de trabalho; aqui entra em cena o personagem Ben, viúvo aposentado, que aos 70 anos se viu em uma vida monótona e tentava preencher seu vazio em várias outras formas e atividades de lazer, mas nenhuma com êxito, foi então que decidiu buscar uma vaga de estagiário que estava sendo oferecida, vendo ali a oportunidade de se reinventar, de voltar ao mercado de trabalho. Apesar das dificuldades encontradas com o uso das tecnologias, Ben precisava gravar um vídeo, e o seu ajudante nessa tarefa foi seu neto de nove anos de idade. Passou por várias entrevistas, até ser contratado pela empresa de Jules.

Ben era um homem que já possuía uma bagagem de conhecimento, tanto na área organizacional, como pessoal, sempre observava as demandas que surgiam na empresa, e buscava promover um equilíbrio entre os setores, e na jornada individual de cada um. O interessante é a harmonia gerada entre o conflito de gerações, e a experiência e o bom senso de Ben, que acaba sendo o personagem principal nesse enredo, mostrando o valor da amizade e do comprometimento com o trabalho.

Este trabalho tem como objetivo discorrer sobre o filme citado a cima, correlacionando-o com o sentido do trabalho na contemporaneidade.

Fazendo uma relação sobre o sentido do trabalho para Ben, pode-se observar que era visto como uma extensão da sua identidade, pois tentou de várias formas preencher a si mesmo com outras modalidades de atividades, mas não conseguia alcançar êxito naquilo que fazia. Portanto, esse sentido faz parte do ritmo aprendido no decorrer da sua vida e sua carreira profissional.

Para manter-se ativo, Ben procura a vaga para estagiário, mesmo com dificuldades com o uso de equipamentos tecnológicos, consegue se superar. E é essa angústia que tira o homem do cotidiano, comodismo e o redireciona ao encontro de si. A partir do momento em que ele entra na empresa e é contratado, é como se estivesse retomando a sua identidade que ele havia perdido devido a sua aposentadoria, podendo ser identificado na cena do filme onde ele coloca vários relógios para despertar, e o prazer que sente ao arrumar sua roupa de trabalho.

Fonte: http://zip.net/bptLGj

Por mais que ele enfrentasse o choque de gerações, ele acaba por conquistar os seus colegas de trabalho e se aproxima aos poucos de Jules, promovendo um equilíbrio na empresa. Mesmo enfrentando preconceito no início, não deixou de ser ele mesmo para se manter no local de trabalho.

Segundo Albornoz (2004) “o trabalho está na base de toda sociedade, estabelecendo as formas de relação entre indivíduos, entre as classes sociais, criando relações de poder e propriedade, determinando o ritmo cotidiano”. O trabalho é parte integrante do sujeito.

A palavra trabalho tem suas nuances em várias línguas e culturas, e também no cotidiano possui muito significado, como atividade em serviço, mas também podendo significar dificuldade e incômodo. Em nossa língua, a palavra trabalho vem do latim (tripalium) que era um instrumento feito de três paus aguçados, utilizados pelos agricultores no trato dos cereais. O que na maioria dos dicionários registra como instrumento de tortura.

Para Albornoz (2004) a forma de trabalho passa por três grandes estágios, o primeiro onde o homem complementa o trabalho da natureza, isto é, vive da colheita das frutas e da caça de animais e pesca. O segundo, o homem confirma ser sentido através do trabalho artesanal e agrícola, e por último a revolução industrial que surgiu com aplicação da ciência à produção através da expansão capitalista.

Hoje temos um modelo de trabalho completamente diversificado, no filme percebemos que é uma empresa totalmente do século XXI, que se utiliza da tecnologia a seu favor.

Podemos elencar alguns fatores apresentados no filme para o bem estar da empresa e dos colaboradores:

– A liderança de Jules que é a CEO (Chief Executive Officer), que em português significa Diretor Executivo da empresa, trata todos os colaboradores com respeito, os elogia, não tem medo de se redimir e buscar ser o exemplo para toda a equipe. Essa é a verdadeira comunicação interna, que retém e motiva funcionários;

– A comunicação da empresa de Jules é na horizontal, modelo mais aceito pelas equipes na atualidade, porém, são poucos gestores que conseguem lidar com esse modelo, aderindo a um modelo mais “tradicional” que a comunicação na vertical, que é aquela “eu mando e você obedece”. Maximiano (2000, p.284) nos traz que “muitas das vezes, a comunicação para baixo procura manter as pessoas informadas para que possam trabalhar direito” e tem a comunicação ascendente que é quando:

“Os subordinados dão informações sobre o andamento e problemas do trabalho aos superiores, de modo que estes possam decidir o que fazer. Mas a informação necessária é com frequência censurada ou não é transmitida, e às vezes com resultados desastrosos” (HAMPTON, 1992, p. 434).

Fonte: http://zip.net/bbtKVB

Porém corre o risco de haver uma filtragem providencial destas informações, com intuito de encobrir ou atenuar conflitos e problemas que precisam de resolução. Jules se utiliza da comunicação horizontal, pois a mesma está envolvida em todo o processo da empresa e dando voz a todos da organização. Pois todos trabalham no mesmo andar, ninguém tem seu próprio escritório, nem mesmo a CEO, e o mais importante e relevante para a empresa é o trabalho em equipe e a comunicação;

– Assertividade no processo organizacional é importante, pois ele visa muito a saúde da equipe sem trazer prejuízos para a empresa e Jules mostra que mesmo sendo a fundadora e CEO da empresa, ela participa ativa e efetivamente nos processos da organização, entendendo como tudo acontece na prática. E ela faz isso para vivenciar a experiência de aproximação real com o público, de falar pessoalmente com ele e ver os detalhes que podem ser trabalhados. Em um dos momentos do filme ela vai pessoalmente explicar como deve ser feita a embalagem adequada do produto. Ela organiza e fecha o pacote se preocupando com a experiência de compra do cliente. Outro ponto fundamental que é assertiva nos processos seletivos da empresa, sabendo identificar pessoas empáticas da equipe existente, para que a proatividade dos colaboradores não seja afetada;

– Proatividade, é o momento que Ben entra em cena e mesmo com suas dificuldades nos início não desiste e resolve dar uma viravolta quando ele fala “vamos fazer acontecer” e assim ele faz toda a diferença da empresa;

– Empatia, é diferente de ser simpático! É um sentimento além, é quando a pessoa se coloca no lugar do outro, ou seja, é uma compreensão, é saber respeitar e entender os sentimentos do próximo. O filme não trouxe jovens “bobos” que não sabem conversar pessoalmente. Trouxe uma nova geração da qual fazemos parte e temos orgulho de fazer parte dela. São pessoas antenadas, inteligentes e conectadas, que sabem colocar-se no lugar do outros e os ajudam em suas limitações. Vivem bem em meio a diversidade, respeitam os demais e são totalmente empáticos, por saberem se colocar no lugar do outro.

Conclui-se que o mercado de trabalho está cheio de desafios, a tecnologia tem proporcionado uma série de oportunidades de novos empreendimentos, porém é necessário vários fatores para que possa fazer a diferença entre os demais. E inovação, criatividade, comunicação, forma de liderança, proatividade, decisões assertivas, ambiente e condições de trabalho proporcionando qualidade de vida, enfim uma gama de critérios a serem realizados para obter um bom desenvolvimento quando o assunto é trabalho.

Fonte: http://zip.net/bptLGk

É importante destacar que não tem como definir o trabalho mais importante, pois depende do sentido que o indivíduo atribui ao trabalho, podemos relacionar alguns fatores importantes para o indivíduo no que diz respeito ao sentido para ele. Deve haver algo que motiva o sujeito para realização de determinada atividade, como também a satisfação, o sujeito deve estar satisfeito com o que faz.

Para Ben, o sentido do trabalho estava em ser útil para as outras pessoas, ou seja, a aposentadoria, a morte da sua esposa, trouxe um vazio no qual ele estava incomodado, então quando surgiu a proposta de estagiário Señior, ele foi em busca de um sentido para vida. Cabe ainda destacar o quanto Bem se tornou mais alegre e motivado, atribui a isso o fato de está no mercado de trabalho desenvolvendo o que aprendeu ao longo da vida, assim trazendo um sentido para viver.

REFERÊNCIAS:

ARENDT, H. A condição Humana. 10. Ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004.

HAMPTON, D. R. Administração contemporânea. 3. ed. São Paulo: Makron Books do Brasil, 1992. 590 p.

MAXIMIANO, Antonio Cesar Amaru. Teoria geral da administração: da escola científica à competitividade na economia globalizada. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2000.

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