O Mágico de Oz

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Os contos de fadas apesar de serem hoje vistos como entretenimento ou como algo infantil, nos mostram em sua estrutura e em seu significado mais profundo algo de uma seriedade impar: o processo iniciatório.

Na obra O Mágico de Oz do escritor norte-americano L. Frank Baum, a heroína Dorothy passa por uma séria de provas iniciatórias onde irá passar da imaturidade da infância para a vida adulta.

O conto começa nos mostrando a órfão Dorothy morando no Kansas com seus tios. O lugar é apresentado como triste e cinzento, sendo somente Dorothy feliz com seu cachorrinho Totó. Até que um dia um ciclone atingiu sua casa e a levou com casa e tudo para o mundo de Oz.

O ciclone é uma força da natureza extremamente destrutiva. Nesse caso podemos afirmar de forma simbólica que Dorothy foi alçada para o mundo simbólico do inconsciente. Ela está em uma sublimatio, observando tudo de longe de forma a observar as múltiplas possibilidades de sua vida.

Quando observamos o desenvolvimento de uma criança vemos que a primeira função a ser desenvolvida por ela é a sensação. Ela avalia o mundo com os cincos sentidos: ela toca, cheira e coloca tudo na boca. Após certa idade a criança entra em contato com o mundo da fantasia, da imaginação e é ai que a função intuição começa a se manifestar.

Dorothy está em contato no mundo de Oz com a intuição e as possibilidades que a sua vida pode tomar. Nesse mundo ela entra em contato com figuras arquetípicas e instintos ainda desconhecidos.

Ao chegar a Oz ela descobre que matou uma das bruxas más acidentalmente. Nesse mundo há quatro bruxas: as do Leste e Oeste são más e as do Norte e Sul boas. Ou seja, é uma totalidade feminina em um equilíbrio entre bem e mal, mas que não possui a contraparte masculina.

Dorothy se encontra com as quatro bruxas nos quatro pontos cardeais em uma espécie de busca da totalidade. Um símbolo da totalidade materna, com seus aspectos bons e maus, do qual temos que entrar em contato para compreendê-lo e superá-lo.

 Tomo a liberdade de não seguir a narrativa e me deter apenas nos aspectos simbólicos do conto, por isso não me deterei na ordem dos acontecimentos.

Ela mata a primeira bruxa a do Leste acidentalmente e fica com os seus sapatos, que lhe cabem perfeitamente. O calçar os sapatos que servem somente a determinada pessoa é um tema conhecido dos contos de fadas. Vemos isso em Cinderela.

Os sapatos mantêm nossos pés aquecidos e protegidos para que possamos seguir nossos caminhos. Isso significa que Dorothy deverá seguir um caminho que só pertence a ela. No processo de individuação devemos viver a porção que nos cabe e que é somente nossa e aceita-lo como uma realidade. Entretanto não costumamos a aceitar nosso quinhão tão facilmente como Dorothy, questionamos, reprimimos e assim desenvolvemos sintomas neróticos.

O fato de herdar da bruxa má significa que aspectos sombrios foram incorporados a sua psique. Em contos como o de Vasilisa, a heroína herda algo da bruxa má (Baba Yaga) que no final acaba lhe ajudando, mostrando que a dimensão sombria incorporada lhe auxilia agora com astucia e diminui a ingenuidade da heroína.

Dorothy também se encontra com alguns anões e com a Bruxa Boa do Norte. Os anões foram libertados com a morte da Bruxa Má do Leste, isso psicologicamente significa que os impulsos criativos de Dorothy, representados pelos anões, estão livres de um complexo que os aprisionava.

 

Além disso, ela ganha da Bruxa Boa um beijo mágico que irá protegê-la em seu caminho. Ou seja, aspectos da imagem arquetípica da boa mãe lhe protegem do mal.

Dorothy após se encontrar com o Mágico na cidade das Esmeraldas sai em uma jornada onde destrói a Bruxa Má do Oeste e também se encontra com a Bruxa Boa, Glinda.

É digno de nota a forma como ela mata a bruxa: com água. Nos contos de fadas é comum termos a redenção de algum personagem amaldiçoado pelo banho. Psicologicamente o banho e a água significam um retorno ao inconsciente, a fim de purificar certos aspectos sombrios (Von Franz, 1985). A bruxa morre ao ser banhada pela água, ou seja, ela retorna ao inconsciente a fim de perder seu aspecto destrutivo e ser renovada. Um complexo destrutivo ao morrer simbolicamente, transfere a libido (energia psíquica) para outros aspectos da psique, ativando partes ainda desconhecidas nossas e impulsionando para um maior desenvolvimento.

Sobre Glinda, falarei ao final do texto.

Bem, durante a jornada Dorothy juntamente com o seu cão Totó se encontram com alguns personagens muito importantes para o desenvolvimento a psique da jovem.

Primeiramente ela se encontra com um boneco de palha que deseja ter um cérebro. A palha é um elemento extremamente leve, seco e frágil e o boneco feito dela é comumente usado para espantar corvos das plantações. Ou seja, ele é útil para espantar pensamentos nocivos da mente.

O fato de desejar um cérebro e de ser feito de um objeto seco significa que Dorothy está entrando em contato com a função pensamento.

Após alguns anos, já na adolescência, o individuo entra em contato com a função pensamento e começa a desenvolver a lógica e a discriminação entre as coisas.

Por ultimo, o individuo entra em contato com a função sentimento, no livro simbolizado aqui pelo homem de lata, que deseja ter um coração e a voltar a sentir e a amar assim como fazia quando era humano.

Dessa forma Dorothy desenvolve todas as funções e cada uma delas ocupará seu reino em Oz. Entretanto devemos lembrar que Dorothy é uma heroína, uma figura arquetípica que mostra o funcionamento de um ego ideal em consonância com as demandas do Self. Na realidade, nós humanos entramos em contato com as funções, mas desenvolvemos uma, no máximo delas e no processo de individuação temos que dar espaço e lugar as menos desenvolvidas para que possamos ampliar nossa consciência e nos tornarmos mais completos.

Após encontrar essas figuras, Dorothy se depara com um leão sem coragem. No simbolismo alquímico o leão é o sol inferior, uma representação do principio masculino, um impulso egocêntrico do poder. Além disso, ele é um animal nobre, o rei da selva. Aqui Dorothy se encontra com um principio instintivo ainda, de sua consciência. Podemos cair em tentação de analisar o leão como o animus de Dorothy, mas assim reduziríamos demais sua interpretação.

Dorothy como pré-adolescente está em pleno desenvolvimento de seu ego e sua consciência. Seus instintos estão em pleno vapor e nesse ponto da vida ela está buscando coragem para encarar o mundo externo e suas demandas, o que é típico da primeira fase da vida do ser humano.

A menina está sempre acompanhada de seu cão. O animal que acompanha e auxilia o herói ou heroína nos contos é um tema recorrente. E aqui o animal é símbolo não só de instintos, mas também da lealdade que Dorothy tem ao seu processo de iniciação.

Em sua jornada Dorothy também se depara com vários desafios e problemas que são solucionados com a colaboração do grupo formado pela menina, o cachorro, o leão, o homem de lata e o espantalho.

Em uma dessas aventuras é ajudada por ratos. Os ratos são símbolos da alma dos mortos e das bruxas. No caso do conto eles são positivos e prestativos, mostrando que os aspectos repugnantes e perigosos da psique podem também nos auxiliar. Pois justamente aquilo que somos pode nos curar, e o que somos também possui aspectos deprimentes e horríveis.

Dorothy chega a Cidade das Esmeraldas para encontrar o Mágico que lhe ajudará a voltar para sua casa no Kansas. Entretanto ela descobre que ele não tem poderes e que é uma farsa.

Em nossas vidas, quantas vezes depositamos esperanças mágicas em seres humanos para posteriormente descobrirmos que são apenas humanos?

Aqui há uma retirada das projeções mágicas que a menina faz em pessoas mais velhas e com posições de poder. E isso é um processo importantíssimo a qual devemos passar. O amadurecimento está em retirarmos a projeção mágica e infantil do nosso poder pessoal de outro e assumirmos a responsabilidade por nossas vitórias e fracassos.

Por fim, Dorothy deve buscar a ajuda de Glinda, a outra Bruxa Boa, que lhe diz que os sapatos que ela calça são mágicos e que podiam o tempo todo levá-la de vota para casa. Além disso, ela dá ao leão, ao espantalho e ao homem de lata um reino para governar, estabelecendo o local adequado de cada função e arquétipo.

O fato de somente descobrir no final que os sapatos poderiam levar Dorothy de volta mostra que muitas vezes a solução de nossos conflitos e problemas está conosco o tempo todo, mas que antes de poder alcançá-la devemos percorrer um caminho de amadurecimento. Uma vez que saber a solução antes da hora pode atrasar nosso desenvolvimento. Por essa razão é que não se deve apressar um processo de psicoterapia, tudo deve ocorrer ao seu tempo e o terapeuta deve ter a sensibilidade para saber a hora correta de apontar a solução e a saída do conflito.

Dorothy então regressa para casa onde nota que sua realidade mudou. Agora ela pode enxergar as coisas a sua volta com mais maturidade, tendo agora mais ferramentas para observar os aspectos bons e maus de sua vida.

 

FICHA TÉCNICA DO LIVRO

O MÁGICO DE OZ

Autor: L. Frank Baum
Páginas: 224
Edição:
Tipo de Capa: Capa Dura
Editora: Jorge Zahar
Ano:2013

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Iemanjá: rainha das águas

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Iemanjá é um Orixá muito querido e venerado no Brasil Iemanjá. Seu nome deriva de Yèyé omo ejá, que significa “Mãe cujos filhos são peixe”.

Ela é o orixá dos Egbá, uma nação iorubá estabelecida outrora na região entre Ifé e Ibadan, onde existe ainda o rio Yemojá.

É considerada a mãe de quase todos os Orixás Iorubanos, enquanto a maternidade dos Orixás Daomeanos é atribuída a Nanã. Iemanjá seria a filha de Olokun, deus (em Benim) ou deusa (em Ifé) do mar. No Brasil ela é considerada a rainha do mar, mas, entre os iorubas ela seria a princesa.

Ela costuma ser representada com o aspecto de uma matrona, com seios volumosos, sendo símbolo de maternidade fecunda e nutritiva. Também costuma ser representada sob a forma latinizada de uma sereia, com longos cabelos soltos ao vento.

O sábado é o dia da semana que lhe é consagrado, juntamente com outras divindades femininas, e costuma ser saudada com gritos de “Odò Ìyá!!!” (“Mãe do rio”).

Iemanjá costuma ser sincretizada com Nossa Senhora da Imaculada Conceição, festejada no dia 08 de dezembro, e também com a Nossa Senhora das Candeias, festejada no dia 02 de fevereiro, dia em que é realizada uma festa das mais populares do ano, atraindo à praia do Rio Vermelho uma multidão imensa de fiéis e de admiradores de Mãe das Águas, que costumam entregar as suas oferendas á grande mãe das águas.

Mas o culto de Iemanjá é mais intenso durante a última noite do ano, quando centenas de milhares de adeptos vão, cerca de meia-noite, acender velas ao longo das praias e jogar flores e presentes no mar. São seguidores não apenas do candomblé, mas da umbanda e de outras denominações espiritualistas.

Algo interessante, apontada por Verger, em Orixás, é que nessas festas Iemanjá é representada como uma espécie de fada, com a pele cor de alabastro, vestida numa longa túnica, bem ampla, de musselina branca com uma longa cauda enfeitada de estrelas douradas; surgindo das águas, com seus longos cabelos pretos esvoaçando ao vento, coroada com um diadema feito de pérola, tendo no alto uma estrela-do-mar. Rosas brancas e estrelas douradas, desprendidas de sua cauda, flutuam suavemente no marulho das ondas. Ela aparece magra e esbelta, com pequenos seios e o corpo imponentemente encurvado. Uma imagem bem distante da Iemanjá “matrona de seios volumosos”.

Pois Iemanjá foi relacionada a Nossa Senhora, se tornando, então, artificialmente mais importante que as outras divindades femininas, e artificialmente se tornou uma figura unilateral. Mas sobre isso falarei com mais detalhes posteriormente.

Sua popularidade, principalmente entre os brasileiros, povo carente e explorado, se deve ao seu caráter de tolerância e aceitação. As lágrimas são salgadas assim como as águas do mar. E Iemanjá em várias lendas chorou por seus filhos, transformando suas lágrimas em mar.

Iemanjá está associada à maternidade, mas não da mesma forma que Oxum, outra Iabá da maternidade.

Oxum preside a gestação, é a senhora do útero, ovários e liquido amniótico. Iemanjá é personificação da maternidade austera, mas protetora. Ela é a mãe que educa nos lembrando o papel que cada um exerce dentro do núcleo familiar.

Ela é o sentimento de amor entre os entes familiares, ela dá o sentido às uniões por laços consanguíneos. Iemanjá é mais uma face da manifestação do arquétipo da Grande Mãe.

Como símbolo da maternidade e dona das riquezas do mar, ela alimenta seus filhos, com peixes. Em sua face benéfica representa o arquétipo da doadora da vida aquática, detendo toda vida primordial. Em seu aspecto sombrio é aquela que recolhe seus filhos de volta aos seus braços com a morte, embalando-os em suas ondas. Lembrando que o mar além fonte de vida e riqueza, também é um grande cemitério.

O mar, fonte de vida biológica, simboliza o inconsciente, a fonte de vida psíquica. E Iemanjá e as ondas do mar representam os movimentos de progressão e regressão da psique.

O movimento de progressão da libido resulta da necessidade vital de adaptação ao meio. É caracterizado pela extroversão, pelo envolvimento com o objeto e pelo livre fluxo de energia. São as ondas do mar indo em direção a praia e se espalhando na areia.

O movimento de regressão ocorre quando as possibilidades de que dispõe o indivíduo (dentro de suas peculiaridades, dentro de seu tipo psicológico) não são capazes de corresponder a essas exigências ou os obstáculos que se levantam no seu caminho são demasiado fortes, a energia se detém. Acumula-se, fica estagnada e acaba recuando. A marcha retrograda da libido terá por efeito a reativação de conteúdos do mundo interior. Serão reanimados materiais excluídos do consciente, inibidos no inconsciente, por serem perturbadores dos esforços de adaptação ao mundo exterior (Silveira, 1992). São as ondas em seu movimento de volta ao mar.

A regressão é comumente representada em mitos onde o herói é engolido por uma baleia, ou outro animal marinho e fica vagando durante um bom tempo para depois realizar seus feitos. Na regressão o ego retorna a mãe, em um incesto simbólico, de cunho não erótico. Ele é derivado da saudade do acalento do ventre materno, daquele paraíso urobórico.

Esses movimentos são incessantes em nossa vida, e extremamente necessários. O mundo externo, com suas demandas, pode ser muito cruel, por essa razão buscamos constantemente uma pausa, um descanso no oásis proporcionado pelos braços da Grande Mãe. Assim podemos recarregar nossas baterias.

O grande perigo disso reside em querermos ficar eternamente em seus braços e não conseguirmos realizar nosso potencial de individualidade no mundo, nos tornando eternamente dependentes e infantis.

 

Iemanjá, então, representa os poderes do inconsciente, extremamente sedutor e perigoso. Lembrando que as sereias estão ligadas a Iemanjá e representam um arquétipo extremamente perigoso, onde vários heróis sucumbiram aos seus encantos e ficaram presos na indiferenciação.

O ego deve lutar para não se perder nesse paraíso urobórico e compreender que a regressão e progressão da libido é uma dinâmica constante. A estagnação leva a indiferenciação. Retornar ao inconsciente de tempos em tempos pode ser perigoso, mas se o ego aprende quando é hora de voltar a se espalhar pelo mundo, pode adquirir as riquezas do inconsciente e do mundo mágico de Iemanjá.

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O Senhor dos Anéis – O Retorno do Rei

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E aqui no terceiro filme chegamos ao desfecho da história.

Vimos em As Duas Torres que um reino havia sido ignorado, o reino de Mordor, cujo rei é Sauron o Senhor do escuro.

Sobre Sauron é importante acrescentarmos uma nova interpretação para enriquecer nossa compreensão sobre o filme.

Nos contos de fadas europeus a figura do Mago representa o aspecto do sombrio da imagem de Deus que não foi reconhecido pela consciência coletiva (Von Franz, 1985).

Infelizmente a sociedade ocidental tem uma imagem do divino extremamente equivocada. Temos Deus como summum bonum (ele é só o Bem), o que exclui, a priori, o Maligno (Jung, 1979). E isso reflete diretamente em nossa própria percepção acerca de nós mesmos. Vemos-nos como seres melhores do que realmente somos. Nossas sombras são projetadas no outro, assim como o lado sombrio da divindade cristã foi projetada no diabo.

Além disso, no filme As Duas Torres tivemos uma modificação significativa em Gandalf. Ele passou de mago cinzento a mago branco. Esse embranquecer simboliza a estado da alquimia denominado albedo. O albedo é uma purificação, um renascimento. Ou seja, além de representar o aspecto benéfico da divindade, o Mago Gandalf agora representa uma nova ordem renascida na consciência coletiva.

E a ação continua.

Frodo, Sam seguem rumo a Mordor para a destruição do anel, sendo guiados por Gollum.

O herói Frodo antes que consiga destruir o anel de poder terá que enfrentar seu aspecto sombrio, representado pelo Hobbit Sméagol que se transformou em Gollum e nessa luta com sua sombra, ele perde um dedo.

Isso significa um enorme sacrifício. Aqui o herói teve de aceitar o sofrimento concreto e pagou com sua própria carne pelo desenvolvimento de sua personalidade e da psique coletiva. Frodo sacrifica as projeções do ego e o desejo de poder e de segregação que qualifica uma consciência centrada no ego.

Gandalf, Aragorn, Legolas e Gimli acompanhados do rei de Rohan e sua comitiva, chegam em Isengard onde se encontram com Merry e Pippin.

Após isso o grupo de divide: Gandalf parte com o hobbit Pippin para Minas Tirith, onde não consegue convencer o regente Denethor a acender os faróis e pedir socorro aos aliados.

Denethor é o regente de Gondor, reino esse que deve ser assumido por Aragorn, o regente legitimo. Mas Denethor está gravemente doente. Ele está completamente insano a ponto de querer queimar a si próprio e o filho Faramir vivos.

Nos contos de fadas geralmente o rei se encontra doente ou velo demais e deve ser substituído. Aragorn agora deve aceitar quem ele realmente é, o rei que trará a renovação à consciência coletiva. O rei que unificará os povos e fará com que todos lutem sob sua bandeira e que trará de volta o elemento faltante e desprezado: o feminino.

Se no filme anterior ele viveu um impasse entre duas mulheres, aqui ele se decide pelo seu verdadeiro amor, a elfa Arween.

Ele se decide por ela quando recebe a visita de Elrond, o pai de Arween, que lhe entrega a espada de Isildur reforjada e lhe diz que sua filha retornou a Valfenda, após uma visão onde ela vislumbra seu filho com Aragon, mas que ela está morrendo, pois seu destino agora se encontra ligado ao do Anel.

Ao aceitar a espada, Aragorn aceita seu destino de rei.

A criança que Arween vê simboliza representa as promessas de renovação, uma vez que a consciência coletiva está doente.

O fato de Arween estar morrendo representa justamente a desvalorização do feminino vista no texto anterior. Se o Anel e Sauron não forem destruídos ela e a própria natureza irão sucumbir, uma vez que Sauron destrói as florestas sem piedade.

O princípio do Eros, da fertilidade e da sensualidade desaparecerão da consciência coletiva. E é nesse instante que Aragorn assume o compromisso de defender o reino para auxiliar a sua amada a não sucumbir. Aragorn, Legolas e Gimli partem para as minas Tirith. E Aragorn deve convencer o exército de mortos a lutar por ele. Os três então partem para a Senda dos Mortos.

Aragorn entra em uma caverna para se encontrar com os mortos, remetendo a uma descida ao Hades. Isso psicologicamente significa que ele deve se acertar e honrar os espíritos ancestrais. Os orientais são hábeis conhecedores dessa arte de reverenciar os ancestrais. Infelizmente nós ocidentais perdemos esse hábito.

Quando os Cavaleiros de Rohan partem para auxiliar Gondor na guerra, Merry e Éowyn, disfarçados, se juntam as tropas.

Éowyn que foi preterida por Aragorn agora luta e derrota o Rei Bruxo de Angmar e se torna a Rainha de Rohan, simbolizando a ascensão novamente do feminino.

E por fim O Anel é destruído. Frodo e Sam são resgatados pelas Águias de Gandalf. Aragorn é coroado rei de Gondor e se casa com Arween.

Agora a consciência foi renovada e o reino dos homens se firma.

O fato de Sauron ter morrido significa que quando um complexo morre nos contos, ou em sonhos, a energia (libido) que antes o avivava será investida em outro aspecto psíquico.

Os Hobbits retornam a sua terra. Tempos depois, Frodo se dirige aos Portos Cinzentos e junto de Bilbo, Gandalf, Elrond e Galadriel parte da Terra-Média para sempre. A missão deles foi cumprida!

E assim se finda a saga do Senhor dos Anéis.

FICHA TÉCNICA

O SENHOR DOS ANÉIS – O RETORNO DO REI

Título Original: The Lord of the Rings: The Return of the King
Direção: Peter Jackson
Música composta por: Howard Shore
Canção original: Into the West
Ano: 2003

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Hades e o arquétipo da força que impulsiona o crescimento

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Hades é o deus do reino dos mortos. É filho de Cronos e Réia, irmão de Zeus, Posseidon, Deméter, Héstia e Hera e marido de Perséfone. Conhecido em Roma como Plutão.

Após a vitória sobre os Titãs, o Universo foi dividido em três grandes reinos: cabendo a Zeus o Olimpo, a Posseidon os oceanos e a Hades o imenso império localizado no “seio das trevas brumosas”, nas entranhas da Terra, denominado Inferno.

Hades possui um capacete que o torna invisível. Esse capacete, por sinal, muito semelhante ao de Siegfried na mitologia germânica, foi usado por outras divindades como Atena e até por heróis, como Perseu, quando mata aGórgona Medusa.

Seu nome era raramente proferido pelos gregos, que temiam excitar sua cólera, pois era violento e poderoso.

Conforme Brandão (1986) era normalmente invocado por meio de eufemismos, sendo o mais comum Plutão (o “rico”), fazendo alusão não apenas a “seus hóspedes inumeráveis”, mas também às riquezas inexauríveis das entranhas da terra, sendo estas mesmas a fonte profunda de toda produção vegetal.

Hades era geralmente retratado como tranquilo em sua majestade. Conhecido como Zeus subterrâneo saiu apenas duas vezes, sendo uma delas para raptar Corée torná-la sua esposa.

Mesmo assim ele possui um caráter cruel, implacável e inflexível, sendo odiado por todos. E esse caráter se mostrava quando algum intruso teimava em não lhe respeitar os domínios. Exemplo disso ocorreu com o audacioso Pirítoo, que, acompanhado de Teseu, penetrou no Hades na louca esperança de raptar Perséfone. Pirítoofoi punido pelo Deus a ficar sentado em uma cadeira, por toda a eternidade.

Lutou ainda contra Héracles, que desceu aos Infernos, para capturar seu cão Cérbero. Foi no decurso deste combate que o herói o feriu no ombro direito com uma flechada. Tão grande era a dor, que o Senhor dos mortos teve que subir ao Olimpo e solicitar os serviços de curandeiro de Apolo, que lhe aplicou sobre o ferimento um bálsamo curativo. Essa foi a segunda e última vez que Hades saiu de seus domínios.

Esse reino dos mortos também leva seu nome Hades e sua localização era em um abismo encravado nas entranhas da Terra, e cuja entrada se situava no Cabo Tênaro (sul do Peloponeso) ou numa caverna existente perto de Cumas, na Magna Graecia (sul da Itália) (Brandão, 1986).

Hades e Perséfone tinham um casamento calmo. Apenas uma vez Hades a traiu, quando se apaixonou pela Minta. Minta (ou Minte), ninfa que habitava o Submundo, mantinha com Hades um relacionamento, interrompido por seu casamento; a ninfa então, procurando recuperar o amante, passou a se vangloriar, dizendo ser mais bonita que sua rival, despertando a fúria em Deméter, mãe de Core. Deméter então puniu a moça presunçosa, fazendo em seu lugar surgir a menta.

A simbologia da união dele com Perséfone mostra o casamento de duas forças da natureza e da vida: a riqueza do subsolo que fornece os minerais necessários para fazer brotar de seu âmago as sementes, simbolizando vida e morte, o nascimento da semente e sua consequente morte.

Importante salientar que Hades não é o deus da morte. Esse papel cabe a Tanatos.

Enquanto arquétipo, Hades simboliza a força que impulsiona o crescimento das plantas,o local onde os preciosos metais e pedras são extraídos e o localpara onde todos os seres vivos devem voltar.

Ele é o símbolo do inconsciente pessoal e coletivo. Local onde estão os tesouros da alma, nossas potencialidades, ou seja, os elementos que ainda não vieram à luz e que continuam nas sombras. Mas também lá estão nossos demônios interiores, nossos terrores, nosso inferno pessoal, as coisas mortas e reprimidas.

Como inconsciente pessoal podemos encontrar os arquétipos, nossos padrões humanos universais que existem desde o início dos tempos e que foram vividos pelas pessoas que já morreram.

Ele é o responsável por fornecer energia aos vegetais para erguerem-se a partir da semente mergulhada na obscuridade do solo, ou seja, é dele quem surge a energia necessária para criarmos algo novo em nossas vidas.

Mas seu caráter implacável não permite que ninguém saia de seu reino, uma vez ali tendo ingressado. Ele reclama de volta aquilo que ele dá. Por isso ele é tão temido. O ego não aceita o seu fim.

Para os gregos a esperança de uma possibilidade de pós-vida se encontrava em sua esposa, Perséfone que representa a vida emergente e a juventude. Ela é a semente que morre e retorna. Psicologicamente isso significa que a vida é feita em ciclos onde alternamos morte e vida. Coisas devem morrer para que o novo renasça. Perséfone e Hades mostram que para termos novas possibilidades e energia para surgir à riqueza interior, algo sempre deve ser sacrificado e morto.

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Oz – Mágico e Poderoso

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Oz: Mágico e Poderoso é prelúdio do livro do escritor americano L. Frank Baum, publicado em 1900 e que foi adaptado para o cinema em 2013. O filme começa com um circo itinerante onde trabalha o fracassado mágico Oscar “Oz” Diggs.

Oscar é um sujeito arrogante, com mania de grandiosidade. Vive flertando com as mulheres sem estabelecer laço com nenhuma delas – nem mesmo com a mulher que ele gosta – e trata seu fiel assistente com desdém.

Pode-se observar nas atitudes de Oscar traços de um intuitivo. Como o fato de viver no mundo das possibilidades e de não se comprometer com a realidade. Oscar vive com seu pensamento no futuro (intuitivo) e pouco valoriza os relacionamentos. Mostrando que a função sentimento também é pouco trabalhada em sua personalidade.

As atitudes de Oscar criam vários problemas para ele. E um dia quando arranja confusão com um grandalhão, que o persegue por ter flertado com sua mulher, foge em um balão de ar quente. Porém é sugado por um tornado que o leva para a mágica terra de Oz.

Se analisarmos o filme de forma literal podemos dizer que o mágico morreu e foi para o mundo dos mortos. Entretanto, o filme é uma fantasia por isso tomo a liberdade de analisá-lo de forma simbólica. Além disso, a análise dos personagens será feita em relação ao mágico, uma vez que ele é o herói da saga.

O tornado é uma força da natureza que simboliza que Oscar foi alçado aos céus em uma inflação destrutiva.

O mundo de Oz pode ser considerado como símbolo do inconsciente coletivo e seus arquétipos. O ego do mágico foi derrotado, ele perdeu o controle naquele balão e agora terá que lidar com algo desconhecido e trabalhar aspectos de sua personalidade antes ignorado.

Nesse novo mundo ele conhece a bela e ingênua bruxa Theodora, que acredita que ele é o mágico da profecia que irá destruir a bruxa má que matou o rei de Oz. Seguindo em direção a cidade das Esmeraldas, Theodora se apaixona por Oscar, mas sem ser correspondida (o que trará sérias conseqüências para o herói).

No caminho eles encontram o macaco voador Finley, que promete uma dívida de vida a Oscar quando ele o salva de um leão.

O macaco como animal simboliza os instintos. Nas sociedades orientais simboliza a agilidade, a inteligência e o desprendimento. Vide que na Mitologia Hindu há um deus com cabeça de macaco Hanumam, que simboliza a devoção, a dedicação e a força.

Já na sociedade ocidental o macaco é visto de forma negativa sendo considerado símbolo do homem degradado pelos vícios da malícia e da luxúria. Essa discrepância ocorre devido à cristianização que passou a considerar os instintos como algo sujo e demoníaco.

Portanto, vemos no macaco dois aspectos: o da inteligência e o dos instintos. No caso do filme, ele possui asas e uma extrema dedicação ao seu mestre. As asas demonstram que os instintos estão sendo espiritualizados e alcançando um nível mais elevado.

Oscar possui a característica de querer levar vantagem em tudo, com uma boa dose de astucia, o que representa o lado sombrio do macaco. Entretanto, com o macaco Finley ele irá aprender a lição da gratidão e da dedicação a alguém.

Na cidade das Esmeraldas, Oscar conhece irmã de Theodora; Evanora, que lhe diz que a bruxa má, Glinda, reside na floresta negra e pode ser morta, destruindo sua varinha, a fonte de seus poderes. Mas na verdade é Evanora que é a bruxa má e matou o rei, pai de Glinda.

Theodora, Evanora e Glinda formam uma tríade feminina, sendo respectivamente: A Bruxa Malvada do Oeste, A Bruxa Malvada do Leste e A Bruxa Boa do Sul.

Sobre Theodora é importante falar que inicialmente ela é boa, entretanto devido à manipulação de Evanora ela descobre que não é correspondida em seu amor por Oscar. Com isso ela se transforma em uma bruxa má com a pele verde.

Esse aspecto da mulher rejeitada que busca a vingança é um tema conhecido dos contos de fadas e dos mitos. Vemos esse tema na Bela Adormecida, onde a fada rejeitada busca vingança contra a princesa recém nascida. Deusas da mitologia grega como Hera, Afrodite e Artemistambém se vingavam quando eram traídas ou esquecidas em suas reverencias.

Nesse caso, percebemos uma predominância do elemento feminino no mundo de Oz e a ausência do elemento masculino que foi eliminado, mas que será compensado com a chegada de Oscar, o quarto elemento.

Mas antes disso, o mágico tem uma jornada onde deverá se transformar, principalmente em relação à função sentimento e o respeito pela força do feminino.

Oscar e Finley, então são unidos no caminho para a floresta a China Girl, uma pequena boneca de porcelana, cuja aldeia e família foram destruídas por Evanora.

A boneca é um brinquedo tipicamente feminino que geralmente recebe as projeções dos fantasmas da maternidade da menina, onde ela imita em suas brincadeiras sua relação com a mãe.

Mas no filme é o herói que terá que se envolver com essa figura. Nesse caso podemos, de forma criteriosa, dizer que a boneca de porcelana mostra a anima ainda em estado primitivo e frágil de Oscar. Porém, é por meio do relacionamento com ela que o mágico irá desenvolver seu sentimento e o cuidado que não havia nele antes.

A bruxa boa Glinda, então leva o grupo para o seu castelo onde ela confessa que sabe que Oscar não é um verdadeiro mago. Entretanto, a força da profecia pode fazer com que o povo lute ao lado dele, o que o força a superar sua ética duvidosa para convencer o povo de que ele é o herói necessário para libertar Oz.

Dessa forma, ele usa todo o seu conhecimento em ilusionismo para derrotar as duas bruxas.

É importante atentar que ele não mata nenhuma das duas, elas apenas são banidas, mostrando que o aspecto sombrio do feminino é necessário para o desenvolvimento da psique e não deve ser negligenciado. Sua força impulsiona o indivíduo para o processo de individuação, pois é nesse aspecto que o indivíduo é expulso do paraíso materno.

Para finalizar, Oscar após desenvolver uma ética interna e seu sentimento se torna rei, trazendo a renovação ao reino de Oz e o equilíbrio com o feminino por meio de sua união com Glinda.

O filme então nos mostra que cada um de nós tem um destino a cumprir e que ninguém deve seguir o de outro, mesmo com o medo e a insegurança advindo daquilo que nos é designado pelo inconsciente.

 

 

FICHA TÉCNICA

OZ: MÁGICO E PODEROSO

DireçãoSam Raimi
Música composta porDanny Elfman
ContinuaçãoThe Wizard of Oz
RoteiroMitchell Kapner, David Lindsay-Abaire
País de Origem: EUA
Ano: 2014

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Demeter e a representação do instinto maternal

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Demeter é a deusa grega da vegetação, deusa da terra cultivada, das colheitas e das estações do ano. É conhecida como Ceres em Roma.

Filha de Cronos e Réia, irmã de Zeus, Hades, Posseidon, Héstia e Hera, as origens de seu culto são atestadas em Creta e o santuário de Elêusis data da época micênica (Brandão, 1986).

A planta a ela dedicada é o trigo e juntamente com Dioniso saiu ensinando aos homens a cuidarem da terra e da vegetação.

É retratada como uma mulher de cabelo dourado e vestida com roupão azul, ou, mais comumente na escultura, como figura matronal, sentada.

Teve uma filha, Perséfone, com seu irmão Zeus e esse mito é o centro dos Mistérios Elêusis da qual é um personagem vital.

Com seu irmão Posseidon teve um casal de gêmeos: a menina Despina(“a deusa das sombras invernais”) e Árion. Mas Demeter abandonou a menina ao nascer para procurar Perséfone quando raptada. Despina, que representa o inverno, é o oposto de sua irmã, Perséfone, que representa a primavera e de sua mãe, deusa da agricultura. O filho chamado Árion, era um cavalo de crinas azuis, tinha o poder da fala e de ver o futuro. Foi o cavalo mais rápido de todos os tempos e ajudou muitos heróis bravamente em suas conquistas. Ela também é uma das deusas que tiveram filhos com mortais. Com o herói cretense Jasãoteve o deus Pluto. Um fragmento do Catálogo de Mulheres, de Hesíodo, sugere que Deméter teve um outro amante mortal, Eetion, que foi fulminado por um raio de Zeus.

O culto a Deméter era levado muito a sério. A dor pela qual a deusa passou com o rapto de Coré por Hades, com o consentimento do pai Zeus fez com que ela deixasse de dar vida e alimento aos homens. A vegetação deixou de crescer e os alimentos se tornaram escassos.

Coma volta de Perséfone por dois terços do ano a sua companhia, Demeter devolveu os grãos da vida ao homem.

O período em que Perséfone passa com sua mãe corresponde à primavera, onde os grãos brotam, saindo da terra assim como a Perséfone. Ao retornar ao Hades inicia-se o outono, quando os grãos são enterrados, da mesma forma que Perséfone volta ao reino do marido. Durante o inverno, Despina mostra sua ira contra sua mãe Demeter e sua irmã, congelando lagos e destruindo plantações e flores.

Demeter é então uma deusa nutridora, a Terra-Mãe que envia seu filho Pluto (Rico), o deus da riqueza agrária aos homens piedosos. Ela é a mãe do grão, e o grão é Perséfone que fica escondida por certo tempo no interior da Terra para se tornar espiga, ou seja, alimento.

Ela então está ligada as estações do ano e aos ciclos da colheita do trigo e foi ela que ensinou os homens à arte de fabricar pães.

Demeter está indissoluvelmente ligada a sua filha Perséfone, formando com ela uma dupla denominada As Deusas. O mito do rapto de Coré /Perséfone já foi descrito no texto anterior sobre essa deusa, por isso não vou citá-lo novamente.

Um ponto importante na história do sofrimento de Demeter é que ela tentou tornar Demofonte imortal, mas foi impedida pela mãe do menino.

Essa decisão pode ser interpretada como o desejo de ‘adotar’ um filho (que a consolaria da perda de Perséfone) e, ao mesmo tempo, como uma vingança contra Zeus e os Olímpicos, pois Demeter estava transformando um homem em deus. As deusas possuíam esse poder de outorgar a imortalidade aos humanos, e o fogo ou o cozimento do neófito figuravam entre os meios mais reputados.

Isso significa que o homem jamais encontrará a imortalidade física.

Enquanto figura arquetípica, a relação de Demeter e sua filha representa a ligação mãe e filha arquetípica presente na estrutura psíquica de toda mulher.

Von Franz (2010), diz que na psicologia da mulher, o arquétipo do Self  pode se apresentar sob os traços de uma mulher mais velha, ou então mais jovem (Demeter e Coré).

No processo de individuação a mulher na primeira metade da vida deve recolher as projeções que faz em sua mãe para que se torne individuo. E na segunda metade a mulher deve retirar a projeção que faz em sua filha. E essa ligação não é nada fácil de ser feita, pois se trata de uma ligação muito forte, e a ruptura dessa relação simbiótica é sentida como uma morte (Hades).

Demeter então representa o instinto maternal. Ela não consegue se ver como indivíduo fora da relação com um filho, por essa razão ela busca um filho substituto em Demofonte.

Como arquétipo materno representa a nutrição e a generosidade. Além de mãe de Perséfone era fornecedora de alimentação (como deusa do cereal) e de alimento espiritual (os mistérios eleusinos) (Bolen, 1990).

Deméter é a grande deusa das alternâncias de vida e de morte, que regularizam não somente o ciclo da vegetação, mas também de toda a existência. Ou seja, sem esses ciclos de vida e morte, não há fertilidade na terra, nem fertilidade psicologia.

O ato de descer ao Hades, realizado por Perséfone, simboliza uma descida ao inconsciente na busca do sentido da vida e da própria personalidade. Um processo iniciatório de morrer e nascer renovado.

O lado sombrio desse arquétipo é o a mãe que impede o crescimento dos filhos. A mãe destruidora. É o arquétipo que impede a independência do filho e o subseqüente desenvolvimento da personalidade. A perda do filho para o mundo é sentido como rejeição.

Toda mãe de certa forma e em variados graus, passam por esse sentimento quando os filhos crescem e saem de casa. É a síndrome do ninho vazio. Por essa razão é importante que a mulher desenvolva atividades criativas fora do âmbito da maternidade.

Esse é, portanto, um arquétipo que auxilia tanto homens e mulheres a nutrirem a si mesmos e aos outros, a serem generosos, a doar atenção e zelo, e a encontrarem satisfação como alguém que zela e provê a subsistência de outro. Ela nos proporciona a segurança interior que nos leva a crescer e prosperar.

É ela quem provê nossa subsistência física e nosso alimento espiritual, fornecendo o significado de nossas vidas por meio de uma iniciação nos mistérios da morte e renascimento.

 

 

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Hécate – a deusa ctônica

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O nome Hécate em grego significa aquela que “fere à vontade”, que “age como lhe apraz”. Hécate não possui um mito próprio, ela é mais conhecida por seus atributos. Sendo uma deusa descendente dos titãs é independente do Olimpo.

Ela é uma deusa misteriosa, que na época pré-olimpica possuía atributos benéficos como dispensadora de bens e favores, concessora de prosperidade material, dispensadora do dom da eloquência em assembleias, da vitória nas batalhas e nos jogos e da abundância de peixes aos pescadores. Faz prosperar o rebanho ou o aniquila, a seu bel-prazer (Brandão, 1986).

 

Entretanto com o advento do patriarcado houve uma modificação em suas características que passaram a ser vistas de forma negativa. Hécate passou a presidir a magia e os encantamentos, a bruxaria, o conhecimento de ervas e plantas venenosas, a necromancia e a feitiçaria. Passou a presidir as encruzilhadas, local consagrado a feitiçaria.

 

Ilustração: Hekate – Maximilian Pirner, 1901.

 

Costuma ser representada segurando duas tochas, ou uma chave. Não raro suas estátuas representam-na sob a forma de mulher com três corpos e três cabeças. Aparece sempre seguida de éguas, lobas e cadelas.

Dessa forma Hécate foi associada a figuras mitológicas da bruxaria por excelência: Eetes, Circe e Medéia. Sendo tardiamente colocada como mãe de Circe e tia de Medéia. Hécate, assim como Perséfone, é uma deusa dos mortos. Mas enquanto Perséfone preside o encaminhamento das almas ao Hades, Hécate preside a aparição dos fantasmas dos mortos e sua comunicação.

Deusa ctônica (ligada ao mundo subterrâneo) e lunar preside a germinação e o parto, protege a navegação e também concede a eloquência e a vitória. Já seu lado sombrio é infernal, presidindo os horrores noturnos, os fantasmas, os espectros e monstros apavorantes.

 

 

Como deusa das encruzilhadas, Hécate simboliza as escolhas de caminhos que por vezes devemos tomar em nossas vidas. E essa decisão pode ser infernal e trazer fantasmas e espectros de nosso inconsciente à tona.

Apesar de posteriormente Artemis assumir a fase de lua crescente, a aparência tríplice de Hécate mostra que ela representa as três fases da lua: crescente, minguante e nova. A fase cheia é representada por Selene.

A lua mostra os domínios do nosso inconsciente, aquilo que não conseguimos enxergar, ou que vemos de forma deturpada. Sua luz difusa não nos deixa enxergar com clareza, mostrando apenas sombras. Por essa razão é que em nosso inconsciente se agitam monstros, espectros e fantasmas, simplesmente porque nos são desconhecidos e nos trazem uma sensação de incerteza.

 

 

De um lado, então ela simboliza o inferno vivo do psiquismo, mas de outro uma imensa reserva de energias que se devem ordenar por meio da objetividade e da paciência.

Ela é o feminino primordial, o caos e as potencialidades todas misturadas, por essa razão sua forma tríplice também representa os três níveis simbolizados pelo céu, terra e mundo subterrâneo. Dependendo de nossa escolha diante de uma encruzilhada, não tomamos apenas um caminho horizontal, mas também um caminho vertical rumo a um desses níveis.

 

Na busca de nossa própria identidade é necessário antes passar pelo caos, pela noite escura da alma, pois nesse estado o ego aprende a esperar para que novas potencialidades se manifestem. É um momento cheio de conflitos, de ansiedades e de confusões. Mas que precede um novo nascimento e que nos mostra que nossa vida permanece eternamente fértil e eternamente incompleta.

 

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Dionísio – o deus do vinho, da loucura, do êxtase e da tragédia

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Dioniso (Baco para os romanos) possui três outros epítetos: Iaco, Brômio e Zagreu.

Iaco é o deus que conduzia a procissão dos Iniciados nos Mistérios de Elêusis. Brômio é “o ruidoso, o fremente, o palpitante”, significação que se harmoniza perfeitamente com a agitação e o tremor, acompanhados de estertores e surdos rugidos, que assinalavam o estado de transe com a presença do deus que se apossou de seus adoradores.

Zagreu é um dos nomes pelos quais é chamado o deus do êxtase e do entusiasmo no mundo mediterrâneo e particularmente, ao que parece, na ilha de Creta, onde possivelmente Zagreu teve o seu berço (Brandão, 1987).

Era filho de Zeus, mas dentre os deuses olímpicos foi o único a ter mãe mortal, Semele.

O mito de seu nascimento conta que primeiramente da união entre Perséfone e Zeus (sob a forma de serpente) surgiu o deus Zagreu. Hera, ciumenta, persuadiu os Titãs a atacarem o deus enquanto ele se olhava em um espelho. Não só os Titãs o despedaçaram como também comeram os pedaços do seu corpo com exceção do coração que Atena resgatou.

Atena trouxe a Zeus o coração e este o usou para preparar uma poção com a qual engravidou Semele, que então gerou Dioniso.

Semele ficou grávida, o que provocou o ódio de Hera. Para se vingar disse a Semele eu pedisse ao amante para se mostrar em todo o seu esplendor, da mesma forma que aparecia a Hera. Não podendo negar seu pedido, Zeus aparece a ela em sua carruagem de raios e trovões, o que levou Semele a morte. Zeus pega então o menino prematuro e o costura em sua coxa. Ao nascer, Zeus enviou Dioniso a irmã de Semele, Ino e o cunhado Atamante e ordenou que fosse criado como menina.

Mesmo assim Hera descobriu e enlouqueceu o casal que tentaram matá-lo, mas Zeus novamente o salva e o leva as ninfas do monte Nisa.

Seu tutor Sileno lhe ensinou os segredos da natureza e da produção de vinho. Sileno era descrito como o mais velho, o mais sábio e o mais beberrão dos seguidores de Dioniso, e era descrito como tutor do jovem deus nos hinos órficos. Era representado como estando quase sempre bêbado e tendo de ser amparado por sátiros ou carregado por um burro.

Adulto, a raiva de Hera tornou Dioniso louco o fazendo cometer assassinatos. Assim ele passa a vagar por várias partes da Terra. Ao chegar em Frígia, a deusa Cíbele o curou e o instruiu em seus ritos de iniciação. Curado, ele atravessa a Ásia ensinando a cultura da uva. Ele foi o primeiro a plantar e cultivar as parreiras, dessa forma ele passa então a ser cultivado como deus do vinho.

As árvores a ele consagradas são: a videira, a figueira a hera e os pinheiros. Seus animais consagrados são: o touro, o bode, a pantera, a corça, o leão, o leopardo, o tigre, o asno, o golfinho e a serpente (Bolen, 1990).

Dioniso é um deus que está sempre rodeado de mulheres. Portanto o mundo feminino lhe é familiar. Ele é também um deus da vegetação e está intimamente ligado a Demeter.

Como arquétipo Dioniso está ligado a operação alquímica da solutio, uma vez que ele representa a intensidade emocional capaz de dissolver os limites do ego. Por isso ele é um mobilizador de fortes emoções, desde as mais elevadas até as mais vis.

Conforme Edinger (2006).

“Na sua forma extrema, é selvagem, irracional, louca, desestruturada e estática. É inimiga de todas as convenções, leis e regras estabelecidas. Está a serviço não da segurança, mas da vida e do rejuvenescimento. O fraco e o imaturo podem ser destruídos pela sua força; o forte, como a terra inundada pelo Nilo, será fertilizado e revitalizado. Muitas síndromes clínicas traduzem uma identificação concreta com o princípio de Dionísio. O alcoolismo e a adição à droga são exemplos óbvios. Também o donjuanismo pode ser considerado uma forma de identificação com Dionísio, na qual o indivíduo se rodeia de mulheres em vários estágios de amor (Mênades) que o ameaçam de desmembramento psicológico por conflitos, obrigações e ligações. Dionísio assume um caráter compulsivo quando acontece numa personalidade dissociada. Em outras palavras, Dionísio destrói o ego quando este, à maneira de Penteu, não está relacionado com o todo. Em circunstâncias favoráveis, promove a harmonia e dissolve as diferenças.”

O fato de não morrer, por ser imortal o aproxima do egípcio Osíris e também de Hades, o deus da morte, sendo que conforme Heráclito, Dioniso era um e o mesmo com Hades.

Nos mistérios Eleusis, Dioniso descia ao submundo e se unia a Perséfone, sua mãe, sendo uma representação do filho-amante da deusa.

Pelo fato de ser retratado por vezes como criança, Dioniso se aproxima da figura do eterno adolescente, o puer aeternus, que é caracterizado pela pessoa intensa e emotiva, que não consegue encontrar objetividade em meio as suas paixões e é devorado pelas emoções. Vive em busca do êxtase e frenesi. É viciado em fortes emoções, por essa razão vive em busca de sexo, ou drogas. A pessoa tomada por esse arquétipo se torna alguém muito temperamental, passando do frenesi ao desespero sem razão aparente.

A mãe biológica de Dioniso morreu, sendo então cercado por amas de leite e cuidadoras. A separação física entre mãe e filho aqui nos mostra que, acarreta uma idealização da figura materna e no caso dos homens, ocorrerá uma busca por mulheres que sejam mães e amantes ao mesmo tempo, sendo que essas nunca chegarão aos pés de sua mãe interna. Vide que Dioniso, desce ao submundo, ou seja, ao inconsciente para se relacionar com sua mãe divina, Perséfone.

Nesse caso, o mito nos mostra que Dioniso está ligado ao mundo materno e ao inconsciente. O eu é contraditório para um deus que é um dos filhos favoritos de seu pai Zeus.

Isso ocorre, pois Dioniso não teve uma relação direta com Zeus, assim como seus irmãos Apolo e Hermes. Ele não figurava entre os olímpicos e permanecia em meio à natureza. Mas apesar disso Zeus reconhecia sua importância, pois sendo um deus ligado ao poder e a consciência ele sabia que essa força precisava ser equilibrada pelo caos e pela simplicidade representados por Dioniso.

Ele é um deus feminino-masculino sendo um símbolo do mediador entre esses o mundo do inconsciente e da consciência. Ou seja, ele pode ser considerado o xamã, aquele que torna possível o contato com o mundo dos arquétipos por meio dos sonhos e das fantasias.

Não é a toa que tem uma ligação tão forte com as mulheres, pois essas têm muito mais facilidade em entrar em contato com o irracional. Entretanto, ele pode ser um grande aliado no desenvolvimento da psique masculina fazendo-o entrar em contato com seu lado obscuro e emocional.

Dioniso e Hera formam um par de opostos. Ela deusa do casamento, ele deus do desregramento. Isso mostra que as emoções suscitadas por Dioniso fazem o individuo esquecer seu papel habitual.

O êxtase e o arrebatamento do deus podem transformar o individuo de forma positiva e negativa, dependendo da força do Eu. Os felinos como a pantera e o lince, dedicados ao deus, mostram isso. Ambos são animais belíssimos e fascinantes, mas ao mesmo tempo sanguinários. Suas Mênades quando tomadas pelo deus se transformavam enfurecidas e assassinas.

Se o ego não tiver alguma força, existe o perigo de literalizar essas emoções. Muitos assassinos são movidos pelo aspecto místico de Dioniso. Mas se o ego estiver saudável existe a possibilidade de ampliação da personalidade e de vivenciar emoções antes desconhecidas.

O desmembramento representado por Dioniso é um tema conhecido nas mitologias. Osíris e Jesus Cristo (por meio da crucificação), também simbolizam a morte e a ressurreição do deus, que sofre e padece.

O desmembramento assim como a crucificação simboliza o estar repartido entre opostos. Quando se está dividido entre várias possibilidades e isso causa sofrimento, Dioniso está presente. E isso possibilita a tomada de consciência quando percebemos vários aspectos incongruentes em nós mesmos.

Mas para que esse desmembramento seja positivo ele deve ser intercalado com a consciência, assim como mostra o mito onde Apolo e Dioniso revezavam o oráculo de Delfos. Apolo, deus solar, patriarcal, representante da consciência cedia ao irmão o oráculo durante três meses do ano. Isso significa que, em uma sociedade como a nossa centrada no logos e na consciência, devemos ceder um espaço em nossa vida ao irracional, ao êxtase e ao contato com nosso inconsciente para que possamos nos refazer e renascer, assim como o deus, para uma nova forma mais completa e mais ampliada.

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Perséfone – a deusa virgem e rainha do submundo

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Coré ou Perséfone é filha de Zeus, o senhor do Olimpo e Deméter, a Senhora da vegetação e da produtividade da terra. Conhecida como Prosérpina pelos romanos. A palavra Coré ou Kore, em grego, significa donzela ou filha. Por isso enquanto Coré é a Deusa doce e virgem.

Hades e Perséfone

Seu mito conta que vários deuses como Hermes, Ares, Apolo e Dioniso cortejaram Coré. Sua mãe Deméter, no entanto rejeitou a todos e escondeu a filha longe da companhia dos deuses.

Quando os sinais de sua grande beleza e feminilidade começaram a brilhar, em sua adolescência, Coré chamou a atenção de seu tio Hades que a pediu em casamento. Zeus, sem sequer consultar Deméter, atendeu ao pedido de seu irmão, que, impaciente, emergiu da terra e raptou-a enquanto ela colhia flores com as ninfas, ou segundo os hinos Homéricos, a deusa estava também junto de suas irmãs Atena e Artemis. Hades levou-a para seus domínios (o mundo dos mortos), desposando-a e fazendo dela sua rainha.

Irritada com Hades e Zeus, decidiu não mais retornar ao Olimpo, permanecendo na terra, abdicando de suas funções divinas, até que lhe devolvessem a filha. Inconsolável, acaba por se descuidar de suas tarefas levando as terras a tornarem-se estéreis e a escassez de alimentos.

Ela então se recusa a ingerir qualquer alimento e começa a definhar. Ninguém sabe lhe contar o que aconteceu com sua filha, mas Deméter depois de muito procurar finalmente descobre através de Hécate e Hélio que a jovem deusa havia sido levada para o mundo dos mortos, e junto com Hermes, vai buscá-la no reino de Hades (ou segundo outras fontes, Zeus ordena que Hades devolva a sua filha).

Como, entretanto Perséfone tinha comido uma semente de romã concluiu-se que não havia rejeitado inteiramente Hades. Assim, estabelece-se um acordo, ela passaria metade do ano junto a mãe, quando seria Koré, a eterna adolescente, e o restante com Hades, quando se tornaria a sombria Perséfone (Wikipedia, 2014).

Perséfone e Hades Plutão (com a cornucópia): gravura em fundo vermelho numa cílice, ca. 440–430 a.C.

A papoula e o narciso são as plantas a ela dedicadas. A papoula devido ao fato de ter abrandado a dor de sua mãe na ocasião de seu rapto. E o narciso, pois estava colhendo esta flor quando foi raptada por Hades. A ela também são associadas as serpentes.

Em seu mito podemos ver várias imagens arquetípicas importantes. Um deles é a imagem do rapto. A imagem do rapto representa um ritual de iniciação pertencente a ritos da vegetação. Normalmente, o rapto se consuma no outono, “quando os trabalhos agrícolas estão terminados”, os celeiros estão cheios e é, portanto, o momento de se pensar e preparar a próxima colheita (Brandão, 1986).

O rapto da noiva também era um costume entre os gregos e romanos onde a noiva sendo levada nos braços do noivo simula uma fuga e começa a gritar, pedindo o auxílio das mulheres que a acompanham. Psicologicamente isso significa que para a mulher o ato do casamento significa a morte. A morte de sua ligação com a mãe e de sua imaturidade enquanto mulher.

Pois para a relação mãe e filha o masculino é visto como violador e sequestrador.

Outro tema importante é o da heroína ou deusa que cai no sono da morte. Esse é um tema comum em contos de fadas. Heroínas como Branca de Neve e A Bela Adormecida ficaram adormecidas por um tempo devido a maldição de uma bruxa e despertaram por meio de um beijo de amor.

O mito de Perséfone pode fazer o seguinte paralelo com A Bela Adormecida: No conto a maldição do sono tem a duração de cem anos. Durante esse tempo o reino se tornou estéril e uma parede de espinhos cresceu ao redor do castelo. No mito a terra se torna estéril e sem vida, pois Demeter está sofrendo.

A esterilidade da Terra significa psicologicamente que o feminino está dormente, por essa razão não há fertilidade e tudo se tornou árido.

Ou seja, o mito da descida cíclica de Perséfone ao Hades e seu retorno a superfície simboliza as estações do ano e a fertilidade da terra, assim como os mistérios femininos, que inclui a espera pelo tempo certo para que algo amadureça.

Perséfone foi a figura central nos Mistérios de Elêusis, que por dois mil anos antes do cristianismo foi a principal religião dos gregos. Nos Mistérios de Elêusis os gregos experienciavam a volta ou renovação da vida depois da morte através da volta anual de Perséfone do Inferno (Bolen, 1990).

Era um rito centrado na Grande Mãe. Perséfone era uma deusa tipicamente cretense, assim como Hera, ou seja, ela era uma transposição da Grande Mãe, que foi assimilada pelos gregos, recebendo uma mãe grega, mas mantendo seu aspecto de fecundidade. Por essa razão era chamada de Hera infernal.

Perséfone também se liga a Afrodite, sendo que as duas rivalizavam em beleza. Com ela forma um par de opostos: a deusa da morte dos grãos e a deusa da vida dos grãos.

A híbrida Coré-Perséfone nos mostra dois arquétipos distintos em uma mesma divindade: o da jovem-virgem e o da rainha do mundo dos mortos.

Como a jovem Coré esbelta e bonita, está associada com símbolos de fertilidade: a romã, o grão, o milho, e também com o narciso. Como rainha do Inferno, simboliza uma deusa experiente que reina sobre os mortos, guia os vivos que visitam o mundo das trevas, e pede para si o que deseja.

Demeter e Perséfone

Coré representa a mulher presa a uma mãe dominadora e protetora. A eterna adolescente que não sabe o que quer e se deixa manipular por outras pessoas. Mesmo adulta está sempre voltada a agradar a mãe. Geralmente seu lado masculino é ausente e primitivo. O homem é visto como intruso nessa relação, sendo que somente um rapto, ou seja, uma possessão para ajudá-la a se relacionar com ele e adquirir características como objetividade e foco. Assim como A Bela Adormecida, espera para ser acordada de seu sono.

Já como Perséfone ela representa o aspecto feminino que empreendeu a descida ao inconsciente e ao sofrimento e por isso é capaz de guiar os outros em suas jornadas. Ela alcança um desenvolvimento psicológico e uma autonomia ao entrar em contato com sua subjetividade e não ficar presa a ela.

Perséfone é aquela que é capaz de regredir ao mundo interior quando necessário e de saber quando voltar para as exigências do mundo externo renovada.

Assim como Hera ela também é uma Rainha e ao contrário dela tem um casamento harmonioso com Hades, com raras brigas.

O rapto de Perséfone por Hades

Perséfone é o símbolo da função intuição, mas que amadureceu e mantém um relacionamento com sua contraparte inferior a sensação, representada pelo mundo subterrâneo e seu marido Hades. Nesse compromisso estabelecido com a função inferior é possível para a intuição materializar suas ideias no mundo exterior.

Para concluir, Perséfone é o arquétipo que nos auxilia em nossa descida a nossa própria profundeza. Ela é um guia, um psicopompo. A mediadora entre a realidade externa e a subjetividade interna. É ela, portanto, quem pode nos auxiliar na compreensão do significado simbólico de nossos próprios sofrimentos.

 

 

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