A desconstrução de Jacques Derrida

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Este trabalho tem por objetivo discorrer sobre o pós-estruturalismo de Jacques Derrida, concomitantemente, aspectos relacionados a sua biografia e as influências que ocorreram ao longo de sua trajetória.   Serão elucidados conceitos de estruturalismo, como também as mudanças a este relacionadas. Derrida, em sua carreira, mobilizou a forma de organização da sociedade contemporânea, trazendo o termo “desconstrução”, considerando-o como uma desmontagem de ideias formadas, tidas como verdades absolutas. Foram abordados também críticas do pensamento moderno – logocentrismo e fonocentrismo, vislumbrando todo seu processo, e respectivamente, os princípios destacados, apresentando o conceito de fonemas e as configurações que norteiam as diferenças de escrita.

Para tanto, irá esclarecer o sentido e aplicação; operando a desconstrução, que tem em sua narrativa o conceito de centro, como também a diferença que existe entre différance e desconstrução, de antemão, o mesmo tem foco na escrita e em seu discurso defende a ideia de construir novos significados, possibilitando ver aspectos da verdade sobre um outro olhar. Uma das correntes filosóficas que influenciou o mundo contemporâneo, em meados do século XX, foi o Pós-Estruturalismo (BUENO, 2015). Essa linha de pensamento influenciou desde a arquitetura até a educação, abalando, assim, a forma de organização da sociedade moderna (SANCHEZ, 2012) .  Distingue-se as ideias do pensamento pós-estruturalista como sendo múltiplo e vasto, tendo como característica particular a “desconstrução de ideias e teorias estruturadas” (CORRENTES FILOSÓFICAS, 2011).

Fonte: https://goo.gl/jBvfTC

A corrente que se destaca neste período intitulou-se Desconstrução, ideia de Jacques Derrida, pensador e filósofo francês. Lecionou na França e em grandes universidades estadunidenses, como Yale, Harvard e John Hopkins. Foi muito influenciado pelas ideias de Freud, considerando a teoria do inconsciente como sendo revolucionária para a filosofia moderna (UOL EDUCAÇÃO). Em 1966, ainda desconhecido, Derrida apresenta um ensaio onde criticava e contestava os conceitos do estruturalismo (MENESES, 2013). Mas o que vem a ser a Desconstrução? Derrida aponta que tentar entender a desconstrução como um conceito ou até mesmo um método seria contraditório, já que a corrente surge justamente com o intuitoo de alterar as ideias de conceitos e métodos (VASCONCELOS, 2003). Derrida (apud VASCONCELOS, 2003, p. 74) denomina a Desconstrução como uma estratégia

O que me interessava naquele momento [da escrita de La dissemination, La double séance e La mythologie blanche], o que tento continuar agora sob outras vias, é, a par de uma “economia geral”, uma espécie de estratégia geral da desconstrução. […]. É, pois necessário antecipar um duplo gesto, segundo uma unidade simultaneamente sistemática e como que afastada de si mesma, uma escrita desdobrada, isto é multiplicada por si própria, aquilo a que chamei em “La double séance, uma dupla ciência: por um lado, atravessar uma fase de derrubamento. […] aceitar essa necessidade é reconhecer que, numa oposição filosófica clássica, não tratamos com uma coexistência pacífica de um vis-a-vis, mas com uma hierarquia violenta. Um dos dois termos domina o outro (axiologicamente, logicamente, etc.), ocupa o cimo. Desconstruir a oposição é primeiro, num determinado momento, derrubar a hierarquia.

Assim, a Desconstrução além de uma interpretação, nem mesmo uma operação, mas uma “releitura do mundo”, abrindo uma gama de possibilidades e significâncias e assim não dando espaço a “limitações metodológicas” (MENESES, 2013, p. 183). Em se tratando das críticas do pensamento moderno, tem-se o logocentrismo, caracterizado por “(…)um conjunto de pressuposições em que se assenta a cultura do Ocidente.  Bem de acordo com o percurso da lógica, o logocentrismo marca-se por um grupo    de    conceitos    estabelecidos    em    categorias    opositivas    como    mente/corpo, essência/circunstância, verdade/mentira” (GOULART, 2003, p.12).

Fonte: https://goo.gl/Aab1gu

Atrelado a essas noções que organizam o pensamento humano, que funcionam como elementos centrais, se concebe uma série de conceitos e ideias que dão ao homem uma espécie de realidade como um todo. Derrida utiliza-se muito da antítese no logocentrismo, afirma ainda que essas ideias centrais acabam sendo usadas como objeto de dominação e hierarquização

Nessa atitude, procede-se a uma hierarquização que tem por objetivo afirmar a superioridade de um termo em relação ao outro.  Assim, nenhuma dúvida haveria em se pensar as oposições espírito/matéria ou Deus/diabo como produtoras   de   uma   verdade   que   ilumina   o   primeiro   elemento   da   oposição.   Essa hierarquização também é vista por Derrida como um tipo de relação de poder uma vez que a  predominância  do  elemento  privilegiado  denota    um fundamentalismo  que  se  impõe, autoritariamente,   no   sentido   de   propor-se   como   um   centro   inquestionável,   única possibilidade  de    explicação  da  realidade  e  de  explicitação da  verdade,  em  termos absolutos, Derrida atua para avultar-se  a concepção logocêntrica  afirma o  valor  de  um  centro,  em  prejuízo   de  seu  oposto, e   metafísica  atribui  ao logos a possibilidade de afirmação da verdade e a própria explicação da origem do ser (GOULART, 2003, p.12).

Ao falar de fonocentrismo, Derrida faz uma crítica. Segundo ele, a linguagem na cultura ocidental tem o seu lado negativo, uma vez que ela subtrai as várias formas de linguagem. Critica ainda o fato de que a racionalidade e a razão são completamente ligadas a fala e que esta é um objeto direto de verdades conscientes. Isso é o que difere um indivíduo do outro, visto que a etiologia do fonocentrismo é a fala sobre a escrita, escrita essa que não está sujeita a autoridade de quem a escreve (GOULART, 2003). A esse respeito:

Nas suas investidas contra a metafísica, Derrida dedica um significativo espaço para a crítica ao fonocentrismo, ou seja, para mostrar tudo o que a fala tem de negativo, uma vez que   ela   contribui   para   a   manutenção   das   condições   que   oblitera   a   manifestação multifacetada da linguagem. Por coisas como essas é que disse, acima, que a fala pode ajudar a compreender a presença, na medida em que a fala, por suas propriedades fônicas, atua como se estivesse legitimando a presença do falante, numa dinâmica que é a própria autenticidade, por estar, ali, sem artifícios e sem aparências, atestando uma presença e uma verdade (GOULART, 2003, p.13).

Fonte: https://goo.gl/M4Jokc

Portanto, segundo o autor, o idealismo favoreceu para as práticas escritas e verbais, como as verdades mais próximas do ser. Derrida afirma que o fonocentrismo está ligado inteiramente a Logocentrismo, pois os escritores o desafiam. Essa escrita que é responsável por excluir a polissemia. No entanto

A escrita não tem sentidos unívocos; ela produz sentidos os quais, mais do que múltiplos (polissemia), são sempre relacionais, incertos e não sabidos, diferentes e diferidos. Os conceitos desconstruídos por Derrida são os de significado, verdade, ser, essência. A esses conceitos, ele opõe as noções diferença (“différance”) e rastro (“trace”). A diferença é o próprio movimento do sentido, que só existe numa rede de elementos passados e futuros, numa economia de rastros” (PERRONE-MOISÉS, 1995).

O princípio que norteia o pensamento de Derrida sobre a Desconstrução dos centros é saussuriano, e ele admite na sua obra “Gramatologia”, conforme comenta Leal (LEAL, 2009), onde apresenta o conceito de fonema, segundo o qual o papel do significante apenas se torna perceptível em contraposição a outro significante, como exemplo, Deus é conhecido quando contrastado ao diabo, a partir das diferenças apresentadas atribui-se significados (DERRIDA, 2006, apud LEAL, 2009). Na acepção de Derrida (2006, apud LEAL, 2009), o significante caracteriza-se pela possibilidade de articulação do significado por meio da fala e da escrita e o significado é o conceito posto para a articulação. Derrida acrescenta ainda:

[…] não era um lugar fixo mas uma função, uma espécie de não-lugar no qual se faziam indefinidamente substituições de signos. Foi então o momento em que a linguagem invadiu o campo problemático universal; foi então o momento em que, na ausência de centro ou de origem, tudo se torna discurso – com a condição de nos entendermos sobre essa palavra – isto é, sistema no qual o significado central, originário ou transcendental, nunca está absolutamente presente fora de um sistema de diferenças (DERRIDA, 2002, p.232 apud PEDROSO JÚNIOR, s.d., p. 18).

Como mencionado acima, Derrida destaca as “margens”, a qual chama de “diferenças”, demonstrando a marginalização da literatura por questões geográficas ou opressões ideológicas. Com isso motivou a busca por pesquisas relacionadas à literatura e estudos culturais. A fala e a escrita são produtos das relações, e de acordo com Derrida, a linguagem é uma estrutura orientada. A desconstrução derridariana (DERRIDA, 2006, p. 265 apud LEAL, 2009) sobre o suplemento que é o fato de existir lacunas de ausências que existe na fala e somente a escrita contribui para complementá-la.

Fonte: https://goo.gl/x5Y8Xp

Na desconstrução tem como princípio da diferença, da referência e do contexto, desmembramento do mesmo conceito, em que o termo e seu outro são co-participantes do significado. Derrida coloca que a configuração do significado de bem depende do conceito de mal, cada um é definido a partir de sua diferença com seu outro (LEAL, 2009). Embora fosse herdeiro do estruturalismo, ele problematiza o conceito de centro, ou seja, se existia um centro é porque ainda permanece no estruturalismo e consequentemente é considerada uma verdade metafísica e que como todas as verdades devem ser colocadas em questão.

Interessava-se em discutir e explicar os termos denominados de desconstrução e différance, pois para ele era clara a diferença entre os dois. Cada palavra tinha seus sentidos próprios e o que elas representavam. “Différance é um termo que Derrida cunhou em 1968 à luz de suas pesquisas sobre a Teoria Saussuriana e estruturalista da Linguagem(LECHTE, 2002, p. 125). Derrida dizia que havia uma grande complexidade entre a fala e a escrita, uma vez que os sons das palavras entram pelo córtex auditivo atravessam outras áreas e chegam ao córtex motor primário para o processamento da fala e nesse percurso distorções podem ocorrer, pois segundo Lechte (2002, p.126) “além disso, a afirmação de que a escrita fonética é inteiramente fonética ou de que a fala é inteiramente auditiva torna-se suspeita […]”.

Fonte: https://goo.gl/1US6F1

Em todas as suas obras Derrida teve o foco na escrita, pois inclui elementos pictográficos, ideográficos e fonéticos, sendo assim, ela não é semelhante em si mesma. A escrita é sempre multifacetada e desafia a identidade ou a ideia de originalidade. Derrida frisava quanto à “impureza” da escrita e seus diversos sentidos. No sentido da desconstrução percebe se a queda da linguagem da metafísica, pois através deste houve o rompimento do significado único das palavras e surge uma aplicação com maiores significados entre a palavra proferidas e escritas.

O Pós-Estruturalismo foi considerado uma desconstrução e uma quebra de paradigmas que perdurou por diversos anos. No entanto alguns pensadores como Derrida deram sua grande contribuição com ideias revolucionárias, que mudaram a postura do ocidente no campo da gramatologia e outros conceitos, no qual ele não concordava, pois os mesmos resumiam se a ideia de centro. As proposições de Derrida são consideradas um tanto quanto desafiadoras. Críticos questionam se o próprio filósofo teria incorrido naquilo que contesta, uma vez que seus conceitos também podem ter sido influenciados pelo contexto histórico e cultural, assim como aqueles sobre os quais ele debatia.

Fonte: https://infogr.am/desarrollo-sustentable4

 A ideia de desconstrução supõe questionar aquilo que, predominantemente no mundo ocidental, é considerado como verdade absoluta. O questionamento das tais ocorre principalmente através da linguagem, uma vez que é a forma pela qual elas foram instituídas. Derrida critica as noções dualistas a partir das quais se limita e reduz as características da linguagem, tais quais os termos que, uma vez mencionados, implicam necessariamente em um oposto (Homem/mulher ou verdade/mentira, por exemplo). Para ele, é preciso mais que simplesmente contextualizar as produções e influências que estavam sob elas; indo além, faz-se necessário abrir-se às possibilidades de uma linguagem que é multifacetada.

REFERÊNCIAS:

BUENO, Sinésio Ferraz. Da teoria crítica ao pós-estruturalismo: breves apontamentos para uma possível confrontação entre Adorno e Deleuze. Educar em Revista. ed. Curitiba: UFPR. n. 56, p. 149-161, 2015. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/er/n56/0101-4358-er-56-00149.pdf>. Acesso em: 14 de mar. 2017.

CORRENTES FILOSÓFICAS. Pós-Estruturalismo, 2011. Disponível em: <http://correntesfilosoficas.blogspot.com.br/2011/11/pos-estruturalismo.html>. Acesso em: 14 mar. 2017.

LEAL, Edilene M. Carvalho. Jacques Derrida: pensador da desconstrução pensador da diferença – XV ENCONTRO NACIONAL ABRA11PSO, 2009, Maceio-AL. Anais. Faculdade Integrada Tiradentes-FITs, 2009. Disponível em: <https://goo.gl/RdhJZq>. Acesso em: 01 mar 2017.

LECHTE, John. Cinquenta pensadores contemporâneos essenciais: do estruturalismo à pós-modernidade. 2ª ed. Rio de Janeiro: DIFEL, 2002.

MENESES, Ramiro Délio Borges de. A desconstrução em Jacques Derrida: O que é e o que não é pela estratégia. Universitas Philosophica, n. 60, p. 177-204, 2013. Disponível em: <http://www.scielo.org.co/pdf/unph/v30n60/v30n60a09.pdf>. Acesso em: 01 mar. 2017.

PEDROSO JÚNIOR, Neurivaldo Campos. Jacques Derrida e a desconstrução: uma introdução. Revista Encontros de Vista. s.d. Disponível em: <https://goo.gl/lB9NyA> Acesso em: 01 mar. 2017.

PERRONE-MOISÉS, Leyla. Pensamento alterou rumos da crítica e da teoria. Outras Margens. Folha de São Paulo. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/fsp/1995/12/03/mais!/8.html>. Acesso em: 15 de mar. 2017.

SANCHEZ, Renata Latuf de Oliveira. Estruturalismo e Pós-Estruturalismo: diálogos entre Cinema e Arquitetura. Anagrama, v. 6, n. 1, p. 1-14, 2012. Disponível em: <https://goo.gl/JAsTnc>. Acesso em: 14 mar. 2017.

UOL EDUCAÇÃO. Biografias: Jacques Derrida. s/d. Disponível em: <https://educacao.uol.com.br/biografias/jacques-derrida.htm>. Acesso em: 15 mar. 2017.

VASCONCELOS, José Antonio. O que é desconstrução. Revista de Filosofia, v. 15, n. 17, p. 73-78, 2003. Disponível em: <http://www2.pucpr.br/reol/index.php/RF?dd1=117&dd99=pdf>. Acesso em: 14 mar. 2017.

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As influências midiáticas sobre a aparência e o corpo feminino

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O presente ensaio visa retratar as mudanças na configuração do corpo ao longo dos tempos, resultando no ideal de corpo midiático. Este rompeu com barreiras, tabus e repressões, e posteriormente passou a ser cultuado, desejado, concomitantemente sinônimo de bem estar e saúde. Tendo como fonte inspiradora a mulher, formula que permite construir e reconstruir o novo, a moda, a ostentação, a beleza dentro de um contexto mundialmente copiado, a busca constante corpo imaginário.

Essa amostra, parte do Livro Corpos Mutantes, o qual analisa o corpo canônico, ou seja, corpo modelado, sendo resultado de uma busca desenfreada nas academias de ginástica, modificado, adaptado a realidade vigente, fugindo do tradicional, do básico, sendo molde pra mais diversas faixas etárias, promovendo e estruturando um modelo comum, para o fabricado. Visto que, a mídia se utiliza do investimento no corpo, para vender imagens de mulheres, produtos, cosméticos e cirurgias plásticas. De acordo com Fontes (2004):

Publicizado exaustivamente nos meios de comunicação de massa e tido como desejável e sinônimo de beleza, saúde e bem estar, o corpo canônico é, em essência, resultado de um conjunto de investimentos em práticas, modos e artifícios que visam alterar as configurações anatômicas e estéticas (FONTES, 2004, p. 73).

O que contrapõe a este corpo canônico passa a ser dissonante, o modelo estruturado pela comunicação de massa como ideal, demonstrado repetidas vezes pela mídia, em determinados grupos principalmente os que buscam uma vida alternativa, estão em contramão a este conceito, foge a essa realidade, para tanto, estão em desacordo ao modelo estabelecido. As mulheres diferentes fogem a essa regra, tido como corpo dissonante, ou seja, não estão inseridas a este modelo contemporâneo, ocasionando frustrações por não alcançar o desejado, ou estipulado por uma corporeidade canônica.

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Fonte: http://www.coisasdegraziella.com/2014_11_01_archive.html

As trajetórias do corpo na contemporaneidade e as influências midiáticas sobre o corpo feminino

O corpo passou por diversas configurações no decorrer do tempo, tempo este, que expressa seus valores de muitas formas, e o formato do corpo é uma delas, pois cada país, cada cultura, região apresenta o que estimam e, constroem-se padrões de belezas que vão mudando assim como determina o contexto. Na Idade Média, prevalecia o domínio da igreja católica, muitos atos eram tidos como pecados, alguns até mortais. Neste contexto o corpo, em especial da mulher, era tido como sagrado e, até a higiene era considerados imorais e impuros, e tanto o corpo das mulheres quanto o dos homens eram totalmente coberto (DAMBROS; CORTE; JAEGER, 2008).

A esse respeito, Foucault (1988) analisa que, no espaço social a sexualidade só era reconhecida dentro do âmbito familiar, como forma de reprodução, dessa forma, o decoro das atitudes escondia os corpos e higienizava os discursos. O sexo e desse modo, o corpo, sofriam repressões. Fontes (2006) retrata as mudanças ao longo do século XX, pelas quais o corpo passa, sendo estas:

O corpo representado, visto e descrito pelo olhar do outro, da igreja, do estado, do artista; o corpo representante, um corpo ativo, autônomo quanto às suas práticas, consciente do seu poder político e revolucionário, porta voz do discurso de uma geração, contestador, sujeito desse próprio discurso e agente propositor e defensor de reformas que vão da sexualidade à política (FONTES, 2006, p. 7).

Posteriormente, vivenciamos o que Fontes (2006) descreve como o corpo apresentador de si mesmo, ou seja, o corpo canônico, o qual deriva-se de uma cultura pautada pelo efêmero e pelo imediato, perpassado por cirurgias plásticas e implantes de substâncias químicas “que busca incessantemente apagar da pele as marcas biológicas do tempo, ao mesmo tempo inscrever na forma física os sinais da corpolatria. Este corpo é, em si mesmo, o próprio espetáculo” (FONTES, 2006, p. 7.)

Nessa direção, Freire Costa (2005), ao traçar o corpo na sociedade contemporânea, destaca que o mito cientificista ocupou um espaço moral na vida dos sujeitos, pois, se antes, o cuidado de si era voltado para os sentimentos, alma e longevidade, na contemporaneidade, vivenciamos um novo modelo de identidade: a bioidentidade, sendo esta a valorização do corpo saudável, belo e jovem, e para chegar aos resultados esperados utiliza-se da bioascese, ou seja, a disciplina, uma vez que “ser jovem, saudável, longevo e atento à forma física tornou-se a regra científica que aprova ou condena outras aspirações à felicidade” (FREIRE COSTA, 2005, p. 190).

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Fonte:http://www.blogdaje.com/page/11/

Indubitavelmente, o lugar do corpo se modificou, pois, antes esse era tido como matéria bruta, ou seja, um meio para se atingir um ideal, era garantia de saúde para buscar aspirações sentimentais, porém, o prazer sensorial hoje é buscado como antes se buscava valores sentimentais, passando a fazer parte da subjetivação, entretanto, Freire Costa (2004) nos alerta que “diferentemente do prazer sentimental, que pode durar na ausência dos estímulos sensórios-motores, o prazer sensorial depende do estímulo físico imediato e da presença do objeto fonte da estimulação” (p. 6), sendo assim, o individuo precisa buscar nos objetos sua fonte constante de prazer, uma vez que, o corpo tem suas limitações biológicas. (FREIRE COSTA, 2004)

Assim, o sujeito passa cada vez mais a investir nos objetos de consumo, como forma de obter satisfação pessoal e deixa de investir em bens comuns. O corpo ideal é produzido pelos meios de comunicação de massa, torna-se um simulacro, propagado pela mídia, a qual se aproveita do individualismo vigente para vender os produtos e fabricar os corpos desejados. Freire Costa (2005) chama essa sociedade pautada no corpo de “sociedade somática”, a qual hiperinveste afetivamente na imagem corporal e a coloca no mesmo patamar que os atributos sentimentais. Nas palavras do autor:

O narcisista cuida apenas de si, porque aprendeu a acreditar que a felicidade é sinônima de satisfação sensorial. Assim, o sujeito da moral hodierna teria se tornado indiferente a compromissos com os outros -faceta narcisista- e a projetos pessoais duradouros- faceta hedonista (FREIRE COSTA, 2005, p. 186).

Desse modo, o corpo passa a ser lugar de destaque na vida dos sujeitos. E a publicidade se utiliza disso, tornando o corpo por vezes, como um produto a ser vendido, e por vezes também ligado a um ato político.

Fontes (2006) argumenta que, nas primeiras décadas do século, o corpo foi reprimido, após, observa-se que o corpo reivindica o próprio espaço de apresentação, sobretudo nas décadas do pós-guerra, na qual se transforma em bandeira de luta, de quebra de tabus e de discurso político. Enquanto que nos anos 90, o corpo toma outra configuração e pode ser definido com o corpo que representa, o corpo representante. O avanço médico e cientifico contribuiu para o descortinamento do corpo, e a mídia instituiu seus discursos sobre o corpo canônico, sobretudo, no corpo feminino.

Muitas épocas foram marcadas por formatos de belezas midiáticos que jamais deixarão a historia, como a beleza estonteante Marilyn Monroe, mulher de seios fartos com cintura de “pilão” que era o próprio padrão de beleza da época. E assim décadas foram passando com seus padrões de belezas estabelecidos conforme determinava momento. No entanto o ano de 1980, Arnold Schwarzenegger, entra no circuito para deixar um modelo de físico que perpetuaria durante décadas, pois foi depois dos concursos que o mesmo ganhou de fisiculturista por seis vezes consecutivas que o seu corpo tornou-se um modelo a ser seguido.

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Fonte: http://seuhistory.com/etiquetas/marilyn-monro

Observa-se assim, que os discursos médicos sobre boa forma aliada a sinônimo de saúde (é preciso ter baixas taxas de glicose e colesterol, se alimentar corretamente, etc.) ultrapassaram o âmbito da saúde e passaram a possuir uma denotação estética, pois hoje, o sujeito não vai a academias para ser saudável, mais que isso: este deseja ter o corpo da moda. Além disso, o imediatismo e hedonismo fazem com que o sujeito queira práticas rápidas, por isso, as intervenções cirúrgicas ganharam destaques. A corporeidade canônica é caracterizada, então:

Como aquela que recorre à adoção voluntária de um conjunto de práticas, técnicas, métodos e hábitos que têm como firme propósito (re)configurar o corpo biológico, transformando-o em um corpo potencializado em seus aspectos estéticos e em suas formas de gênero: grosso modo, homens musculosos e mulheres de seios voluptuosos e curvas definidas (FONTES, 2006, p. 10).

A publicidade em muito contribui para isso, na medida em que se utiliza da figura de mulheres famosas, com seus corpos malhados, peles perfeitas, cabelos sedosos e sorrisos radiantes, para apresentar um produto.

Sobre isso, Debord (1997) elucida que “o espetáculo não é um conjunto de imagens, mas uma relação social entre pessoas, mediada por imagens”, nesse sentido, temos as redes sociais, como o instagram no qual imagens são postadas para gerir o espetáculo, não havendo mais a distinção entre a vida pública e privada, porém, o que vemos é o que o espetáculo tem se convertido no real.  Desse modo, o sujeito não apenas almeja apenas ter o corpo de tal famosa, mas anseia também por ser tão feliz quanto essa aparenta ser.

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Fotos: http://geralcodigos.blogspot.com.br/

Para Lipovetsky (2000) apud Samarão (2007)  Ao longo do século XX a publicidade passou a ter muita influencia sobre as mulheres generalizou a “paixão” pela moda, favoreceu a expansão social dos produtos de beleza, contribuiu para fazer da aparência uma dimensão essencial da identidade feminina para o maior número de mulheres. Samarão (2007) analisa que isso levou a propagação de normas e imagens ideais do feminino, submetendo as mulheres à ditadura do consumo e inferiorizarão da mulher “ora intensificando as angústias da idade, ora reforçando os estereótipos de mulher frívola e superficial” (SAMARÃO, 2007, p. 7).

Desse modo, quem foge desse discurso midiático e publicizado sobre o corpo, é tido como dissonante, sendo este visto como corpo in-válido, ou seja, aquele que não adere aos artifícios de adequação da aparência, não segue os padrões reproduzidos pelas redes sociais ou televisão, este é visto com estranhamento e até mesmo de repulsa (FONTES, 2006). O corpo passou por diversas transformações, todas elas influenciadas pelo contexto político e histórico de uma época, sendo que, na atualidade, a mídia e publicidade têm tido poder sobre o corpo, principalmente no que concerne ao corpo feminino. Diante disso, caberia nos perguntar, será que somos mesmo donos do nosso corpo?

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Fonte: http://meubatomnaoechanel.blogspot.com.br/2012_10_01_archive.html

 No que tange o corpo feminino, este é palco de discussões até mesmo no âmbito de saúde pública, uma vez que, as mulheres não possuem o direito sobre o aborto, e para as feministas, a mulher deveria ser dona do seu próprio corpo. Na contemporaneidade, tem-se influencia do hedonismo e narcisismo, o que leva os indivíduos a hiperinvestirem no corpo, deixando de lado os valores duráveis e de bem comum.

A publicidade assim, tem se beneficiado na medida em que, se utiliza de imagens de mulheres bonitas e padronizadas para vender seus produtos. Por fim, vemos que o sujeito na contemporaneidade, tem recorrido a intervenções cirúrgicas, acreditando que dessa forma, irá alcançar a felicidade, porém, o que vemos é que isso é um simulacro, é a inversão do real, pois, o sujeito não tem consciência das reais motivações que talvez o faça buscar em um bisturi, uma forma de cicatrizar seu ego fragilizado.

REFERÊNCIAS

DAMBROS; CORTE; JAEGER. O corpo na Idade Média. Revista Ef de Portes, Ano 13 , N° 121, Buenos Aires, 2008. Disponível em: http://www.efdeportes.com/efd121/o-corpo-na-idade-media.htm. Acesso em: 06 de setembro de 2016.

 

DEBORD, G. A sociedade do espetáculo. Ed. Contraponto. Rio de Janeiro, 1997.

FREIRE- COSTA. Perspectivas da juventude na sociedade de mercado. In: NOVAES, R;VANUCHI, P. (orgs). Juventude e sociedade: trabalho, educação, cultura e participação.São Paulo, Perseu Abramo, 2004.

 

______________O vestígio e a Aura: Corpo e consumo na moral do espetáculo. E. Garamond. Rio de Janeiro, 2005.

 

FONTES, M. Os Percursos do Corpo na Cultura Contemporânea. XXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – UnB, Brasília, 2006 .

 

FOUCAULT, M. História da Sexualidade. A vontade de saber. Ed. Graal. Rio de Janeiro, 1988.

 

SAMARÃO, L. O espetáculo da publicidade: a representação do corpo feminino na mídia. Revista Contemporânea. v. 5. n. 1, 2007. Disponível em: http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/contemporanea/article/view/17200/12633 Acesso em: 08 de setembro de 2016.

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