A Casa de Marta, fundada em 2002, é uma Instituição Filantrópica, de iniciativa da Igreja Católica, pertencente à Arquidiocese de Palmas. Ainda, é um Centro de Apoio a gestantes menores de idade, de 12 a 17 anos, expostas à insegurança, fragilidade e em situação de risco.
Além disso, a Casa oferece oficinas (alguns trabalhos manuais e confecção do seu próprio enxoval); treinamento de cuidados com os bebês; atendimento psicológico; momento de reflexão e espiritualidade, além de visitas domiciliares. Vale ressaltar que a Casa não funciona sob regime de internato, porém suas atividades são realizadas três vezes por semana (segunda-feira, quarta-feira e sexta-feira das 8h30 às 16h30). No que tange à manutenção, a Casa conta com o voluntariado, além de doações externas (COMPROMISSO, 2014, p.1).
Roberta Sales (nome fictício) ingressou na Casa de Marta aos 15 anos de idade, enquanto ainda estava grávida de 6 meses. Hoje (10 de abril de 2018), Roberta tem 16 anos e sua filha está com 9 meses de idade.
(En)Cena – Como você ficou sabendo da existência da Casa?
Roberta Sales – Foi pela madrinha do meu esposo, ela é do Conselho Tutelar. Ela falou sobre a Casa de Marta. Falou uma coisa que não é: que eles ensinavam a banhar a criança porque eu não sabia de nada, cuidar, essas coisas assim. Aí falou que davam as coisas, o enxoval, essas coisas assim.
(En)Cena – Quais sentimentos envolveram você durante o período em que estava grávida e hoje como mãe?
Roberta Sales – Antigamente, eu era muito fechada. Sempre fui na minha. Nunca fui de conversar com ninguém não. As meninas (outras adolescentes que também frequentam a Casa) vieram falar comigo, aí eu falei pra elas que não era de conversar com ninguém e aí eu falei que não queria falar com elas. Eu falei bem assim pra elas. Aí elas ficaram assim… Eu comecei a ficar na minha, mas mesmo assim elas puxavam assunto comigo e eu mesmo assim não queria conversar. Aí nós acabamos conversando porque eu era muito besta com o “negócio” do meu marido. Eu achava que as outras pessoas chegavam em mim só pra querer meu marido. Aí a gente começou a virar amigas.
(En)Cena – Você percebeu alguma mudança no seu corpo?
Roberta Sales – Demais. Muita estria. Eu fiquei muito feia depois que eu ganhei a neném. Agora que eu estou me ajeitando mesmo, mas assim, no começo eu ficava arrependida de ter filho porque eu estraguei muito o meu corpo, depois que eu ganhei.
(En)Cena – A sua rotina foi alterada?
Roberta Sales – Foi. Eu era muito de sair. Aí depois que eu ganhei, eu deixei de sair. Enquanto estava grávida também deixei de sair porque eu me achava muito feia. Aí depois que a minha autoestima foi levantando. As pessoas falando que eu estava bonita e eu achando. Eu sempre fui otimista. Sempre me acho bonita. Assim, quando estou arrumada. Quando não estou, não falo que sou bonita não.
(En)Cena – Qual a ideia que você tem sobre ser mãe?
Roberta Sales – Responsabilidade grande porque eu não tinha. Antes de eu vir pra cá, eu não gostava da minha mãe, não conversava com ela. E eu fui entender as coisas que a minha mãe falava pra mim depois que eu fui ser mãe. Aí eu fui entender as coisas direito. Assim, eu me sinto uma pessoa melhor, sabia? Minha vida mudou bastante, eu era muito “desandada” antigamente. Eu nunca amei ninguém de verdade e hoje eu amo ela bastante (filha). As pessoas falavam que a mãe dava a vida pelo filho. Eu não acreditava nessas coisas, mas hoje eu dou minha vida pela minha filha. Eu mudei demais.
(En)Cena – Teve algum momento de rejeição, que você pensou talvez em abortar…
Roberta Sales – Não. Foi no começo da gravidez que eu parei de falar com a minha mãe porque ela queria que eu abortasse. Ela não queria que eu tivesse filho. Aí ela me deu remédio. Eu tomei, mas assim eu não queria tomar. Meu pai já era o oposto, falava que não era pra eu tomar, mas eu tomei e não aconteceu nada. Aí eu briguei com a minha mãe porque ela estava insistindo muito nisso. A gente se afastou. Aí depois que eu ganhei, quando eu voltei a falar com ela.
(En)Cena – Você tomou o remédio por muito tempo?
Roberta Sales – Não, eu tomei uma vez só.
(En)Cena – Que tipo de apoio você mais precisa ou de quem?
Roberta Sales – Eu conto mais com a minha mãe e com aqui, a Casa de Marta mesmo porque eles me ajudam bastante. No dia que eu estava precisando, que eu não tinha nada pra comer lá em casa, eles me deram uma cesta básica, um monte de coisa. Quando eu estou precisando lá em casa, eu venho aqui e peço, que eles me dão.
(En)Cena – Que tipo de profissional você acha que poderia atuar ou auxiliar você?
Roberta Sales – Uma psicóloga e uma das irmãs, que não são mais daqui. Elas me falavam as coisas, fez eu ter menos ódio da minha mãe. É porque a minha mãe nunca gostou de mim. Hoje ela gosta de mim, mais por causa do neném. Minha mãe é preconceituosa. Ela não gostava de mim por causa da minha cor porque eu era “mais moreninha”. Minha irmã é branca e ela só me aceitou agora porque a mina filha é branca. Só por causa disso. Ela disse que se tivesse um filho “preto”, moreno, ela disse que não ia aceitar nem gostar.
(En)Cena – Ao deixar de frequentar a Casa, você iniciou alguma outra atividade?
Roberta Sales – Até comecei a trabalhar aí o lugar que eu estava trabalhando como recepcionista, não quis me pagar. Aí eu não fui mais.
(En)Cena – Você já percebeu alguma mudança em sua vida desde que ingressou na Casa?
Roberta Sales – Ajudou em relação à minha mãe. Ajudou com comida, no momento que eu realmente estava precisando, passando fome mesmo. Aí eu pedi para uma das irmãs e ela me deu uma cesta básica. Ela foi lá em casa e viu que eu realmente estava precisando e me deu.
(En)Cena – Você consegue planejar algo? Seja para amanhã, daqui a 2 anos, 5 anos…?
Roberta Sales – Eu tenho. Eu quero voltar a estudar. Já falei que vou voltar a estudar ano que vem. Aí vou entrar no exército também ano que vem.
Referências:
COMPROMISSO com a vida. Palmas, TO: Casa de Marta, 2014.
Nota: A entrevista foi realizada com autorização dos dirigentes da Casa de Marta no período do desenvolvimento do Estágio Específico em Saúde Mental, do curso de Psicologia do Centro Universitário Luterano de Palmas – Ceulp/Ulbra, com a supervisão da Profa. Dra Irenides Teixeira.