Joana Amaral: Com brancos e negros no mesmo ambiente, se algo der errado, a culpa será do negro

 

Maria Sueli de Souza Amaral Cury – suelicury@gmail.com

O (En)Cena entrevista a senhora Joana Pereira Amaral Neta, profissional com o curso Normal Superior, pós-graduada em Prestação Jurisdicional, educadora, serventuária do poder Judiciário Tocantinense. Joana argumenta que o povo brasileiro é racista e dissimulado, e isso fica perceptível nas situações mais corriqueiras da vida, “presente nas brincadeiras, recheadas de dizeres racistas, sendo que evoluem para as oportunidades sociais, nos estudos,  no trabalho”.

A servidora pública argumenta ainda que “para alcançarmos um lugar ao sol, nosso trabalho e esforço é muito maior que o dos outros. A cor da pele é como uma punição, antes mesmo de nascer”. Confira estes e outros temas na entrevista a seguir.

 

(En) Cena – Não a questionarei quanto à raça em virtude de crer que a palavra raça, já possui uma conotação racista, pois, somos uma única raça, a raça humana, assim sendo, como você se classifica na nossa sociedade quanto à sua cor de pele?

Joana: Sou uma mulher preta. Assim me defino, seja com choro ou glórias e, exijo respeito. Sou humana igual aos outros que assim se definem.

(En) Cena – Você sabe o que é o racismo?

Joana: Sim, como mulher preta e pertencente geneticamente a esse grupo, o racismo é uma prática em anular um ser em detrimento de outro, com base na cor da pele, como se esta definisse a superioridade ou inferioridade de um indivíduo.

Créditos da entrevistada- acervo pessoal.

(En) Cena – Você acredita que o Brasil é um país racista? Se sim, como manifesta?

Joana: Sim, o povo brasileiro é racista e dissimulado, perceptível nas situações mais corriqueiras da vida, presente nas brincadeiras, recheadas de dizeres racistas, sendo que evoluem para as oportunidades sociais, nos estudos,  no trabalho, na diferença salarial entre pessoas negras e brancas e nas diferentes formas de tratamento socialmente e perante a lei, os julgadores são sempre mais severos  quando trata de uma pessoa negra.

(En) Cena – Tu crês que o racismo é nato ou ensina-se?

Joana: Então, acredito que ninguém nasce racista, as crianças são ensinadas e o ciclo gira, não há ruptura, crianças ensinadas hoje, adultos racistas de amanhã.

 

(En) Cena – Como você identifica uma atitude racista?

Joana: Uma atitude racista pode ser facilmente percebida quando alguém é impedido de exercer e ter seus direitos reconhecidos, que denotam exclusão social, profissional seja através de demonstração de que a pessoa não é bem-vinda em determinado local devido à sua “raça” ou descendência. Negar o ato sofrido, e ainda tentar justifica-lo como sendo natural por ser a nossa cultura social.

(En) Cena – Quais são os principais desafios de uma mulher negra serventuária do Poder Judiciário, majoritariamente branco?

Joana: Os principais desafios de uma mulher negra, serventuária do Poder Judiciário, é o mesmo de qualquer trabalhadora de outra repartição, empresa ou outro trabalho, resta-lhe trabalhar no espaço e acima de tudo observar as intensões maledicentes que às vezes são ditas em tom de brincadeira mas, que são atitudes racistas. Brancos e negros no mesmo ambiente, se algo der errado, a culpa será do negro, este tem que trabalhar como se pisando em ovos, e isso é estressante. O norte do negro, ainda não o encontramos. Para alcançarmos um lugar ao sol, nosso trabalho e esforço é muito maior que o dos outros. A cor da pele é como uma punição, antes mesmo de nascer.

 (En) Cena – Onde você trabalha, há várias pessoas negras trabalhando e exercendo função de chefia?

Joana: Não, somente duas pessoas.

(En) Cena – Tu acreditas na igualdade de oportunidades entre as pessoas de cor da pele negra e branca?

Joana: Não, esse conceito continua a ser trabalhado.

Créditos da entrevistada- acervo pessoal.

(En) Cena – Em seu ambiente de trabalho, você sofreu e/ou percebeu alguma situação racista por parte de seus gestores?

Joana: Não.

 (En) Cena – Você experienciou e/ou identificou alguma situação racista com o público externo?

Joana: Sim, para as pessoas brancas, o negro deverá ser sempre o seu prestador de serviços. Eles não pedem, mandam como nos tempos de senzala.

(En) Cena – Você acredita que o racismo pode causar danos emocionais à pessoa que seja alvo dessa atitude, levando-a a um quadro de depressão? Se sim, de qual forma?

Joana: Sim, podemos ver esses danos nas pessoas através de sentimentos de inferioridade, com baixa autoestima, sentimentos de vergonha, medo, angústia, ansiedade, perda da identidade, insegurança e desesperança em lutar e não ver mudanças em sua vida e na de seus descendentes.

(En) Cena – Tu acreditas que algum dia a nossa sociedade evoluirá para banir o racismo?

Joana: Não acredito, sempre terá a raiz no processo de escravidão no país, assim como a libertação dos escravos, temos e teremos apenas um verniz, um disfarce de mudanças. Quem está no topo do poder, são os brancos e não há interesse destes para uma sociedade de iguais direitos entre brancos e pretos.

(En) Cena – Como trabalhar a sociedade brasileira para eliminar e/ou dirimir o racismo?

Joana: Essa é luta diária e permanente, de toda forma, realizar diagnóstico dentro das instituições públicas  e empresas de maneira a identificar o perfil, e estabelecer e promover a diversidade racial como um critério, uma forma de promover e propiciar  igualdade de oportunidades para todos.