Quando um casal de idosos completa 50 anos de casados — ou mais —, a pergunta que mais se ouve é: “Qual o segredo para ficarem juntos tanto tempo?”
Independente das palavras escolhidas para responder, quase sempre elas vêm acompanhadas de uma risadinha sem graça. E, toda vez que vejo essa cena, me pergunto: quantas vezes esse casal quis, na verdade, estar separado? Quantas vezes aquela risada tímida tenta esconder uma vontade engolida, um silêncio imposto? A pergunta que me salta à boca é outra: o quanto de vocês foi deixado para trás para que esse relacionamento pudesse durar tanto?
Hoje em dia, casais que chegam a dois anos de relacionamento já são considerados vitoriosos. Uma relação com essa duração já carrega o rótulo de longa. Ainda assim, seguimos colocando os casamentos de nossos avós e pais como exemplos do que é “certo”, do que deveríamos almejar, como se fossem conquistas plenas. Mas raramente nos perguntamos quanto sofrimento foi acumulado, esquecido, negligenciado — talvez até naturalizado — para que aquelas duas pessoas permanecessem juntas a ponto de, hoje, um não existir mais sem o outro. Podemos chamar isso de amor… ou seria a perda da individualidade?
Também não podemos ignorar as questões de gênero. Principalmente no caso das mulheres mais velhas, que estão em relacionamentos de 25, 30, 40 anos. Essas mulheres não tiveram as mesmas possibilidades que nós temos hoje. Muitos desses casamentos sobreviveram, simplesmente, porque elas não tinham outra escolha. E me pergunto: essas mulheres sabem o que é ser verdadeiramente amada? Sabem o que é querer estar em um relacionamento — e não apenas precisar? Será que, se tivessem as oportunidades que temos hoje, ainda assim escolheriam os mesmos parceiros? Talvez tivessem escolhido outras mulheres, mas nem essa opção lhes foi dada. A verdade é que, se tudo dependesse apenas de amor e liberdade de escolha, talvez eu nem estivesse escrevendo este texto — e muitos de vocês, sequer lendo. Porque muitos de nós somos frutos da impossibilidade de um “não”.
A conclusão a que chego é simples, porém necessária: não deveríamos romantizar tanto os relacionamentos. É urgente enxergar a realidade como ela é — com suas dores, silêncios, privações e ausências disfarçadas de paciência e resiliência. E, talvez, da próxima vez que eu vir aquele casal idoso dando uma risadinha diante da pergunta clássica, eu não pergunte mais qual o segredo. Talvez eu apenas sorria de volta e pense, em silêncio: Quantas vezes vocês se deixaram para que o “nós” pudesse existir? E será que valeu a pena?