Desde que a cantora Daniela Mercury assumiu seu relacionamento com outra mulher, a jornalista Malu Verçosa, ouvi críticas e questionamentos sobre o fato de ela ter sido casada com Marco Scabia. A dualidade do desejo bissexual ainda é visto com resistência e preconceito pela sociedade.
O ator José de Abreu, recentemente, declarou em sua página do Twitter: “Eu sou bissexual, e daí? Posso escolher quem eu beijo? Quando quero beijar uma pessoa, não peço atestado de preferência sexual, só depende de ela querer”. E teoriza: “Tem dias que prefiro homens, tem dias que prefiro mulheres. Tenho que mudar? Eu sou assim, ué. Tenho que ser igual aos outros? Prefiro o que me dá prazer. E prefiro ter a preferência que deixá-la nas mãos da natureza… Ou de Deus. Prefiro homens e mulheres que me interessem sexualmente”.
O bissexual muitas vezes é acusado de ser alguém com dúvida e de estar passando por um momento de transição até confirmar sua homossexualidade. A bissexualidade existe, sim, e é preciso reconhecer esta orientação sexual. O desejo e a atração sexual são direcionados igualmente para homens e mulheres. A identidade sexual é bem definida e não admite estereótipos. O bissexual não é um homossexual enrustido, mas uma pessoa que transita livremente no sistema binário, homem ou mulher.
Exigência
Desde cedo somos exigidos a nos relacionar com alguém do sexo oposto, portanto, enquadrar-se numa heterossexualidade. Esta imposição denuncia que a heterossexualidade é compulsória.
Existe um número grande de pessoas que apresentam este desejo dualista, e resultado disso são sites de encontros que propiciam a relação bissexual. Homens que se relacionam com mulheres e se cadastram buscando relacionamentos com homens.
Muitos equívocos são atribuídos à bissexualidade, que é uma expressão legítima do desejo. São acusados de promíscuos, de não conseguirem ter uma relação monogâmica. Os bissexuais podem ter relações duradouras e fidelizadas.
Atração
O bissexual pode sentir-se atraído por ambos os sexos, mesmo que não coloque isso em prática. A igualdade entre homens e mulheres cria intersecções cada vez maiores entre masculino e feminino. As diferenças são destituídas a partir de um processo mútuo de identificação. Com a inserção das mulheres no mercado de trabalho, o advento da pílula anticoncepcional, a autonomia sexual e os movimentos de libertação sexual, o desejo e o prazer revelaram suas pluralidades.
Na década de 1950, Alfred Kinsey, estudioso sobre sexualidade, criou uma escala que ia de zero a seis, em que zero era “exclusivamente heterossexual” e seis “exclusivamente homossexual”. No meio da tabela, o três representava “bissexual”. Segundo essa escala, 46% dos entrevistados eram exclusivamente heterossexuais, 4% exclusivamente homossexuais e 50% não se apresentavam exclusivamente nem homo nem heterossexuais, mas bissexuais.
Freud concebia uma “bissexualidade psíquica inata”, algo possível para o ser humano tendo como base o desenvolvimento sexual das crianças, que interiorizavam como referência os órgãos sexuais do pai e da mãe. Segundo Jung, o ser humano possui uma bissexualidade psíquica herdada pelas experiências raciais do homem com a mulher e da mulher com o homem. Os conceitos de “Anima” (arquétipo feminino no homem) e “Animus” (arquétipo masculino na mulher) são assim concebidos pelo teórico. Em sua psique, o ser humano é bissexual.
Identidade
A identidade de gênero, masculino ou feminino, pode ser definida pela sociedade, mas o desejo e o prazer são mutáveis, e não estáticos. Além de os papéis sociais ficarem cada vez mais estreitos, é ingênuo achar que existam padrões para a expressividade do sexo.
A bissexualidade parece ser, definitivamente, uma realidade para todos, em que, as pessoas vão se relacionar de acordo com suas conveniências e necessidades, sem se preocupar se são homens ou mulheres. A mudança de mentalidades enfraquece a heteronormatividade e é aí que reside a legitimidade da identidade sexual.