O Grego é Heresia

Erasmo, tido como herói de batalha nos contextos de reforma e contrarreforma; O mesmo tem marca fortíssima para o surgimento do protestantismo. Erasmo era admirador fiel de Jerônimo. Este foi tido como santo por Erasmo, por morrer virgem, não ingerir carne ou bebidas alcoólicas, dormir no chão, usar trajes cilícios e se mutilar três vezes ao dia. Seu amigo, Quentin Metsys chegou a pintar um retrato de Erasmo que nos remete ao famoso retrato de Jerônimo, por Van Eyck, para representar o quanto Erasmo era devoto á seu herói, sendo retratado na mesma posição (p. 132). Foi esta adoração que o levou a aprender grego, para que pudesse entender de forma direta os escritos de seu ídolo. E ao se deparar com as diferenças que as traduções traziam com o que Jerônimo escrevera de fato, Erasmo se dedicou a retraduzir corrigindo todos os equívocos que os textos traziam.

Porém esta ação de Erasmo o fez ser conhecido como “agressor herético” a Jerônimo (p. 134), pois Erasmo se voltou para um livro tido como livro santo pela igreja e pela sociedade da época, A Vulgata, causando uma crise social. Este livro regia todas as normas e leis da época, bem como os serviços religiosos, representando o poder do Latim na Idade Média.

Levantamentos como o preço da autoridade da igreja e a veracidade da Palavra de Deus nortearam os sentimentos diante da crítica de Erasmo, pois este havia colocado a ordem da sociedade em jogo (p. 135). As pessoas temiam que as alterações da Vulgata ameaçassem a instituição da igreja, assim como ocorreu. “A igreja foi violentamente desmembrada por esse movimento intelectual. ”

Fonte: goo.gl/wAm5ss

As mudanças que Erasmo propôs dividiu a sociedade e um massacre foi iniciado, como o caso de Hermann van Flekwyk que foi morto na fogueira acusado de “mamar nos peitos venenosos de Erasmo” (p.136), e a erudição de Erasmo se tornou caso de vida ou morte. Neste momento o Grego havia se tornado um alicerce de aprendizado e de cultura, uma das maiores conquistas da Renascença. Mas foi no Concílio de Trento, em 1546, que a Vulgata foi declarada como “autentica” e fora proibido a rejeição da mesma, neste momento toda a inflamação sobre a versão de Erasmo foi apagada (p. 137). Nasce neste momento um sentimento de nojo de tudo que fosse de cunho grego, fora orientado até as crianças que se afastassem do grego. Ele se tornou sinônimo de origem de heresias. E Erasmo passou a enfrentar muitos adversários de forma direta.

Após as críticas de Lee a primeira edição da versão de Erasmo, uma cópia do livro de Lee foi mergulhada em fezes e exposta no meio de uma sala de leitura pública. John Meier mostra a Erasmo a real preocupação da igreja quanto a exatidão da letra diante da manutenção da autoridade. Esta discussão entre Erasmo e Meier expressou exatamente o sentimento das discussões entre reformadores e conservadores. Um preocupado com a verdade e a erudição e o outro com tradição e autoridade, respectivamente. Nasce neste momento também um grupo chamado “Os Troianos” que reprimia toda e qualquer expressão de estudo e aprendizado dos clássicos, ridicularizando quem o estivesse praticando, mas foram repudiados por More, em nome do rei Henrique VIII, como “facções estúpidas (p.139).

Logo, em 1559, Elizabeth I e Eduardo VI, que foram instruídos por Ascham, acadêmico de Cambridge muito influenciado por Erasmo e pela causa humanista, em uma rigorosa educação em grego, levaram a Inglaterra ao protestantismo. Porém criticados por Erasmo quanto a tradução da Bíblia para o inglês. Esta critica se deu por uma preocupação exacerbada pela tradução que poderia gerar conflitos de sinônimos e mudaria princípios religiosos como a disputa por “amor” e “caridade” (p.140). Entretanto o uso do inglês foi radical em apoio a Reforma. E por fim T. S. Eliot se preocupa com a importância de se estudar grego e latim para entender as raízes e a sobrevivência da civilização cristã, usando a compreensão dos clássicos para o entendimento da tradição ocidental (p.141).

REFERÊNCIA:

GOLDHILL, Simon. Amor, Sexo e Tragédia. Ed 1, Editora Jorge Zahar, 2007.