Paternidade Socioafetiva: quando o afeto prevalece sob a verdade biológica

A paternidade socioafetiva é uma das espécies de paternidade no qual o vínculo afetivo prevalece sob a verdade biológica, sendo reconhecida como paternidade civil para todos os efeitos. Nesse tipo, não há vínculo sanguíneo biológico entre pai e filha(o), mas considera-se o vínculo afetivo, na construção de cuidado, carinho e atenção, para que haja o devido reconhecimento da paternidade.

Frente às novas dinâmicas familiares existentes e levando-se a conta o princípio da dignidade da pessoa humana, faz-se necessário uma reflexão e atualização do mundo jurídico, prezando pelo pleno desenvolvimento dos indivíduos e resguardando seus direitos.

O Código Civil de 1916 já vinha trazendo o direito de reconhecimento de filiação, porém em termos mais exclusivos, com interpretações que hoje não cabem à realidade familiar; por este motivo, os tribunais, atualmente, exigem a superação deste no que tange ao conceito tradicional de família, aquele que considera tão somente os laços de consanguinidade (OLIVEIRA; SANTANA, 2017).

Segundo Scott Junior (2010), a paternidade socioafetiva, apesar de parecer um fenômeno novo, já está nas famílias há muito tempo e somente na atualidade houve a evolução da legislação e da doutrina para que ela fosse compreendida em nosso ordenamento jurídico pátrio. Assim, entende-se que a “paternidade não tem ligação direta com fatores biológicos para ser determinada (SCOTT JUNIOR, 2010, p. 37), uma vez que está unida pelos laços socioafetivos construídos diariamente na relação de pai e filha(o).

Fonte: encurtador.com.br/uvS45

Através do art. 227, § 6º, da Constituição Federal de 1988, fica assegurado um conceito de paternidade mais amplo, ao doutrinar que “os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação” (BRASIL, 1988).

Um dos temas que levantam discussões em torno da paternidade socioafetiva é com relação ao Direito Sucessório, no questionamento de se a(o) filha(o) de criação, aquela(e) considerada(o) por laços afetivos, também teria o mesmo direito de sucessão dos filhos biológicos.

Como apontam Oliveira e Santana (2017), existe no legislativo uma omissão quanto à regulamentação da paternidade socioafetiva, deste modo, é mister que os julgadores façam tanto quanto possível para extirpar a desigualdade de tratamento entre os filhos, sejam eles de parentesco civil, natural ou socioafetivo.

No sentido de filiação, relação entre pais e filhos, entende-se que não deva haver nenhuma distinção entre estes, sejam eles legítimos ou ilegítimos – este último considerado os filhos frutos de relação fora de “justas núpcias” (OLIVEIRA; SANTANA, 2017, p. 94). Sendo assim, conforme o artigo já mencionado da CF/88, é inadmissível, então, que filhos consagrados numa relação filial de paternidade socioafetiva, não venham a usufruir dos bens, heranças e demais efeitos sucessórios que cabem também aos filhos consanguíneos.

No mesmo sentido, Scott Junior (2010) salienta que se a(o) filha(o) é legalmente reconhecida(o) nesta espécie de paternidade, logo não há dúvidas quanto aos direitos sucessórios. Por fim, depreende-se que o vínculo afetivo não torna a relação filial de menor importância perante a jurisprudência, cabendo aos magistrados a efetividade desses direitos nos acordos.

REFERÊNCIAS:

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 24 nov. 2020.

OLIVEIRA, Eliana Maria Pavan de; SANTANA, Ana Cristina Teixeira de Castro. Paternidade socioafetiva e seus efeitos no direito sucessório. Revista Jurídica Uniaraxá, Araxá, v. 21, n. 20, p. 87-115, ago. 2017. Disponível em: https://core.ac.uk/download/pdf/231278205.pdf. Acesso em: 24 nov. 2020.

SCOTT JUNIOR, Valmôr. Efeitos sucessórios da paternidade socioafetiva. Sociais e Humanas, Santa Maria, v. 23, n. 02, p. 35-46, jul/dez 2010. Disponível em: https://periodicos.ufsm.br/sociaisehumanas/article/view/3203. Acesso em: 24 nov. 2020.