Tratamento de Depressão e o Preconceito contra os Antidepressivos

Vivemos em um tempo onde cada vez mais se torna comum termos contato com o adoecimento psíquico, seja porque nós mesmos estamos vivenciando, ou temos pessoas próximas que passam por estes desafios e assim afetam também a vida dos que os rodeiam, gerando muitas vezes busca por conhecimento acerca do que são os transtornos, como se manifestam, como podem ser tratados, e nos perguntamos qual o melhor tipo de tratamento para cada um, se realmente precisa de remédio, ou às vezes se basta somente tratar com remédio.

Um dos transtornos mais comuns que se vê na atualidade é a depressão, onde temos como características mais comuns o humor deprimido, a falta de interesse em atividade cotidianas, isolamento, e em casos mais graves pode levar até a ideação suicida. A depressão coloca o indivíduo em um sofrimento que pode chegar a níveis extremos, que pode dificultar a vivência das relações, trabalho, estudos, todas as realidades daqueles que a vivenciam.

Para falarmos sobre o tratamento mais adequado e eficaz para este adoecimento, precisamos compreender como ele acontece, suas causas, e como se dá o aprofundamento dos sintomas, e um consenso de que a depressão pode se desenvolver por diversos fatores, sendo alguns deles a predisposição genética, acontecimentos traumáticos, personalidade, sociais e de relacionamentos interpessoais, não pode ser atribuída a uma única (BARROSO, 2018).

No nosso cérebro por algum ou mais um destes motivos os neurônios para de produzir um ou mais dos seguintes neurotransmissores: serotonina, noradrenalina e dopamina, conforme Lage (2011), e com a diminuição na produção desses neurotransmissores começa a diminuir a quantidade de sinapses realizadas, e os neurônios vão sendo cada vez menos estimulados, a partir deste momento já aparecem os primeiros sintomas. É importantíssimo que desde os primeiros sintomas procure ajuda, pois a tendência é de que com o passar do tempo os sintomas se aprofundem, os neurônios que estão sendo pouco estimulados, param de produzir uma vitamina chamada BDNF, vitamina que é alimento dos neurônios, e passam a diminuir a quantidade de suas conexões, e chegando ao ponto destes neurônios deixarem de existir.

Figura 1 – Esquema de neurônios com e sem a vitamina BDNF que só é produzida em neurônios que são frequentemente estimulados.

 

Uma breve analogia para entendermos este processo natural do organismo é quando praticamos alguma atividade física, e nosso corpo vai ganhando mais músculos nas áreas mais estimuladas e vai se fortalecendo, no entanto quando deixamos de fazer atividade física tudo aquilo que havia sido adquirido de massa muscular e preparo físico logo desaparecem, dessa mesma forma se dá no cérebro humano, a medida que uma parte deixa de ser estimulada ela começa a diminuir e por fim os neurônios vão deixando de existir. Assim é possível observar os casos mais profundos de depressão que os indivíduos apresentam muita dificuldade de melhora, se dá justamente por esta perda de massa cerebral.

Partindo deste entendimento da depressão, como traçar a melhor forma de tratamento? Para este, como para muitos transtornos não há uma resposta certa que contemple todos as pessoas, cada pessoa que vive com este transtorno o experimenta de uma forma, apresenta sinais e sintomas diferentes, e isto afeta suas realidades também de formas diferentes. Por isso o tratamento para cada paciente é único, mas podemos aqui trazer aspectos essenciais para o tratamento, como ao perceber os primeiros sintomas já buscar ajuda profissional, procurar terapia para trabalhar suas questões de sofrimento e fazer psicoeducação aprendendo a identificar e lidar com os sintomas, percebendo a necessidade buscar o tratamento medicamentoso, procurar criar hábitos saudáveis, tanto em nível de alimentação quanto a atividade física, e contar com o apoio da rede de apoio, pessoas próximas com se tem bom vínculo de confiança.

Como falado para cada pessoa existe um tratamento específico, estes aspectos citados são os basilares de qualquer tratamento deste transtorno, e para além deste entram as estratégias específicas para cada realidade encontrada. E aqui nesse processo de tratamento podemos encontrar muitos desafios relacionados à adesão ao tratamento, tanto a resistência das pessoas em buscarem a terapia para trabalhar suas questões pessoais, quanto o preconceito quanto ao tratamento medicamentoso quando ele é evidenciado como necessário no caso em questão.

Trazemos ainda como marca da sociedade media certa resistência quanto a terapia, que por gerações foi tido como coisa para ‘loucos’, comportamento este que expõe os indivíduos a se permitirem sofrer muito mais do que precisam e por vezes esperar que seus sofrimentos cheguem a níveis que já atrapalham todas as áreas de suas vidas para só neste momento buscarem ajuda para lidar e manejar seus problemas. 

Outro grande problema frequente no tratamento da depressão está no preconceito ligado ao uso do medicamento, que pode se dar por diversos motivos como por não ser bem explicado aos indivíduos que começam este tipo de tratamento que ele demora certo tempo para começar a apresentar o efeito desejado de melhora nos sintomas da depressão, e que, no entanto os efeitos adversos podem começar no dia seguinte ao início do tratamento. 

Questão comum também ligada ao tratamento medicamentoso no tratamento é o medo de se tornarem dependentes pelo resto de suas vidas do remédio, no entanto não a menor parte das pessoas que fazem tratamento com antidepressivos acaba tendo que fazer uso por tempo muito mais prolongado do medicamento, justamente por estar vivenciando uma depressão mais profunda com perda de massa encefálica, o que dificulta a recuperação do indivíduo. 

Faz-se necessário compreender o porquê da demora do medicamento em trazer a melhora em relação a velocidade em trazer seus efeitos colaterais. Como visto a depressão altera o processo de produção de um ou mais dos neurotransmissores, serotonina, noradrenalina e dopamina, então a maioria dos antidepressivos age nos neurônios impedindo que ele recolha os neurotransmissores que ainda não se uniram aos receptores do outro neurônio fazendo que estes neurotransmissores passem mais tempo na fenda e possam se ligar e produzam assim a quantidade normal de sinapses (comunicação elétrica entre neurônios), com a quantidade baixa que está sendo produzida pelos neurônios.

No entanto, os mesmos neurotransmissores importantes na depressão, também estão diretamente ligados a outros processos no corpo humano, como olhos, glândulas salivares, intestino, pâncreas, rins, fígado, coração, pênis. O remédio que faz efeito nas sinapses cerebrais também faz nestes sistemas, pois usam os mesmos neurotransmissores, o que explica os efeitos colaterais dos medicamentos, algo importante a ressaltar é que estes efeitos são considerados efeitos leves que o organismo do indivíduo a curto prazo ou deixam de existir ou são assimilados pelo organismo e o indivíduo encontra meios para lidar com os efeitos no cotidiano, como a sensação de boca seca, que faz com que a pessoa passe a tomar mais água em vista de diminuir esta sensação.

Mas por que o antidepressivo não tem ação rápida, e eficaz já no primeiro dia? O cérebro tem seu sistema de segurança e Feedback, cada neurônio tem uma estrutura que analisa a quantidade de neurotransmissores lançados na fenda sináptica e envia um Feedback para o próprio neurônio, ou indicando que esta tudo normal ou esta estrutura percebe que tem um volume muito elevado de neurotransmissores e começa a agir diminuindo ainda mais a produção de neurotransmissor e diminuindo a quantidade que é lançada na fenda, só depois de alguns dias ou semanas fazendo o uso da medicação é que esta estrutura desiste de inibir a produção e as sinapses voltam à normalidade e assim a pessoa passa a sentir a melhora com o uso do remédio. 

Figura 2 – Neurônio serotoninérgico, auto receptor é destaque em roxo.

Com o passar de alguns meses fazendo o uso corretamente da medicação o neurônio que foi muito estimulado, voltou a produzir sua vitamina e pode voltar a produzir em quantidade normal os neurotransmissores que estavam sendo produzidos em baixos níveis, paralelo a este tratamento medicamentoso que trata os sintomas, se o indivíduo buscou a terapia tratou também as possíveis causas do transtorno, podendo fazer com que estes níveis de neurotransmissores não voltem a diminuir, e se organizou em relação a hábitos saudáveis, esta pessoa tem grandes chances de ter uma vida melhor sem sofrer com sintomas de depressão, e poderá deixar de fazer o uso do medicamento, fazendo o desmame de forma correta junto ao profissional competente.

Portanto, diante da percepção dos sintomas, se faz necessário buscar ajuda, fazer terapia, buscar hábitos saudáveis, e se necessário viver o processo de tratamento medicamentoso para que tão logo quanto possível o organismo possa voltar a normalidade e que possa bem viver cada aspecto da vida. 

Referências 

BARROSO, Sabrina Martins; BAPTISTA, Makilim Nunes; ZANON, Cristian. Solidão como variável preditora na depressão em adultos. Estudos Interdisciplinares em Psicologia, v. 9, n. 3, p. 26-37, 2018.

LAGE, Jorge Teixeira. Neurobiologia da depressão. 2011.