O processo de morrer e o enlutamento: análise comparativa dos modelos teóricos do luto, etapas, processos e tarefas

O luto é uma experiência profundamente pessoal, mas sua compreensão teórica pode ser facilitada por diferentes modelos que exploram as emoções, tarefas e processos envolvidos.

 Este trabalho visa explorar a comparação dos modelos teóricos do luto com ênfase nos trabalhos de Elisabeth Kübler-Ross, J.W. Worden, e H. Schut e M. Stroebe. A análise será conduzida através de pesquisas bibliográficas, permitindo uma investigação detalhada sobre etapas, processos e tarefas envolvidas no luto. A escolha deste tema é justificada por poder contribuir significativamente para a prática profissional. Portanto, em casos de sofrimento com o luto, a compreensão aprofundada deste fenômeno pode auxiliar na melhoria de um atendimento psicoterapêutico.

O luto é uma experiência profundamente pessoal, mas sua compreensão teórica pode ser facilitada por diferentes modelos que exploram as emoções, tarefas e processos envolvidos. Entre os mais influentes estão os modelos de Elisabeth Kübler-Ross, J.W. Worden, e H. Schut e M. Stroebe. Cada um oferece uma perspectiva única sobre como lidamos com a perda, refletindo diferentes dimensões da experiência de luto.

Elisabeth Kübler-Ross, em seu trabalho pioneiro, delineou cinco estágios que muitas pessoas experimentam após a perda de um ente querido. A primeira é a negação, nesta fase inicial a pessoa pode ter dificuldade em aceitar a realidade da perda. A negação serve como um mecanismo de defesa, permitindo que a pessoa enfrente a dor da perda gradualmente. Raiva; À medida que a realidade se torna mais evidente, sentimentos de raiva podem surgir. Essa raiva pode ser direcionada a si mesma, a outros ou até à pessoa falecida. Essa fase é uma resposta natural à frustração e à impotência diante da perda.  O terceiro estágio é a negociação, a pessoa tenta fazer acordos ou promessas na esperança de reverter a situação, comum ouvir pensamentos do tipo: “Se eu tivesse feito isso, talvez não teria acontecido.” (Também conhecido como “barganha”).

“Não, eu não, não pode ser verdade”. Esta negação inicial era palpável tanto nos pacientes que recebiam diretamente a notícia no começo da doença quanto aqueles a quem não havia sido dita a verdade, e ainda naqueles que vinham a saber por conta própria (KÜBLER-ROSS,2012, p.43).

A Depressão; esta fase é marcada por uma profunda tristeza e reflexão sobre a perda. A pessoa pode sentir-se sobrecarregada e isolada, lidando com a dor emocional de forma mais intensa. A última fase é a aceitação, envolve aceitar a realidade da perda. Embora a dor possa permanecer, a pessoa começa a encontrar um novo sentido na vida, integrando a perda em sua história pessoal.

Não se confunda aceitação com um estágio de felicidade. É quase uma fuga de sentimentos. É como se a dor tivesse esvanecido, a luta tivesse cessado e fosse chegado o momento do “repouso derradeiro antes da longa viagem” (KÜBLER-ROSS,2012, p.118). Kübler-Ross enfatiza que esses estágios não são necessariamente lineares. As pessoas podem transitar entre eles de maneira não sequencial, o que reflete a complexidade do luto. O modelo também destaca a importância do diálogo sobre a morte, incentivando uma conversa aberta sobre o tema, que pode ajudar na aceitação e compreensão do processo.

As principais críticas aos estágios do luto de Kubler-Ross são que os estágios foram desenvolvidos sem evidências suficientes e muitas vezes são aplicados de forma muito rigorosa. A autora e seus colaboradores desenvolveram suas ideias qualitativamente através de entrevistas aprofundadas com mais de duzentos pacientes terminais. Os críticos se concentraram no fato de que sua pesquisa e uso de “estágios” não foram validados empiricamente. Também se diz que o conceito de “estágios” é aplicado de forma muito rígida e linear.

                                                                                                                                                                                Fonte: canva

O autor J.W. Worden apresenta uma abordagem prática e orientada para as tarefas que as pessoas precisam enfrentar durante o luto. Worden destaca que o luto é um processo ativo, onde o engajamento em cada uma das tarefas é essencial para a cura. Essa abordagem também reconhece a importância do suporte social e da individualidade da experiência de luto, permitindo que cada pessoa encontre seu próprio caminho.

A expressão “luto” representa uma experiência universal de perda, especialmente após a morte de um ente querido. O luto também é um processo cognitivo que requer confronto e reestruturação de pensamentos sobre o falecido, a experiência da perda e o mundo alterado no qual o sobrevivente deve viver agora. O processo, conhecido como trabalho de luto, inclui tarefas básicas a serem realizadas pelo sobrevivente para se adaptar à perda (Worden, 2018).

A primeira tarefa envolve reconhecer e aceitar que a pessoa amada não está mais presente. Essa aceitação é fundamental para começar o processo de luto. A segunda tarefa é processar a dor da perda; enfatiza a necessidade de enfrentar e experimentar a dor e as emoções que surgem, isso pode incluir tristeza, raiva e confusão. A terceira tarefa é de se ajustar sem o ente querido; envolve adaptar-se a novas circunstâncias, o que pode incluir mudanças na rotina, no papel social e nas relações. É um processo de reconfiguração da identidade e da vida diária. A última tarefa é encontrar um modo de manter um vínculo com o falecido; sugere que é possível continuar a honrar e lembrar a pessoa que partiu, mantendo um vínculo emocional que não impede o avanço, mas enriquece a vida.

   O modelo dual proposto por H. Schut e M. Stroebe oferece uma perspectiva inovadora que combina dois tipos de processamento emocional. O primeiro deles é o processamento da perda; esta dimensão envolve o enfrentamento da dor e das emoções associadas à perda. O foco está em reconhecer e processar a tristeza, a saudade e outras reações emocionais. E o segundo processamento é da restauração; dimensão que diz respeito à adaptação à nova realidade e à busca por novas atividades e relacionamentos, este processamento é voltado para a reconstrução. 

                                                                                Fonte: canva

Desse modo, para sintetizar as principais descobertas deste trabalho, é possível afirmar que cada um desses modelos oferece uma visão única, mas eles também apresentam inter-relações e complementaridades. O modelo de Kübler-Ross, com suas etapas emocionais, pode ser visto como um precursor que influenciou as outras duas abordagens. Enquanto Kübler-Ross se concentra nas reações emocionais, Worden introduz a ideia de tarefas a serem completadas, o que fornece um aspecto mais prático e ativo ao luto. Por outro lado, o modelo de Schut e Stroebe acrescenta uma nova dimensão ao enfatizar a oscilação entre a dor e a adaptação. Essa fluidez no processo de luto é uma característica que complementa a rigidez das etapas de Kübler-Ross e a estrutura das tarefas de Worden, oferecendo um espaço para a individualidade e a complexidade emocional. Observou-se que juntas, essas abordagens oferecem uma visão abrangente e multifacetada do luto, permitindo que profissionais de saúde mental e indivíduos compreendam e naveguem essa experiência profundamente humana.

Autoria:  Amanda Franceschini Aguiar e Maria Vitória Cardoso

 

 Referências

AVIS, K. A.; STROEBE, M.; SCHUT, H. Stages of Grief Portrayed on the Internet: A Systematic Analysis and Critical Appraisal. Frontiers in Psychology, v. 12, n. 12, 2 dez. 2021

CESAR.et. al. Luto: uma perspectiva da terapia analítico comportamental. Psicologia Argumento, v. 33, n. 83, 2015.

KHOSRAVI, M. Worden’s task-based approach for supporting people bereaved by COVID-19. Current Psychology, v. 40, n. 11, 2 Jan. 2021.

M, S.; H, S.; K, B. Cautioning Health-Care Professionals. Disponível em: <https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/28355991/>.

OUR HOUSE. Worden’s Four Tasks of Mourning – OUR HOUSE Grief Support Center. Disponível em: <https://www.ourhouse-grief.org/grief-pages/grieving-adults/four-tasks-of-mourning/>.

STROEBE, M.SCHUT, H. The Dual Process Model of Coping with Bereavement: A Decade on. OMEGA – Journal of Death and Dying, v. 61, n. 4, p. 273–289, dez. 2010.

STROEBE, M.SCHUT, H. The Dual Process Model of coping with Bereavement: Rationale and Description. Death Studies, v. 23, n. 3, p. 197–224, mar. 1999.

TYRRELL, P. et al. Kubler-Ross stages of dying and subsequent models of grief. Disponível em: <https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK507885/>.