Em 20 de fevereiro, o país chama a atenção para as consequências geradas pelo uso excessivo dessas substâncias
Ao longo dos últimos meses, pesquisas confirmaram o aumento no consumo de álcool e drogas provocado pelo isolamento social, durante a pandemia de Covid-19. Estudo da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), por exemplo, reportou que 35% dos entrevistados com idades entre 30 e 39 anos relataram ter ampliado o número de ocasiões em que consumiram mais de cinco doses de álcool. Como resultado, a OMS (Organização Mundial da Saúde) chegou a recomendar que os países limitassem a venda de bebidas alcoólicas no período. Nesse sentido, ganha ainda mais importância a data de 20 de fevereiro, considerada o Dia Nacional de Combate às Drogas e ao Alcoolismo.
“Uma campanha deste tipo chama a atenção para uma problemática recorrente, que nos acompanha todos os dias”, avalia Guilherme Campanhã, psicólogo do CAPS AD (Centro de Atenção Psicossocial de Álcool e Drogas) Jardim Ângela, gerenciado pelo CEJAM – Centro de Estudos e Pesquisas “Dr. João Amorim” em parceria com a Prefeitura Municipal de São Paulo.
“Poder dedicar um dia para falar especificamente sobre as drogas possibilita repensar nossa relação com as substâncias psicoativas e promover maior consciência no papel que elas ocupam na vida de todos”, completa.
Em seu atendimento clínico diário, o psicólogo também observou um agravamento no quadro de usuários de álcool e drogas. De acordo com o profissional, esse aumento no consumo ocorre principalmente em uma tentativa de “suportar” as incertezas e transformações trazidas pela pandemia.
“Ocorre que, muitas vezes, o caminho conhecido para lidar com angústias é justamente o uso abusivo destas substâncias. Construir novas formas de elaborar e encarar as dificuldades é o que permite a ressignificação do papel das substâncias na realidade destes usuários”, afirma.
Para auxiliar a população neste momento difícil, São Paulo disponibiliza o atendimento através dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e das Unidades Básicas de Saúde (UBS). A rede municipal conta, atualmente, com 95 CAPS, sendo 31 deles sobre Álcool e Drogas (AD), 32 Infanto-juvenis e 32 Adultos.
No entanto, ainda assim, é preciso ampliar o debate sobre o assunto. “Ainda que, hoje em dia, a questão das drogas seja discutida mais abertamente, temos muito o que avançar. Se por um lado os adolescentes têm mais acesso à informação, por outro as dificuldades econômicas, sociais e a falta de perspectivas empurram os jovens para um consumo cada vez maior das substâncias”, avalia.
Atenção com familiares
No processo de atendimento, acolhimento e tratamento dos dependentes químicos é muito importante que a família esteja envolvida em uma rede de proteção. Muitas vezes cabe aos próprios familiares perceberem os sinais que indicam uma possível dependência, como mudanças bruscas no padrão do humor, dificuldades em manter uma rotina e sustentar as relações.
“Precisamos encarar a dependência química de forma aberta e sem preconceitos. Os familiares podem sempre buscar ajuda e orientações nos equipamentos de saúde, em especial os CAPS, que mantêm plantão de acolhimento ‘porta aberta’, sem necessidade de encaminhamento prévio. É importante ressaltar que, ainda que o paciente apresente resistência em se tratar, os CAPS estão aptos a acolher e atender os familiares”, explica o psicólogo.
“A melhor forma de ajudar uma pessoa nesta situação é não julgá-la, colocando-se ‘ao lado dela’. Ocorre que muitas famílias ainda enxergam a dependência química como um desvio de caráter e não como uma doença e isso, certamente, dificulta o processo de aceitação e o próprio tratamento em si”, completa.
Principalmente em relação ao álcool, os familiares podem avaliar se o consumo deixou de ser eventual para se tornar um hábito, a partir da frequência e da quantidade ingerida. “De forma geral, quando o uso de determinada substância começa a se sobressair em detrimento da rotina de vida da pessoa, além do surgimento de conflitos e prejuízos nas mais diversas áreas da vida, é preciso acender o sinal de alerta e buscar ajuda profissional”, conclui Guilherme Campanhã.