
Na quinta-feira, 22 de maio, o (EN)CENA abriu as portas para um encontro com estudantes de Psicologia acima de 40 anos, com o tema: “Vozes femininas – tecendo significados no entardecer da vida”. O evento foi uma iniciativa das alunas do curso de Psicologia Glaucilene Santana, Lilian Rosa e Marildes Martins, vinculadas ao (EN)CENA, com o objetivo de promover a discussão sobre a meia-idade feminina e o processo de individuação, por meio da escuta e da troca de experiências, valorizando suas narrativas e ressignificações.
O evento apresentava um chamado para as alunas de Psicologia acima de 40 anos refletirem sobre a meia-idade feminina e o processo de individuação; a potência das narrativas compartilhadas; ressignificações coletivas nessa fase da vida, através de um espaço acolhedor de escuta e troca, com diálogos que valorizam sua trajetória e rede de apoio para novas descobertas.
Iniciamos o encontro com uma dinâmica profunda chamada “O Baú das Estações: Cartas à Mulher que Sou”, integrando os conceitos de individuação de Jung, a sabedoria do entardecer da vida e a celebração das múltiplas vozes femininas. Nesse sentido, objetivou-se facilitar a reflexão sobre a jornada de individuação, incentivando as participantes a reconhecerem e integrarem suas diferentes “vozes internas” ao longo das estações da vida, com acolhimento e profundidade.
E, a partir de algumas perguntas disparadoras, demos início à discussão e reflexão das participantes:
Como você está vivenciando a meia-idade? Há crise?
Quais pressões sociais são mais marcantes nesta fase?
A vivência da meia-idade é um convite para reexaminarmos nossa vida e questionar: quem sou eu além da minha história e dos papéis que representei? Essa fase da vida aponta para possíveis sentimentos de perda e vazio, incentivando a introspecção para encontrar a totalidade interior. A Psicologia Analítica de Jung chama esse processo de individuação, um momento onde a pessoa passa a se conectar com seu verdadeiro eu, promovendo equilíbrio interno e uma vida mais plena. É uma jornada única para cada um, que envolve autodescoberta, aceitação e crescimento contínuo. Isso faz sentido para você?


O diálogo conduziu as participantes por uma jornada que transcendia o tempo linear, tecendo conexões entre memórias, desafios do presente e expectativas futuras. Ao desvendar as camadas do processo de maturidade feminina, ficou claro que ele não se resume a uma simples passagem cronológica, mas envolve rupturas, reinvenções e, sobretudo, um confronto com estruturas sociais que insistem em definir a mulher a partir de estereótipos limitantes.
A escassez de pesquisas focadas nessa fase da vida não é mero acaso: reflete um apagamento sistemático. O etarismo atua como um mecanismo de invisibilização, especialmente quando a mulher deixa de cumprir os papeis tradicionalmente esperados, seja da juventude idealizada, seja da maternidade como única forma de legitimação social. O que emerge, então, é uma contradição dolorosa: enquanto a sociedade celebra a “liberdade” das mulheres mais jovens, aquelas em fases posteriores são frequentemente relegadas a um lugar de silêncio, como se suas experiências, desejos e até mesmo suas crises não merecessem espaço de fala.

E é justamente aí que a Metanoia, essa crise transformadora, se revela crucial. Longe de ser um mero turbilhão emocional, ela representa um portal para a individuação, um processo no qual a mulher é convocada a se reencontrar além dos papéis desempenhados para os outros. Ao mergulhar em sua sombra, ela enfrenta aspectos abandonados ou reprimidos: sonhos adiados, frustrações não elaboradas, potências negadas. Não se trata de um movimento solitário, mas de um ato político, pois questiona a noção de que a vida feminina deve ser sempre dedicada ao cuidado externo, nunca ao auto encontro.
O desejo por liberdade e por laços afetivos incondicionais, comum a todas as participantes, ecoa como um manifesto tácito. Liberdade não no sentido superficial, mas como autonomia sobre o próprio corpo, tempo e narrativa. E laços que não exijam a diminuição de si, mas que permitam existências plenas, sem a cobrança de eternas doações emocionais.
O evento, ao criar um espaço seguro para essas reflexões, mostrou que a conscientização sobre esse processo é ferramenta fundamental para desmontar estigmas. Os depoimentos compartilhados não apenas validaram experiências individuais, mas construíram uma teia coletiva de resistência. A troca ao encerrar o encontro foi mais que um momento de descontração, simbolizou o alimento do diálogo, do acolhimento e da sororidade necessária para que essas mulheres, e todas as outras, possam atravessar suas metamorfoses sem serem devoradas pelos mandatos sociais que insistem em lhes dizer quem devem ser.
Autoras:
- Glaucilene Lopes Santana
- Lilian Rosa Nunes
- Marildes Martins da Silva Rocha