Eu nunca quis…

O dia foi agradável, diria até feliz, mas logo aquela felicidade se esvaiu e deu espaço para minha dor lacerante.

Mesmo sendo considerada a mais animada da turma, detentora do título de descolada, tudo cai ladeira abaixo quando retiro a fina camada de maquiagem que esconde a minha real faceta.

Meus amigos e familiares até pensam que eu estou bem, até comentaram as recentes mudanças no meu corte de cabelo, vestimenta, comportamento, mas sem real interesse pelo que se passa comigo.

Quando cheguei no meu apartamento, sentei-me no sofá com as luzes apagadas, refletindo se realmente deveria fazer isso.

Eu imaginava que a minha mente estaria bagunçada, cheia de dúvidas, mas pelo contrário, estava límpida, serena, dando a sensação de que essa era a única alternativa viável.

Pensei em deixar alguma mensagem de despedida, mas percebi que não aliviaria a dor.

Tomada a decisão, percebi que meu cérebro começou a trabalhar de uma forma que tudo parecia simples e rápido de resolver, sem aquele peso moral da decisão, me sentia finalmente livre da dor que carreguei durante toda minha existência.

Por longos minutos me senti aliviada, até mesmo feliz e ansiosa para fazer o que estava por vir.

Pensei nos métodos, pensei na eficácia, nada poderia dar errado. O planejamento foi demorado, percebi que já era madrugada quando senti fome.

 Ao me levantar, senti um leve impulso de verificar as minhas notificações no celular que esteve todo esse tempo no modo silencioso.

Me espantei, recebi um texto enorme da pessoa que mais me machucou na minha vida, a que mais fez com que eu me sentisse inútil e incapaz. Esse texto era um pedindo de desculpas, nele continha histórias que eu nem lembrava que ele tinha feito comigo.

Quando terminei de ler a carta do meu pai, toda aquela certeza, todo aquele impulso ruiu, um terrível choro de alívio e dor dominou meu corpo, esqueci tudo que tinha que fazer. Aquilo me salvou.