Eu estava quase subindo as escadas para me encontrar com Sandra em seu apartamento. Paro. Por que estou fazendo isso? Será que minha vida vai mudar com ela? Estamos destinados a ficar juntos a vida toda? Sandra é uma mulher de vinte e cinco anos, eu tenho vinte e três. Ela trabalha em um jornal cultural do Rio de Janeiro. Posso dizer que ela é uma mulher forte, decidida. Eu nem sei quem sou ou o que vou fazer da minha vida. Posso estar me enganando, e enganando ela.
Meus pais me apresentaram a ela há dois meses. Eles a conheceram em uma festa na Tijuca, ela estava trabalhando para o jornal cultural. Meu pai e minha mãe gostaram muito dela. Dizem que ela vai ser o amor da minha vida, a mulher perfeita, os meus filhos com ela seriam lindos. Eu quis conhece-la, pois eles queriam muito que eu saísse com ela.
Continuo parado no primeiro degrau. Eu não sei se subo para encontrar a Sandra ou se vou embora, não quero magoá-la. Eu digo que estou doente. Ou que houve um imprevisto no trabalho. Eu não quero subir essas escadas. Sento. Começo a discar o número dela. Desisto. Não quero mais ligar. Começo a chorar. Eu não quero mentir para ninguém. Eu gosto de outra pessoa. Enxugo as lágrimas e paro de chorar. Levanto.
Penso na primeira vez que eu e Sandra saímos. Confesso que ela estava linda. Usava um vestido preto com um brilho prateado. Os brincos de prata. Batom vermelho. Nós conversamos sobre tudo da vida. Contei a ela que estava terminando a faculdade de direito. Ela me perguntava várias coisas sobre o curso, tinha um grande interesse na área. Eu me sentia bem com ela. Mas apenas como amigos. Não sei o por quê de eu estar forçando as coisas.
Eu gosto de outra pessoa… Ricardo, um amigo que conheci na faculdade, ele faz letras. Nós sempre conversamos quando saímos para beber. Tenho uma grande afeição por ele. Temos tanta coisa em comum. Um dia nós estávamos em um bar e ele me falou que uma vez estava sozinho na praia do Arpoador em Ipanema, e ele ficou sentado na areia. Era fim de tarde. Várias pessoas passando por ele. E ele imaginou que um dia ele iria ter uma casa com vista para o mar, era seu maior sonho. E nesse lugar ele iria escrever vários livros. Uma grande inspiração, o mar. E ele não parava de falar nisso. Eu perguntei se ele iria viver sozinho nessa casa, respondeu que não sabe. Falei que todo mundo precisa de alguém para viver, todos precisam de um amor. Ele discordou. É uma das coisas que não temos em comum. Ele é engraçado.
Ainda estou parado perto da escada. Meu celular toca. Era Sandra. Não sei o que faço. Acabo atendendo. Ela disse que eu estava demorando muito para chegar ao apartamento dela. Digo que não posso ir, pois minha mãe estava passando mal e eu tinha que vê-la. Sandra acredita. Falo com ela que marcamos outro dia para nos encontrar. Saio do prédio.
Fico andando na calçada, sem um rumo. Chego à praia do Arpoador depois de quarenta e cinco minutos perambulando pela cidade. Decido que vou ficar um tempo sentado na areia observando a noite. Olho para o céu escuro, as estrelas, e a lua, tudo ali mexe comigo. Cada estrela tinha seu lugar no céu, cada uma tinha o que fazer na noite, brilhar. Estava sozinho olhando aquela multidão de estrelas. Eu percebo que estou confuso. Algo está acontecendo dentro de mim. É o fim.
Meu celular toca novamente. Ricardo estava ligando. Eu atendo e digo para ele que estava na praia do arpoador. Disse que me aconteceu quase a mesma coisa que ele teve, mas dessa vez eu não via meu sonho. Eu estava no escuro. Não sabia o que iria acontecer comigo, eu estava perdido. De repente ele me convida para conhecer seu novo apartamento, que era ali em Ipanema mesmo. Disse que tinha umas cervejas para beber. Falei que eu iria e ele me disse o endereço. Levantei-me da areia e fui andando até o apartamento. Cheguei ao prédio.
Quase subindo a escada, paro no primeiro degrau. Eu preciso subir. Penso em como vai ser lá em cima na casa de Ricardo, será que ele está sozinho? Eu preciso soltar o que está aqui dentro do meu peito. Necessito desabafar com ele. Eu preciso dizer algo para Ricardo. Ele tem que me entender. Eu começo a subir as escadas e vejo uma luz, enxergo meu sonho.
Ilustração: Hudson Eygo