Com 38 semanas de gravidez, às 04:00 horas da manhã, comecei a sentir dores características de contrações. As mesmas se davam de forma leve e com grande intervalo de tempo, sendo as dores suportáveis decidi por continuar em casa até quando as mesmas começassem a ocorrer com mais intensidade, pois pensei sobre ir para a maternidade no começo do trabalho de parto e ter que passar por todo processo burocrático existente dentro da maternidade do hospital Dona Regina.
Por volta das 06:00 às dores se tornaram moderadas e com intervalo de tempo intermediário, então decidi por informar a minha mãe, pessoa que me acompanhou no momento do parto, que estava sentindo contrações e que já considerava que as dores estavam com uma intensidade moderada. Começamos a organizar as coisas para ir para a maternidade. Às 09:30 minha mãe ligou para o SAMU para podermos ir para a maternidade, pois estávamos sem carro, na central do SAMU foi informado que os mesmos estavam sem ambulância disponível e forneceram o contato dos bombeiros. Quando minha mãe ligou para os bombeiros os mesmos informaram que não prestam esse tipo de serviço, mas diante a indisponibilidade do SAMU o serviço seria realizado, pois deveria ser cumprindo o princípio do SUS que defende a universalização, onde a saúde é um direito que cabe ao Estado assegurar sendo que o acesso às ações e serviços deve ser garantido pelo mesmo.
Não muito tempo depois os bombeiros chegaram e me buscaram dentro de casa, perguntando se era necessário algum tipo de ajuda para me locomover. Foi permitido que minha acompanhante fosse juntamente comigo na ambulância e dentro da ambulância foram prestados os primeiros atendimentos que foram de aferir pressão, perguntas sobre estado de saúde, possíveis tipos de alergia, assim como também foi cronometrado o intervalo de tempo das contrações, que estavam ocorrendo uma a cada 2 minutos.
Ao chegar na maternidade, devido ao fato de ter ido de ambulância, fui encaminhada diretamente à triagem e após a mesma foi realizado o encaminhamento para o toque, com o intuito de saber quantos centímetros estavam dilatados. Enquanto esperava pelo toque chorava de tanta dor, mas baixo para os outros não perceberem, afinal todos me diziam que aquele era o momento mais feliz da minha vida, então eu não deveria estar chorando. Após o toque veio a notícia de que já haviam 6 centímetros dilatados e que faltavam ainda 4 centímetros para o ideal, que levaria uma média de mais 8 horas para serem atingidos.
Depois do toque fui direcionada para outra sala com outra enfermeira, senti muito medo, pois ninguém me disse o que eu ia fazer em outra sala com outras enfermeiras e minha mãe havia sumido a pedido da enfermeira que fez o toque. Para piorar a situação começaram a me fazer várias perguntas que eu não sabia porque estavam sendo feitas, então fiquei apavorada com a ideia de algo estar errado. Depois de uns 10 minutos em meio a angústia de estar só e de ter que responder perguntas que eu não sabia porque estavam sendo feitas, minha mãe retornou com a roupa de acompanhante e a enfermeira começou a informar a ela porque perguntas estavam sendo feitas e que a partir dali eu já iria para uma sala onde aconteceria o parto. Me senti muito lesada, pois o meu direito à informação sobre minha saúde, que está nos princípios e diretrizes do SUS, não foi respeitado.
A sala do parto era simples e juntamente comigo na sala estava minha mãe e duas enfermeiras obstétricas residentes, que acompanharam e me instruíram no parto. Uma das enfermeiras estava grávida de 8 meses e por isso ficou grande parte do tempo sentada, auxiliando em pequenos detalhes. A outra se apresentou e durante o tempo que estive no trabalho de parto foi compreensível comigo, me ajudando a manter a calma, me deixando escolher como queria ficar, se deitada na cama ou em pé, parada ou fazendo exercícios, sempre respeitando as minhas decisões. Preservou minha autonomia, que é um princípio muito importante do SUS, que preza pela integridade física e moral da pessoa.
Em determinado momento durante este processo a dor havia se tornado insuportável e pedi para realizar o toque novamente e, mesmo faltando muito tempo ainda das 8 horas que foi indicado que demoraria para atingir a dilatação ideal, a enfermeira realizou o toque, para que eu me sentisse melhor. Quando ela fez novamente já haviam 9 centímetros dilatados e não faltaria muito para o ideal. Então ela começou a me instruir sobre o que fazer, pois o parto aconteceria de maneira natural, como de fato aconteceu, e me falou que quando o bebê nascesse colocaria ele sobre o meu peito para que criasse-se um vínculo, mas eu informei que não queria, estava cansada, sem força e sentido uma dor extrema, então ela me falou novamente que colocaria o bebê sobre meu peito e eu novamente disse que não queria, com isso ela pediu para que minha mãe me convencesse a deixar colocar o bebê sobre meu peito e minha mãe disse que não, pois eu já tinha feito minha escolha.
Naquele momento senti o olhar de desaprovação da enfermeira e me senti muito mal, pois o seu olhar dizia que eu tinha que deixar ela colocar meu bebê sobre meu peito, que eu tinha que querer viver aquele momento, mesmo estando cansada e me sentindo exposta, com isso me veio grande tristeza e me senti falhando no meu primeiro momento como mãe, aquilo me arrasou e tive que lidar com mais aquele sentimento em meio a tanto sofrimento que já estava vivendo. Após meia hora do ocorrido meu filho nasceu, 2 quilos e 750 gramas, de parto natural, sem nenhuma complicação, saudável e perfeito, aquele foi o momento feliz que vivi e então percebi que as obrigações existem, mas que para mim elas não serviam e que eu viveria o meu momento feliz da minha maneira.