Sobre aceitação e não aceitação: Relato de uma mulher que namora outra mulher

Por Maria Laura Maximo Martins – mlauramaximo@rede.ulbra.br

Eu não me recordo exatamente com que idade eu me percebi “diferente”. Sei apenas que aos 15 anos beijei uma menina pela primeira vez. Para mim foi tão normal, que não me questionei tentando descobrir se realmente era aquilo, se realmente fazia parte de mim. O que eu sei é que, mesmo rodeada de muitas pessoas convencionais e certos costumes que iam contra esse acontecimento, nunca achei errado. Meu pensamento, desde sempre, foi que devemos respeitar as pessoas como elas são. Ainda mais quando elas estão simplesmente amando.

Entretanto, esse primeiro contato foi apenas uma brincadeira, não foi algo que pesou para mim.Quatro anos após o primeiro beijo, conheci uma mulher que despertou em mim sentimentos e desejos. E foi nessa época que eu de fato compreendi que eu tinha a capacidade de desejar uma pessoa do mesmo sexo. De sentir atração. E a partir daí, no auge dos meus 19 anos, iniciei uma luta que começou primeiramente contra a minha própria pessoa e as sensações que transbordavam meu corpo… 

Eram tantas dúvidas que preenchiam a minha cabeça. Será se eu não estaria apenas confusa? Será se eu não estaria sendo influenciada por colegas? Será se Deus se orgulharia de mim? Será que minha família me aceitaria? Será que a sociedade me abraçaria? Será que eu seria capaz de bater de frente contra cada obstáculo? Será se eu mesma me aceitaria? Será que eu tinha maturidade pra entender, me rotular e lutar infinitas batalhas?

Fonte: Imagem retirada do site Pixabay.

Esse arsenal de questionamentos, misturados com a fase de precisar escolher qual faculdade eu teria que fazer e outras tantas mudanças na minha vida pessoal, abalou meu emocional de maneira extrema e cruel. Mergulhei em uma depressão que sugou, por aquele período, toda a minha essência. Eu, que costumava ser tão sonhadora, já não enxergava meus sonhos e um futuro. A problemática acerca da minha sexualidade foi engavetada, afinal, eu mal saia de casa mesmo. Não socializava. O mundo se resumia ao meu quarto. As pessoas geralmente funcionam durante o dia. O meu dia se tornou noite. E assim, por alguns anos, eu me escondi de diversos ambientes e situações e eventos. E evitava me enxergar também. Não somente nos reflexos de espelhos. Eu evitava não pensar, olhar para o meu eu interno e aos poucos passei a ser uma desconhecida para mim mesma. 

O estrago emocional interno foi tão grande que cogitei sumir e de fato tentei desaparecer. Eu sinto como se tivesse chegado ao fundo do poço e não tivesse mais saída. Deixei de conhecer novas pessoas, por receio de me entregar e me envolver em novos relacionamentos. Foi nessas escolhas de privação que cheguei ao meu extremo. Ou ficaria para sempre afundada naquele poço ou sairia em busca da luz, não existia meio-termo. Por essa razão, mesmo sem forças, arranquei todas as camadas e muralhas que havia construído. E hoje posso dizer que a maioria delas está no chão, já não existem.

Fonte: imagem retirada do site Freepik.

No meio do caos, encontrei a força para ser quem eu sou. Comecei a enfrentar batalhas e me aventurar em lutas para defender a minha essência, a minha orientação sexual, a minha liberdade em amar. Não é fácil lidar com olhares de desaprovação, falas maldosas e atitudes por vezes, veladas. Porém, é libertador. Depois de tantos anos na escuridão, em uma cárcere abstrata e atroz, finalmente, arranquei as amarras e me afoguei em um relacionamento que me traz paz, que me move e me faz esquecer tantos medos que antes cegavam. 

Hoje finalmente posso dizer que me aceitei. Minha esperança agora é poder afirmar que cada pessoa que eu amo, cada familiar, cada amigo, as pessoas em geral desse planeta, também me aceitam, mas não dá para vencer tudo de uma vez. Enquanto esse dia não chega, decido a cada novo dia viver a minha verdade, enfrentando os desafios que teimam em surgir.